PRODUÇÕES LITERÁRIAS DEDICADAS À FORMAÇÃO

DE REVOLUCIONÁRIOS MARXISTAS QUE ATUAM NO DOMÍNIO DO DIREITO, DO ESTADO E DA JUSTIÇA DE CLASSE

 

 

Luta de Classes Proletária e Governos de Colaboração de Classes

na Alemanha da Virada do Século XX

 

Na Disjuntiva: Assembléia Nacional Constituinte Apoiada em Órgãos de Poder Proletário Rumo ao Socialismo Democrático

Ou Órgãos de Poder Proletário na Construção da Ditadura Revolucionária Democrático-Proletária Para a Instituição de uma Sociedade Socialista Sem Classes

 

Fundamentos Históricos Para uma Análise da Política Stalinista  de Frente Popular

 

 

EMIL ASTURIG VON MÜNCHEN

PORTAU SCHMIDT VON KÖLN

 

Para Palestras, Cursos e Publicações sobre o Tema em Destaque

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Fevereiro de 2002

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ÍNDICE

 

 

 

 

À Guisa de  Introdução

 

O Alvoroço do “Bloco Histórico Trotskysta-Gramsciano- Altamira-Coggioliano”

do PO / PTS / MAS / MTS / CS à luz dos Elementos Político-Estratégicos da Luta Revolucionária da Argentina de 2001-2002 em face das Perspectivas da Revolução Proletária Alemã de 1918-1919 na disjuntiva : Assembléia Nacional Constituinte apoiada em órgãos de poder proletário rumo ao socialismo democrático ou órgãos de poder proletário na construção da Ditadura Revolucionária Democrático-Proletária para a instituição de uma sociedade socialista sem classes

 

 

Capítulo I.

O Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD) na virada do século XX

e o Marxismo Revolucionário

 

Capítulo II.

Lênin e Luxemburg : Duas Concepções Marxistas no Movimento Proletário-Revolucionário Europeu do Início do Século XX

 

II.1.

A Questão Organizativa do Partido Revolucionário

II.2.

Acerca do Imperialismo

II.3.

A Questão Militar da Revolução Proletária

II.4.

O Direito de Auto-Determinação das Nações Oprimidas

II.5.

Em Face da Questão da Assembléia Nacional Constituinte

 

Capítulo III

I Guerra Mundial do Capitalismo Imperialista e a Paz Civil  

 

Capítulo IV

Ascenso Revolucionário de 1918-1919 : A Reorganização do Movimento dos Trabalhadores Alemães e o Surgimento de um Governo Aparente dos Trabalhadores

 

Capítulo V

O Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados : Assembléia Nacional Constituinte ou Impulsão dos Órgãos de Poder Proletário

 

Capítulo VI

A Fundação do Partido Comunista da Alemanha (KPD) sob o signo da ascensão de Karl Radek : Diferenças de Matizes Políticos entre Liebknecht e Luxemburg no Quadro da Greve Geral de 1919

 

Capítulo VII 

A Constituição Jurídico-Normativa do Socialismo Democrático : Constituição Menos Democrática e Mais Socialista, ainda que resultante não de um Socialismo Superpoderoso, porém Renovado ...

 

À Guisa de Conclusão

 

 

 

 

À GUISA DE INTRODUÇÃO

 

O ALVOROÇO DO

“BLOCO HISTÓRICO TROTSKYSTA-GRAMSCIANO ALTAMIRA-COGGIOLIANO”

DO PO / PTS / MAS / MTS / CS

À LUZ DOS ELEMENTOS POLÍTICO-ESTRATÉGICOS

DA LUTA REVOLUCIONÁRIA DA ARGENTINA DE 2001-2002

 

Foi nos idos da turbulenta alvorada do século XX, porém, que se estruturou um núcleo “ácido” de marxistas revolucionários proletários, em território europeu, o qual, sofregamente interessado em “mover-se em direção da classe trabalhadora” e progressivamente em amadurecimento revolucionário -  não, porém, sem alguns pontos movediços e arenosos –, entendeu a necessidade imperiosa de e logrou contribuir para preservar-se a doutrina proletário-emancipadora mais genuína, fundada em uma concepção rigorosamente dialético-materialista, contra os ensaios “desapiedados e frívolos” dos revisores e corretores do pensamento de Marx e Engels de sua época :

 

“Nós, marxistas, entendemos sob o conceito de Estado não meramente uma organização de seres humanos que se encontram ligados pela descendência, pela nacionalidade ou pelo local de residência.

Em nossa concepção, o Estado pressupõe, antes de tudo, o fato de que, no interior das organizações de seres humanos, existem diversas camadas que possuem interesses distintos.

No conceito de Estado, já está incluído o conceito de Justiça de Classe. ...

Poder-se-ia perguntar : por que a maioria não se apropria, simplesmente, da posse da minoria ?

Porém, sabemos que, em certos períodos da história, é necessário – e, até mesmo, é uma lei natural – o fato de que uma maioria seja governada pela minoria, no interesse continuado desenvolvimento da humanidade.

Assim, também o capitalismo foi algo inteiramente útil para o continuado progresso da humanidade, não tendo sido, pois, criado por uma invenção demoníaca de homens maliciosos, senão surgiu como uma necessidade do desenvolvimento econômico.

