II.A.2.

CONQUISTA DA HEGEMONIA DO PROLETARIADO

NA PERSPECTIVA DO IDEALISMO GRAMSCIANO

PARA A COLABORAÇÃO DE CLASSES

E A CAPITULAÇÃO DIANTE DO ESTADO BURGUÊS

 

 

Texto de Autoria de

Portau Schmidt von Köln

Emil Asturig von München

 

A Enfermidade Gramsciana

no Movimento Trotskysta Contemporâneo

e nas Lutas de Emancipação do Proletariado

Polêmica Trotsky e Gramsci  : Gramsci e Trotsky  

O SU-QI e a Corrente Franco-Gramsciana

de Atualização, Correção

e Superação do Marxismo

(O Meta-Marxismo de Actuel Marx)

 

Voltar ao Índice Geral  

http://www.scientific-socialism.de/SUCapa.htm 

 

É por demais sabido que Lenin emerge, no quadro do pensamento marxista contemporâneo marcado pelo advento e pela agonia do imperialismo capitalista, como sendo o mais renomado e expressivo intelectual da conquista da hegemonia do proletariado sobre os demais setores, estamentos e classes sociais oprimidas sob o capitalismo, enquanto estratégia político-revolucionária de incorporação das mais amplas massas populares nos processos revolucionários violentos, voltados à tarefa histórica decisiva de destruição do Estado da ínfima minoria dos exploradores e opressores, na trilha da emancipação do proletariado e construção do socialismo.  

A concepção de Lenin acerca da hegemonia do proletariado nos processos revolucionários – tal como toda sua portentosa obra científico-literária – encontra-se, plena e permanentemente, revestida da mais rigosa aplicação da doutrina do materialismo histórico e da dialética materialista, tal como concebidas por Marx e Engels.

É precisamente essa concepção de Lenin concernente à hegemonia do proletariado nas revoluções político-sociais que permite divisar, nitidamente, na Revolução de Outubro seu inconfundível caráter de ação histórica impulsionada pelas largas massas exploradas e oprimidas, resultando absolutamente vulgar e equivocado equiparar-se-a a um Golpe de Estado de uma Minoria ou às iniciativas revolucionárias-insurreicionais de Auguste Blanqui, tal como celebremente o fez Max Weber, ou ainda concebê-la em paralelo com uma Revolução de Ultra-Esquerdistas Iluminados, tal como concebida e defendida, mais recentemente, no pensamento de Herbert Marcuse[1][2].   

 

 

Acerca do tema, Lenin teve a possibilidade de destacar, com precisão :

 

„O marxismo é uma doutrina profundamente ampla e multi-facetada.

Não é de espantar que pedacinhos de citações de Marx – em particular se são apresentados em locais inadequados – são encontrados sempre entre os „argumentos“ daqueles que rompem com o marxismo.

Uma conspiração militar é blaquismo, se não é organizada pelo partido de uma determinada classe, se seus autores não consideram o momento político, em geral, e o internacional, em particular, se esse partido não goza da simpatia da maioria do povo, comprovada com fatos objetivos, se o desenvolvimento dos acontecimentos  não conduz à contestação prática das ilusões conciliacionistas da pequena-burguesia, se a maioria dos órgãos da luta revolucionária, reconhecidos como „representativos“ ou de outro modo qualquer atuantes, na forma de „soviets“ não está conquistada, se  no exército (em tempos de guerra) não existe um clima plenamente maduro contra o governo que prolonga a guerra injusta contra a vontade do povo, se as consignas de levante ( tais como „Todo Poder aos Soviets“, „Terra para os Camponeses“, „Oferta Imediata de uma Paz Democrática a Todos os Povos Belicosos e, ao mesmo tempo, imediata anulação dos tratados secretos e abolição da diplomacia secreta“ etc.) não possuem a maior difusão e não ganharam a maior popularidade, se os trabalhadores avançados não estão convencidos da situação desesperadora das massas e seguros do apoio da população rural, apoio que se expressa em um movimento camponês autêntico ou no levante contra os latifundiários e do governo que o protege, se a condição econômica do país oferece a esperança fundada de uma feliz superação da crise através de meios pacíficos e parlamentares.“[3]         

 

 

 

Além disso, Lenin assinala, em sua obra O Radicalismo de Esquerda. A Enfermidade Infantil do Comunismo :

 

“A arte do político (e a correta compreensão do comunista para suas tarefas) consiste em analisar corretamente as condições e o momento em que a vanguarda do proletariado pode tomar o poder com sucesso, de modo a que possa suficientemente contar, durante e depois da tomada do poder, com um largo apoio de largas camadas da classe trabalhadora e das massas trabalhadoras não-proletárias, afirmando, fortalecendo e expandindo sua dominação depois da tomada do poder através da educação, formação e incorporação de massas cada vez mais amplas de trabalhadores.”[4]

 

  

No mesmo sentido, Lenin, quando trata da política de abrir espaços dentro da sociedade civil e do Estado da classe dos exploradores e opressores, fundando-se estritamente na doutrina de Marx e Engels, concebe-a como forma de fortalecimento das forças revolucionárias do proletariado, respeitando suas especificidades regionais, nacionais e continentais, visando à deflagração de revoluções violentas, em todos os países do globo, capazes de despedaçar tais aparatos estatais e edificar uma Ditadura Revolucionária hegemonizada pelo Proletariado – inclusive, nomeadamente, nos países industrializados, marcados pela auréola da liberdade político-burguesa anglo-saxônica, como a Grã-Bretanha e os EUA.

No entanto, cumpriu a Antonio Gramsci ocupar-se, preponderantemente entre 1928 e 1937, em sua obra maior Cadernos do Cárcere, com a reformulação da concepção de hegemonia do proletariado de Lenin, visando a remodulá-la como estratégia fundamental do que denominou „guerras de posição“, i.e. a luta pela „conquista do Estado“, realizada pelo proletariado moral e intelectualmente dirigente em face de seus aliados políticos, através da tomada de „trincheiras, fortalezas e casamatas“, vale dizer conquista de instituições, bastiões e espaços culturais, políticos e econômicos, públicos e privados, que viessem a permitir ampliar ao máximo a democracia popular e a experiência associativas dos trabalhadores, rumando a partir daí, segura e sobretudo pacificamente, sem a culminação de „guerra de movimento“, i.e. sem explosões de revoluções violentas e frontais dirigidas à detruição, à implosão e ao despedaçamento dos aparatos estatais burgueses, para o atingimento do socialismo.[5]

 

 

 

Sendo assim, a política de Gramsci de abrir espaços dentro da sociedade civil e do Estado da classe dos exploradores e opressores é projetada como forma de impedir a eclosão de uma revolução violenta, de um ataque frontal do proletariado visando à destruição desses aparatos estatais, de modo a promover-se, por conseqüencia, em troca, a conquista preambular da direção moral e intelectual do proletariado sobre a “sociedade civil” e, a seguir, a democratização – mediante substituição dissolutiva e não destruição aniquiladora - do Estado Burguês, como forma de ascender ao socialismo, no quadro da “criação” de um “Estado Socialista”, sobretudo nos países capitalistas de industrialização avançada, cujas assim denominadas cultura e civilização modernas assentam-se sobre os cadáveres de milhões de proletários dos países coloniais e semi-coloniais.

Nesse sentido, a concepção de hegemonia do proletariado de Gramsci conduz, direta e efetivamente, ao conciliacionismo de classes, ao colaboracionismo do proletariado e seus aliados político-revolucionários com a burguesia, e, em última instância, à sua capitulação diante dos Estados burgueses. 

No presente subtítulo, bem como no Capítulo III do presente trabalho, serão fornecidos dados comprobatórios acerca do fato de ter sido tal elaboração intelectual de Gramsci relativa à conquista da hegemonia do proletariado construída, em sentido lógico-epistêmico, essencialmente idealista, de tal forma a ser plenamente possível falar-se, sem margem de erro, da versão idealista-subjetivista-gramsciana da hegemonia do proletariado ou ainda, levando-se em conta o imenso débito intelectual de Gramsci em face do célebre autor liberal italiano Benedetto Croce na elaboração dessa sua concepção teórica, falar-se da versão idealista-subjetivista-gramsciana(-crociana) da hegemonia do proletariado.

Fazendo-se referência à concepção de Lenin acerca do tema enquanto versão dialético-materialista da hegemonia do proletariado, ou ainda, versão da hegemonia do proletariado desenvolvida por Lenin, em diametral oposição ao que será aqui denominado versão idealista-subjetivista, concebida por Gramsci - ou então versão idealista-subjetivista-gramsciana(-crociana) da hegemonia do proletariado -, cumpre, de partida, indagar : 

Os principais ideólogos do Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI), os principais dirigentes da seção brasileira do SU-QI, Tendência Democracia Socialista(DS), em seu empenho de lutar pela “Democracia Socialista como pressuposto e condição para a transição rumo a uma sociedade realmente comunista” e por “Uma Europa Social e Democrática e um Mundo dos Cidadãos”, adotam, defendem e operam, presentemente com qual versão de hegemonia do proletariado : a versão dialético-materialista, desenvolvida por Lenin, ou a versão idealista-subjetivista, equacionada por Gramsci ?   

Para produzir-se uma devida resposta a essa indagação, cumpre examinar, atenciosamente, alguns materiais apresentados a seguir e elaborar algumas ponderações.

De início, cabe constatar que a defesa da perspectiva de “construção da hegemonia dos trabalhadores e da maioria do povo em favor de um governo de esquerda, em nível nacional“ foi proclamada, solenemente, tal como demonstrado acima, por Tendência Democracia Socialista(DS), seção brasileira do SU-QI, em sua V. Conferência Nacional, de junho de 1999.

Visando a demonstrar, agora, que tal alusão à “construção da hegemonia” de Democracia Socialista(DS) e, por consegüinte, também da direção do SU-QI,  expressa sua mais cabal capitulação à ideologia gramsciana, no que toca à problemática da hegemonia do proletariado, cumpre reproduzir aqui, ainda mais uma vez, as seguintes passagens da V. Conferência Nacional em destaque: 

 

„Vemo-nos diante de um processo que poderia conduzir a notáveis experiências na construção do poder popular e da democracia direta(p. 37).

Tal possibilidade assume forma concreta sobretudo em Porto Alegre e é fortalecido, agora, em uma base mais ampla, com a conquista do governo do Estado do Rio Grande do Sul.

É necessário posicionar-se, ao mesmo tempo, em face dos enormes desafios que poderiam resultar das resistências das elites, das restrições legais e tributárias existentes em todos os níveis, dos perigos também decorrentes da separação de um impacto nas instituições e dos impactos sociais dos militantes de esquerda. Alguns setores desses últimos – não apenas no Brasil – possuem uma outra postura em relação aos governos regionais e municipais.

Eles consideram uma participação em tais postos públicos como uma legitimação para a participação no governo nacional, sem que isso conduza a grandes rupturas. Expresso de outra forma : consideram isso como uma oportunidade de demonstrar claramente à burguesia que se pode governar com os setores de esquerda. ...

Partindo da experiência no Rio Grande do Sul pode-se clarificar no que o PT deve-se diferenciar, no quadro de sua participação em governos regionais, de outros partidos : nomeadamente em sua capacidade de fazer valer sua própria postura em relação às questões democráticas e de promover tranformações transitórias na sociedade, i.e. ultrapassar os limites da ordem burguesa existente...

Como próxima tarefa política imediata, a Conferência estabeleceu o engajamento do PT, da CUT e do CMP e de todo campo conjunto das forças populares e democráticas em uma campanha política em favor do fim do governo Cardoso e sua substituição por um governo democrático-popular.

Nas crises nacionais despedaça-se o projeto hegemônico.

Essa é uma oportunidade favorável para impulsionar uma alternativa de esquerda. Um aspecto essencial de nossa atividade atual consiste, pois, no desenvolvimento de uma alternativa programática diante do pano de fundo da crise no Brasil(p. 38).

A história do PT propicia-nos elementos para tal alternativa, pela qual devemos lutar :

 

·         Grandes reformas de redistribuição, tais como contidas nos programas de 1989 e 1994 ;

·         Democracia radical e participação direta da população, partindo das experiências do Rio Grande do Sul ;

·         Defesa da soberania nacional e da solidariedade internacional ;

·         Redifinição das decisões econômicas do país, partindo dessas grandes linhas ;

·         Construção da hegemonia dos trabalhadores e da maioria do povo em favor de um governo de esquerda, em nível nacional(p.39).“[6]

 

 

 

Para a elaboração de uma análise mais fundamentada acerca do tema, cabe, ainda, colocar em clara evidência todos os argumentos relacionados com a concepção da hegemonia dos ideólogos da seção brasileira do SU-QI, contidos no „projeto socialista“, formulado por Democracia Socialista(DS) sob o título de Teses para uma Atualização do Programa do Partido dos Trabalhadores.

Tais teses foram publicadas, em abril de 2000, nas colunas do órgão político oficial dessa organização internacional, i.e. a Revista INPREKORR, onde é possível ler-se, mais pormenorizada e sobejamente, o seguinte :

 

„TESE 6 : O SOCIALISMO ENQUANTO AUTO-GOVERNO SOLIDÁRIO DO POVO ORGANIZADO

 

Nosso programa democrático para o povo simples deve orientar-se em uma concepção de socialismo que tenha por objetivo a apropriação do controle dos mecanismos da direção econômica e política da sociedade pela população organizada(p. 10).  

Como perspectiva para a época atual e enquanto eixo para um programa democrático do povo simples, nossas propostas devem nitidamente ser mais limitadas : todas as formas de auto-administração e de controle social do Estado e do mercado devem ser desenvolvidas.

Enquanto perspectiva de curto-prazo, não defendemos nem o desaparecimento do Estado (no original alemão : Verschwinden des Staates) – o que é notório – nem sua redução.

Defendemos sua transformação : ele deve ser controlado, cada vez mais intensamente, por uma população organizada e consciente, que se constitua, mais e mais, como público real.

Nesse sentido, defendemos um enfraquecimento do Estado (no original alemão: Schwächung des Staates), i.e. seu enfraquecimento enquanto aparato politicamente autônomo.

Nossa experiência dos últimos anos são extremamente valiosas para uma concretização dessa perspectiva, porque existiram progressos na participação do povo em diversas administrações municipais, em particular em Porto Alegre, e devido a que esse processo pode ser agora expandido em nível de governo do Estado do Rio Grande do Sul.

Essas experiências demonstraram que essa forma de tratamento da questão do Estado é tanto democrática como eficiente. ...

Afirmamos que, sob o ponto de vista democrático, uma redução do Estado (no original alemão : Reduzierung des Staates) e com isso uma expansão dos mercados capitalistas não faz nenhum sentido. Na realidade, isso conduziria a uma perda de possibilidades de decisão para o povo, i.e. a uma perda de democracia.

Afirmamos, porém, também, que, sob o ponto de vista democrático, um fortalecimento do Estado não faz nenhum sentido, se não se fortalecerem os mecanismos de controle da sociedade sobre o Estado.

Se a expansão da atividade do Estado (no original alemão : Ausweitung der Staatstätigkeit) ocorrer em combinação com um controle social sobre suas atividades, desenvolveremos as formas que possibilitam aos cidadãos e cidadãs alcançar mais controle sobre suas condições de vida ou, em outras palavras, expandiremos a democracia.

Nesse sentido, a „expansão“ da atividade do Estado contribui para o processo de seu desaparecimento (no original alemão : seines Verschwindens), no longo prazo, i.e. para sua retração na sociedade organizada.  ...

No quadro de um governo democrático do povo e no curso do processo de transformação, surgirão as condições a fim de que possa ser resolvido um grande problema ( se não o maior deles ) no qual esbarram as iniciativas dos trabalhadores no domínio econômico regularmente, a saber : a pressão de se adaptar aos dados do mercado, i.e. de fazer seu o modo de ver das empresas(p.11). ...

