90 ANOS DA REVOLUÇÃO SOCIALISTA PROLETÁRIA RUSSA DE OUTUBRO DE 1917

MORAL E CONSCIÊNCIA, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO DAS LUTAS REVOLUCIONÁRIAS

DE EMANCIPAÇÃO PROLETÁRIO-SOCIALISTA

TEXTOS DE CÉLEBRES DIRIGENTES BOLCHEVIQUES SOBRE J. M. SVERDLOV

 

JAKOB MIKHAILOVITCH SVERDLOV:  

Tristes Recordações

 

VANIA ABOIMOV[1]

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução Asturig Emil von München

Janeiro 2003 emilvonmuenchen@web.de

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Em 1902, reunímo-nos em número de 8 pessoas, na cidade de Nijn Novgorod, junto à foz do rio da cidade, perto dos bancos de areia de Gneuschev e, depois de termos esperado o companheiro J. Sverdlov por um bom tempo, decidimos iniciar a reunião sem ele.

Pronunciei, então, minha primeira intervenção sobre a questão econômica.

Porém, de um modo bem característico, minhas palavras provocaram entre nós uma divisão.

Alexandr Belov compreendeu-as equivocadamente, nelas contemplando um declarado caráter de zubatovismo, ao passo que Gemborissov concebeu-as, plenamente, em seu conjunto[2].

 

Depois disso, o conteúdo de minha intervenção foi transmitido ao companheiro Jakob Sverdlov, para que o examinasse.

Através de seu irmão Benjamim, Jakob Sverdlov veio então a me conhecer e, dentro de pouco tempo, tornei-me uma freqüentadora assídua da habitação dos Sverdlovs.    

Benjamim Sverdlov e Sara Sverdlov – irmãos de Jakob Sverdlov  - forneciam-me materiais literários.

Isso ocorreu no momento em que o companheiro Jakob Sverdlov tinha já de percorrer várias localidades e, retornando a Nijn Novgorod, aproveitava todos os seus escassos minutos disponíveis para permanecer em casa, ao lados dos seus familiares.

Recordo-me de que, em uma ocasião a seguir, Jakob Sverdlov, usando meu casaco e meu chapéu, teve de fugir do Clube dos Estamentos Gerais, onde ocorria, então, uma assembléia de trabalhadores.

A partir daquela data, foi substituído junto a nós, durante um certo tempo, pelo companheiro Benjamim Sverdlov. 

Nosso círculo ampliou-se, posteriormente, com os Dobrovskys e os Kurbatovs.

Às vezes, A. Beloozerova comparecia às reuniões.

A. Preobrajensky e Zakhoper já eram, então, bolcheviques ...

Bem cedo, pela manhã, Zakhoper trazia ao meu quarto, diretamente da estação ferroviária central, uma grande cesta com a seguinte literatura ilegal :

 

1.          “Guerra e Revolução” de Parvus ;

2.          “Movimento de Emancipação na Rússia” e

3.          números e mais números do “Iskra (i.e. A Centelha).

 

Através de Zakhoper, ficava sabendo que Jakob Sverdlov encontrava-se em Yaroslavl ou em Kazan.

Para mim, resultava claro que as atividades de empacotamento e de envio da literatura remetida eram realizadas, em grande parte, pelo próprio companheiro Jakob Sverdlov, tanto mais porque a enviavam constantemente à habitação dos Sverdlovs, dentro de fronhas de travesseiros e por intermédio de um simpático rapazinho.

Em um momento posterior, fui deslocada para a região rural de Balakhinsky.

Tendo eu partido, permaneceram no círculo de Jakob Sverdlov, em Nijn Novgorod, os seguintes companheiros : Mischa Juravliev, Vania Pakhomov e Petya Schaschurin.

Esse último companheiro foi assassinado e lançado ao rio pelos Cem-Negros, por não estar levando consigo, na ocasião, um crucifixo e possuir os bolsos cheios de proclamações revolucionárias[3].

 

Certa vez, decidiu-se, no Sindicato dos Trabalhadores Alfaiates de Nijn Novgorod, que um memorial em homenagem a Petya Schaschurin haveria de ser construído.

Schaschurin também era venerado por toda a família Sverdlov.

A partir de então, transcorreram muitos anos e eis que, à época do Congresso dos Sovietes dos Trabalhadores, Soldados e Camponeses de Toda a Rússia, realizado em Petrogrado, no mês de junho de 1917, no interior do Palácio Kshessinskaya, vim a encontrar-me, novamente, com o companheiro Jakob Sverdlov e  o companheiro Yalt, antigo membro de nosso círculo.

Sverdlov encarou-me bem nos olhos, levantou o dedo em direção à minha face e, sem forçar a memória, perguntou-me :

 

“- Vania Aboimov ?”

 

 Não pude conter as lágrimas : eu havia mudado tanto e, depois de todo aquele longo tempo, Jakob Sverdlov reconheceu-me, imediatamente.

Sua primeira pergunta foi sobre a oficina fabril Lavrinovitch, da qual nós dois juntos empreendemos uma fuga, escapando por bem debaixo do nariz de um agente espião da Okhrana (Polícia Secreta Czarista), presente na assembléia que ali então ocorria.

Esse espião veio a nos perseguir, logo a seguir.

A segunta pergunta de Jakob Sverdlov foi sobre a manifestação que, então, separou-o de todos nós.

Porém, ainda não consigo me esquecer das atividades de conspiração de Jakob Sverdlov.

Certa vez, eu e ele íamos pelo bosque de Marina, atravessando o campo, rumo a um esconderijo que era sua própria casa.