E apenas sobre suas ruínas podemos continuar a construir.”[1]    

 

 

 

Em face das alegativas de celebrizados revisores, amargamente críticos das concepções insculpidas no Manifesto do Partido Comunista, de Marx e Engels, alegativas essas lançadas enquanto suposta alternativa para “mover-se em direção da classe trabalhadora” ... -, em face de argumentos de que os movimentos adotam uma série de reinvindicações e alternativas programáticas – o que é positivo e importante – porém, “falta-lhes uma compreensão teórica da natureza da evolução do sistema imperial” ... -, em face das instâncias de homens “frívolos e desapiedados”, imunizados, genialmente, de todo “sentimentalismo filistino”, de que uma das questões que ainda restaria por solucionar-se seria “a desunião dos movimentos urbanos e rurais ...”, posto que os movimentos existentes juntos, se estivessem unificados em um só movimento coerente, estariam mais próximos de “disputar o poder estatal”[2] ... -, a acidez dos “marxistas”, envelhecidos, porém vivificados, nas páginas de 1848, contestava, argutamente, o velado pano de fundo deshistoricizado de tais objeções, fundando-se em sua larga experiência fática de lutas fracionais impiedosas, deflagradas implacavelmente contra todos os revisores, glosadores, remendadores, corretores e pretensos atualizadores “da verve de Marx e Engels e de sua celebraçao acrítica do potencial revolucionário do desenvolvimento das forças de produção”:

 

“«Já não reconheço mais nenhum Partido. Reconheço apenas alemães. » - essa sentença enganosa foi colocada no início da Guerra Mundial ...

« Já não reconhecemos mais diferentes Partidos Socialistas. Reconhecemos apenas socialistas », assim soa essa sentença no final da Guerra Mundial.

A bandeira de uma nova Paz Civil encontra-se eriçada ...

E, novamente, aí estão em disputa os que gritam mais alto, os Scheidemann e consortes ...

Porém, nem toda “unidade” fortalece.

A unidade entre o fogo e a água apaga o fogo e volatiza a água.

A unidade entre o lobo e o cordeiro entrega o cordeiro ao lobo para ser devorado.

A unidade entre o proletariado e as classes dominantes sacrifica o proletariado

A unidade com traidores significa derrota ...

Podemos nos unificar com aqueles que não são senão representantes dos exploradores caplitalistas, vestidos de socialistas ?

Podemos e estamos autorizados a ligar-nos a eles, sem nos tornarmos culpados por seus golpes ? ...

As massas trabalhadoras são os executores da revolução social.

A consciência clara, o conhecimento claro de suas tarefas históricas, a vontade clara de seu cumprimento são as qualidades sem as quais elas não podem realizar sua obra ....

Apenas a partir da crítica mais implacável, pode surgir a claridade.

Apenas a partir da claridade, pode surgir a unidade.

Apenas a partir da unidade na ideologia, no objetivo e na vontade, pode surgir a força de criação de um novo mundo do socialismo.”[3]

 

 

    

Nesse cenário de profundas disputas ideológicas e partidárias, procurando, desesperadamente, fundar-se na defesa aguerrida e heróica das concepções fundamentais de Marx e Engels – expostas ao tufão das epidemias sociais-revisionistas e centristas-oportunistas de construção das “novas teorias da ação revolucionária” -, como forma de mover-se em direção da classe trabalhadora, em sentido efetivamente socialista-revolucionário – e não filo-oportunista -, preocupados, sim, em reunir, solidamente, os homens que manejariam as armas para assestar um golpe efetivamente mortal ao capitalismo – não o fazendo com contemporização de dualidade de poderes das classes sociais inconciliavelmente antagônicas -, com vistas a ser materialmente possível a edificação de uma República Socialista Livre da Alemanha, viram-se forçados os revolucionários marxistas do proletariado alemão a enfrentar a voracidade da tempestade insurrecional dos anos 1918 e 1919.

Essa Unwetter, esse thunderstorm, foi marcado pelos mais perversos estratagemas colocados em prática por um Estado burguês-imperialista e seus colaboradores, vestidos em trajes socialistas, na luta desesperada contra o massacre e o extermínio, sem trégua e sem armistício, do movimento socialista-revolucionário, proletário e internacionalista, mais poderoso que a Europa continental havia, até então, conhecido.

O cenário para essa degola selvagem encontrava o seu palco de exibição nas ruelas e nos becos, nas avenidas e nos prédios, nos emaranhados de pedra e de cimento, das mais importantes cidades de um dos principais bastiões do imperialismo capitalista do início do século XX : o II Império da  Alemanha.

 

“Uma dificuldade que possui a direção da luta de rua é condicionada pelo caráter da cidade, por seu plano urbanístico e por suas características arquitetônicas.