 

TESE 8. A NECESSIDADE DA HEGEMONIA DOS TRABALHADORES

 

Quando teve lugar uma intensa discussão acerca de um programa alternativo para o Brasil, o PT desenvolveu suas propostas para um programa de luta democrático, dirigido ao povo pobre, em favor de uma verdadeira alternativa.

Uma das mais importantes características desse programa foi a acentuação da necessidade de que os trabalhadores conquistem a hegemonia, no bloco das diferentes forças, que o apóiam, na medida em que eles desenvolvam um larga política de alianças no terreno democrático e das organizações populares, sem se subordinar, entretanto, aos setores burgueses.

O processo histórico dos últimos anos confirma essa necessidade.

Ainda que existam inúmeros setores burgueses que sofram sob a política neoliberal, eles mesmos demonstram-se cada vez menos dispostos a trilhar um caminho que os levasse  a uma oposição ao neoliberalismo. ....

Dizer que existe uma necessidade de uma alternativa hegemonizada pelos trabalhadores significa também que nosso projeto não pode se entregar aos limites do capitalismo, não pode ser nenhum novo programa de política burguesa de desenvolvimento.

Nosso programa democrático e dirigido ao povo simples tem de ser um programa de transição ao socialismo – mais ainda do que na elaboração do programa dos anos 80.

A necessidade de uma hegemonia dos trabalhadores e do bloco popular remete a uma visão estratégica que não reduz as propostas de reconformação das instituições à luta por vitórias eleitorais.

Mesmo que as eleições sejam um aspecto importante, podem os trabalhadores e o povo simples conquistar uma hegemonia apenas se transformarem as estruturas do Estado.

Isso depende da organização e da crescente mobilização social.

Porém, devemos conduzir na sociedade também uma luta ideológica de princípio.

Os valores de solidariedade na comunidade, da nação e da comunidade das nações deve adquirir uma prioridade.

Um exemplo interessante para a viabilidade dessas propostas é o sucesso do movimento dos Sem-Terra (MST)(p. 13).[7]

 

 

 

Confrontadas, mesmo que superficialmente, as retro-citadas Teses 6 e 8 para uma Atualização do Programa do Partido dos Trabalhadores, defendidas por Democracia Socialista(DS), em abril de 2000, com o extrato acima reproduzido, extraído de sua declaração relativa à sua V. Conferência Nacional, de julho de 1999, resulta, efetivamente, claro que Democracia Socialista(DS) defende, presentemente, a construção de um “projeto hegemônico”.

Tal “projeto hegemônico” defendido por Democracia Socialista(DS) está pautado na necessidade de os trabalhadores e da maioria do povo brasileiro conquistarem sua hegemonia no bloco de diferentes forças que o apóiam, desenvolvendo “uma larga política de alianças no terreno democrático e das organizações populares, sem se subordinar, entretanto, aos setores burgueses”, sendo que, nesse sentido, resulta em aberto a possibilidade de admitir-se alianças firmadas com partidos pequeno-burgueses, como o PDT, bem como a luta por obter-se apoios de segundo turno, auridos junto a partidos burgueses como o PFL, o PMDB, e mesmo o PSDB, à maneira empreendida pelos Suplicys paulistas, tendo-se em vista alcançar-se vitórias eleitorais mais seguramente.

“Uma larga política de alianças no terreno democrático e das organizações populares”, pode também significar, assim, a aprovação da composição de governos em que participem políticos burgueses, “sem se subordinar, entretanto, aos setores burgueses”.  

A luta política pela “hegemonia dos trabalhadores e do bloco popular”, que, segundo Democracias Socialista(DS), não se reduziria, entretanto, à reconformação das instituições mediante luta por vitórias eleitorais, mas implicaria sim a “transformação das estruturas do Estado”, mediante a „construção do poder popular e da democracia direta“, fundada na organização e na crescente mobilização social, haveria de ser conduzida juntamente com uma luta ideológica de princípio”, em que “os valores de solidariedade na comunidade, da nação e da comunidade das nações deve adquirir uma prioridade”.

Exemplos para a viabilidade de suas propostas, Democracia Socialista(DS) encontra no sucesso do Movimento dos Sem-Terra, bem como na conquista do governo municipal de Porto Alegre e do governo do Estado do Rio Grande do Sul.

Esse “programa democrático e dirigido ao povo simples” haveria de constituir “um programa de transição ao socialismo”, que alega defender Democracia Socialista(DS), posto que seu projeto não pretende “se entregar aos limites do capitalismo, não pode ser nenhum novo programa de política burguesa de desenvolvimento”.

Segundo Democracia Socialista(DS), a “construção da hegemonia dos trabalhadores e da maioria do povo em favor de um governo de esquerda, em nível nacional“ estaria voltada, em uma perspectiva de curto-prazo, à transformação e enfraquecimento do Estado Burguês Brasileiro, no sentido de que „ele deve ser controlado, cada vez mais intensamente, por uma população organizada e consciente, que se constitua, mais e mais, como público real”.

Resulta meridianamente claro de todo o exposto – i.e. sem ser necessário recorrer às consignas concretas que Democracia Socialista(DS) extrái desses seus argumentos - que todo o raciocínio desenvolvido e defendido por Democracia Socialista(DS), em suas teses e em seu V. Encontro Nacional, relativo à sua concepção de hegemonia dos trabalhadores e do bloco popular está voltado para o atingimento do socialismo mediante a transformação e o enfraquecimento, i.e. a democratização do Estado Burguês Brasileiro.

Tal perspectiva, pois, encontra-se plenamente embasada pela, fundada na e coerente com a versão idealista-subjetivista-gramsciana(-crociana) de hegemonia do proletariado e, de nenhuma maneira, apóia-se na concepção dialético-materialista de Lenin acerca dessa matéria.

Ressalte-se que Democracia Socialista(DS) não desenvolve nenhuma idéia, mesmo que remota, ou argumento, mesmo que mais levemente rudimentar, que denote a necessidade de a conquista da hegemonia do proletariado no Brasil estar voltada para destruição do Estado Burguês Brasileiro e para o estabelecimento da Ditadura Revolucionária do Proletariado ou mesmo de um Estado do tipo da Comuna de Paris, incorporadores da mais ampla Soberania proletária, enquanto forma de transição para o socialismo, esse último raciocínio plenamente fundado na versão dialético-materialista da hegemonia do proletariado.

Nesse sentido, cumpre destacar, nesse passo, a maneira segundo a qual em sua Tese 10, Democracia Socialista(DS) formula seus eixos para seu suposto “programa de transição ao socialismo” : 

 

“Tese 10. Os Eixos para um Programa Democrático do Povo Simples.

A. Democratização radical da sociedade, em cujo contexto o eixo central deve ser a participação da população na determinação de seu próprio destino; em face do monopólio da mídia da burguesia, necessitamos uma democratização dos meios de comunicação de massas; democratização das eleições, os mandatos devem permanecer no partido, eleição de deputados federais na lista do partido, revogação dos detentores de mandatos, proibição de financiamento por empresas; financiamento das campanhas eleitorais mediante fundos dos partidos ; proibição de os detentores de mandatos permanecerem na direção dos meios de comunicação de massas ; controle social da Justiça. ...

F. Reforma radical das administrações municipais e reconformação do desenvolvimento municipal sobre a base das necessidades da população, que deve poder se expressar diretamente nas decisões; tais reformas devem ser ampliadas em conformidade com as experiências havidas com o orçamento participativo.“[8] 

 

 

Mediante a simples leitura das consignas, contidas no “projeto hegemônico” de Democracia Socialista(DS), voltado ao atingimento do socialismo, o leitor atento pode verificar o fato de que tal orientação de “democratização radical da sociedade” e “controle social da Justiça”, de “reforma radical das administrações municipais” e “orçamento participativo” não se orientam, direta ou mesmo indiretamente, para a missão de destruição do Estado Burguês Brasileiro, senão para a sua transformação e enfraquecimento.

A Tendência Democracia Socialista(DS), no quadro de seu “projeto hegemônico”, não se ocupa, mesmo que ligeiramente, com o desenvolvimento de uma estratégia político-revolucionária em que o proletariado brasileiro dirija as mais imensas massas populares oprimidas pelo despotismo do capitalismo brasileiro, incorporando-as em processos revolucionários violentos, voltados à tarefa histórica decisiva de despedaçamento do Estado Burguês Brasileiro e de edificação de uma Ditadura Revolucionária do Proletariado, incorporadora essa última da mais ampla Democracia do Proletariado do Brasil e hegemonizadora das mais amplas massas populares oprimidas brasileiras.

Sendo assim, é plenamente correto afirmar que a DS não se orienta na versão dialético-materialista da hegemonia do proletariado, tal como formulada e desenvolvida por Lenin, senão na versão de hegemonia idealista-subjetivista, concebida por Gramsci.     

Convém, nesse passo, fundamentar mais doutrinariamente os argumentos aqui desenvolvidos demonstrando a natureza mais própria da concepção dialético-materialista da hegemonia do proletariado nos processos revolucionários, contrastando-a, claramente, com suas contrafacções desnaturadoras : i.e. a versão de hegemonia do proletariado burocrático-stalinista e, como sua decorrência direta, a versão idealista-subjetivista-gramsciana(-crociana).

Marx e Engels souberam conceber, originária e profundamente, o sentido e o significado da estratégia política de luta pela hegemônia de nações, projetando-a, antes de tudo, no contexto da problemática da hegemonia das classes sociais e, respectivamente, de suas frações, falanges, setores e grupos de poder econômicos específicos, visando à dominação do aparelho estatal e de nações subjulgadas.

Em suas obras, tal fenômeno surge referido, em diversos momentos, seja mediante a utilização do vocábulo Vormachtstellung (no vernáculo : supremacia), seja através do emprego do temo Vorherrschaft (literalmente : predomínio), ou ainda, com a incorporação, na língua alemã, do termo de origem grega, Hegemonie[9][10][11].   

 

 

A problemática relativa à concepção da hegemonia do proletariado em processos revolucionários passou a adquirir grande importância, tendo em conta o fato de Karl Marx referir a possibilidade, já a partir de 1856, de combinação de uma revolução proletária com uma guerra camponesa, como forma de derrubar todas as camadas superiores da sociedade na Prússia.[12]  

 

 

No quadro do pensamento dos revolucionários marxistas russos, a concepção propriamente de hegemonia do proletariado foi, a seguir, amplamente desenvolvida, com base em fundamentos notoriamente histórico-materialistas e dialético-materialistas.

Em sua obra de 1894, intitulada O Que São os “Amigos do Povo”, Lenin teve a oportunidade de elaborar as seguintes considerações conclusivas, condizentes já com o mais pleno desenvolvimento posterior de sua concepção dialético-materialista da hegemonia do proletariado nas Revoluções Russas  :

 

“Se os representantes avançados da classe trabalhadora se apropriarem da idéia do socialismo científico, se eles se tornarem conscientes do papel histórico dos trabalhadores russos, se essas idéias alcançarem ampla divulgação, fundando os trabalhadores sólidas organizações e essas tranformarem a luta econômica, atualmente fragmentada, em luta de classes conscientemente dirigida, então os trabalhadores russos irão se levantar, colocar-se na cabeça de todos os elementos democráticos, derrubar o absolutismo e o proletariado russo (ombro a ombro com o proletariado de todos os países) ingressará no caminho direto da luta política aberta pela revolução comunista vitoriosa.[13]

 

 

 

Alguns anos a seguir, Lenin elaborou, de maneira clara, a seguinte formulação já relacionada, diretamente, com sua concepção dialético-materialista de hegemonia do proletariado :

 

“Enquanto concentra, presentemente, todas as suas forças na tarefa realizada entre os trabalhadores das fábrica e das minas, a Social-Democracia não pode esquecer que a expansão do movimento deve incorporar, nas fileiras das massas por ela organizadas, tanto os trabalhadores domésticos da cidade e do campo (Kustare) e os trabalhadores rurais como os milhões do campesinato arruinado e morto de fome.

Em segundo lugar, “o trabalhador russo deve levar e levará, sobre seus ombros, a causa da conquista da liberdade política à vitória”.

A Social-Democracia, que assume como tarefa a derrubada do absolutismo, tem de ser a lutadora de vanguarda da democracia e, por isso mesmo, conceder todo apoio a todos os elementos democráticos da população russa, ganhando-os assim para si como aliados.”[14]              

 

 

 

E, logo a seguir, assinalou Lenin :

 

„Falta-nos organização.

A massa trabalhadora já está em movimento e disposta a seguir os dirigentes socialistas, porém o “quartel-general” ainda não logrou organizar um forte coração de tropa que reparta todas as forças disponíveis dos trabalhadores conscientes e assegure a organização conspirativa (secreta) da causa, de modo que os planos de ação, de antemão formulados, permaneçam ignorados não apenas pelas autoridades, senão ainda por todos aqueles localizados fora da organização. 

Essa organização deve ser uma organização revolucionária : ela deve ser composta por homens que reconheçam, claramente, as tarefas do movimento operário social-democrático e estejam decididos em favor da luta insistente contra o regime político atual.

Ela deve unificar os conhecimentos socialistas e as experiências revolucionárias, que a inteligência revolucionária russa elaborou a partir dos ensinamentos de muitas décadas, com o conhecimento dos meios dos trabalhadores e a capacidade própria dos trabalhadores avançados, de agitar as massas e dirigí-las.“[15]

 

 

 

Em um primeiro momento, é possível verificar-se que não apenas Lenin, senão também outros importantes ideólogos Sociais-Democrátas Russos do século XIX, defendendo o caráter democrático-burguês do subseqüente processo revolucionário de derrubada do Estado Czarista a ter lugar, futuramente, na Rússia -  estremando-se, assim, claramente da concepção dos populistas que o caracterizavam como direta e eminentemente socialista -, preocuparam-se já em determinar qual seria o papel do proletariado revolucionário e de seu partido dirigente em tal contexto, bem como, particularmente, sua relação a ser travada com a burguesia, de modo a precisar a hipótese de dever ou não o proletariado relegar a tarefa de direção da revolução à burguesia ou diretamente assumí-lo.[16]

 

 

Nesse contexto, Georgii Plekhanov e Pavel Axelrod, membros do grupo marxista “Libertação do Trabalho”, alegavam que, baseado na posição histórica do proletariado russo, o Partido Operário da Social-Democracia Russa(POSDR) seria capaz de “conquistar a hegemonia” sobre as classes, frações e setores sociais oprimidos, no contexto da luta contra o absolutismo czarista.[17]

 

 

Nesse sentido, em uma carta dirigida a Plekhanov, em 30 de janeiro de 1901, tratando de questões organizativas, Lenin refere-se, expressamente, à realização de esforços organizativos em favor da construção da « famosa “Hegemonia” da Social-Democracia », dando a entender que esse vocábulo, por ele mencionado entre aspas, fazia já parte corrente do universo de discussões dos marxistas sociais-democrátas russos.

Nessa ocasião, Lenin destacou, logo de início, que a conquista dessa hegemonia apenas poderia ser levada a cabo, conseqüentemente, mediante o apoio prestado pela mais intensa e ampla luta ideológica do proletariado, assegurada em suas próprias publicações jornalísticas e científicas :

 

“Vale perguntar se a famosa “hegemonia” da Social-Democracia, nesse quadro, resultará baldada ?(p. 40) ...

Caso seja-nos permitido e possível alcançar realmente a hegemonia, isso será então exclusivamente possível com a ajuda de um jornal político (fundado em um órgão científico), e se nos declaram, com revoltante impertinência, que a parte política de nosso jornal não deve concorrer com a empresa política dos Srs. Liberais, resulta claro o papel sofrível que nos reservaram(p. 41).”[18]

     

 

 

Porém, foi tão somente no período posterior à cisão entre bolcheviques e mencheviques – que coube a Lenin preocupar-se mais detalhadamente com a problemática concernente ao papel dirigente do partido revolucionário e à luta pela conquista da hegemonia do proletariado, precisamente em um momento em que os mencheviques, encabeçados sobretudo por Yulii Martov, haviam repudiado, definitivamente, a idéia de hegemonia, por considerarem-na um fator amedrontador para o desencadeamento da ação política das forças democrático-burguesas contra o absolutismo czarista.

