PRODUÇÕES LITERÁRIAS DEDICADAS À FORMAÇÃO 

DE REVOLUCIONÁRIOS MARXISTAS QUE ATUAM NO DOMÍNIO DO DIREITO, DO ESTADO E DA JUSTIÇA DE CLASSE

 

PEQUENOS ENSAIOS SOBRE MARXISMO E DIREITO, SOCIEDADE E ESTADO NA REVOLUÇÃO

 

Liberdade, Justiça e Igualdade

Enquanto Deusas da Mitologia Moderna

 

IVAN P. PODVOLOTSKY[1]

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução

Emil Asturig  von München, Julho de 2005

 

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Os que imitam o marxismo - falsificando-o porém - exclamam, de modo a procurar encontrar justificação para as suas próprias posições :

Porém, o que dizer da liberdade do indivíduo, das liberdades de imprensa, expressão, reunião e etc. ?

São também elas, em seu parecer, Direitos de classe e não Direitos individuais ?

 Em verdade, essas assim-denominadas "liberdades" já conseguiram revelar a sua desajeitada natureza de classe, a ponto de, presentemente, pouco existir para ser dito a respeito delas.

Porém, uma vez que a necessidade nos obriga a provar o óbvio ululante, devemos remeter nossos "marxistas" ao próprio Marx.

   

"... quando aquele sujeitinho do Wedde esteve em Londres, pela primeira vez, usei a expressão "mitologia moderna" enquanto designação das Deusas da "Justiça, Liberdade, Igualdade etc.", as quais voltaram a ser a última gritaria do momento. Isso provocou uma profunda impressão em Wedde, pois ele mesmo tem feito muito a serviço desses seres superiores."[2]

 

Assim, para Marx, todas essas categorias nada são senão mitologia, fraude, embuste.

Liberdade, igualdade etc. são, para Marx, tão irreais quanto deusas.

Contudo, alguns "marxistas" encontram-se intoxicados com a "liberdade", a "igualdade" etc. e veneram-nas como se fossem verdades puras e eternas.

Porém, uma liberdade abstrata, eterna, foi inteiramente estranha ao próprio Marx.  

 

"Meus Senhores ! Não fiquem assombrados com a palavra abstrata liberdade. A questão é a seguinte:  Liberdade de quem ? Essa palavra não significa a liberdade de um indivíduo em relação a um outro indivíduo.

Significa a liberdade de que goza o capital para efetuar a exploração dos trabalhadores."[3]

 

Esse é o modo segundo o qual Marx colocava a questão em tela.

Para Marx, uma Deusa Eterna da Liberdade - o fetiche da liberdade - não existe.

O que, de fato, existe é apenas a liberdade para uma certa classe.

Na sociedade capitalista, é a liberdade dos capitalistas de explorarem a classe trabalhadora.

Citaremos, agora, um longo parágrafo de Marx, extraído de sua obra O 18 Brumário de Luís Bonaparte, fazendo votos para que os cabeças-duras quase marxistas sejam capazes de ver o fato de que a liberdade, na sociedade capitalista, é liberdade apenas para os capitalistas :

 

"O quartel-general inevitável das liberdades de 1848, liberdade pessoal, liberdade de imprensa, de expressão, de associação, de reunião, de instrução, de religião etc. adquiriu um uniforme constitucional, que tornou essas liberdades invioláveis.

Com efeito, cada uma dessas liberdades é proclamada como Direito absoluto do cidadão francês, porém com a permanente glosa marginal de que cada uma delas é ilimitada, na medida em que não for limitada por "Direitos iguais de outras pessoas e pela segurança pública", ou por "leis", que devem mediar precisamente essa harmonia das liberdades individuais umas com as outras e com a segurança pública. 

P.ex.:

 

"Artigo 8°. Os cidadãos têm o Direito de se associar, de se reunir pacificamente e sem armas, de peticionar,  expressar seus pensamentos por meio da imprensa ou de um outro modo qualquer. O exercício desse Direito não possui nenhum limite senão os Direitos e a liberdade de terceiros e da segurança pública." (Constitution Française de 1848 (Constituição Francesa de 1848), Capítulo II : Droits de citoyens garantis par la constitution (Direitos dos Cidadãos Garantidos pela Constituição), Artigo 8.

 

"Artigo 9°. O ensino é livre. A liberdade de ensino deve ser exercida segundo as condições de capacidade e de moralidade, determinadas pelas leis e sob a supervisão do Estado." (Ibidem, Artigo 9)          

 

"Artigo 3°. A residência de toda e qualquer pessoa que habite no território francês é inviolável. É proibido nela penetrar, senão em conformidade com as formas e nos casos previstos na lei." (Não com exceção das formas prescritas em lei." (Ibidem, Artigo 3°) etc. etc.

Portanto, a Constituição se refere, constantemente, a Leis Orgânicas a serem promulgadas que deverão executar essas glosas marginais e regular o gozo dessas liberdades ilimitadas, de tal modo que não colidam entre si e nem com a segurança pública.      