Para os que não estão familiarizados com a cidade, surge essa última como um gigantesco amontoado de pedras de construções e prédios irregularmente imbricados, tal como um labirinto de ruas, ruelas, praças etc., no interior das quais torna-se inconcebível quaisquer tipos de ações planejadas de luta e onde tudo tem de permanecer reservado à improvisação, ao poder do acaso.”[4]

 

 

Se o Deus Marte, sedento de sangue, lograsse derrotar, devastadoramente e no menor espaço de tempo, o ascenso revolucionário proletário dos focos de combate indômitos, entrincheirados nas cidades altamente industrializadas do país de trânsito por excelência para o Leste Europeu, muitas melhores chances possuiria uma ofensiva contra-revolucionária imperialista arrasadora, deflagrada contra a República Socialista Soviética da Rússia, comandada, desimpedidamente, pelos Exércitos Brancos de diversos Estados burgueses-imperialistas, em colaboração até mesmo com os Freikorps da Alemanha :        

 

“Esse dia, em que aqui se reuni o I Congresso dos Conselhos dos Trabalhadores e Soldados, possui significado histórico.

A primeira tarefa do Congresso é a de proteger a revolução, derrotando a contra-revolução. ...

Momentaneamente, não temos, na Alemanha, uma República Socialista, mas sim uma República Capitalista.

A República Socialista deve ser instaurada apenas pelo proletariado, mediante a luta contra o Governo atual que se tornou o portador do capitalismo.

Exigimos do Congresso que ele tome em suas mãos o inteiro poder político, visando à implementação do socialismo, não transferindo seu poder a uma Assembléia Nacional, que não representaria o órgão da revolução.

Exigimos do Congresso dos Conselhos que ele estenda a mão aos nossos irmãos russos, conclamando os delegados da Rússia a aqui comparecerem.

Queremos a Revolução Mundial e a unificação dos proletários de todos os países, consagrada entre Conselhos de Trabalhadores e Soldados.”[5]

 

 

   

Eis a orientação política, brilhantemente sintetizada e energicamente defendida, em discurso público, por Karl Liebknecht, perante as massas berlinenses que se acotovelavam nas ruas da cidade, no dia 16 de Dezembro de 1918, data da abertura dos trabalhos do I Congresso dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha, a partir da Sacada do Edifício da Assembléia Estadual, em face da disjuntiva que postulámos como sub-título da presente investigação : Assembléia Nacional  Constituinte, apoiada em órgãos de poder proletário, rumo ao Socialismo Democrático ou órgãos de poder proletário, na construção da Ditadura Revolucionária Democrático-Proletária, visando à instituição de uma sociedade socialista, sem classes e sem Estado.    

Acerca do significado efetivamente social-colaboracionista da consigna de Assembléia Nacional Constituinte, sustentada sobre órgãos de poder proletário, Karl Liebknecht ainda teve oportunidade de ressaltar, em 15 de janeiro de 1919, no último dia de vida de suas espetaculares lutas proletário-marxistas[6], já inteiramente acificado por sua sólida e brilhante defesa dos mais legítimos interesses do proletariado mundial, em sua luta inconciliável pela derrubada violenta da exploração e da dominação burguesa-imperialista, em prol da tomada militarmente orquestrada de todo o poder de Estado em mãos proletárias :

 

 

 

“ « Ataque geral contra Spartakus ! Abaixo os spartakistas ! », uivam através dos becos. « Agarrem, torturem, apunhalem, transpassem, atropelem, fritem os spartakistas na gordura !»

Horrores estão sendo perpetrados que obscurecem aquelas barbaridades belgas, empreendidas pelas tropas alemãs.

«Spartakus está derrotado », clamam, com júbilo, do prédio dos Correios até o do “Vorwärts (Avante) (obs.: prédio esse o do órgão jornalístico da Social-Democracia Alemã (SPD)” .

« Spartakus está derrotado » !

E os sabres, e os revólveres e as carabinas da velha polícia germânica, reconstituída, juntamente com o desarmamento dos trabalhadores revolucionários, selarão sua derrota. « Spartakus está derrotado » !

Sob as baionetas do Coronel Reinhard, sob as metralhadoras e canhões do General Lüttwitz, devem ser realizadas as eleições da Assembléia Nacional – um plebiscito para o Napoleão Ebert. « Spartakus está derrotado » !

Sim, Senhor ! Os trabalhadores revolucionários de Berlim foram batidos !

Sim, Senhor ! Massacrados às centenas como bestas !

Sim, Senhor ! Lançados no cárcere, estão várias centenas de seus mais fiéis !

Sim Senhor ! Foram batidos.

Posto que foram abandonados pelos marinheiros, pelos soldados, pelas tropas de segurança, pelas guardas populares, com cujo auxílio eles haviam contado firmemente.

E suas forças foram paralisadas, mediante a irresolução e a fraqueza de sua direção.

E a monstruosa torrente de lama contra-revolucionária das partes atrasadas da população e das classes possuidoras dragaram-nos.

Sim, Senhor, foram batidos. E havia de ser um mandamento histórico que fossem batidos. Pois, o tempo ainda não estava maduro.

E, sem embargo – a luta foi inevitável.

Pois, entregar, sem combate, a Central de Polícia, esse palácio da revolução, a Eugen Ernst e a Hirsch, seria uma derrota degradante.

A luta estava imposta ao proletariado pelos bandos de Ebert e, de modo elementar, o proletariado gritou a partir das massas de Berlim – superando todas as dúvidas e ponderações.

Sim, Senhor ! Os trabalhadores revolucionários de Berlim foram batidos.