A partir de então, Lenin escreveria, mais expressamente, em defesa da concepção dialético-materialista – i.e. não pequeno-burguesa, não amadorística -  da conquista da hegemonia do proletariado, no contexto objetivo e no quadro concreto do processo revolucionário russo de então :

 

“Ainda menos conclusivamente, o novo e último descobrimento do novo “Iskra”(Lenin refere-se aqui aos neo-iskristas) resiste a uma crítica de que “o liberalismo sem a metade democrático-burguesa” serviria, no máximo, para ser castigado com escorpiões, que “é mais razoável lançar ao mar a idéia da hegemonia”, se não se pode tratar com ninguém, a não ser com os ativistas do Semstwo.

Todo liberalismo serve para que a Social-Democracia o apoie até o ponto em que intervenha como efetivo lutador contra o despotismo.

Esse apoio, que o único democráta conseqüente até o fim, i.e. o proletariado, demonstra a todos os democrátas inconseqüentes(i.e. burgueses), representa, sim, a concretização da idéia de hegemonia.

Apenas a concepção pequeno-burguesa, amadorística, sobre a hegemonia entrevê sua essência em um acordo, com reconhecimento recíproco e condições estabelecidas no papel.

Do ponto de vista proletário, a hegemonia na guerra pertence àquele que luta mais energicamente do que todos, que utiliza todas as oportunidades para assestar um golpe no inimigo, pertence àquele junto ao qual concordam palavras e atos, àquele que, por isso, é o dirigente da democracia, crítico ideológico de toda imperfeição.

(Observação para os neo-iskristas perspicazes : vão nos contestar dizendo que a enérgica luta do proletariado, sem existir qualquer condições, conduziria a que a burguesia recolhesse os frutos da vitória.

Respondemos com a pergunta : Que garantia pode existir para o cumprimento das condições colocadas pelo proletariado senão a força autônoma do proletariado?"[19]

 

 

 

Diante da irrupção violenta da Revolução de 1905, Lenin veio a desenvolver da seguinte forma, concreta e objetivamente, a problemática relacionada com a perpectiva dialético-materialista da hegemonia do proletariado, de modo a ser possível alcançar-se a Ditadura Democrático-Revolucionária do Proletário e do Campesinato :

 

“Nesse momento, a classe trabalhadora é impelida, instintivamente, para uma ação revolucionária aberta e devemos conseguir colocar as tarefas dessa ação corretamente, para então propagar, ao máximo possível, o conhecimento dessas tarefas e sua compreensão.

Não se pode esquecer que atrás do pessimismo corrente relativo à nossa ligação com as massas escondem-se, agora muito freqüentemente, idéias burguesas acerca do papel do proletariado na revolução.

Devemos, sem dúvida, fazer ainda muito, muito mesmo, para formar e organizar a classe trabalhadora, porém toda a questão gira hoje em torno disso: onde deve residir o ponto de gravidade político dessa formação e dessa organização.

Nos sindicatos e nas associações legais ou no levante armado, na criação de um exército revolucionário e de um governo revolucionário?...     

O ponto de partida da revolução depende de a classe trabalhadora desempenhar um papel de ajudante (no original russo : posobnik) da burguesia, poderoso, no sentido da força, em seu embate contra o despotismo, porém politicamente impotente, ou o papel de dirigente da revolução popular.”[20]   

 

 

Quando depois da derrota da Revolução de 1905 declararam os mencheviques considerarem concluída a revolução democrático-burguesa da Rússia, por ter-se convertido o czarismo em uma monarquia burguesa, progressivamente capitalista e anti-feudal  - o que, de per si, justificaria, supostamente, com muito mais razão, a mais plena rejeição da concepção de hegemonia do proletariado, Lenin interviu, resolutamente, em favor de sua concepção em destaque, elaborada em plena coerência com a doutrina dialético-materialista de Marx e Engels.

Lenin veio a assinalar, além disso, que Plekhanov se separou de Martov e Protessov, quando esses últimos tornaram predominante entre os mencheviques a teoria da renegação da hegemonia do proletariado na Revolução Russa.

Com efeito, escreve Lenin :

 

„Martov faz escárnio da concepção de que o proletariado é „a força determinante“ na revolução.

Apenas os liberais ousaram, até o presente momento, - e isso também nem sempre – renegar o fato histórico indiscutível de que o proletariado russo, em 1905, de fato, desempenhou o papel de „poder determinante“.

E, quando adquiriu predominância a teoria renegadora da „hegemonia do proletariado na Revolução Russa“, divulgada na obra de cinco volumes intitulada „Movimento Sindical“, sob a redação de Martov e Potressov, Plekhanov demitiu-se dessa redação e declarou o „Movimento Sindical“ como sendo um trabalho de liquidadores.

Martov não representa agora o menchevismo inteiro, senão apenas aquele que se separou do ainda menchevique Plekhanov e que esse último considerou ser oportunismo.“[21]

 

 

No contexto do início da segunda da década do século XX, Lenin passou a ocupar-se, resolutamente, com a defesa da concepção da hegemonia do proletariado, elaborada em plena coerência com a doutrina dialético-materialista de Marx e Engels e, nitidamente, expurgada de todos os elementos estranhos aportados por adeptos dos pensadores idealistas-subjetivistas do empiro-criticismo alemão, como Ernst Mach,  Richard Avenarius e Joseph Petzoldt :

 

“À maneira de Heróstrato, p.ex., surge a declaração de Basarov : “Considero a questão suficientemente conhecida da “Hegemonia” como um dos maiores e mais inúteis mal-entendidos de nosso tempo.”

Através dos defensores de Mach, nossos centristas parecem dispensar quaisquer fatos : uns protegem a “Liberdade da Decadência”, na medida em que reconhecem o Otsovismus como justo matiz, outros, que concebem a idiotice e nocividade do Otsovismo, estendem a mão diretamente aos liquidadores na política.

Precisamente, os liquidadores conduzem uma luta direta e indireta contra a idéia de hegemonia, seja no “Nasha Zaria”, como na “Jizn” e no livro “O Movimento Social”.

Constatamos com pesar o fato de que Basarov passou para o lado deles.

Quais são seus argumentos ? Há cinco anos, a hegemonia era um fato. “Atualmente, essa hegemonia não apenas desapareceu por razões inteiramente compreensíveis, como também converteu-se em seu oposto direto.”

Prova : “Nos nossos dias, é pressuposto indispensável de popularidade nos círculos democráticos da sociedade dar um chute no marxismo.””[22]       

 

 

Nesse mesmo e preciso sentido de defesa da concepção dialético-materialista da hegemonia do proletariado na revolução, formulada tendo em vista uma sua aliança, histórico-materialisticamente fundada, com outras classes e setores de classe sociais, oprimidas pelo jugo capitalista, conduzidas sob a direção política específica do proletariado na luta por sua desescravização político-econômica, Lenin assinalou, então, da maneira mais clara e inconfundível :

 

“A revolução burguesa não está concluída entre nós.

A autocracia tenta, com novas formas, resolver as tarefas que lhe foram legadas pela revolução burguesa e que se impõe através de todo o transcurso objetivo do desenvolvimento econômico, porém ela não as pode resolver. ...

Na base das tarefas democrático-burguesas irresolvidas posiciona-se, inevitavelmente, a crise revolucionária.

Ela amadurece novamente. Nós a confrontamos mais uma vez, confrontámo-la de um novo modo, não como antes, não naquela velocidade, não apenas nas velhas formas, porém confrontámo-la indubitavelmente.

As tarefas do proletariado resultam dessa situação com determinação inequívoca e inalterável.

Enquanto a única classe conseqüentemente revolucionária da sociedade moderna, deve o proletariado ser o dirigente, o sujeito hegemônico na luta de todo o povo pela total revolução democrática, na luta de todos os trabalhadores e explorados contra os opressores e exploradores.

O proletariado é apenas revolucionário na medida em que ele seja consciente dessa idéia de hegemonia e a aplique na prática.

O proletário que adquire consciência dessa tarefa é um escravo  que se levanta contra a escravidão.

O proletário que não se tornou consciente acerca da idéia da hegemonia de sua classe ou renega essa idéia, é um escravo que não compreende sua situação de escravo.

No melhor dos casos, é ele um escravo que luta pela melhoria de sua situação de escravo, porém não pela abolição da escravatura.”[23]  

 

 

 

Visando a precisar seu raciocínio teórico, que demonstra ser possível a conquista da hegemonia do proletariado apenas no contexto da mais enérgica luta político-militar violenta contra seus exploradores e opressores, prossegue, então, Lenin, de maneira muito percuciente, como que logrando prever o destino que conheceria a concepção da hegemonia do proletariado nas mãos dos candidatos a conquistadores da hegemonia sobre a sociedade civil burguesa, visando à democratização bem como a transformação do Estado Burguês, culminando com a sua respectiva substituição por um “Estado Socialista” :

 

“Disso torna-se claro que a famosa fórmula de uns dos mais recentes protagonistas de nosso reformismo, o Sr. Levitski, do “Nasha Zaria”, que afirma dever a Social-Democracia Russa surgir “sem nenhuma hegemonia, mas sim como um partido de classe”, representa a fórmula do mais conseqüente reformismo.

Mais ainda : essa é a fórmula do mais completo renegacionismo.

Afirmar “nenhuma hegemonia, mas sim um partido de classe”, significa passar para o lado da burguesia, para o lado do liberal, que diz ao escravo do nosso tempo, o trabalhador assalariado : lute pela melhoria de tua situação como escravo, considere, porém, a idéia de eliminação da escravidão como utopia perniciosa !

Compare-se a notória fórmula de Bernstein “o movimento é tudo, o objetivo final não é nada” com a fórmula de Levitski e ver-se-á que a variante é a única e mesma idéia.

Nos mesmos casos, trata-se do reconhecimento tão somente das reformas e a negação da revolução.

A fórmula de Bernstein é mais abrangente, pois ela tem em vista a revolução socialista (o objetivo final da Social-Democracia enquanto partido da sociedade burguesa).

A fórmula de Levitski é mais estreita, pois ela condena a revolução em geral e é especialmente calculada para renunciar aquilo que, entre os anos de 1905-1907, os liberais mais odiaram : o fato de o proletariado ter arrancado aos liberais a direção das massas populares (em particular do campesinato) na luta pela inteira revolução democrática.”[24]        

 

 

 

Dando aplicação à concepção dialético-materialista da hegemonia no contexto da análise das forças políticas no interior das classes dominantes, utilizando lógica análoga àquela rigorosamente adotada por Marx e Engels, Lenin demonstrou como seria possível conceber-se a luta de classes entre duas forças hegemônicas, no contexto do processo revolucionário russo :

 

“O período de Stolypin da contra-revolução russa é caracterizado pelo fato de que a burguesia liberal se desviou da democracia e que, por isso, Stolypin logrou adquirir, ora junto a um, ora junto a outro representante dessa burguesia, assistência simpatias e conselhos.

Se as coisas não tivessem sido assim, Stolypin não teria conseguido impor a hegemonia do conselho da nobreza unido sobre a burguesia orientada em sentido contra-revolucionário, com o auxílio, a simpatia e o apoio ativo e passivo dessa burguesia.”[25]

 

 

 

No quadro de um autêntico debate de revolucionários-proletários, empenhados ambos em fundar as bases de uma concepção dialético-materialista da hegemonia do proletariado nas Revoluções Russas, segundo os estritos critérios da doutrina Marx e Engels, Lenin criticou, em seu famoso artigo Acerca de Duas Linhas da Revolução, de 1915, os posicionamentos de Trotsky, assinalando, porém, às escâncaras, o seguinte, ao final de sua análise :

 

“Elucidar as relações entre as classes na futura revolução é a tarefa principal de um partido revolucionário. ...

Essa tarefa não é resolvida corretamente por Trotsky, em Nasche Slovo(Nossa Palavra).

Ele repete sua teoria “original” de 1905 e não quer refletir acerca das razões devido às quais a vida transcorreu ao largo dessa teoria maravilhosa ao longo de dez anos inteiros.

A original teoria de Trotsky resgata o apelo dos bolcheviques relativo à luta revolucionária decidida do proletariado e à conquista do poder político pelo proletariado, porém, dos mencheviques, a “negação” do papel do campesinato.

O campesinato estaria, segundo Trotsky, fragmentado em camadas, tendo-se diferenciado.

Seu possível papel revolucionário teria sido sempre muito pequeno.

Na Rússia seria impossível uma revolução “nacional” : “Vivemos na época do imperialismo”, “o imperialismo” coloca frente à frente, porém, “não a nação burguesa perante o velho regime, senão o proletariado à nação burguesa”.

Aí temos um exemplo curioso para o “jogo com a palavrinha” imperialismo !  

Se na Rússia opõe-se o proletariado já “à nação burguesa”, então quer dizer que : a Rússia coloca-se, diretamente, diante da Revolução Socialista !

Então, é errada a consigna (levantada por Trotsky na Conferência de Janeiro de 1912 e repetida, depois, em 1905) “confiscação das terras dos latifundiários”.

Sendo assim, deve-se falar não de governo “dos trabalhadores revolucionários”, mas sim de governo “socialista dos trabalhadores” !!”

 

Nesse contexto, conclui Lenin, da seguinte forma, manifesta e incorrumptivelmente :

 

“Quão longe vai a confusão com Trotsky, é possível perceber pela sua frase de que o proletariado irá arrastar consigo, por sua resolução, também as “massas não-proletárias(!)” !!(Nr. 217).

Trotsky não refletiu que, se o proletariado conseguir arrastar consigo as massas rurais não-proletárias para a confiscação das terras dos latifundiários e derrubar a monarquia, isso será precisamente a consumação da “revolução burguesa nacional” na Rússia, a Ditadura Democrático-Revolucionária do Proletariado e do Campesinato ! ...

Porém, o seguinte é agora o essencial : 

O proletariado luta – e irá lutar desinteressadamente -, pela conquista do poder, pela república, pela confiscação das terras, i.e. pelo arrastamento do campesinato, pelo esgotamento de suas forças revolucionárias, pela participação das “massas não-proletárias” na libertação da Rússia burguesa do “imperialismo” feudal-militar(=czarismo).

Essa libertação da Rússia burguesa do czarismo, da propriedade fundiária e da dominação do proprietário fundiário, o proletariado aproveitará, sem demora, não para ajudar o camponês próspero na luta contra os trabalhadores rurais, mas sim para executar a revolução socialista, em aliança com os proletários da Europa.”[26]

 

 

         

Sabe-se que a exitosa Revolução de Fevereiro de 1917, que derrubou a milenar autocracia czarista, elevando, em seus primeiros momentos, à sua cumeeira o Partido dos Cadetes, i.e. os representantes da burguesia liberal russa, comandados por Miliukov e Guchkov, porém trazendo novamente à luz os organismos soviéticos eliminados há 10 anos atrás, não logrou consagrar a edificação da Ditadura Democrática do Proletariado e do Campesinato, tal qual preconizada por Lenin, desde 1905.[27]

 

 

Nada obstante, a luta a ser travada entre duas forças potencialmente hegemônicas estava, novamente, colocada de maneira clara, na forma de um regime de poder dual.   

