PRODUÇÕES LITERÁRIAS DEDICADAS À FORMAÇÃO

DE REVOLUCIONÁRIOS MARXISTAS QUE ATUAM NO DOMÍNIO DO DIREITO, DO ESTADO E DA JUSTIÇA DE CLASSE

 

KARL MARX E FRIEDRICH ENGELS SOBRE O DIREITO E O ESTADO, OS JURISTAS E A JUSTIÇA

 

Prefácio à Crítica da Economia Política

 

Tanto as Relações Jurídicas Quanto as Formas do Estado

Não Podem Ser Compreendidas Nem Por Si Mesmas Nem A Partir do Assim Denominado Desenvolvimento Geral do Espírito Humano:

O Conjunto das Relações de Produção Forma a Estrutura Econômica da Sociedade, a Base Real,

Sobre a Qual Se Ergue Uma Superestrutura Jurídica e Política e à Qual Correspondem Determinadas Formas Sociais de Consciência

Em Certo Nível de Seu Desenvolvimento, as Forças Produtivas Materiais da Sociedade

Entram em Contradição Com as Relações de Produção Existentes ou – o Que Destas é Apenas Uma Expressão Jurídica –

Com as Relações de Propriedade, No Interior Das Quais Se Haviam Movimentado Até Então

Surge, Então, Uma Época de Revolução Social

 

 

KARL MARX[1]

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução

 Emil Asturig von München, Agosto de 2008

 

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(…) Examino o sistema da economia burguesa em consonância com a seguinte ordem: capital, propriedade fundiária, trabalho assalariado; Estado, comércio exterior, mercado mundial.

Sob as três primeiras rubricas, investigo as condições econômicas de vida das três grandes classes em que se decompõe a moderna sociedade burguesa.

A interconexão existente entre as outras três rubricas salta aos olhos. (…)

 

(...) Meu estudo de especialização era o da ciência do Direito que impulsionei, entretanto, apenas como disciplina subordinada, ao lado da filosofia e da história.

 

Em 1842 e 1843, atuando como redator da “Gazeta Renana”, encontrei-me, pela primeira vez, na situação embaraçosa de ter de participar da discussão sobre os assim chamados interesses materiais.

Os debates da Assembléia Estadual Renana sobre o roubo de madeira e o parcelamento da propriedade fundiária, a polêmica oficial que o Sr. von Schaper, outrora Presidente Superior da Província da Renânia, promoveu contra a “Gazeta Renana” acerca das condições dos camponeses do Vale do Rio Mosela, os debates, por fim, sobre o livre comércio e o protecionismo aduaneiro, forneceram os primeiros pretextos para que me dedicasse às questões econômicas.   

Por outro lado, naquela época, quando a boa vontade de “ir adiante” compensara multiplamente o conhecimento objetivo, tornara-se audível, na “Gazeta Renana”, um eco do socialismo e do comunismo francês, extenuadamente tingido de filosofia.

Declarei-me contra essa obra de má qualidade, confessando, porém, ao mesmo tempo, de modo direto e aberto, em uma controvérsia com o “Diário Público de Augsburg”, que meus estudos, empreendidos até então, não me permetiam ousar formular, por mim mesmo, nenhum julgamento acerca do conteúdo das orientações francesas.

Em vez disso, aproveitei, avidamente, a ilusão dos gestores da “Gazeta Renana”, que acreditavam poder fazer retroceder a sentença de morte recaída sobre o jornal, lançando mão de posições mais complacentes, a fim de me retirar da cena pública e recolher-me em meu gabinete de estudo.      

O primeiro trabalho empreendido para a solução da dúvida que me assaltava foi a realização de uma revisão crítica da Filosofia do Direito de Hegel, um trabalho cuja introdução foi editada, em 1844, em Paris, nos “Anais Franco-Alemães”.

Minha investigação desembocou no resultado de que tanto as relações jurídicas quanto as formas do Estado não podem ser compreendidas nem por si mesmas nem a partir do assim denominado desenvolvimento geral do espírito humano.