E os Ebert-Scheidemann-Noske venceram.

Venceram, pois o generalato, a burocracia, os latifundiários, de pele e osso, os padres e os sacos de dinheiro e tudo que é atrasado, limitado, sectário, estava do lados deles. E venceram com tiros, bombas de gás e morteiros.

Porém, há derrotas que são vitórias. E há vitórias que são mais implacáveis que as derrotas. Os vencidos da semana sangrenta de janeiro impuseram-se gloriosamente. Eles disputaram por grandes coisas : pela linha mais preciosa da humanidade sofredora, pela redenção espiritual e material das massas famintas, derramaram seu sangue sagrado que, desse modo, foi santificado.

E das gotas desse sangue, dessas sementes de dragão para as vitórias de hoje, ressurgirão as vinganças dos caídos, de cada fibra dilacerada, novos lutadores da elevada causa que é eterna e imperecível, tal como o firmamento.

Os derrotados de hoje serão os vencedores de amanhã ...

Ainda não está encerrado o caminho de Gólgata da classe trabalhadora alemã, porém o dia da emancipação aproxima-se. O dia do Tribunal dos Ebert-Scheidemann-Noske e dos poderosos capitalistas, os quais ainda hoje escondem-se atrás daqueles. As ondas dos acontecimentos batem na altura dos céus : estamos acostumados  a ser lançados da cumeeira ao abismo.

Porém, nosso navio segue seu curso direto, firme  e orgulhoso, rumo ao seu objetivo. E se ainda, então, vamos viver quando isso for alcançado ? 

Vivamos nosso programa !  Ele dominará o mundo da humanidade emancipada.

Apesar de tudo !”[7]

 

 

 

Sem embargo, na grandiosa história de luta em prol do socialismo sobre o solo da Alemanha, esse lendário e relevantíssimo congresso proletário que insinuava irromper suas portas à instauração de uma República Socialista, fundada pelos trabalhadores e soldados revolucionários, tomando todo poder político em suas mãos, não transferindo nenhum átomo de suas atribuições jurídico-políticas a uma Assembléia Nacional Constituinte, deflagrando, pelo contrário, uma luta encarniçada contra o Governo Provisório de Coalizão, formado no quadro de negociações eminentemente burocráticas e ilegítimas travadas entre o Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD), representado por Ebert, Scheidemann e Landsberg, e pelo Partido Social-Democrático Independente da Alemanha (USPD), encabeçado por Kautsky, Haase e Bernstein, esse congresso de trabalhadores e soldados haveria de avalizar precisamente a fórmula antagônica às posições defendidas aguçadamente pelo mais intrépido e ousado dirigente revolucionário-marxista do proletariado alemão desses dias : por 400 votos a 50, a posição favorável à convocação imediata de eleições para uma Assembléia Nacional Constituinte, a realizar-se em 19 de janeiro de 1919, bem como por 344 votos a 98, a rejeição categórica da convocação imediata de um novo Congresso dos Conselhos.[8]

 

 

 

“Art. 165. Os trabalhadores e empregados devem atuar, em comunidade com os empresários, e com igualdade de Direitos, na regulação das condições salariais e de trabalho, bem como no desenvolvimento econômico conjunto das forças produtivas.

As organizações de ambos os lados e seus acordos serão reconhecidos para a implementação de seus interesses sociais e econômicos, os trabalhadores e empregados manterão representações legais nos Conselhos de Trabalhadores de Fábrica, bem como em Conselhos Distritais de Trabalhadores de Fábrica, organizados segundo o domínio da economia, e em um Conselho de Trabalhadores do Império.

Os Conselhos de Trabalhadores Distritais e o Conselho de Trabalhadores do Império intervêm visando ao cumprimento das atividades econômicas conjuntas e à atuação na execução das Leis de Socialização, conjuntamente com as representações dos empresários e demais círculos populares participantes, em Conselhos Econômicos Distritais e em um Conselho Econômico Imperial.

Os Conselhos Econômicos Distritais e o Conselho Econômico Imperial devem ser conformados de modo que todos os grupos profissionais importantes sejam neles respectivamente representados, em seu significado econômico e social.

Os projetos de lei político-sociais e econômicos de significado fundamental devem ser apresentados pelo Governo do Império, antes de sua introdução, ao Conselho Econômico do Império para parecer.

O Conselho Econômico do Império tem o Direito de requerer, ele mesmo, tais projetos de lei.

Caso o Governo Federal não lhes autorize, deve, apesar disso, apresentar tais projetos ao Parlamento do Império, com a exposição de seu ponto de vista.

O Conselho Econômico do Império pode mandar representar o projeto mediante um de seus membros, diante do Parlamento do Império. Podem ser transferidos aos Conselhos de Trabalhadores e da Economia atribuições de controle e de administração, nos domínios que lhe forem repassados.

Regular a construção e as tarefas dos Conselhos de Trabalhadores e da Economia, bem como sua relação para com outras corporações sociais auto-administrativas, é matéria que pertence exclusivamente ao Império.”

 

“Art. 181. O povo alemão resolveu e decidiu essa Constituição através da Assembléia Nacional.