A duradoura e sistemática orientação dos bolcheviques de lutarem, constantemente, pela conquista da hegemonia do proletariado na revolução democrático-burguesa, no sentido estritamente dialético-materialista que Lenin conferia a essa concepção estratégica, permitiu ao proletariado russo, nos mêses subseqüentes, exercer a direção política sobre seus aliados revolucionários, i.e. camponeses e soldados, na permanente e imediata luta por romper com a burguesia liberal, conquistar a maioria da população para si, concentrar todo o seu poder nos Soviets e empreender medidas visando ao despedaçamento do Estado Burguês, mediante levante armando, e, no contexto de uma revolução socialista, edificar uma Ditadura Revolucionária, hegemonizada pelo Proletariado, incorporadora da mais ampla e historicamente mais avançada Democracia das classes exploradas e oprimidas. [28][29]

 

 

Nesse contexto histórico, emergia a Ditadura Revolucionária como um regime de aliança de classes, entre o proletariado hegemônico, vanguarda dos trabalhadores, e inúmeras camadas não-proletárias de trabalhadores (pequenos-burgueses, pequenos-proprietários, camponêses, intelectuais etc.) ou sua maioria, uma aliança produzida no quadro de uma guerra civil para a integral derrubada do capitalismo, para a repressão da resistência burguesa e das tentativas de restauração, voltada à edificação do socialismo : uma aliança entre firmes adeptos da revolução socialista e setores aliados vacilantes ou neutros, integrantes de classes distintas em sentido econômico, político, social e ideológico.

No mesmo sentido da concepção dialético-materialista de Lenin relativa à hegemonia do proletariado, é plenamente possível verificar-se que Trotsky, em 1917, dava expressão a essa estratégia legitimamente marxista do proletariado revolucionário com os seguintes termos :    

 

“Formalmente, em palavras, a burguesia concordou em relegar a questão da forma de governo à discrição da Assembléia Constituinte.

Praticamente, contundo, o Governo Provisório cadete-outubrista converterá todo o trabalho preparatório da Assembléia Constituinte em uma campanha em favor da monarquia contra a república.

O caráter da Assembléia Constituinte dependerá, largamente, do caráter daqueles que a convocarem.

É evidente, portanto, que, no preciso momento, o proletariado revolucionário terá de colocar seus próprios órgãos, os Conselhos dos Trabalhadores, Soldados e Camponeses, contra os órgãos executivos do Governo Provisório.

Nessa luta, o proletariado deve unir sob si mesmo as massas ascendentes do povo, com um objetivo em vista : tomar o poder governamental.

 Apenas um governo revolucionário dos trabalhadores terá o desejo e a habilidade de dar ao país uma densa purificação democrática durante o trabalho preparatório da Assembléia Constituinte, reconstruir o exército de baixo ao alto, convertê-lo em uma milícia revolucionária e mostrar, na prática, aos camponeses mais pobres que sua única salvação está no apoio a um regime revolucionário dos trabalhadores.

Uma Assembléia Constituinte convocada depois de tal trabalho preparatório refletirá fielmente as forças criativas revolucionárias do país e tornar-se-á um poderoso fator no desenvolvimento subseqüente da revolução.”[30] 

 

 

 

Essa, portanto, a concepção dialético-materialista da hegemonia do proletariado, entrevista por Marx e Engels, desenvolvida por Lenin e Trotsky, que haveria de nortear a política socialista revolucionário-proletária, impulsionada na égide dos primeiros quatro congressos da  Internacional Comunista.[31]

 

 

Precisamente no quadro dessa concepção de conquista da hegemonia do proletariado, Lenin, em sua polêmica travada, em 1920, contra os ultra-esquerdistas alemães, holandeses e italianos, contra os assim-denominados “comunistas de esquerda” ou “radicais de esquerda” da Alemanha, da Holanda e da Itália, assinalou o seguinte:

 

“Os comunistas alemães, acerca dos quais falamos agora, não se chamam “esquerdistas”, porém – se não me engano – “oposição fundamental”.

Na subseqüente exposição resultará claro que eles demonstram os sintomas da “enfermidade do radicalismo de esquerda”(p. 24). ...

Devem os revolucionários trabalhar nos sindicatos reacionários ?

Os “esquerdistas” alemães consideram como líquido e certo que essa pergunta deve ser repondida, incondicionalmente, de modo negativo(p. 31). ...

Deve-se participar nos parlamentos burgueses ?

Os comunistas alemães “esquerdistas” respondem essa questão com grande menosprezo – e com grande insensatez – de modo negativo(p. 41). ...”[32]

 

 

 

Ponderando devidamente tais respostas, concluiu, então, Lenin, enfaticamente :

 

“A próxima tarefa da vanguarda consciente no movimento internacional dos trabalhadores, i.e. os partidos comunistas, grupos e correntes consiste em aprender a dirigir as amplas massas (no momento, ainda, na maioria dos casos, não despertada, ainda adormercida, apática, aprisionada por concepções tradicionais) a essas suas novas posições(i.e. às posições comunistas), dito mais corretamente aprender a dirigir não apenas o próprio partido, senão ainda também essas massas, na medida em que passam para novas posições.

Se a primeira tarefa histórica (a conquista da vanguarda consciente do proletariado para o Poder Soviético e a Ditadura da Classe Trabalhadora) não pode ser realizada sem a plena vitória ideológica e política sobre o oportunismo e o social-chauvinismo, a segunda tarefa, que agora passa a ser a próxima e que consiste na capacidade de dirigir as massas às novas posições, podendo assegurar a vitória da vanguarda na revolução, essa segunda tarefa não pode ser cumprida sem romper com o doutrinarismo esquerdista, sem superar completamente os seus erros e deles se libertar.”[33]                    

 

Nesse preciso sentido, Lenin aconselhou, derradeiramente, aos comunistas alemães, em 1921 :

 

“Mantenham o sangue frio e a firmeza.

Corrijam, sistematicamente, os erros do passado.

Atentem, ininterrumptamente, para a conquista da maioria das massas dos trabalhadores, seja nos sindicatos, seja fora dos sindicatos.

Construam um partido comunista forte e inteligente, capaz de dirigir as massas, em todas e quaisquer guinadas dos acontecimentos.

Elaborem uma estratégia que seja superior à melhor estratégia internacional  da burgueisia avançada e mais esclarecida (através da experiência secular, em geral, e através da “experiência russa”, em particular) – isto é o que deve-se fazer e o que o proletariado alemão fará, é o que lhe garantirá a vitória.”[34]

 

 

 

A concepção da hegemonia do proletariado, tal como entrevista por Lenin e Trotsky da maneira mais avançada no quadro dos processos de revoluções violentas de emancipação do proletariado russo do início do século XX, voltadas à destruição, à implosão, ao despedaçamento do Estado de classe da ínfima minoria de exploradores e opressores burgueses e latifundiários, haveria de sofrer uma profunda deformação teórica com o ascenso da burocracia comanda por Stálin.

A luta pela conquista da hegemonia do proletariado nos processos revolucionários, concebida em sentido dialético-materialista, foi, então, transformada de autêntica estratégica de luta para a emancipação do proletariado e fomento da revolução socialista mundial, rumo à construção do socialismo, em um instrumento burocrático-stalinista de conciliacionismo de classes, de colaboracionismo do proletariado e seus aliados político-revolucionários com a burguesia e, em última instância, à sua capitulação diante dos Estados burgueses da Europa Ocidental e de todo mundo.  

O primeiro passo nessa malfadada empresa téorico-doutrinária e político-prática de desfiguração da concepção dialético-materialista da hegemonia do proletariado foi esboçada por Grigorii Zinoviev, em uma de suas mais claudicantes produções teóricas, intitulada História do Partido Bolchevique, vindo à luz em 1923.

Nessa sua obra de 1923, Zinoviev, enquanto Presidente do Comitê Executivo do Soviet de Petrogrado e da Internacional Comunista, notoriamente instrumentado pelos interesses políticos da burocracia soviética em ascensão, alucinado pelas falsas perspectivas alvissareiras de sua Troika projetada para existir juntamente com Stálin e Kamenev na campanha contra o “trotskysmo”, assumiu a iniciativa intelectual de demonstrar que a concepção concernente à hegemonia do proletariado de Lenin haveria de ser entendida em diametral oposição às concepções de Trotsky acerca do papel do proletariado no quadro da Revolução de Outubro, e, por consegüinte, em manisfesta oposição à sua formulação da Teoria da Revolução Permanente.[35]

 

 

No quadro da ideologia burocrático-stalinista, produziu-se, então, de maneira clara e conseqüente, a mais integral desfiguração da concepção dialético-materialista de Lenin e Trotsky acerca do papel do proletariado russo nas revoluções do início do século, a fim de convertê-la, em um primeiro passo, em um instrumento eficaz de sustentação da teoria do Socialismo em um Só País e de luta contra contra a Revolução Permanente, protagonizada por Trotsky.

A seguir, a concepção dialético-materialista da hegemonia do proletariado foi, progressiva e gradativamente, desfigurada, ao longo dos anos de burocratização do Estado Operário Soviético, em favor do impulsionamento da política ultra-esquerdista do terceiro período da Internacional Comunista Burocratizada, e, finalmente, em prol do fomento de frentes populares em todo mundo, projetada como meio de defesa da política stalinista de construção do Socialismo em um Só País.

Nesse contexto histórico-cambiante, já em seu livro de maio de 1924, intitulado Acerca dos Fundamentos do Leninismo, Stálin pretendeu demonstrar, falaciosa e longamente, a tese de que a Teoria da Revolução Permanente de Trotsky deveria ser equiparada à ”Teoria de Subestimação do Papel do Campesinato” nas revoluções russas.  

Segundo Stálin, Lenin teria combatido os adeptos da Revolução Permanente não em razão da questão da permanência ou da ininterruptibilidade do fenômeno revolucionário, mas sim porque os “permanentistas”, encabeçados por Trotsky, teriam subestimado o papel do campesinato enquanto reserva poderosa de apoio do proletariado nos processos revolucionários.

No contexto dessa sua obra em referência, Stálin teve a oportunidade de formular a seguinte afirmação, etapista, abstrata e dogmática, acerca da conquista da hegemonia do proletariado, plenamente falaciosa em seu conteúdo e inteiramente em contradição com a doutrina de Lenin acerca do tema :

 

“A hegemonia do proletariado foi o germe da Ditadura do Proletariado e o estágio de transição (no original alemão : die Übergangsstufe) para ela.”[36]

 

 

Logo depois, em seu livro de dezembro de 1924, intitulado A Revolução de Outubro e a Tática dos Comunistas Russos, Stálin, aprofundando sua falsificação do pensamento de Lenin e Trotsky acerca do papel estratégico do proletariado no quadro dos processos revolucionários da Rússia do início do século, sustentou que os erros dos adeptos da Teoria da Revolução Permanente, defendida por Trotsky, consistiria não apenas na subestimação do papel do campesinato na revolução – tal como afirmado por Stálin ainda mesmo em maio de 1924 – senão também, adicionalmente, em seu desprezo da capacidade do proletariado poder e dever dirigí-lo, i.e. na descrença por parte dos trotskystas na concepção da hegemonia do proletariado.[37]  

 

 

Em seu livro Acerca das Questões do Leninismo, publicado em 25 de janeiro de 1926, Stálin reporta-se, a seguir, claramente, à concepção da hegemonia do proletariado, como forma de a situar contra os fundamentos mais essenciais da Teoria da Revolução Permanente, protagonizada por Trotsky.

A partir desse momento, é perfeitamente possível divisar como a concepção dialético-materialista da hegemonia do proletariado, desenvolvida por Lenin e devidamente concebida por Trotsky, no quadro das revoluções russas do início do século XX, passou a ser, crescentemente, condensada abstratamente por Stálin em um conjunto de pressupostos formulares dogmáticos, destinados a embasar a definitiva aniquilação da mais ampla Soberania proletária, bem como a servir, segundo os interesses da burocracia-stalinista, seja à política de ultra-esquerdismo de terceiro período, seja a de fomento de frentes populares em todo mundo, sob o manto de um suposto leninismo, mediante o patrocínio da Internacional Comunista Burocratizada. 

Em Acerca das Questões do Leninismo, Stálin escreve, da seguinte forma :

 

“Lenin foi o único marxista que entendeu e desenvolveu corretamente a idéia da Revolução Permanente.

Lenin diferencia-se nessa questão dos “permanentistas”(i.e. dos trotskystas) pelo fato de que os “permanentistas” deturpam a idéia marxista da Revolução Permanente, na medida em que a transformam em uma sabedoria livresca sem vida, enquanto Lenin a toma em sua forma pura, tornando-a um dos fundamentos de sua teoria da revolução(p. 18). ...[38]

 

 

Pode-se produzir uma tal radical transformação das velhas relações burguesas sem uma revolução violenta, sem a Ditadura do Proletariado?

É claro que não se pode acreditar nisso.

Acreditar que uma tal revolução possa transcorrer pacificamente, no quadro da democracia burguesa, adaptada ao domínio da burguesia, significa ou perder o juízo e os conceitos humanos normais ou, de maneira vulgar e aberta, abandonar a revolução proletária. ...

Por isso Lenin afirma que “a libertação da classe oprimida é impossível sem revolução violenta, senão também sem a aniquilação do aparato do poder de Estado, criado pela classe dominante”(Lenin, Vol. 25, p. 360, ed. russa).

“ « Só quando a maioria do povo, primeiro sob a manutenção da propriedade privada, i.e. sob a manutenção do poder e do jugo do capital, vier a se declarar em favor do partido do proletariado, poderá e será permitido a esse partido tomar o poder », afirmam os democrátas pequeno-burgueses, lacaios factuais da burguesia, que se chamam socialistas“(Lenin, Vol. 30, p. 249, ed. russa).

 “ « Em primeiro lugar, conseguindo o proletariado revolucionário derrubar a burguesia, sacudir o jugo do capital, destruir o aparelho estatal burguês, poderá depois o proletariado vitorioso ganhar para si, rapidamente, as simpatias e o apoio da maioria das massas trabalhadoras não-proletárias, na medida em que as satisfaça, em prejuízo dos exploradores », afirmamos nós."(Lenin, ibidem).

„Para ganhar a maioria da população para si“, continua Lenin, „o proletariado tem de primeiro derrubar a burguesia e conquistar o poder de Estado.

Em segundo lugar, ele deve instituir o Poder Soviético e, nisso, despedaçar o velho aparelho de Estado, através do que enterra imediatamente a dominação, a autoridade, a influência da burguesia e dos pactuadores pequeno-burgueses entre as massas trabalhadoras não-proletárias.

Ele deve, em terceiro lugar, aniquilar definitivamente a influência da burguesia e dos pactuadores pequeno-burgueses entre a maioria das massas trabalhadoras não-proletárias, através da satisfação de suas necessidades econômicas, à custa dos exploradores.“(Lenin, ibidem). ...(p. 23)

Isso não significa, entretanto, que o poder de uma classe, da classe proletária, que não divide o poder com outras classes e não pode dividí-lo, não necessite do auxílio, da aliança com as massas exploradas e trabalhadoras de outras classes para o atingimento de seus objetivos.

Esse poder, o poder de uma classe, pode ser apenas alcançado através de uma forma especial de aliança entre a classe dos proletários e das massas trabalhadoras das classes pequeno-burguesas, em particular das massas trabalhadoras do campesinato. ...

Essa forma especial da aliança consiste em que a sua força dirigente é o proletariado.

Essa forma especial da aliança consiste em que o dirigente do Estado, o dirigente no sistema da Ditadura do Proletariado é um Partido, o Partido do Proletariado, o Partido dos Comunistas, que não divide e não pode dividir a direção com outros partidos. .... (p. 24).“[39]

 

 

 

A doutrina burocrático-stalinista da hegemonia do proletariado petrificou-se, a seguir, na dogmática reduzida inflexivelmente a uma fórmula morta, cerrada, estática, imprestável para o impulsionamento de qualquer ação independente do proletário-revolucionário hegemônico, tal como resulta claro das seguintes palavras, redigidas por Stálin, em sua Conversação com a Primeira Delegação dos Trabalhadores Norte-Americanos, de 9 de setembro de 1927 :

 

„Eis aqui algumas questões para as quais Lenin deu algo de novo e seguiu desenvolvendo a doutrina de Marx.