Elas, pelo contrário, possuem suas raízes nas relações materiais de vida cujo conjunto Hegel sintetizou, segundo o procedimento dos ingleses e dos franceses do século XVIII, sob o nome de “sociedade civil”, sendo certo, porém, que a anatomia da sociedade civil há de ser procurada na economia política.

A investigação desta, que iniciei em Paris, vim a continuar em Bruxelas, para onde emigrei, por decorrência de uma ordem de extradição do Sr. Guizot.

O resultado geral que diante de mim emergiu e que, uma vez alcançado, serviu de fio condutor aos meus estudos, pode ser formulado, brevemente, da seguinte forma :

 

Na produção social de suas vidas, os seres humanos ingressam em relações determinadas, necessárias, independentes da sua vontade, relações de produção essas que correspondem a um determinado nível de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais.

O conjunto dessas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real, sobre a qual se ergue uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem determinadas formas sociais de consciência.

O modo de produção da vida material condiciona, em geral, o processo de vida social, político e espiritual.

Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas sim, inversamente, é o seu ser social que determina a sua consciência.

Em certo nível de seu desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes ou - o que destas é apenas uma expressão juridica - com as relações de propriedade, no interior das quais se haviam movimentado até então.              

De formas de desenvolvimento das forças produtivas, essas relações convertem-se em seus entraves.

Surge, então, uma época de revolução social.

Com a modificação do fundamento econômico, revolve-se toda a monstruosa superestrutra, de um modo mais lento ou mais rápido.

Na análise dessas transformações, deve-se sempre diferenciar entre a transformação material das condições econômicas de produção - a ser constatada fielmente segundo as ciências naturais - e as formas jurídicas, políticas, religiosas, artísticas ou filosóficas, em suma, formas ideológicas, com as quais os homens tornam-se conscientes desse conflito e o extinguem.

Assim como não se julga aquilo que um indivíduo é segundo o que ele próprio pensa de si mesmo, tampouco se pode julgar uma tal época de transformação a partir de sua própria consciência.

Pelo contrário, deve-se, muito mais, esclarecer essa consciência a partir das contradições da vida material, a partir do conflito existente entre forças produtivas e relações sociais de produção.

Uma formação social não perece jamais antes que todas as forças produtivas estejam desenvolvidas, para as quais é amplamente suficiente.

Novas relações de produção mais elevadas não surgem jamais no lugar de outras antes que as condições materiais de sua existência tenham germinado no próprio seio da velha sociedade.         

Por essa razão, a humanidade sempre coloca a si mesma apenas problemas que pode resolver, pois, considerando-se mais precisamente, verificar-se-á sempre que o próprio problema apenas emerge quando as condições materiais de sua resolução já existem ou, no mínimo, estão em processo de se tornarem existentes.

Em grandes traços, os modos de produção asiático, antigo, feudal e burguês moderno podem ser designados como épocas progressivas da formação social econômica.

As relações burguesas de produção são a última forma antagônica do processo de produção social, antagônica não no sentido de um antagonismo individual, senão no sentido de um antagonismo emergente das condições sociais de vida dos indivíduos.

Porém, as forças produtivas que se desenvolvem no seio da sociedade burguesa criam, ao mesmo tempo, as condições materiais para a solução desse antagonismo.

Com essa formação social, encerra-se, por isso, a pré-história da sociedade humana.

Friedrich Engels, com quem mantive um permanente intercâmbio de idéias por escrito, desde o surgimento de seu esboço genial acerca da crítica das categorias econômicas (contido nos “Anais Franco-Alemães”), alcançou, juntamente comigo, o mesmo resultado através de outro caminho (vide seu “A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra”) e, quando também se estabeleceu, na primavera de 1845, em Bruxelas, decidimos elaborar, em conjunto, nossa concepção em oposição à ideologia da filosofia alemã, acertando as contas com a nossa antiga convicção filosófica.

Esse propósito foi executado na forma de uma crítica à filosofia pós-hegeliana.

O manuscrito “A Ideologia Alemã”, dois grossos volumes em oitavo, já havia chegado há muito tempo em seu local de edição na Vestefália, quando recebemos a notícia de que circunstâncias modificadas impediam a sua impressão.    

Relegamos esse manuscrito à crítica roedora dos ratos tanto mais voluntariamente, tendo em consideração o fato de que havíamos alcançado nosso principal objetivo: nossa própria clarificação.