Ela entra em vigor no dia de sua promulgação.”[9]

 

 

 

Eis aí, nesses dois artigos normativos da Constituiçao de Weimar, promulgada, a seguir, no dia 11 de agosto de 1919 – há praticamente oito meses depois do discurso público de Karl Liebknecht retro-referido -, até onde pôde chegar a expressão mais elevada do mais disforme mostrengo político, produto do mais desbragado conciliacionismo de poderes de classes, protagonizado pelos frente-populistas, dualistas-colaboracionistas, que a história contemporânea de todo o mundo teve a oportunidade de conhecer.

Esse prodígio resultante da defesa preambular de uma orientação política de Assembléia Nacional Constituinte, livre e soberana, escorada sobre e legitimada por órgãos de luta de massas, tais como conselhos (verbi gratia : assembléias) de trabalhadores e soldados piqueteiros, fortalecidos através de greves gerais e de massas, encontra-se plasmado, no documento constitucional acima citado, mediante a força vinculante de normas jurídico-positivas consagradoras de um suposto “Socialismo Democrático”, edificado após o fim da I Guerra Imperialista Mundial, no quadro da República de Weimar, por obra e arte da Social-Democracia Alemã (SPD), dirigida, então, por Friedrich Ebert e Philipp Scheidemann, em conluio com seus mais legítimos aliados políticos, entre os quais se descataram Karl Kautsky, Rudolf Hilferding e Eduard Bernstein.

Da investigação desse tema histórico-político, dedicar-nos-emos, mais adiante, no curso do presente estudo. 

Entretanto, cumpre assinalar, desde logo, à guisa de introdução, que os fenômenos históricos, avançando tal como uma espiral cronológica, não dogmaticamente delineada, de antemão, por seus diversos protagonistas sociais e políticos, reproduzem, reiteradamente, também outros Quasímodos democrático-socialistas, outros atentados teóricos, políticos e históricos perpetrados contra a longa e encarniçada, acirrada e sangrenta, luta de libertação do proletariado explorado e de seus aliados socialmente oprimidos.

Foi, assim, que Antonio Gramsci, ao colocar de cabeça para baixo a concepção dialético-materialista de Marx e Engels, Lênin e Trotsky, em seus fundamentos mais essenciais, desfigurou-a, distorceu-a, deturpou-a, deformou-a, do modo mais completo e radical, sobretudo por menosprezar e renegar, desde seu prisma de análise idealista-subjetivista, a importância decisiva e cardeal da imprescindibilidade da violência revolucionária do proletariado hegemônico em sua missão histórica de despedaçar o Estado Burguês e edificar a Ditadura Revolucionária do Proletariado, incorporadora da mais ampla e historicamente superior Democracia Proletária.[10]

 

 

 

Já tivemos a oportunidade de assinalar, alhures, que a concepção de hegemonia do proletariado de Gramsci encontrou sua mais eminente consagração nas Teses de Lyon do Partido Comunista Italiano(PCI), redigidas em janeiro de 1926, enquanto produto da obra intelectual conjunta de Antonio Gramsci e Palmiro Togliatti (Ercoli).

Tais teses nada mais fizeram senão ratificar a validade da famosa palavra de ordem anti-monárquica, de natureza supostamente democrático-intermediária, que já ordenava toda a intervenção do PCI, desde o assassinato do deputado socialista Giacomo Matteotti, em 1924 : Assembléia Republicana Constituinte, apoiada nos Comitês de Operários e Camponeses ou, por assim dizer, em Assembléias Operárias e Camponesas.

Gramsci e Togliatti alegaram, à época, conceber esses comitês operários e camponeses como instrumentos de mobilização das massas e embriões de sovietes em face da ditatura fascista de Benito Mussolini.[11]

 

 

 

Extraordinariamente atento ao tema, Trotsky teve a oportunidade de assinalar, entretanto, já mesmo em novembro de 1929 :

 

“No que concerne à direção oficial do Partido Italiano, não tive a oportunidade de observá-la senão a partir do Executivo da Internacional, na pessoa de Ercoli (i.e. Palmiro Togliatti).

Dotado de uma espírito de adaptação e de um bom palavreado, Ercoli é adequado (não se poderia dizer melhor) para os discursos de um procurador ou de um advogado, acerca de um tema de encomenda e, de modo geral, para executar ordens. ...

A propósito, não é Ercoli que tenta adaptar à Itália a idéia de “ditadura democrática do proletariado e dos camponeses”, sob a forma de uma palavra de ordem de assembléia constituinte, apoiada sobre uma assembléia operária e camponesa.

Nas questões acerca da URSS, da Revolução Chinesa, da Greve Geral da Inglaterra, da Revolução da Polônia e da luta contra o fascismo italiano, Ercoli, como também outros dirigentes de formação burocrática, adota, inevitavelmente, uma posição oportunista para, depois, eventualmente, a seguir, retificá-la, mediante aventuras de ultra-esquerda.

Parece que, atualmente, trata-se precisamente da estação do ano dessas aventuras.” [12]

 

 

 

 

Em maio de 1930, regressando ao mesmo tema, Trotsky, então, observou, incisivamente, fornecendo um ensinamento histórico inolvidável para as futuras gerações de marxistas-revolucionários :

 

A Assembléia Republicana constitui, inegavelmente, um organismo do Estado Burguês.