Em primeiro lugar, a questão do Capitalismo Monopolista, o Imperialismo, enquanto nova fase do capitalismo(p. 82). ...

Em segundo lugar, a Ditadura do Proletariado(p. 83). ...

Em terceiro lugar, a questão das formas e métodos da construção vitoriosa do socialismo no período da Ditadura do Proletariado, período da passagem do capitalismo ao socialismo, em um país cercado por Estados capitalistas(p.83)....

Em quarto lugar, a questão da Hegemonia do Proletariado na revolução, em toda revolução popular, tanto na revolução contra o czarismo como na revolução contra o capitalismo(p. 84). ...

Em quinto lugar, a questão nacional e colonial(p. 86). ...

Finalmente,  a questão do partido do proletariado(p. 86).“[40]

         

 

 

No que tange à quarta questão retro-enumerada, Stálin observou :

 

„Marx e Engels esboçaram a idéia da hegemonia do proletariado em seus fundamentos.

O novo em Lenin consiste em que ele desenvolveu esse esboço e construiu-o em um sistema fechado da hegemonia do proletariado, em um sistema fechado da direção das massas trabalhadoras na cidade e no campo através do proletariado não apenas na derrubada do czarismo e do capitalismo, senão ainda na construção do socialismo sob a Ditadura do Proletariado.

É sabido que a idéia da hegemonia do proletariado graças a Lenin e seu partido encontrou uma magistral aplicação na Rússia.

Disso se esclarece, entre outras coisas, o porquê de a revolução na Rússia ter conduzido à dominação do proletariado.

Antes, as coisas se passavam de tal forma que os trabalhadores, durante a revolução, lutavam nas barricadas, derramavam o seu sangue, derrubavam o velho e o poder caía, porém, nas mãos da burguesia que, então, os oprimia e os explorava.

Assim foi na Inglaterra e na França. Assim foi na Alemanha.

Entre nós, na Rússia a coisa teve outra aplicação.

Entre nós, os trabalhadores são não apenas a força de embate da revolução.

Enquanto força de embate, o proletariado russo procurou, ao mesmo tempo, tornar-se o hegemonizador, o dirigente político de todas as massas exploradas na cidade e no campo, acaudilhando em torno de si essas massas, separando-as da burguesia e isolando essa última politicamente.

E enquanto hegemonizador das massas exploradas lutou o proletariado para conquistar o poder e utilizá-lo em seu próprio interesse contra a burguesia, contra o capitalismo.

Disso se esclarece também o fato de que toda poderosa irrupção da revolução na Rússia, em outubro de 1905 e fevereiro de 1917, trouxe à superfície os soviets dos deputados dos trabalhadores enquanto forma cardeal do novo aparato de poder, destinado a oprimir a burguesia – em oposição ao parlamento burguês, enquanto velho aparato de poder, destinado a oprimir o proletariado.

Por duas vezes, entre nós, a burguesia tentou reinstituir o parlamento burguês e colocar um fim nos soviets : em setembro de 1917, durante o pré-parlamento, antes da tomada do poder pelos bolcheviques, e em janeiro de 1918, durante a Assembléia Constituinte, depois da tomada do poder pelo proletariado – sendo que, em cada uma dessas vezes, ela sofreu uma derrota.

Por quê ? Porque a burguesia já estava isolada politicamente, as massas de milhões de trabalhadores consideravam o proletariado como o único dirigente e os soviets já estavam provados e comprovados pelas massas como seu próprio poder operário que, trocado por um parlamento burguês, significaria um suicídio para o proletariado.

Por isso, não é de admirar que o parlamentarismo burguês não encontrou raiz entre nós.

Esse é o motivo pelo qual a revolução na Rússia conduziu à dominação do proletariado.     

Esses são os resultados da concretização do sistema leninista de hegemonia do proletariado na revolução.“[41]

 

 

 

É, precisamente, a partir da versão burocrático-stalinista acerca do sistema leninista de hegemonia do proletariado na revolução, difundida pela Internacional Comunista Burocratizada, que Gramsci, fiel adulador de Josef Stálin enquanto “il più recente grande teorico” em matérias de internacionalismo, arrancará em seus intentos teóricos de projetar essa temática no contexto da situação política da Itália de seu tempo, em que o campesinato do sul do país poderia ser hegemonizado pelo proletariado para desempenhar importante papel no impulsionamento da revolução socialista italiana[42][43].

 

 

Com efeito, Gramsci concebeu a hegemonia do proletariado na revolução fundando-se, preponderantemente, nas formulações de Stálin acerca do tema, para desenvolvê-la, entretanto, desde uma perspectiva idealista-subjetivista própria, mais apta a configurar-se como um instrumento de frente populares e de conciliacionismo de classes, sobretudo nos Estados capitalistas-imperialistas avançados.

Nesse sentido, Gramsci concebeu a estratégia autenticamente revolucionária do proletariado, consistente na luta pela conquista da hegemonia do proletariado na revolução, admitindo os pressupostos de sua versão stalinista de um „sistema fechado da hegemonia do proletariado“, de tal modo a se tornar possível seu inserimento em sua perspectiva idealista-subjetivista que elaborou acerca da filosofia da práxis.

Acerca da defesa de tal abordagem da filosofia da práxis, dotada de fundamento idealista-subjetivista, Gramsci afirma, de modo plenamente incisivo e efetivamente claro, que, em seu modo de ver, a objetividade do conhecimento depende da intersubjetividade e a realidade seria apenas possível enquanto „subjetividade histórica de uma classe“ :

 

„“Objetivo“ significa isso e apenas isso : que aquela realidade é reconhecida enquanto realidade objetiva, que é conhecida por todos os homens, dependendo de todo ponto de vista meramente particular e grupal(p. 175).... 

A filosofia da práxis está ligada não apenas com a filosofia da imanência, senão ainda com a teoria subjetivista da realidade, na medida em que ela, precisamente de modo inverso, declara a realidade enquanto fato histórico, enquanto „subjetividade histórica de uma classe“, enquanto fato real que se oferece como fenômeno da „especulação“ filosófica, sendo simplesmente um ato prático que conduz a forma de um conteúdo social concreto e um modo, i.e. o conjunto da sociedade, a uma unidade moral(p. 253).“[44]  

 

 

 

Partindo dessa base epistemológica, a distinção político-conceitual formulada por Stálin entre os processos antigos proletários-revolucionários, desenvolvidos, outrora, na Inglaterra, na França e na Alemanha, com trabalhadores que „lutavam nas barricadas derramavam o seu sangue, derrubavam o velho e o poder caía, porém, nas mãos da burguesia que, então, os oprimia e os explorava“ e os novos processos conhecidos pelas revoluções da Rússia, onde o proletariado foi não apenas a força de embate mas também „o hegemonizador, o dirigente político de todas as massas exploradas na cidade e no campo, acaudilhando em torno de si essas massas, separando-as da burguesia e isolando essa última politicamente“,  „motivo pelo qual a revolução na Rússia conduziu à dominação do proletariado“ - essa distinção de Stálin haveria de ser  consagrada e radicalmente aprofundada por Gramsci, em seu intento de inserir a hegemonia do proletariado na estratégia fundamental  que denominou „guerra de posição“, base fundamental para a articulação de frente populares e de conciliacionismos de classe, sobretudo nos Estados capitalistas-imperialistas avançados.

A „guerra de posição“ – em oposição fundamental à “guerra de movimento” e ao “ataque frontal”, protagonizado por Trotsky “em um período em que esse é apenas causa de fiascos”, permitiria, segundo Gramsci, alcançar a conquista do Estado, realizada pelo proletariado e seus aliados políticos, mediante a conquista de „trincheiras, fortalezas e casamatas“ na “sociedade civil e política”, entendida essa última aqui em sentido lato, vale dizer conquista da direção de instituições, associações e espaços culturais, políticos e econômicos, privados e públicos, que viessem a permitir ampliar ao máximo a democracia popular direta, rumando a partir daí, segura e sobretudo pacificamente, sem explosões de revoluções violentas e deflagrações de ataques frontais, dirigidos à destruição, à implosão e ao despedaçamento dos aparatos estatais burgueses, para o atingimento do socialismo[45][46].

 

 

Evidentemente, a concepção de Gramsci acerca da hegemonia do proletariado sofreu modificações consideráveis e expressivas, partindo de uma abordagem mais próxima da versão burocrático-stalinista, tal como formulada nos excertos das obras de Stálin acima-apresentados – o que é suscetível de verificar-se nas produções literárias de Gramsci que até 1926 se projetam -, indo alcançar sua última forma mais particular e contraditória dos Cadernos do Cárcere, entre 1928 e 1933, perpassada por seu idealismo-subjetivista e situada no contexto da estratégia da „guerra de posição“.

Nesse sentido, é mister observar que, em sua obra intitulada Alguns Pontos de Vista acerca da Questão do Sul, do ano de 1926, Gramsci pronunciou-se da seguinte forma acerca da conquista da hegemonia do proletariado contra o despotismo capitalista italiano :  

      

„Os comunistas turineses colocaram, concretamente, a questão da „hegemonia do proletariado“, i.e. a questão da base social da Ditadura do Proletariado e do Estado Operário.

O proletariado pode tornar-se classe dirigente e dominante na medida em que consiga criar um sistema de alianças de classe que lhe permita mobilizar contra o capitalismo e o Estado Burguês a maioria da população trabalhadora, isso significa, na Itália, nas relações reais de classe existentes na Itália, na medida em que consiga obter o consenso das amplas massas camponesas.

Porém, a questão camponesa na Itália é historicamente determinada.

Ela não é a „questão agrária e camponesa em geral“. 

Na Itália, a questão camponesa assumiu duas formas típicas e particulares, em decorrência da determinada tradição italiana, em decorrência do desenvolvimento determinado da história italiana : a questão do sul e a questão do Vaticano

Conquistar a maioria das massas camponesas significa, pois, para o proletariado italiano, tornar suas próprias essas duas questões, desde o ponto de vista social, compreender as exigências de classe que elas representam, incorporar essas exigências em seu programa revolucionário de transição, situar essas exigências entre as suas próprias reivindicações de luta. “[47]

 

 

Essas frases foram redigidas por Gramsci em sua maturidade política, pouco antes de sua detenção, em 8 de novembro de 1926, enquanto dirigente do Partido Comunista Italiano(PCI), após sua experiência de dois anos, em 1922 e 1923, como representante do PCI junto ao Comitê Executivo e ao V Congresso do Komintern, sua preparação e intervenção decisiva no III Congresso de Stalinização do PCI, ocorrido entre agosto de 1925 e janeiro de 1926, e sua elaboração das Teses de Lyon do PCI, juntamente com Palmiro Togliatti (Ercoli), em janeiro de 1926.[48]  

 

 

Partindo da versão burocrático-stalinista de hegemonia do proletariado, destinada à impugnação da Teoria da Revolução Permanente, protagonizada por Trotsky, Gramsci, prosseguiu, em seus Cadernos do Cárcere, redigidos preponderantemente entre 1928 e 1933, elaborando suas considerações acerca da hegemonia do proletariado na revolução, para chegar às seguintes conclusões, cada vez mais coerentes com sua abordagem teórico idealista-subjetivista do marxismo, dedicando-se à construção de um „sistema fechado“, teoricamente lógico-formal, abstrato, rarefeito e transcendental, em que a hegemonia do proletariado surge, à semelhança de Stálin, enquanto germe da Ditadura do Proletariado e o estágio de transição para ela”, no quadro das etapas da luta pela conquista do poder de Estado:[49] 

 

 

 

„A supremacia de um grupo social manifesta-se de dois modos : enquanto „domínio“ e enquanto „direção moral e espiritual“.

Um grupo social é dominante em face dos grupos adversários, que ele tende a „liquidar“ ou mesmo subjulgar também com a força armada, e é dirigente em face dos grupos afins e aliados.

Um grupo social pode e deve mesmo ser dirigente já antes da conquista do poder de governo (e essa é uma das condições principais para a própria conquista do poder);

Depois, quando ele exerce o poder e também quando o tiver firmemente em suas mãos, torna-se dominante, porém deve continuar a ser também „dirigente“.“[50]  

 

 

 

Em tal excerto é possível, portanto, verificar-se, literalmente, como a versão dialético-materialista da hegemonia do proletariado, tal como formulada por Lenin e devidamente entrevista por Trotsky, distingui-se, claramente, da versão idealista-gramsciana, construída a partir daquela de linhagem burocrático-stalinista : se para Lenin “a arte do político (e a correta compreensão do comunista para suas tarefas) consiste em analisar corretamente as condições e o momento em que a vanguarda do proletariado pode tomar o poder com sucesso, de modo a que possa suficientemente contar, durante e depois da tomada do poder, com um largo apoio de largas camadas da classe trabalhadora e das massas trabalhadoras não-proletárias, afirmando, fortalecendo e expandindo sua dominação depois da tomada do poder através da educação, formação e incorporação de massas cada vez mais amplas de trabalhadores”, para Gramsci “um grupo social pode já antes mesmo da conquista do poder de governo intervir de modo dirigente“, sendo que „na realidade, deve até mesmo fazê-lo (isso pertence aos pressupostos fundamentais da conquista do poder)“. [51]

 

 

Além disso, na concepção dialético-materialista de conquista da hegemonia do proletariado na revolução, tal como formulada e desenvolvida por Lenin, a vanguarda do proletariado, podendo derrubar a burguesia no âmbito de sua revolução violenta, destruindo o aparelho de Estado da classe dos exploradores e opressores, ganha para si, durante e depois da tomada do poder, as simpatias e o apoio da maioria das massas trabalhadoras, proletárias e não-proletárias, na medida em que as satisfaça em prejuízo dos exploradores.

Na concepção idealista-subjetivista de conquista da hegemonia, tal como desenvolvida por Gramsci, em seus Cadernos do Cárcere, a vanguarda do proletariado, enquanto grupo social, pode e deve tornar-se dirigente de seus aliados políticos já antes mesmo da conquista do poder, ainda que não as possa satisfazer, substancialmente, em sentido material, em prejuízo dos exploradores.

De maneira decisiva, Gramsci escreve, então, a seguir, da seguinte forma, acerca de sua concepção de conquista da hegemonia do proletariado, enquanto elemento fundamental da „guerra de posição“ :

 

Passagem da guerra de manobra ( e do ataque frontal ) à guerra de posição também no campo político.

Essa me parece ser a questão de teoria política mais importante, colocada pelo período do após-guerra, e mais difícil de ser resolvida justamente.

Ela está ligada às questões levantadas por Bronstein (i.e. por Trotsky), o qual, de um modo ou de outro, pode ser considerado o teórico político do ataque frontal, em um período em que esse é apenas causa de fiascos.

Apenas indiretamente (mediatamente), essa passagem na ciência política está ligada àquela ocorrida no campo militar, ainda que exista um laço essencial.

A guerra de posição exige enorme sacrifícios de massas ilimitadas da população.

Por isso, é necessária uma concentração inaudita da hegemonia e, pois, uma forma de governo “intervencionista”, que mais abertamente assuma a ofensiva contra os opositores e organize, permanentemente, a “impossibilidade” de desagregação interna : controles de todo gênero, políticos, administrativos etc., reforçando as posições hegemônicas do grupo dominante, etc.

Tudo isso indica que se entrou em uma fase culminante da situação político-histórica, posto que na política da “guerra de posição”, uma vez vencida essa, torna-se ela definitivamente decisiva.

Na política, subsiste a guerra de movimento até quando se trate de conquistar posições não decisivas, não sendo, pois, mobilizados todos os recursos da hegemonia do Estado.

Mas, quando por uma razão ou por outra, essas posições perderam o seu valor e apenas as posições decisivas têm importância, passa-se à guerra de assédio, comprimida, difícil, em que se exige qualidade excepcional de paciência e de espírito inventivo.