Posteriormente, essas Leis Orgânicas serão produzidas pelos amigos da ordem, sendo todas essas liberdades reguladas de tal modo que a burguesia, no gozo que delas faz, não encontrará nenhuma barreira, imposta pelos mesmos Direitos das demais classes.      

Onde proibe inteiramente essas liberdades "a terceiros" ou permite o seu exercício, sob determinadas condições - que nada são senão muitas tramas policiais -, tal sempre ocorre exclusivamente no interesse da "segurança pública", i.e. da segurança da burguesia, tal qual prescreve a Constituição.  

 

Por isso, a seguir, ambas as partes fundam-se, com pleno Direito, na Constituição : tanto os amigos da ordem, que suspendem todas aquelas liberdades, quanto os democratas, que exigem todas elas.

Com efeito, cada parágrafo da Constituição contém sua própria antítese, contém em si mesmo sua própria Câmara Alta e sua própria Câmara Baixa, a saber : liberdade, na frase dotada de sentido geral, supressão da liberdade, na glosa marginal.     

Portanto, enquanto o nome da liberdade foi respeitado e tão somente interditada a sua verdadeira execução - evidentemente, no domínio da via jurisdicional -, a existência constitucional da liberdade permaneceu inviolada, intacta, ainda que a sua existência comum pudesse encontrar-se tão morta.”[4]      

 

A concepção de Engels acerca desse tema encontra-se em inteira conformidade com os posicionamentos de Marx :

 

" ... os assim chamados Direitos do homem ... permaneceram, na prática, limitados à classe dominante, à burguesia, tendo perecido para a classe oprimida, o proletariado, seja de modo direito ou indireto, preservando-se, assim, a ironia da história."[5]

 

Examinando as relações sociais, Marx e Engels descobriram que, em uma sociedade capitalista, a liberdade significa a liberdade dos capitalistas para garantirem a "segurança social" de seu sistema e revelaram que os Direitos das classes oprimidas não resultam em absolutamente nada.

Porém, alguns "marxistas" nada mais fazem senão apenas consultar as Constituições e nelas encontram solenes proclamações acerca da liberdade universal e eterna.  

Conseqüentemente, deixam de ver que essa liberdade não existe na realidade, porquanto sua existência seria contrária aos interesses da "segurança social"

Contudo, existem outras razões responsáveis pelo fato de que, em um sistema capitalista, a "liberdade" do proletariado é uma ficção, um embuste.

Tais razões são, porém, independentes do fato de que o capitalismo permite e tutela a "liberdade" que não entra em conflito com a "segurança social", i.e. com a dominação da classe capitalista.

Sob as condições da dominação econômica da burguesia, a liberdade de propriedade privada é transformada em Direito vantajoso para o capital, em Direito que favorece o sistema capitalista e a dominação, exercida pelos capitalistas.  Do mesmo modo, sob as condições de dominação econômica e política, impulsionadas pelo capital, a liberdade e a democracia são instrumentos da burguesia, utilizados para a opressão das classes exploradas.

Tal como por Marx assinalado :

  

"O "domínio público" moderno, o sistema estatal moderno já formado não possui como fundamento - tal como a crítica o entende - a sociedade dos privilégios, mas sim a sociedade dos privilégios suprimidos e dissolvidos, a sociedade burguesa desenvolvida, na qual encontram-se liberados os elementos vitais ainda politicamente vinculados aos privilégios.

Nenhum "enclausuramento privilegiado" opõe-se aqui, seja em relação ao próximo, seja em face do domínio público. 

Tal como a indústria livre e o comércio livre suprimem o enclausuramento privilegiado e, com isso, a luta deste, travada contra aqueles, colocando, pelo contrário, em seu lugar, o ser humano desvinculado do privilégio excludente da totalidade genérica, porém, concomitantemente, enclausurador de uma pequena totalidade exclusiva  - ser humano esse já não mais ligado a um outro ser humano, por meio da aparência de um vínculo geral -, produzindo, assim, uma luta generalizada do ser humano contra o ser humano, do indivíduo contra o indivíduo, do mesmo modo toda a sociedade burguesa é propriamente essa guerra de todos indivíduos contra todos, apenas mais recluídos em relação ao próximo, por meio de sua individualidade, bem como é o movimento geral desenfreado dos poderes vitais elementares, liberados dos grilhões dos privilégios. 

O oposto do Estado Representativo Democrático e da sociedade burguesa é a perfeição da oposição clássica, existente entre comunidade pública e escravidão.                 

No mundo moderno, cada um é, ao mesmo tempo, membro da escravidão e da comunidade.

Precisamente a escravidão da sociedade burguesa é, segundo as aparências, a maior liberdade, porque a independência aparentemente completa do indivíduo é considerada como sendo sua própria liberdade o movimento desenfreado e não mais enlaçado por vínculos gerais e por seres humanos de seus elementos vitais alienados, tais quais, p.ex., a propriedade, a indústria, a religião, ao passo que ela mesma é, em verdade, muito mais sua escravidão e desumanização mais acabada.      