Dentre os trabalhos dispersos, com os quais outrora apresentamos nossas concepções ao público, segundo esse ou aquele aspecto, menciono apenas o “Manifesto do Partido Comunista”, redigido conjuntamente por Engels e por mim, e um “Discours sur le libre échange(Discurso sobre o Livre Comércio)”, por mim publicado.

Os pontos decisivos de nossa concepção foram apontados cientificamente, em um primeiro momento - ainda que apenas de modo polêmico -, em meu escrito “Misère de la philosophie etc.(Miséria da Filosofia etc.)”, editado em 1847 e dirigido contra Proudhon.

Um ensaio escrito em alemão sobre “Trabalho Assalariado e Capital”, no qual enfeixei minhas exposições sobre essa matéria, apresentadas na Liga dos Trabalhadores Alemães de Bruxelas, foi interrompido em sua impressão pela Revolução de Fevereiro e por minha violenta expulsão da Bélgica, provocada por essa revolução.

A edição da “Nova Gazeta Renana”, em 1848 e 1849, bem como os acontecimentos que tiveram lugar posteriormente, interromperam meus estudos econômicos que puderam apenas ser retomados no ano de 1850, em Londres.

O imenso material relacionado com a história da economia política que se encontra armazenado no Museu Britânico, o ponto de localização favorável que Londres assegura à observação da sociedade burguesa e, finalmente, o novo estágio de desenvolvimento em que esta parecia ingressar com o descobrimento do ouro da Califórnia e da Austrália, forçaram-me a começar tudo, novamente, desde o início, penetrando, criticamente, com labor, através do novo material.  

Esses estudos conduziram, em parte, por si mesmos, a disciplinas aparentemente situadas em inteira separação, sobre as quais tive de me demorar mais ou menos longamente. 

Porém, o tempo que se encontrava à minha disposição foi, particularmente, restringido pela a necessidade imperativa de realização de uma atividade de remunerada.

Meu trabalho de colaboração -  agora de oito anos - com o primeiro jornal inglês-norte-americano, o “New York Tribune(Tribuna de Nova York)” tornou necessário uma extraordinária fragmentação dos estudos, uma vez que me tenho ocupado, apenas excepcionalmente, com real correspondência jornalística.

No entanto, os artigos sobre os notáveis eventos econômicos da Inglaterra e do continente constituiram uma parte tão significativa de minhas contribuições que me vi forçado a familiarizar-me com detalhes práticos que se situam fora do campo da ciência da economia política, propriamente dita.            

Esse esboço sobre o curso dos meus estudos no domínio da economia política deve apenas comprovar que minhas concepções - seja lá como as julgarem e quão pouco se identifiquem com os preconceitos interessados das classes dominantes -, são o resultado de uma pesquisa conscienciosa, executada durante diversos anos. 

Ao ingressar-se na ciência, tal como na entrada do inferno, deve-se, porém, levantar-se a seguinte reivindicação :

 

          Qui si convien lasciare ogni sospetto

          Ogni viltà convien che qui sia morta.

 

          Aqui, convém abandonar tudo o que é suspeito

          Toda covardia convém ser exterminada.

 

          (Dante, A Divina Comédia)

 

 

 

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS

 

 



[1] Cf. MARX, KARL. Vorwort zur Kritik der Politischen Ökonomie (Prefácio à Crítica da Economia Política)(Agosto de 1858 – Janeiro de 1859), in : ibidem, Vol. 13, Berlim : Dietz Verlag, 1961, pp. 7 e s. O presente texto de Marx foi publicado, pela primeira vez, em 1859, pela editora Franz Duncker. A tradução aqui apresentada tem como base a primeira edição de 1859, melhorada e completada através de incorporações de correções e glosas do exemplar manual de Marx, cuja fotocópia encontrava-se no Arquivo do Instituto de Marxismo-Leninismo do Comitê Central do Partido Comunista da URSS, em Moscou. O texto de Marx em referência  foi utilizado por Engels na reprodução de excertos da obra “Crítica da Economia Política” de Marx, contidos no terceiro volume de “O Capital”.