Na política, o assédio é recíproco, apesar de todas as aparências, e apenas o fato de que o dominador deva fazer uso de todas as suas reservas demonstra qual seja o cálculo que ele faz acerca do adversário.”[52]

 

 

 

Essencialmente marcado por sua versão idealista-subjetivista da hegemonia do proletariado, Gramsci, defendendo, ostensivamente, uma passagem da “guerra de movimento” ou “guerra de manobra e de ataque frontal” para a ”guerra de posição” ou “guerra de assédio”, não apenas no campo militar, senão também no campo político, sustenta, aqui, que „a guerra de posição exige enorme sacrifícios de massas ilimitadas da população”, sendo que “por isso, é necessária uma concentração inaudita da hegemonia”, alegando, então, expressa e inconfundivelmente :

 

“Tudo isso indica que se entrou em uma fase culminante da situação político-histórica, posto que na política da “guerra de posição”, uma vez vencida essa, torna-se ela definitivamente decisiva.

Na política, subsiste a guerra de movimento até quando se trate de conquistar posições não decisivas, não sendo, pois, mobilizados todos os recursos da hegemonia do Estado.” (vide novamente citação acima)

 

 

 

Enquanto a versão dialético-materialista da hegemonia do proletariado, concebida originalmente por Marx e Engels, desenvolvida por Lenin e devidamente entrevista por Trotsky, possui como seu centro de gravidade inafastável a problemática da revolução violenta do proletariado hegemônico, desencadeada com o objetivo de, mediante um “ataque frontal”, destruir, despedaçar, implodir o aparelho de Estado da ínfima minoria de exploradores e opressores.

Evidentemente, o destaque de Marx e Engels, Lenin e Trotsky, para a guerra de movimento ou de manobra não significa que tenham esses mestres da condução da luta de classes desdenhado da importância que assume também, nos mais diversos períodos históricos, a guerra de posição, seja em sua aplicação isolada, seja em seu emprego combinado à primeira modalidade, no desenrolar de um efetivo processo proletário-revolucionário.        

Diferentemente, a versão idealista-subjetivista da hegemonia de Gramsci sustenta que a “fase culminante da situação político-histórica” é representada pela “guerra de posição”, que exige “uma concentração inaudita da hegemonia” : “uma vez vencida essa, torna-se ela definitivamente decisiva”.

A revolução violenta, o ataque frontal do proletariado revolucionário, voltado à destruição do Estado Burguês deve subsistir “até quando se trate de conquistar posições não decisivas, não sendo, pois, mobilizados todos os recursos da hegemonia do Estado.”

Com base em tais alegações de Gramsci é, perfeitamente, acertado afirmar que sua versão da hegemonia do proletariado coloca, efetivamente, a concepção dialético-materialista de Lenin e Trotsky de cabeça para baixo, razão porque cumpre denominá-la, corretamente, de versão idealista-subjetivista.

Enquanto a conquista da hegemonia do proletariado na revolução, segundo a concepção de Marx e Engels, Lenin e Trotsky, encontra sua função decisiva no desenvolvimento, fortalecimento e consolidação das forças de violência do proletariado para a destruição do Estado Burguês, Gramsci declara, pelo contrário, desde uma perspectiva idealista-subjetivista, que a “guerra de posição” - travada para alcançar a conquista do aparelho estatal burguês e realizada pelo proletariado e seus aliados políticos mediante a conquista de „trincheiras, fortalezas e casamatas“ na “sociedade civil e política”, entendida essa última aqui em sentido lato, vale dizer enquanto conquista da direção de instituições, associações e espaços culturais, políticos e econômicos, privados e públicos, que viessem a permitir ampliar ao máximo a democracia popular direta – representa a “fase culminante”, “definitivamente decisiva”, superada a qual tornar-se-ia possível transitar, qualitativamente, de um tipo de organização social em outra, i.e. rumar, segura e sobretudo pacificamente, para o atingimento do socialismo.[53]

 

 

Em verdade, “fase culminante”, “definitivamente decisiva”, pois, para Gramsci – que parte da concepção burocrático-stalinista de hegemonia do proletariado a “guerra de posição”, exigindo “uma concentração inaudita da hegemonia” impediria, de uma vez por todas, que o poder recaísse nas mãos da burguesia que, em tal caso, voltaria a explorar e oprimir os trabalhadores, tal como no caso dos antigos processos proletários-revolucionários, ocorridos na Inglaterra, na França e na Alemanha, segundo a concepção classificatória de Stálin.[54]

 

 

Em sua versão idealista-subjetivista da conquista da hegemonia do proletariado, Gramsci, indicando que a conquista da hegemonia do proletariado através da e para a deflagração da “guerra de movimento”, voltada à destruição do Estado Burguês, não conduziria à “fase culminante”, sendo que essa última poderia ser alcançada, inversamente, apenas com a conquista da hegemonia do proletariado através do e para o impulsionamento da “guerra de posição”.  

Tais caracterizações de Gramsci, perpassadas por um matiz efetivamente idealista-subjetivista, estão plenamente de acordo com sua afirmação contraditória de que o pensador idealista-liberal italiano Benedetto Croce, concomitantemente com “o maior teórico moderno da filosofia da práxis no domínio da organização política e da luta”, i.e. Lenin, teriam, mais plenamente :

 

“analisado o fronte da luta cultural – i.e., em termos políticos, a doutrina da hegemonia enquanto completação da teoria do Poder do Estado  - e, enquanto forma atual da doutrina de 1848, a doutrina da “revolução permanente.”[55]

 

 

 

Mais ainda. É nesse sentido crucial e basilar que Gramsci, no contexto da elaboração de sua concepção acerca da hegemonia do proletarido, partindo da abordagem burocrático-stalinista da Internacional Comunista Degenerada, encontra, finalmente, refúgio lógico-epistêmico no pensamento idealista do renomado liberal-italiano Benedetto Croce, em razão desse último, em sua apresentação ético-política da história, destacar, na política relativa à conquista da hegemonia, o momento do consenso e da direção cultural na atividade do „Estado e da sociedade civil“, considerados em geral.

A crítica de Gramsci em face de Benedetto Croce deve-se, entretanto, ao fato de Croce haver, totalmente, desprezado em sua análise da conquista da hegemonia – projetada no mesmo prisma idealista-subjetivista de Gramsci -, o momento de violência, da coação, da intervenção policial e estatal-legislativa, em face das transformações revolucionárias.[56]

 

 

Assim, Gramsci tem em comum com o pensamento de Croce seu fundamento idealista-subjetivista de abordagem da problemática da hegemonia do proletariado, dele divergindo, entretanto, por pretender considerar, em sentido idealista-subjetivista, também a problemática da violência, do ataque frontal e da coação nos processos revolucionários.

Entretanto, a empresa de Gramsci voltada a conceber a problemática da violência e da coação nos processos revolucionários, desde seu prisma idealista-subjetivista, corrigindo, completando e transformando a abordagem de Bendetto Croce, como forma de enriquecer o marxismo, haveria de se demonstrar, necessariamente, falaciosa e claudicante.

Com efeito, em conformidade com o pensamento metodológico de Gramsci :

 

„É necessário fazer-se com a concepção filosófica de Croce a mesma transformação que os antigos teóricos da filosofia da práxis fizeram com a concepção de Hegel.

Essa é única forma, historicamente frutífera para um reavivamento adequado da filosofia da práxis(p. 257).

Para a filosofia da práxis, o método especulativo demonstra-se como não desprezível.

No interior do desenvolvimento cultural, ele é muito mais rico em valores „instrumentais“ do que os assumidos pela filosofia da práxis (a dialética, por exemplo).

O pensamento de Croce deve ser apreciado, no mínimo, como valor instrumental(p. 258).“[57]

 

 

Gramsci, ao colocar de cabeça para baixo a concepção dialético-materialista de Marx e Engels, Lenin e Trotsky, em seus fundamentos mais essenciais, desfigurou-a, distorceu-a, deturpou-a, deformou-a, do modo mais completo e radical, sobretudo por menosprezar e renegar, desde o prisma idealista-subjetivista, a importância decisiva e cardeal da imprescindibilidade da violência revolucionária do proletariado hegemônico em sua missão histórica de destruir o Estado Burguês e edificar a Ditadura Revolucionária do Proletariado, incorporadora da mais ampla e historicamente superior Soberania proletária.[58]

 

 

Não é demasiado recordar que a concepção da hegemonia do proletariado de Gramsci encontrou, por fim, reconhecimento nas Teses de Lyon do Partido Comunista Italiano(PCI), redigidas em janeiro de 1926, como produto da obra intelectual conjunta de Antonio Gramsci e Palmiro Togliatti (Ercoli).

Tais teses nada mais fizeram senão ratificar a validade da famosa palavra de ordem anti-monárquica, de natureza supostamente democrático-intermediária, que já ordenava toda a intervenção do PCI, desde o assassinato do deputado socialista Giacomo Matteotti, em 1924 : Assembléia Republicana Constituinte, apoiada nos Comitês de Operários e Camponeses.

Gramsci e Togliatti alegaram, à época, conceber esses comitês operários e camponeses como instrumentos de mobilização das massas e embriões de sovietes em face da ditatura fascista de Benito Mussolini.[59]

 

 

Acerca do tema, Trotsky teve a oportunidade de assinalar, entretanto, em novembro de 1929 :

 

“No que concerne à direção oficial do Partido Italiano, não tive a oportunidade de observá-la senão a partir do Executivo da Internacional, na pessoa de Ercoli (i.e. Palmiro Togliatti).

Dotado de uma espírito de adaptação e de um bom palavreado, Ercoli é adequado ( não se poderia dizer melhor ) para os discursos de um procurador ou de um advogado, acerca de um tema de encomenda e, de modo geral, para executar ordens. ...

A propósito, não é Ercoli que tenta adaptar à Itália a idéia de “ditadura democrática do proletariado e dos camponeses”, sob a forma de uma palavra de ordem de assembléia constituinte, apoiada sobre uma assembléia operária e camponesa.

Nas questões acerca da URSS, da Revolução Chinesa, da Greve Geral da Inglaterra, da Revolução da Polônia e da luta contra o fascismo italiano, Ercoli, como também outros dirigentes de formação burocrática, adota, inevitavelmente, uma posição oportunista para, depois, eventualmente, a seguir, retificá-la, mediante aventuras de ultra-esquerda.

Parece que, atualmente, trata-se precisamente da estação do ano dessas aventuras.” [60]

 

 

 

Em maio de 1930, observou, então, Trotsky, incisivamente :

 

“A Assembléia Republicana constitui, inegavelmente, um organismo do Estado Burguês.

O que são, pelo contrário, os Comitês Operários e Camponeses ?

É evidente que, de alguma forma, são um equivalente dos Sovietes de Operários e Camponeses. ...

Como é possível, nessas condições, que uma assembléia republicana – órgão supremo do Estado Burguês – tenha como base organismos do Estado Proletário.”[61]

 

 

 

Diante de todo exposto, convém recolocar a questão proposta no início do presente subtítulo : os principais ideólogos do Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI), os principais dirigentes da seção brasileira do SU-QI, Tendência Democracia Socialista(DS), em seu empenho de lutar pela “Democracia Socialista como pressuposto e condição para a transição rumo a uma sociedade realmente comunista”, por uma “democratização radical da sociedade e o controle social da justiça”, pela “reforma radical das administrações municipais e pelos orçamentos participativos”, por “Uma Europa Social e Democrática e um Mundo dos Cidadãos”, orientando-se para a missão de transformação e enfraquecimento dos Estados Burgueses adotam, defendem e operam, presentemente com qual versão de conquista da hegemonia do proletariado : a versão dialético-materialista, desenvolvida por Lenin e devidamente concebida por Trotsky, ou a versão idealista-subjetivista, equacionada por Gramsci, destinada à promoção de frentes populares e conciliacionismo de classes, como forma de capitulação diante dos Estados Burgueses ?

 

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU – BUENOS AIRES - SÃO PAULO – PARIS

 

 

 

 



[1] Nesse sentido, Lenin assinalou, precisamente : „A burguesia adora designar e escarnear o Levante de Dezembro de Moscou como sendo algo „artificial“. Na literatura alemã, assim-chamada „científica“, o Sr. Professor Max Weber, p.ex., em uma grande obra acerca do desenvolvimento político da Rússia, designou o Levante de Moscou como um „Golpe de Estado“. „ ... O grupo leninista“, escreve esse „sábio“ Sr. Professor, „e uma parte dos sociais-revolucionários prepararam o estapafúrdio levante desde há longo tempo. ... „. Para poder-se apreciar essa sabedoria professoral da burguesia amedrontada, basta recordar os números frios da estatística das greves.“ Cf. LENIN, VLADIMIR I. Ein Vortrag über die Revolution von 1905 (Uma Palestra sobre a Revolução de 1905)(9 de Janeiro de 1917), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXIII, Berlim, 1962, p. 259.      

[2] Nesse sentido, MARCUSE, HERBERT. An Essay on Liberation, London : Penguin, 1969, pp. 5 e s.; IDEM. Soviet Marxism. A Critical Analysis, London : Routledge & Paul, 1958, pp. 15 e s.

[3] Cf. LENIN, VLADIMIR I. Brief an die Genossen (Carta aos Companheiros)(17 de Outubro de 1917), in:   W. I. Lenin Werke, Vol. XXXI, Berlim, 1962, p. 200.

[4] Cf. IDEM. Der „linke Radikalismus“, die Kinderkrankheit im Kommunismus (O „Radicalismo de Esquerda“: Enfermidade Infantil no Comunismo) (Abril-Maio de 1920), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXXI, Berlim, 1962, p. 36.

[5] Acerca do particular significado concenente à temática da conquista do Estado em Gramsci, vide, antes de tudo, vide GRAMSCI, ANTONIO. La Conquista dello Stato(L’Ordine Nuovo, 12 de Julho de 1919), in : Antonio Gramsci. Scritti Politici, Roma, 1967, pp. 218 e s.; IDEM. Lo Stato e il Socialismo(L’Ordine Nuovo, 28 de Junho-5 de Julho de 1919), in : ibidem, pp. 210 e s.; IDEM. Socialisti e Anarchici(L’Ordine Nuovo, 20-27 de Setembro de 1919), in : ibidem, pp. 237 e s. Relativamente às concepções de Gramsci acerca da conquista da hegemonia do proletariado e da „guerra de posição“, vide, especialmente, IDEM. Quaderno del Carcere Nr. 19 (1928-1937) - Il Problema della Direzione Politica nella Formazione e nello Sviluppo della Nazione e dello Stato Moderno in Italia, in : Antonio Gramsci. Disgregazione Sociale e Rivoluzione. Scritti sul Mezzogiono, Napoli : Liguori Editore, 1996, p. 188.; IDEM. Quaderni del Carcere (1928-1937) – Passagio dalla Guerra Manovrata (e dall’Attacco Frontale) alla Guerra di Posizione anche nel Campo Politico, in: : Antonio Gramsci. Scritti Politici, Roma, 1967, pp. 821 e s. Ainda sobre esse tema, vide, mais pormenorizadamente,  o Capítulo III da presente investigação.

[6] Cf. EM TEMPO. 20 JAHRE „DEMOCRACIA SOCIALISTA“. DELEGIERTEN-KONFERENZ VON „DEMOCRACIA SOCIALISTA“(Em Tempo. 20 Anos de „Democracia Socialista. Conferência de Delegados de „Democracia Socialista“), in : INPREKORR. Internationale Pressekorrespondenz, Nr. 337/338, November/Dezember 1999, pp retro-mencionadas.

[7] Cf. TENDENZ SOZIALISTISCHE DEMOCRATIE. These für eine Aktualisierung des Programms der Arbeiterpartei(Tese para uma Atualização do Programa do Partido dos Trabalhadores), in : INPREKORR. Internationale Pressekorrespondenz, Nr. 342, April 2000, pp. retro-referidas.

[8] Cf. IDEM. ibidem, p. 14.