No lugar do privilégio, surge aqui em cena o Direito.”[6]

 

 A burguesia possui todo o poder econômico, enquanto que o proletariado nada possui.

Em virtude do poder econômico da burguesia, a "liberdade" e a "democracia" permanecem sendo afirmações  fradulentas.  Trata-se da "liberdade" da burguesia de explorar a classe trabalhadora. Nenhum "enclausuramento privilegiado" opõe-se aqui, seja em relação ao próximo, seja em face do domínio público. 

Tal como assinalado por Engels :

 

"A Revolução Francesa foi a origem da democracia na Europa.

A democracia é - e, assim, considero todas as formas de governo - uma contradição em si mesma, uma mentira, no fundo nada senão hipocrisia, teologia - tal como nós, alemães, a denominamos.

A liberdade política é falsa liberdade, o pior modo de escravismo, a aparência da liberdade e, por essa razão, a pior servidão. 

O mesmo sucede com a igualdade política, razão por que a democracia há de ser finalmente despedaçada, tal qual qualquer outra forma de governo : a hipocrisia não pode possuir nenhum conteúdo, a contradição nela oculta deve ser colocada às claras.

Ou verdadeira escravidão, i.e. despotismo descarado, ou então autêntica liberdade e autêntica igualdade, i.e. comunismo. 

A Revolução Francesa produziu ambas essas formas : Napoleão instaurou uma delas, Babeuf, a outra.”[7] 

 

Esse é o problema da liberdade, visto à parte da opressão política e da escravidão moral.

Nada obstante, deveríamos conservar na memória o fato de que a burguesia detém em suas mãos o poder político, além do controle sobre as prisões, as Forças Armadas, as Igrejas e os estabelecimentos de ensino.

A burguesia oprime economicamente, porém também escraviza moralmente as pessoas.

Se esses ambos mecanismos de dominação falham, recorre a burguesia ao emprego da pura violência física.

Com o aumento da repressão, a burguesia conclama seus agentes, situados no movimento operário, a incrementarem a exaltação da liberdade e da democracia burguesas. 

A Revolução Proletária há de colocar um fim à "liberdade" burguesa.   

A Ditadura do Proletariado destruirá o sistema burguês e impulsionará uma sociedade comunista, sem classes, uma sociedade, despida dos antagonismos de classes e, conseqüentemente, sem Estado e sem Direito.

Apenas em uma sociedade sem classes, em uma sociedade sem Estado e sem Direito, os seres humanos serão livres.

É, pois, um absurdo falar-se de liberdade sob os auspícios do Direito.

O Direito é incompatível com a liberdade.

Razão pela qual na sociedade em que a liberdade prevalecer, não haverá Direito. 

 

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS

 



[1] Cf. PODVOLOTSKY, IVAN PETROVITCH. Marksistskaya Teoria Prava : Otchiork. S Predisloviem N. Bukharina (Teoria Marxista do Direito : Um Esboço. Com uma Introdução de Nikolai Bukharin), Moscou - Petrogrado : Gosud. Izd-vo, 1923, pp. 102 e s.

[2] Cf. MARX, KARL. Brief an Friedrich Engels (Carta a Friedrich Engels)(01.08.1877), in : Karl Marx & Friedrich Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. 34, Berlim : Dietz Verlag, 1961, p. 66.  

[3] Cf. MARX, KARL. Rede über die Frage des Freihandels (Discurso sobre a Questão da Liberdade de Comércio)(09.01.1848), in : ibidem, Vol. 4, p. 456.     

[4] Cf. MARX, KARL. Der achtzehnte Brumaire des Louis Bonaparte (O 18 Brumário de Luís Bonaparte)(Dezembro de 1851 - Março de 1852), Capítulo II,  in : ibidem, Vol. 8,  p. 126.

[5] Cf. ENGELS, FRIEDRICH. Der Ursprung der Familie, des Privateigentums und des Staats. Im Anschluß an Lewis H. Morgans Forschungen (A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. Em Conexão com as Investigações de Lewis H. Morgans)(Março - Maio de 1884), Capítulo II : Die Familie (A Família),  in : ibidem, Vol. 8, p. 81. 

[6]  Cf. MARX, KARL & ENGELS, FRIEDRICH. Die heilige Familie oder Kritik der kritischen Kritik gegen Bruno Bauer und Konsorten (A Sagrada Família ou a Crítica da Crítica Crítica contra Bruno Bauer e Consortes), (Setembro - Novembro de 1844),  Capítulo 6 : A Crítica Crítica Absoluta ou a Crítica Crítica enquanto Senhor Bruno, 3. Terceira Campanha da Crítica Absoluta, Letra B : A Questão Judia Nr. III,  in : ibidem, Vol. 8, p. 123.     

[7] Cf. ENGELS, FRIEDRICH. Fortschritte der Sozialreform auf dem Kontinent (Progressos da Reforma Social no Continente)(04.11.1843), Capítulo I. Frankreich (França), in : ibidem, Vol. 1, p. 481.