O que são, pelo contrário, os Comitês Operários e Camponeses ?

É evidente que, de alguma forma, são um equivalente dos Sovietes de Operários e Camponeses. ...

Como é possível, nessas condições, que uma assembléia republicana – órgão supremo do Estado Burguês – tenha como base organismos do Estado Proletário.[13]

 

 

 

 

Nesse mesmo sentido, é igualmente indispensável ter-se sempre presente, a forma segundo a qual Lênin sintetizou sua concepção acerca da problemática da consigna de Assembléia Nacional Constituinte, quando se a pretende unificar, fundar, apoiar em órgãos de poder proletário, tal como exsurge das Teses e Exposição acerca da Democracia Burguesa e a Ditadura do Proletariado, de 4 de março de 1919 :

 

“A mais completa bancarrota dos socialistas que se reuniram em Berna (obs.: Lênin refere-se aqui aos socialistas da Internacional Amarela, Kautsky, Hilferding, Martov, Longuet, Turati, Branting etc.), sua mais completa incompreensão para a nova, i.e. para a Democracia Proletária, pode ser atestada no seguinte :

Em 10 de fevereiro de 1919, Branting declarou encerrada a Conferência Internacional da Internacional Amarela, em Berna.

Em 11 de fevereiro de 1919, seus participantes publicaram, em Berlim, no jornal “A Liberdade” um apelo do Partido dos “Independentes” ao proletariado.

Nesse apelo aceita-se o caráter burguês do governo Scheidemann, acusa-se-o de querer eliminar os Conselhos (Räte), que são chamados de portadores e guardiães (Träger und Schützer) da revolução, e formula-se a proposta de legalizar os Conselhos (Räte), conferindo-se-lhes Direitos de Estado, dando-se-lhes o Direito de Impugnação contra as decisões da Assembléia Nacional, com o efeito de ter de decidir um plebiscito nacional.

Uma tal proposta desmascara a total falência ideológica dos teóricos que defendem a democracia e não entenderam seu caráter burguês.

A tentativa ridícula de unificar o Sistema dos Conselhos, i.e. a Ditadura do Proletariado, com a Assembléia Nacional, i.e. a Ditadura da Burguesia, desvenda, definitivamente, às forças incessantemente crescentes da nova Democracia Proletária, tanto a pobreza de espírito dos Socialistas Amarelos e dos Sociais-Democrátas e sua essência politicamente reacionário-pequeno-burguesa quanto suas concessões medrosas(p. 479)...

Nos primeiros oito meses da Revolução Russa foi por demais discutida a questão da organização dos Sovietes.

Para os trabalhadores não estava claro no que consistiria o novo sistema e se seria possível fazer dos Conselhos um aparelho de Estado.

Procedemos em nossa revolução de modo prático e não teórico.

A questão da Constituinte, p.ex., não a havíamos colocado, teoricamente, antes.

Não havíamos dito que não reconhecíamos a Assembléia Constituinte.

Apenas depois, i.e. depois de que as organizações soviéticas se espalharam por todo o país e conquistaram o poder político, apenas então ocupamo-nos de desbaratar a Constituinte(p. 486).[14]

 

 

 

 

Na cadeia dos mais contraditórios portentos histórico-políticos, está cumprindo, porém, ao Partido Obrero (PO), encabeçado por Jorge Altamira, Pablo Rieznik  e Osvaldo Coggiola – esse último o corifeu trotskysta-gramsciano da América Latina - e aos seus aliados universalmente democráticos do PTS, do MAS, do MTS, da CS e seus seguidores[15], protagonizarem a atualização temporal consistente em tentar adaptar à Argentina dos Cacerolazos, nos primeiros anos da alvorada do século XXI, em meio à tempestade de um imenso “Argentinazo”, a concepção social-colaboracionista e idealista-gramsciana de defender – como forma de contemporização de poderes antagônicos de classes sociais – a instituição de uma Assembléia Constituinte, apoiada sobre Assembléias Nacionais Piqueteiras e Populares, enquanto órgãos de luta de massa e da greve geral.

Nesse sentido, Jorge Altamira dirigiu-se ao Presidente da Legislatura Burguesa de Buenos Aires clamando ingentemente pelo seguinte :

 

“Una Asamblea Popular Constituyente, que exprese a la voluntad soberana del pueblo y, en esa medida, se convierta en el ámbito apropiado para discutir y resolver los problemas que interesan a la población trabajadora y comience a reorganizar integralmente a la Ciudad sobre nuevas bases sociales.”[16]

 

 

 

 

Para isso, declarou expressamente Altamira :

 

La Legislatura tiene la oportunidad de encabezar este proceso político de renovación.

Si fuera capaz de dar ese paso *aún tardíamente por relación a la vorágine con que se están precipitando los acontecimientos* tendría reservado un lugar en la historia.