[9] Vide MARX, KARL. Die Westmächte und die Türkei (As Potências Ocidentais e a Turquia) (1854), in : Marx und Engels Werke, Vol. X, Berlim, 1962, pp. 9 e s.; IDEM. Preußen im Jahre 1856 (A Prússia em 1856), in : ibidem, Vol. XI, pp. 636 e s.; IDEM. Sardinien (Sardenha), in : ibidem, Vol. XII, pp. 15 e s.; ENGELS, FRIEDRICH. Vorrede zum Manifest der Kommunistischen Partei. Englische Ausgabe von 1888 (Prefácio ao Manifesto do Partido Comunista. Edição Inglesa de 1888), in : ibidem, Vol. XXI, pp. 352 e s.; IDEM. Revolution und Konterrevolution in Deutschland (Revolução e Contra-Revolução na Alemanha) (1852), in : ibidem, Vol. VIII, pp. 14 e s.

[10] Nesse sentido, vide, exemplificativamente, MARX, KARL. Die Kriegsfrage – Finanzangelegenheiten – Streiks (A Questão da Guerra – Assuntos Financeiros – Greves) (1853), in: Marx und Engels Werke, Vol. IX, Berlim, 1962, pp. 419 e s. ; IDEM. Die preußische Regentschaft(A Regência Prussiana) (1858), in : ibidem, Vol. XII, pp. 609 e s.; IDEM. Die Kriegsaussichten in Europa (As Perspectivas de Guerra na Europa) (1859), in : ibidem, Vol. XIII, pp. 168 e s.;  IDEM. Das russisch-französische Bündnis (A Aliança Franco-Russa) (1860), in : ibidem, Vol. XV, pp. 109 e s.; ENGELS, FRIEDRICH. Regierung und Opposition in Frankreich (Governo e Oposição na França) (1846), in : ibidem, Vol. IV, pp. 27 e s.;  IDEM. Revolution und Konterrevolution in Deutschland (Revolução e Contra-Revolução na Alemanha) (1852), in : ibidem, Vol. VIII, pp. 5, 24, 49 e s.; IDEM. Die Revolution in Spanien (A Revolução na Espanha) (1856), in : ibidem, Vol. XII, pp. 37 e s.; IDEM. Die Trade-Unions (Os Sindicatos) (1881), in : ibidem, Vol. XIX, pp. 254 e s.

[11] Nesse sentido, vide MARX, KARL & ENGELS, FRIEDRICH. Die Debatte über den Jacobyschen Antrag (O Debate sobre o Requerimento Jacobino)(1848), in : Marx und Engels Werke, Vol. V, Berlim, 1962, pp. 222 e s.;  MARX, KARL. Zur Geschichte der Agitationen (Sobre a História das Agitações) (1855), in : ibidem, Vol. XI, pp. 200 e s.; IDEM. Die Lage in Preußen (A Situação na Prússia) (1858) in : ibidem, Bd. XII, pp. 659 e s.; IDEM. Politische Rundschau (Panorama Político) (1859), in : ibidem, Vol. XIII, pp. 487 e s.; IDEM. Der nordamerikanische Bürgerkrieg (A Guerra Civil Norte-Americana) (1861), in : ibidem, Vol. XV, pp. 329 e s.; IDEM. Proklamation des deutschen Bildungsvereins für Arbeiter in London über Polen (Proclamação da União Alemã de Educação para os Trabalhadores em Londres via Polônia), (1863), in : ibidem, Vol. XV, pp. 576 e s.;  ENGELS, FRIEDRICH. Savoyen und Nizza (Savóia e Nice) (1860) , in : ibidem, Vol. XIII, pp. 560 e s.; IDEM. Die Rolle der Gewalt in der Geschichte (O Papel do Poder na História) (1888), in : ibidem, Vol. XXI, pp. 405 e s.

[12] Segundo Marx : “Na realidade, não é provável que a grande burguesia de novo, tal como em 1848, coloque-se na cabeça de uma revolução na Prússia. Os camponeses da Prússia Oriental perderam não apenas tudo que lhe havia aportado em libertação a revolução, senão ainda permanecem, tal como antes, sob o jugo direto da nobreza, seja em sentido administrativo, seja em sentido legal. Na Prússia Renana, onde o capital foi empregado pelas empresas industriais, eles se enfiaram, com igual rapidez, cada vez mais profundamente, na servidão das hipotecas, com a qual se elevaram os juros de créditos. Enquanto na Áustria procurou-se pelo menos apaziguar os camponeses, nada deixou de se passar na Prússia que os pudesse levar ao desespero. No que diz respeito à classe trabalhadora, o governo impediu-a de participar nos lucros de seus empresários, na medida em que a puniu em razão de sua participação em greves e a distancia sistematicamente da participação na vida política. Uma dinastia desunida, um governo dividido em campos inimigos, uma burocracia que se encontra em disputa com a aristocracia, uma crise comercial geral e as classes deserdadas, que estão preenchidas pelo espírito da rebelião contra todas as camadas superiores da sociedade : esse é, no momento, o quadro da Prússia. MARX, KARL. Preußen im Jahre 1856 (A Prússia em 1856), in: Marx und Engels Werke, Vol. XI, Berlim, 1962, p. 640.

[13] Cf. LENIN, VLADIMIR I. Was Sind die „Volksfreunde“ und Wie Kämpfen Sie gegen die Sozialdemokratie? (O Que São os „Amigos do Povo“ e Como Lutam contra a Social-Democracia)(1894), in : W. I. Lenin Werke, Vol. I, Berlim, 1962, p. 304. Nesse mesmo sentido inicial, vide ainda IDEM. Die Aufgaben der russischen Sozialdemokraten (A Tarefa dos Sociais-Democrátas Russos) (1897), in : ibidem, Vol. II, pp. 336 e s.; IDEM. Zwangsrekrutierung von 183 Studenten (Recrutamento Obrigatório de 183 Estudantes)(Janeiro de 1901), in : ibidem, Vol. IV, pp. 420 e s.

[14] Cf. IDEM. Protest russischer Sozialdemokraten (Protesto dos Socias-Democrátas Russos) (Setembro de 1899), in : ibidem, Vol. IV, p. 174. No mesmo sentido, vide IDEM. Entwurf einer Ankündigung der Redaktion (Projeto de uma Proclamação da Redação) (Fevereiro de 1900), in : ibidem, Vol. IV, pp. 324 e s.; IDEM. Ankündigung der Redaktion der Iskra (Proclamação da Redação do Iskra) (Setembro de 1900), in : ibidem, Vol. IV, pp. 352 e s. ; IDEM. Protest russischer Sozialdemokraten(Protesto dos Sociais-Democrátas Russos)(3 de Julho de 1902), in : ibidem, Vol. IV, pp. 170 e s.; IDEM. An die Dorfarmut (À Pobreza do Campo)(Março de 1903), in : ibidem, Vol. VI, pp. 423 e s.; IDEM. Antwort auf eine Kritik unseres Programmentwurfs (Resposta a uma Crítica ao Nosso Projeto de Programa) (Juni de 1903), in : ibidem, Vol. VI, pp. 443 e s. 

[15] Cf. IDEM. Vorwort zu der Broschüre „Die Maitage in Charkow“ (Prefácio à Brochura „O Dia de Maio em Charkow)(Novembro de 1900), in : ibidem, Vol. IV, p. 359. No mesmo sentido, IDEM. Arbeiterpartei und Bauernschaft (Partido dos Trabalhadores e Campesinato)(Fevereiro de 1901), in : ibidem, Vol. IV, pp. 428 e s.

[16] Acerca do tema, vide PLECHANOW, GEORG W. Sozialismus und politischer Kampf (Socialismo e Luta Política) (1883), Frankfurt-Gelsenkirchen : VTK, 1980, pp. 17 e s.

[17] Nesse sentido, vide PLECHANOW, GEORG W. & AXELROD, PAUL Brief an Struve aus dem Jahr 1901(Carta a Struve do Ano de 1901), in: Perry Anderson, Antono Gramsci. Eine kritische Würdigung(Antonio Gramsci. Uma Apreciação Crítica), Berlim : Olle & Wolter, 1979, p. 21.

[18] Cf. LENIN, VLADIMIR I.  An G. W. Plechanow (A Plekhanov)(30 de Janeiro de 1901), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXXIV, Berlim, 1962, p. 40.

[19] Cf. IDEM. Arbeiterdemokratie und bürgerliche Demokratie (Democracia dos Trabalhadores e Democracia Burguesa) (24 (11)de Janeiro de 1905), in : ibidem, Vol. VIII, p. 66.

[20] Cf. IDEM.  Dve Taktiki Sotsial-Demokratii v Demokratitcheskoi Revoliutsii (Duas Táticas da Social-Democracia na Revolução Democrática) (Julho 1905), Moscou : Isdatelstvo Polititcheskoi Literatupyi, 1989, pp.  4 e 5.

[21] Cf. IDEM. An J. Marchlewski (Carta a J. Marchlewski) (7 de Outubro de 1910), in : ibidem, Vol. XXXIV, pp. 421 e 422.

[22] Cf. IDEM. Unsere Liquidatoren (Nossos Liquidadores) (Jan./Fev. 1911) in: ibidem, Vol. XVII, pp. 62 e 63.

[23] Cf. IDEM. Der Reformismus in der russischen Sozialdemokratie (O Reformismo na Social-Democracia Russa)(14 de Setembro de 1911), in : ibidem, Vol. XIV, pp. 218 e 219.

[24] Cf. IDEM. ibidem, p. 219. No mesmo sentido, vide ainda IDEM. Das Rußland von heute und die Arbeiterbewegung (A Rússia de Hoje e o Movimento dos Trabalhadores)(22 de Abril de 1913), in : ibidem, Vol. XIX, pp. 30 e s.; 

[25] Cf. IDEM. Stolypin und die Revolution (Stolypin e a Revolução) (18 de Outubro de 1911), in : ibidem, Vol. XVII, p. 239.

[26] Cf. IDEM. Über die Zwei Linien der Revolution (Acerca de Duas Linhas da Revolução)(20 de Novembro de 1915), in : ibidem, Vol. XXI, pp. 426 e 427.

[27] Acerca do tema, vide LUXEMBURG, ROSA. Zur Russischen Revolution(Acerca da Revolução Russa), in : Rosa Luxemburg. Gesammelte Werke, Vol. 4, Berlim, 1974, pp. 336 e s.

[28] Acerca do tema, vide, especialmente, LENIN, VLADIMIR I.  Briefe aus der Ferne (Cartas de Longe)(12 de Março de 1917) in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXIII, Berlim, 1962, p. 40.; IDEM. Abschiedsbrief an die Schweizer Arbeiter (Carta de Despedida aos Trabalhadores Suiços)(26 de Março de 1917), in : ibidem, Vol. XXIII, pp. 385 e s.; IDEM. Schlußwort zum Referat über die Politische Lage (Encerramento à Exposição sobre a Situação Política)(Abril de 1917), in : ibidem, Vol. XXIV, pp. 134 e s.; IDEM. Resolution des ZK der SDAPR(B) vom 20. April 1917 über die Krise (Resolução do CC do POSDR(B) de 20 de Abril de 1917 sobre a Crise), in : ibidem, Vol. XXIV, pp. 172 e s.; IDEM. Zu den Losungen (Acerca das Consignas)(Julho de 1917), in: ibidem, Vol. XXV, pp. 185 e s.; IDEM. Aus dem Tagebuch eines Publizisten (Do Diário de um Publicista) (Setembro de 1917), in : ibidem, Vol. XXV, pp. 299 e s.  

[29] Acerca da análise dialético-materialista de Lenin relativa às possibilidades de desenvolvimento pacífico e violento da revolução socialista, conduzindo à destruição do Estado Burguês e a Ditadura do Proletariado, vide IDEM. Die Aufgaben der Revolution (As Tarefas da Revolução) (9 de Outubro de 1917), in : ibidem, Vol. XXVI, pp. 50 e s. Acerca da preparação do levante armado, vide IDEM. Brief an das ZK, das Moskauer Komitee, das Petrograder Komitee und an die bolschewistischen Mitglieder der Sowjets von Petrograd und Moskau (Carta ao CC, ao Comitê de Moscou, ao Comitê de Petrogrado e aos Membros dos Soviets de Petrogrado e Moscou) (14 de Outubro de 1917), in : ibidem, Vol. XXVI, pp. 125 e s.; IDEM.  Sitzung des ZK der SDAPR (Sessão do CC do POSDR)(10 de Outubro de 1917), in : ibidem, Vol. XXVI, pp. 176 e s.; IDEM.  Sitzung des ZK der SDAPR (Sessão do CC do POSDR)(16 de Outubro de 1917), in : ibidem, Vol. XXVI, pp. 179 e s.          

[30] Cf. TROTSKY, LÉON. Two Faces—Internal Forces of the Russian Revolution (Duas Faces – Forças Internas da Revolução Russa) (Março de 1917) in : Leon Trotsky Speaks, London, pp. 46 e 47.

[31] Acerca do tema, vide, sobretudo, LENIN, VLADIMIR I. Die Dritte Internationale und ihr Platz in der Geschichte (A III Internacional e seu Lugar na História) (15 de Agosto de 1919), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXIII, Berlim, 1962, pp. 299 e s.; IDEM. Über die Aufgaben der III. Internationale (Acerca das Tarefas da III Internacional)(14 de Julho de 1919) in : ibidem, Vol. XXIX, pp. 501 e s.

[32] Cf. LENIN, VLADIMIR I. Der „linke Radikalismus“, die Kinderkrankheit im Kommunismus (O „Radicalismo de Esquerda“ : Enfermidade Infantil no Comunismo) (Abril-Maio de 1920), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXXI, Berlim, 1962, pp. retro-mencionadas.

[33] Cf. IDEM. Ibidem, pp. 80 e 81.

[34] Cf. IDEM. Brief an die deutschen Kommunisten (Carta aos Comunistas Alemães)(14 de Agosto de 1921), in: ibidem, Vol. XXXII, pp. 538 e 539.

[35] Acerca do tema, Franco Grisolia, da Associazzione Marxista Rivoluzionaria Proposta, notoriamente impactado pela mitologia da doutrina de Gramsci, escreve em uma nota de seu recente artigo, intitulado La Natura ed Il Ruolo del Partito Leninista, acriticamente : “Na Itália, encontra-se difundido um mito segundo o qual o conceito de hegemonia é uma inovação teórica peculiar do pensamento de Antonio Gramsci, que o haveria destacado do rígido “dogmatismo” da III Internacional leninista. Na realidade, o grande revolucionário italiano, não fez senão retomar um conceito próprio dos decênios do marxismo revolucionário russo (“Os promotores da idéia da hegemonia do proletariado na revolução são Plechanov e Lenin” : assim Zinoviev, em sua História, 1923). Gramsci, com grande brilhantismo, repropõe essa temática central na Itália. Além disso, a utilização do termo “hegemonia” – mais vago, à primeira vista, que os outros  - no período do cárcere – constituía para Gramsci também um elemento de prudência em relação às medidas repressivas ulteriores de seus carcereiros fascistas”.  Vide GRISOLIA, FRANCO. La Natura ed il Ruolo del Partito Leninista, in : Ottobre 1917. L’Assalto al Cielo : La Rivoluzione Russa e le Sue Prospettive Internazionali, in: I Dossier di Proposta, 30 maggio 1999. Como é possível verificar a partir de leitura desse extrato, Grisolia visa a legimitar a concepção de hegemonia de Gramsci entre as fileiras trotskystas e de Rifondazione Comunista, repassando ao leitor a idéia de que a tal versão de Gramsci teria seus fundamentos mais essenciais na concepção dialético-materialista de hegemonia de Lenin – e não no idealismo do renomado pensador liberal italiano Benedetto Croce. Além disso, Grisolia, alega, superficialmente e sem qualquer intenção de ressaltar o sentido histórico do desenvolvimento das polêmicas entre os bolcheviques, que Zinoviev, em sua História do Partido Bolchevique, declara que a questão relativa à hegemonia do proletariado já havia sido concebida, anteriormente por Lenin. Seria preciso ler Zinoniev, em uma de suas piores produções literárias, redigida para desferir um ataque medido contra o “trotskysmo”, em defesa da Troika, para alegar que Lenin havia empenhado-se em desenvolver e em defender a idéia de hegemonia do proletariado? Dizer isso e dizê-lo da forma como o faz Grisolia, sem referir o intuito de Zinoviev de, em sua obra em destaque, defachar um ataque ideológico contra o o trotskysmo, é aceitar, implicitamente, a falsa premissa de que a concepção de hegemonia pode apenas ser, efetivamente, entendida no contexto da mais impiedosa luta contra a concepção de Trotsky acerca do papel do proletariado russo na Revolução de Outubro, e sua doutrina da Teoria da Revolução Permanente, tal como o sugeriu, da maneira mais rudimentar Zinoviev, e, da maneira mais ostensiva e despudorada, a versão stalinista da hegemonia, defendida agüerridamente por Stálin e pelos principais preceptores da III Internacional Stalinizada, nos anos subseqüentes.