Por ali caminhávamos nós, já tarde da noite, quando, repentinamente, Jakob Sverdlov, movendo-se, à meia velocidade, disse, dirigindo-se para mim :

 

“- Atrás de nós ..., parece que ...

Diminua o passo !”   

 

Imperceptivelmente, desaceleramos o passo e, ao mesmo tempo, o barulho do caminhar que ía em nossa retaguarda também se abrandou.

Depois de constatar isso, Jakob Sverdlov disse-me, então, jovialmente:

 

“- Aperte o passo, porém não de uma vez !

Mas, se ele quiser nos alcançar, vamos queimar fora, desaparecendo imediatamente

das vistas dele !”      

   

Sumindo ao longo da rua, Jakob Sverdlov aproximou-se do Beco Bolotov e, através da escadaria ali existente, desceu correndo, em direção do Beco Kuznetchny.

Não fiquei para trás.

Paramos, então, em meio à escuridão.

O agente espião da Okhrana que nos perseguia, ergueu sua lanterna, ao descer as escadarias.

Sua fisionomia desonesta e covarde era, de fato, tão cômica que nos transmitia, claramente, sua hesitação em penetrar no meio da escuridão do beco, onde nos encontrávamos.

Detendo-se por alguns minutos, voltou a subir novamente as escadarias, enquanto nós, à medida que acompanhávamos seus movimentos, dirigimo-nos para as Docas de Lykov e fizemos um desvio, indo quase até o Pequeno Beco, receando, porém, prosseguir, imediatamente, rumo ao Jardim da Infância, onde ocorreria o Congresso dos Verdureiros ...

Descanse, nosso querido companheiro !

A sua memória jamais se extinguirá.

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS



[1] Cf. ABOIMOV, VANIA. Grystnoe Vospominanie (Tristes Recordações), in : Yakov Mikhailovitch Sverdlov. Sbornik Vospominanii i Statei (Jakob Mikhailovitch Sverdlov. Coletânea de Recordações e Ensaios), ed. ISTPART : Otdel TS.K.R.K.P.(b.) po Izutcheniiu Istorii Oktiabrskoi Revoliutsii i R.K.P.(b.), Leningrad : Gosudarstvennoe Izdatelstvo Leningrad, 1926, pp. 158 e s.

[2] Cumpre anotar que Sergei V. Zubatov, um dos chefes da Okhrana (i.e. a Polícia Secreta Czarista), tornou-se renomado por ser o fundador do assim denominado “Socialismo Policial” ou “Zubatovismo”, na Rússia Czarista do início do século XX.  Zubatov pretendia eliminar a influência que as organizações revolucionárias e, em particular, o bolchevismo, possuíam junto aos trabalhadores russos, mediante o método inteiramente cínico de organizá-los, dissimuladamente, em larga escala, mantendo-os sob controle da autocracia populista e de sua polícia, enquanto aparentava operar em prol dos objetivos perseguidos pelos explorados e oprimidos.  Através desse método, Zubatov acreditava ser possível alcançar reformas, sem colocar em risco os interesses da classe média, dos nobres e do Poder Czarista. Utilizando grupos de espiões policiais, Zubatov organizou, em 1901, a célebre Sociedade de Auxílio Mútuo para os Trabalhadores nas Indústrias Mecânicas. Nas grandes cidades russas, dezenas de milhares de trabalhadores aderiram a essa associação sindical, sem saber que a Okhrana patrocinava-a, secretamente. Espiões da polícia secreta foram eleitos dirigentes sindicais do zubatovismo. Professores e jornalistas apoiaram o movimento, realizando cursos e palestras em defesa de um czarismo esclarecido.  Visando a demostrar que sua associação era efetivamente eficaz, Zubatov forçou os patrões russos a outorgarem concessões aos trabalhadores. Porém, esses últimos foram muito além do projeto antevisto por ele e escaparam ao controle dos agentes secretos que os oprimiam. Quando, em 1903, sindicatos zubatovistas entraram em greve, o próprio Zubatov foi demitido da Okhrana e forçado a abandonar a Rússia, na medida em que havia sido revelada sua condição de chefe do serviço secreto czarista perante as massas trabalhadoras. Tendo recebido um expressivo apoio financeiro por parte do Governo de Nikolau II, Zubatov permaneceu, até 1917, no exterior, defendendo apologeticamente o czarismo. Ao saber da notícia relativa à abdicação do Czar, ocorrida em fevereiro de 1917, Zubatov suicidou-se, como prova de sua lealdade aos interesses czaristas. Cerca de um ano depois da demissão de Zubatov, veio ele a ser substituído pelo homem religioso, agente da Okhrana, Padre Georg Gapon, o qual tentou novamente conduzir o zubatovismo à prática, através de seu Sindicato dos Trabalhadores Fabris da Rússia e de sua Assembléia Nacional dos Trabalhadores Russos, culminando, em 22 de janeiro de 1905, no esmagamento sangrento dos trabalhadores e demais oprimidos pelo czarismo, no quadro do Domingo Sangrento, sob a consigna de “Deus Salve o Czar, Jornada de Oito Horas e Assembléia Nacional Constituinte.”

[3] Observe-se que os Cem-Negros eram uma organização de extrema direita, monarquista-reacionária e progromista, denominada oficialmente “União do Povo Russo”, montada pela Okhrana (Polícia Secreta Czarista) para combater o movimento revolucionário. Suas tarefas implicavam promoção de assassinatos de revolucionários, execução de progromes anti-semitas, peserguição de intelectuais e trabalhadores marxistas revolucionários etc. No domínio industrial, apoiavam os proprietários de fábricas e de empresas, em todas as questões trabalhistas, executando severos espancamentos de trabalhadores grevistas e revolucionários.