De lo contrario, como ha pasado con otras instituciones anacrónicas, será presa de esos acontecimientos y será devorada por los mismos.”[17]

 

 

 

 

E, conclusivamente, em seu Proyecto de Ley, apresentado à Legislatura Burguesa de Buenos Aires, submeteu Altamira à aprovação dessa última os seguintes artigos de lei, referentes à convocação por ela mesma, no prazo de 45 dias, de uma Assembléia Constituinte, sendo que, até o advento dessa convacação, Altamira reivindicou a formação de um “governo colegiado, integrado por representantes de todos os blocos parlamentares da ex-legislatura da cidade”, i.e. a formação de mais um organismo inequivocamente burguês, um governo burguês provisório de frente-popular :    

 

“PROYECTO DE LEY

 

Articulo 1º. Se convoca a una Asamblea Constituyente en el ámbito de la Ciudad de Buenos Aires en un plazo máximo de 45 días. Esta Asamblea asumirá el gobierno general de la Ciudad, sustituyendo a los actuales poderes Ejecutivo y Legislativo.

 

Articulo 2º. Hasta la asunción de la Asamblea Constituyente, se constituye un gobierno colegiado integrado por representantes de todos los bloques parlamentarios de la ex Legislatura de la Ciudad, en sustitución del poder Ejecutivo y de la Legislatura de la Ciudad de Buenos Aires.

 

Artículo 3º. Comuníquese.”[18]

 

Desse modo, o Partido Obrero (PO) julgou acertado empreender, além de tudo, uma grande inovação histórica, situada no campo da mais extrema deformação da tradição marxista-revolucionária : a secularmente conhecida e típica consigna de conciliação dos paradoxos dialéticos em destaque, reivindicadora de um status supostamente democrático-intermediário transicional, haveria de ser postulada e defendida, ostensivamente, mesmo em um contexto de luta dirigido para a derrubada não de uma ordem monárquico-imperial ou manifestamente fascista, mas sim de um regime democrático-burguês.

A inovação estrambótica da orientação dualista-contemporizadora em tela reinvidica constituir-se, portanto, em patrimônio original e intransferível do Partido Obrero (PO), no marco de sua revisão do marxismo-revolucionário, desde a perspectiva das lentes dos óculos do social-conciliacionismo dos organismos de poder das classes sociais antagônicas, no sentido mais próprio do gramscismo subjetivista.

O percurso que “elevou” Jorge Altamira ao “trotskysmo gramscista” já procuramos desvendar aos leitores em outra sede, há algum tempo atrás, e tal fenômeno extraordinário de manifesta involução ideológica – a despeito de possuir sua profunda importância para o atual processo revolucionário em curso na Argentina – não será, porém, objeto central da presente investigação.[19]   

 

 

 

Assinale-se, apenas, que, tanto em sua intervenção oral no II Fórum Social Mundial de Porto Alegre, como nas mais diversas publicações jornalísticas das “Tapas de Prensa Obrera”, surgidas já segundo a temperatura do levante das massas argentinas de dezembro de 2001, exprimiu-se, fática e documentalmente, o Partido Obrero (PO) defendendo, ostensivamente, a malsinada orientação político-estratégica dualista-contemporizadora, social-colaboracionista, acima referida, consistente em tentar conciliar as atividades de um órgão supremo de um Estado Burguês com organismos revolucionários marcadamente proletários :

 

     “Que se vayan todos”, ya es consigna nacional.

     Por una Asamblea Constituyente libre y soberana.

     Por el desarrollo de las Asambleas nacionales piqueteras y populares,

     como órganos de una lucha de masa y de la huelga general.”[20] 

 

 

 

 

Eis o que clama, perante os sete céus, a mais nova edição de Prensa Obrera, de 28 de fevereiro de 2002.

No editoral do mesmo periódico, o artigo Qué debaten las assembleas populares exprime-se, ainda mais detalhadamente, acerca da questão, ao desvendar a atual estratégia estaferma, “trotskysta –gramsciana” ébria, do Partido Obrero (PO)  :

 

“Asamblea Constituyente

 

La Asamblea Interbarrial aprobó por unanimidad la consigna de Asamblea Constituyente. A partir de ese momento el debate sobre el alcance de esta consigna está lejos de cerrarse.

La consigna de Asamblea Constituyente permite plantear el problema del poder y la

lucha por el poder en las condiciones concretas de la presente situación.

Pero, ¿quién convoca a la Asamblea Constituyente?, se preguntan en las asambleas.

La respuesta es muy sencilla: la convocatoria estará en manos de quien luche por ella.

Es decir que si las asambleas populares luchan por la Constituyente y derriban a los gobiernos capitalistas incapaces de realizarla, van a ser ellas las que tengan la misión de convocarla.

Luchando por la Constituyente lo que equivale, insistimos, a la única forma de luchar por el poder en las actuales condiciones, las propias asambleas populares o piqueteras se convierten en una herramienta de poder de los explotados.

Los que plantean que el poder pase ya a las asambleas populares, sin que tengan que luchar por el poder para la Constituyente, es decir sin acreditar autoridad nacional, organización y fuerza, no hacen más que propagandismo.

La otra inquietud es si algún político o partido enemigo es capaz de convocar a la constituyente. La pregunta expresa el interés por evitar una expropiación del movimiento popular.

Pero la Asamblea Constituyente soberana plantea el derrocamiento del actual gobierno, en primer lugar, y debe abarcar a todos los poderes del estado nacional, provincial y municipal.

