PRODUÇÕES LITERÁRIAS DEDICADAS À FORMAÇÃO 

DE REVOLUCIONÁRIOS MARXISTAS QUE ATUAM NO DOMÍNIO DO DIREITO, DO ESTADO E DA JUSTIÇA DE CLASSE

 

PEQUENOS ENSAIOS SOBRE MARXISMO E DIREITO, SOCIEDADE E ESTADO NA REVOLUÇÃO

 

Direito Enquanto Instrumento de Dominação de Classe :

Direito Burguês e Direito Proletário

 

 

IVAN P. PODVOLOTSKY[1]

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução

Emil Asturig von München, Julho de 2006

 

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O Direito é um fenômeno historicamente inevitável e transitório da sociedade de classes.

Ele constituiu um sistema de normas sociais coercitivas que refletem tanto as relações econômicas como outras relações sociais de uma dada sociedade. É um sistema de normas criadas e protegidas pelo poder do Estado da classe dominante, visando à sanção, à regulação e à consolidação dessas relações e, conseqüentemente, ao fortalecimento da dominação de uma classe social determinada.

Em uma sociedade capitalista, o sistema burguês de Direito, criado e protegido pelo poder da classe capitalista, regula e e consolida as relações capitalistas e a dominação da classe capitalista. 

Essa é a razão por que esse sistema é um sistema de Direito Burguês.

Contudo, confrontamo-nos com a seguinte questão : 

Que modalidade de Direito haverá de existir durante o período da Ditadura do Proletariado ?

A resposta é o "Direito Burguês".

Essa resposta clama por um esclarecimento adicional.

À primeira vista, parece que a fundamentação dessa questão pode ser encontrada nas obras de Marx e Lenin.

Cogitamos, especialmente, da análise de Lenin acerca das concepções de Marx, contidas na "Crítica ao Programa de Gotha".[2]

 

Marx afirma que, na primeira fase do comunismo, quando a realização do princípio "de cada qual segundo suas capacidades, a cada qual segundo suas necessidades" ainda não é possível, o pagamento igual por trabalho igual prestado é ainda, de fato, um "Direito Burguês" desigual, porquanto nem os seres humanos nem suas famílias são iguais.

Em conformidade com as palavras de Marx, temos, então, que :  

 

"Por isso, o Direito igual continua a ser, aqui, – por princípio –, o Direito Burguês, ainda que princípio e prática já não se agridam mais, agarrando-se pelos cabelos ... Apesar desse progresso, esse Direito igual continua a estar aprisionado em uma limitaçao burguesa. ... Trata-se, portanto, segundo seu conteúdo, de um Direito da desigualdade, tal como todo Direito."[3]

 

Deveremos examinar, posteriormente, a seguinte questão : Deverá o Direito existir ou não em um estágio superior de comunismo ?

Nada obstante, uma conclusão óbvia parece já decorrer dos pontos de vista acima reproduzidos : um "Direito Burguês" há de existir, no período de transição. 

Já tivemos ocasião de declarar que, a julgar por suas manifestações externas - i.e. por sua forma - os elementos do Direito Burguês permanecerão, indubitavelmente, existindo, no período de transição, porque as relações de produção e troca de mercadorias continuarão a existir.

Porém, esse Direito prosseguirá sendo efetivamente Direito Burguês real ?

A resposta a essa questão é, porém, negativa.

O que significa Direito Burguês

Direito Burguês é um Direito da classe burguesa que protege a dominação desta, mediante a preservação do sistema social capitalista.

Demonstramos, anteriormente, que nosso Direito Civil não procura proteger nem fortalecer essa dominação da burguesia.

Porém, além do Direito Civil, temos ainda o Direito Constitucional, i.e. o Direito Fundamental, o qual assegura a dominação de classe do proletariado.

Adicionalmente, possuimos o Direito Penal que, tal qual o Direito Civil, contém provisões como aquelas, encontradas nos Códigos Penais Burgueses, desempenhando, porém, função inteiramente diversa.

Antes da Revolução Socialista de Outubro de 1917, o Direito Penal tutelava a dominação de classe do capital e, conseqüentemente, era um Direito do Capitalismo.

Presentemente, essas normas jurídicas estão a serviço do proletariado e, portanto, são Direito do Proletariado.

O exemplo do Direito Penal, considerado por si mesmo, já demonstra que não se deve julgar a natureza do Direito pela sua forma.       

Ao apreciarmos a sua natureza, devemos sempre determinar qual sistema social esse Direito fortalece e, consegüintemente, que dominação de classe é por ele tutelada.

Assim, nosso Direito Constitucional, nosso Direito Civil, nosso Direito Penal e, com efeito, todo nosso sistema jurídico, está a serviço do proletariado e é assegurado pelo poder proletário.

Portanto, é um sistema de Direito Proletário.  

O Direito Privado, que constitui uma das partes desse sistema, é, em vista disso, um Direito Proletário, a despeito do fato de que reflete relações mercantis, apesar de ser formalmente um "Direito Burguês".

Em consonância com Marx e Lenin, coloquei a expressão "Direito Burguês" entre aspas.

Assim procedi, a fim de demonstrar que o "Direito Burguês" entre aspas possui um significado inteiramente diferente de Direito Burguês sem aspas e, portanto, não devemos confundí-los.

Ambos esses Direitos possuem a mesma forma, porém cada um deles possui a sua essência peculiar.

Lenin também esposava essa opinião.