[36] Acerca do tema, vide STALIN, JOSEF W. Über die Grundlage des Leninismus (Sobre os Fundamentos do Leninismo) (26 de Abril de 1924), in: J.W. Stalin Werke, Vol. VI, Dortmund, 1976, literalmente Capítulo V : A Questão Camponesa, p. 112.

[37] Acerca do tema, vide IDEM. Die Oktoberrevolution und die Taktik der russischen Kommunisten (A Revolução de Outubro e a Tática dos Comunistas Russos) (17 de Dezembro de 1924), in : ibidem, Vol. VI, pp. 320 e s.

[38] Formulando cegamente sua crítica à teoria da Revolução Permanente, tal como desenvolvida por Trotsky, a partir da dogmática político-doutrinária de Josef Stálin, Gramsci escreveu, nitidamente, acerca do tema, em seus Cadernos do Cárcere : „Diferenças entre a França, a Alemanha e a Itália no processo de tomada do poder por parte da burguesia (e Inglaterra). Na França, tem-se o processo mais rico de desenvolvimentos e de elementos políticos ativos e positivos. Na Alemanha, o processo desenrola-se, em alguns aspectos, em formas que se assemelham àquelas italianas, em outros, àquelas inglesas. Na Alemanha, o movimento de 1848 fracassa pela escassa concentração burguesa (a palavra de ordem de tipo jacobino foi dada pela extrema esquerda democrática: „revolução em permanência“) e porque a questão da renovação estatal encontra-se entrelaçada com a questão nacional. ...(p. 215) A propósito da palavra de ordem „jacobina“, formulada em 1948-49, deve-se estudar seu complicado destino. Retomada, sistematizada, elaborada, intelectualizada pelo grupo Parvus-Bronstein (obs.: Gramsci refere-se aqui a Parvus e Trotsky), manifestou-se inerte e ineficaz em 1905 e, em seguida : tornou-se uma coisa abstrata, de gabinete científico. Pelo contrário, a corrente que a antagonizou nessa sua manifestação literária (obs.: Gramsci alude aqui à corrente de Stálin), sem empregá-la „de propósito“, aplicou-a, de fato, em uma forma aderente à história atual, concreta, viva, adaptada ao tempo e ao lugar, como decorrente de todos os poros da dada sociedade que era necessário transformar, como aliança de dois grupos sociais, com hegemonia do grupo urbano(p. 217).“ Cf. GRAMSCI, ANTONIO. Quaderni del Carcere, Nr. 19 (1928-1937) - Il Problema della Direzione Politica nella Formazione e nello Sviluppo della Nazione e dello Stato Moderno in Italia. (segundo Giovanni Francioni o texto em referência teria sido redigido, efetivamente, entre fevereiro de 1934 e fevereiro de 1935. Segundo Valentino Gerratana, porém, entre fevereiro e março de 1930), in : Antonio Gramsci. Disgregazione Sociale e Rivoluzione. Scritti sul Mezzogiono, Napoli : Liguori Editore, 1996, pp. retro-mencionadas. Eis aí como, segundo a apreciação de Gramsci, Stálin, antagonizando „a idéia da Revolução Permanente, na medida em que a transformam em uma sabedoria livresca sem vida“(vide literalmente a citação de Stálin formulada acima, no corpo do presente trabalho), aplicou-a, efetivamente, „em uma forma aderente à história atual, concreta, viva, adaptada ao tempo e ao lugar, como decorrente de todos os poros da dada sociedade que era necessário transformar, como aliança de dois grupos sociais, com hegemonia do grupo urbano“, tendo em vista que Parvus e Trotsky haviam a transformado em „uma coisa abstrata, de gabinete científico“(vide expressamente as palavras empregadas acima na citação de Gramsci). Tal formulação de Gramsci, elaborada tendo em conta especificamente a realidade sócio-política soviética interna, surge complementarmente de acordo com seu posicionamento de que Josef Stálin havia de ser considerado, adicionalmente, como il più recente grande teorico” em matérias de internacionalismo, tal como será adiante apresentado ao leitor.

[39] Cf. STALIN, JOSEF W. Zu den Fragen des Leninismus (Acerca das Questões do Leninismo)(25 de Janeiro de 1926), in : ibidem, Vol. VIII, pp. retro-mencionadas.

[40] Cf. IDEM. Unterredung mit der Ersten Amerikanischen Arbeiterdelegation (Conversação com a Primeira Delegação dos Trabalhadores Norte-Americanos) (9 de Setembro de 1927), in : ibidem, Vol. X, pp. retro-mencionadas.

[41] Cf. IDEM. ibidem, pp. 84, 85 e 86.

[42] Cf. GRAMSCI, ANTONIO. Quaderni del Carcere, Nr. 14 (1928-1937) – Internacionalismo e Política Nacional, in : Antonio Gramsci. Note sul Machiavelli sulla Politica e sullo Stato Moderno, Torino : Editori Riuniti, 1991, pp. 144 e 145. Nesse sítio, Gramsci refere-se, expressa e apologeticamente, ao texto de Stálin retro-mencionado, intitulado “Conversação com a Primeira Delegação dos Trabalhadores Norte-Americanos”, em sua luta implacável contra as concepções de Trotsky.  

[43] Tal afirmação é testificada, espontânea, instinta e acriticamente por Christian Riechers, que, posicionando-se do ponto de vista neo-stalinista reciclado - solidário à maneira de abordagem dos problemas teóricos dinamizada pelo atual franco-gramscista e antigo mao-stalinista, Etienne Balibar -, não tem tantos pudores de a obscurecer ou acobertar, à maneira dos principais ideólogos da Associazzione Marxista Rivoluzionaria Proposta, de Grisolia, Ferrando e Ricci. Segundo Christian Riechers : „Para Gramsci, Lenin é concebido, antes de tudo, como um internacionalista „que se nacionaliza“, na medida em que é o teórico da „hegemonia“, entendida como „complemento“ „cultural-estatal“ do „poder do Estado“. Gramsci vai, nesse sentido, mais adiante do que Stálin, a cuja „Conversação com a Primeira Delegação dos Trabalhadores Norte-Americanos“, de 9 de setembro de 1927, deve a definição de Lenin como teórico da hegemonia do proletariado. Apesar da „construção do socialismo em um só país“, entrementes proclamada, Stálin vê o „novo“ do leninismo em face do velho marxismo sobretudo na análise das relações mundias modificadas (imperialismo) e vai falar de hegemonia, tal como resultante das experiências das lutas revolucionárias na Rússia enquanto nova fórmula, apenas no quarto lugar de sua enumeração dos elementos do leninismo. Para Gramsci, a essência do leninismo esgota-se na Teoria da Hegemonia. ... Quando Stálin fala de „esboço“ e de „sistema fechado da hegemonia do proletariado“, aproxima-se muito da concepção de Gramsci de „filosofia da práxis“. Os clássicos apenas „esboçam“, seja em sentido puramente filosófico ou no campo político, seus sucessores sistematizara, „criativamente“. A diferenciação de „força de embate“ e „hegemonizador“ tal como dirigente político, tal como o momento da „separação“ são reencontrados na teoria política de Gramsci, cujo momento central reside no conceito de „hegemonia“.“ Cf. RIECHERS, CHRISTIAN. Antonio Gramsci. Marxismus in Italien (Antono Gramsci. Marxismo na Itália), Frankfurt a.M. : Eur. Verl.-Anst., 1970, pp. 190 e 191. Inspirado pela mesma perspectiva neo-stalinista reclicada, revela Heiner Karuscheit, literalmente, ao leitor : „A compreensão de hegemonia desenvolvida na Rússia e assumida pelo Komintern foi o pano de fundo do qual partiu Gramsci quando desenvolveu sua próprias concepções“. Cf. KAMINSKI, FRANZ / KARUSCHEIT, HEINER / WINTER, KLAUS. Antonio Gramsci. Philosophie und Praxis. Grundlagen und Wirkungen der Gramsci-Debatte (Antonio Gramsci. Filosofia e Práxis. Fundamentos e Efeitos do Debate Gramsci), Frankfurt a. M. : Sendler, 1982, p. 213.

[44] Cf. GRAMSCI, ANTONIO, Philosophie der Praxis(Filosofia da Práxis), Frankfurt a.M. : Fischer, 1967, pp. retro-mencionadas.

[45] Cf. IDEM, Quaderni del Carcere (1928-1937) – Passagio dalla Guerra Manovrata (e dall’Attacco Frontale) alla Guerra di Posizione anche nel Campo Politico, in: : Antonio Gramsci. Scritti Politici, Roma, 1967, pp. 821 e s.

[46] Acerca dessa temática, vide ainda, mais precisamente, o Capítulo III da presente investigação.

[47] Cf. GRAMSCI, ANTONIO. Alcuni Temi della Quistione Meridionale, (Outono de 1926), in : Antonio Gramsci. Disgregazione Sociale e Rivoluzione. Scritti sul Mezzogiono, Napoli : Liguori Editore, 1996, p. 158. Esse mesmo texto surge, em língua italiana, em IDEM. La Costruzione del Partito Comunista(1923-1926), Turino: Einaudi, 1971, pp. 137 e s. Observe-se, ainda, que essa mesma produção de Gramsci foi publicada, pela primeira vez, na revista teórica do PCI „Lo Stato Operaio“, IV, Nr. 1, Paris, Janeiro de 1930, pp. 9 e s.

[48] Acerca do tema, vide, mais pormenorizadamente, os argumentos apresentados a seguir, no Capítulo III do presente texto.

[49] Nesse sentido, vide, precisamente, STALIN, JOSEF W. Über die Grundlage des Leninismus (Sobre os Fundamentos do Leninismo) (26 de Abril de 1924), in: J.W. Stalin Werke, Vol. VI, Dortmund, 1976, literalmente Capítulo V : A Questão Camponesa, p. 112.

[50] Cf. GRAMSCI, ANTONIO. Quaderno del Carcere Nr. 19 (1928-1937) - Il Problema della Direzione Politica nella Formazione e nello Sviluppo della Nazione e dello Stato Moderno in Italia, in : Antonio Gramsci. Disgregazione Sociale e Rivoluzione. Scritti sul Mezzogiono, Napoli : Liguori Editore, 1996, p. 188.

[51] Cf. LENIN, VLADIMIR I. Der „linke Radikalismus“, die Kinderkrankheit im Kommunismus (O „Radicalismo de Esquerda“ : Enfermidade Infantil no Comunismo) (Abril-Maio de 1920), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXXI, Berlim, 1962, p. 36.

[52] Cf. GRAMSCI. ANTONIO Quaderni del Carcere (1928-1937) - Passagio dalla Guerra Manovrata (e dall’Attacco Frontale) alla Guerra di Posizione anche nel Campo Politico, in: Antonio Gramsci. Scritti Politici, Roma, 1967, pp. 821 e s.

[53] Acerca dessa problemática, vide ainda, especialmente, o Capítulo III do presente texto.

[54] Cf. STALIN, JOSEF W. Unterredung mit der Ersten Amerikanischen Arbeiterdelegation (Conversação com a Primeira Delegação dos Trabalhadores Norte-Americanos) (9 de Setembro de 1927), in : J.W. Stalin Werke, Vol. X, pp. 84, 85 e 86. Acerca do tema, vide citação reproduzida acima.

[55] Cf. GRAMSCI, ANTONIO. Philosophie der Praxis(Filosofia da Práxis), Frankfurt a.M. : Fischer, 1967, pp. 258. Citado tb. em IDEM. Marxismus in Italien(Marxismo na Itália), in : Christian Riechers. Antonio Gramsci, Frankfurt a. M. : Eur. Verl.-Anst., 1970, p. 234. Acerca do tema, vide ainda IDEM. Quaderni del Carcere, Nr. 6 (1928-1937) – Egemonia (Società Civile)  e Divisione dei Poteri, in : Antonio Gramsci. Note sul Machiavelli sulla Politica e sullo Stato Moderno, Torino : Editori Riuniti, 1991, pp. 107 e s.; IDEM. Quaderni del Carcere, Nr. 14 (1928-1937) – Internazionalismo e Politica Nazionale, in : ibidem, p. 146.; IDEM. Quaderni del Carcere, Nr. 6 (1928-1937) – Arme e Religioni, in : ibidem, p. 153.

[56] Cf. IDEM. Quaderni del Carcere (1928-1937) - Punti di Riferimento su Benedetto Croce(Il Materialismo Storico e la Filosofia di Benedetto Croce), in : Antonio Gramsci. Scritti Politici, Roma, 1967, pp. 805 e s.; IDEM. Il Significato e i Risultati del III Congresso del Partito Comunista d’Italia. Questione Ideologica(L’Unità. 24 de Fevereiro de 1926), in : ibidem, p. 664.; IDEM. Quaderni del Carcere – Il Concetto di Rivoluzione Passiva. Epilogo Primo(1928-1937), in : ibidem, p. 802.; IDEM.  Philosophie der Praxis(Filosofia da Práxis), Frankfurt a.M. : Fischer, 1967, pp. 248, 254, 272 e s.; IDEM. Zu Politik, Geschichte und Kultur. Ausgewählte Schriften(Antonio Gramsci. Acerca da Política, História e Cultura. Escritos Escolhidos), Leipzig : Philipp Reclam, 1980, pp. 261 e s.

[57] Cf. IDEM. Philosophie der Praxis(Filosofia da Práxis), Frankfurt a.M. : Fischer, 1967, p. 258. Citado tb. em IDEM. Marxismus in Italien(Marxismo na Itália), in : Christian Riechers. Antonio Gramsci, Frankfurt a. M. : Eur. Verl.-Anst., 1970, p. 230.

[58] Segundo o julgamento Christoph Butterwegge – a nosso ver doutrinariamente superficial e sem precisa perspectiva histórica, porém, no geral, revestido de certo interesse analítico - Gramsci teria operado „uma subestimação do problema do poder revolucionário e uma sobrevalorização da luta ideológica, bem como um afrouxamento idealista do materialismo histórico“. Nesse sentido, vide BUTTERWEGGE, CHRISTOPH.  SPD und Staat heute (SPD e Estado Hoje), Berlim, 1979, p. 596.

[59] Cf. GRAMSCI, ANTONIO. Il Significato e i Risultati del III Congresso del Partito Comunista d’Italia (L’Unità, 24 de Fevereiro de 1926), in : Antonio Gramsci. Scritti Politici, Roma, 1967, pp. 651 e s.

[60] Cf. TROTSKY, LEÓN.  Lettera ai Bordighisti (Constantinopla, 25 de Novembro de 1929). Scritti sull’Italia (1921-1938), a cura di Dario Romero, in : http:// www. marxists.org /archive /noneng /trotsky, 1999.

[61] Cf. IDEM. Scritti sull’Italia (1921-1938), Roma : Controcorrente, p. 184.