Sua declaração, a seguir citada no presente texto, indica que Lenin entendia poder existir o Direito Burguês sem aspas apenas no contexto de um sistema de relações capitalistas :

 

"Assim, na primeira fase da sociedade comunista, chamada corretamente socialismo, o "Direito Burguês" é apenas parcialmente suprimido, na medida em que a revolução econômica foi realizada, isto é, apenas no que respeita aos meios de produção. O "Direito Burguês" atribui aos indivíduos a propriedade privada destes meios. O socialismo deles faz propriedade comum. É nisso e nisso somente que o "Direito Burguês" é abolido.

Porém, ele permanece existindo em sua outra função: subsiste enquanto regulador  - fator determinante - da repartição dos produtos e do trabalho entre os membros da sociedade. "Quem não trabalha, não come", este princípio socialista já está assentado. "Para soma igual de trabalho, soma igual de produtos", este outro princípio socialista já se encontra igualmente consolidado. ... 

Na sua primeira fase, no seu primeiro estágio, o comunismo não pode, economicamente, estar em plena maturação, não pode estar completamente livre das tradições ou dos vestígios do capitalismo.

Daí, esse fato interessante de se continuar prisioneiro do "estreito horizonte do Direito Burguês".

O Direito Burguês, no que concerne à repartição, pressupõe, evidentemente, um Estado Burguês, pois o Direito não é nada sem um aparelho capaz de impor a observação de suas normas.” [4]

 

É inteiramente evidente que Lenin, ao designar a distribuição dos artigos de consumo na primeira fase do comunismo como sendo Direito Burguês entre aspas, está definindo esse Direito em termos de forma, projetando em seu interior um conteúto inteiramente novo.

Lenin declara de modo completamente claro que o Direito Burguês, considerado em termos conteudísticos, i.e. Direito Burguês por si mesmo, é tão somente concebível em um Estado Burguês.

Sendo assim, não pode existir Direito Burguês em um Estado Proletário, i.e. um Direito que expresse os interesses do capital e sirva à sua dominação. 

Porém, o proletariado carece mesmo de um Direito ?

Evidentemente que sim.

O proletariado derrubou a autoridade burguesa, porém não logrou eliminar as classes e os antagonismos existentes na sociedade.

Os antagonismos ainda existem : não apenas os antagonismos, gerados pela classe burguesa derrotada em face do proletariado, senão ainda os conflitos, emergentes entre o proletariado e o campesinato, além das contradições, presentes no interior do próprio proletariado enquanto classe.

Enquanto existirem tais antagonismos, enquanto a resistência for ainda possível, o proletariado deve assegurar o novo sistema de relações com normas jurídicas, obrigatórias para todos as camadas da sociedade.

Tendo suprimido a ativa resistência combativa, promovida pela burguesia, o proletariado deve meter a burguesia em uma camisa de força jurídica, i.e. em uma posição cuja interferência no trabalho proletário é impossível.

Assim, o Direito é imprescindível enquanto instrumento de assédio sistemático, enquanto ferramenta, voltada à supressão pacífica da oposição. 

Tal como todo e qualquer Direito, o Direito Proletário também disciplina a conduta dos membros da classe proletária, ao subordinar a vontade de cada um de seus membros à vontade coletiva, i.e. aos interesses de toda a classe proletária.

Certamente, esse Direito é distinto de todas as formas antecedentes de Direito : é o Direito de uma maioria, enquanto que todo o Direito precedente foi o Direito de uma minoria que explorava a maioria de uma determinada sociedade.

Ademais disso, todos os sistemas juridicos do passado procuraram assegurar, eternamente, uma dominação de classe.

Diversamente, o sistema proletário de Direito procura garantir a dominação, exercida pelo proletariado, apenas com o propósito de superar toda e qualquer dominação de classe e, concomitantemente, fazer do Direito um fenômeno desnecessário.     

 

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS



[1] Cf. PODVOLOTSKY, IVAN PETROVITCH. Marksistskaya Teoria Prava : Otcherk. S Predisloviem N. Bukharina (Teoria Marxista do Direito : Um Esboço. Com uma Introdução de Nikolai Bukharin), Moscou - Petrogrado : Gosud. Izd-vo, 1923, pp. 192 e s.

[2] Nesse sentido, vide LENIN, VLADIMIR ILITCH. Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolução. A Doutrina do Marxismo sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revolução) (1917), Moscou : Gosud. Izd.vo., 1989, pp. 7 e s.  Vide, além disso, MARX, KARL. Kritik des Gothaer Programms. Randglossen zum Programm der deutschen Arbeiterpartei (Crítica do Programa de Gotha. Glosas Marginais ao Programa do Partido Alemão dos Trabalhadores) (Abril - Maio de 1875), in : Karl Marx & Friedrich Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. 19, Berlim : Dietz, 1961, pp. 15 e s.

[3] Cf. MARX, KARL. Kritik des Gothaer Programms. Randglossen zum Programm der deutschen Arbeiterpartei (Crítica do Programa de Gotha. Glosas Marginais ao Programa do Partido Alemão dos Trabalhadores) (Abril - Maio de 1875), in : Karl Marx und Friedrich Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. 19, Berlim : Dietz, 1961, p. 20.

[4] Nesse sentido, vide LENIN, VLADIMIR ILITCH. Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolução. A Doutrina do Marxismo sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revolução) (1917), Moscou : Gosud. Izd-vo., 1989, pp. 32 e s.