Los políticos patronales no hablan de Constituyente soberana, porque lo que quieren evitar es precisamente el derrocamiento del régimen.”[21]

 

 

 

 

Portanto : a Assembléia Inter-Bairros, por força e impulso do Partido Obrero e seus aliados universalmente democráticos, veio a ser chamada a dar sustentação e legitimar – sendo que, de fato, já teria até mesmo aprovado – a falaciosa consigna de convocação de uma futura, e ainda precisamente imponderável, Assembléia Constituinte, livre e soberana, organismo jurídico supremo de um Estado Burguês, cujo funcionamento resultaria, desde logo, reconhecido e sacramentado pelos órgãos de luta de massa e de greve geral, “si las asambleas populares luchan por la Constituyente y derriban a los gobiernos capitalistas incapaces de realizarla,  ... si algún político o partido enemigo es capaz de convocar a la constituyente ...  

A Assembléia Inter-Bairros teria decido, assim, mediante esse ato jurídico-político, tranferir a uma futura Assembléia Constituinte, livre e soberana poderes e atribuições legislativas essencias que, originariamente, repousam em suas próprias mãos.

Acerca da natureza da Asamblea Interbarrial, escreveu, além disso, o MST – UIT en Izquierda Unida, até mesmo da seguinte forma :

 

“A partir de diciembre, con los cacerolazos, en muchos barrios de la ciudad se organizaron asambleas.

La gente quiere participar y decidir por sí misma.

Fue surgiendo la necesidad de coordinar con las otras asambleas para fortalecer la pelea porque los reclamos centrales son los mismos.

No sólo el corralito, sino los problemas de fondo del país : el plan económico, qué gobierno hace falta ...

Así empezó a crecer esta Asamblea Inter-barrial, que es una experiencia totalmente nueva de organización popular para la lucha.

Las que deciden son las asambleas de cada barrio.

Participan pequeños comerciantes, estudiantes, jubilados y trabajadores.

En la última se sumaron los delegados del Hospital Italiano.

La Interbarrial funciona como un ámbito de coordinación, porque los vecinos quieren debatir propuestas y también resolver acciones concretas.

Nadie quiere imposiciones.

La participación es abierta, pero hablan los representantes de cada barrio trayendo las propuestas.

Los 70 que nos anotamos hoy representamos cada uno a una asamblea barrial.

Por razones de tiempo hablamos 25 y después se pasó a votar.”[22] 

 

 

 

 

Cumpre, pois, indagar : o Partido Obrero (PO) e seus aliados político-estratégicos, em seu empenho de lutar, em meio aos Piquetes y Cacerolas, por uma Assembléia Constituinte, que esteja fundada no desenvolvimento das Assembléias Nacionais Piqueteiras e Populares, enquanto órgãos de luta de massa e da greve geral adotam, defendem e operam com que versão de conquista da hegemonia do proletariado : a versão dialético-materialista, desenvolvida por Lênin e devidamente concebida por Trotsky, ou a versão idealista-subjetivista, equacionada por Gramsci, destinada à promoção de um específico social-conciliacionismo de classes, como forma de capitulação diante dos Estados Burgueses ?

Estaria o Partido Obrero (PO) e seus aliados político-estratégicos penetrados da concepção irrevogavelmente subjetivista-idealista de que o desate da luta impiedosa travada entre classes dialeticamente antagônicas poderia conduzir a um termo de conciliação dos opostos materiais, emergindo da história, no quadro da revolta das massas exploradas e oprimidas, a possibilidade de um equacionamento de vertentes contraditórias, mediante o surgimento de uma síntese contemporizadora entre o velho e o novo : a racionalidade retórico-parlamentar vinculante, extraída da positividade jurídico-estatal de uma Assembléia Constituinte, tendo na sua base o desenvolvimento dos órgãos de luta de massa e de greve geral ?      

Por força da convocação efetiva de uma Assembléia Constituinte, livre e soberana, assentada sobre esses órgãos de luta de massa e de greve geral e incumbida de estabelecer uma nova Carta Magna Jurídico-Constitucional da Argentina, tornar-se-ia a impulsão da inevitável e inadiável Revolução Proletária Latino-Americana e Mundial extraordinariamente mais dificultosa ou substancialmente mais simplificada?

 

Essa convocação fortaleceria ou não a concepção jurídico-constitucional, ilusória e fantasiosa, de que apenas um Parlamento Constituinte, livremente eleito e soberano, legitimado junto às Assembléias Nacionais Piqueteiras e Populares, estaria efetivamente autorizado a operar intervenções estatais, severas e implacáveis, nas relações sócio-econômico-privadas do modo de produção capitalista remundializado ?

Eis algumas questões para cuja análise o presente estudo teórico-doutrinário pretende, de algum modo – ainda que limitada e escassamente – contribuir, ao ter em conta aquela formulação apresentada por Alícia Sagra, contida em seu artigo intitulado ¿ Salida Democrática o Salida Obrera ? :

 

“Un logro del proceso revolucionario es haber hecho reflexionar a las organizaciones de izquierda que están dando pasos para superar la dispersión existente.

Se ha formado una Mesa de la Izquierda, de donde surgieron declaraciones y acciones conjuntas.

Esa nueva realidad permitió que participásemos como bloque de los enfrentamientos del 20 de diciembre y que enfrentáramos unitariamente a la patota de Duhalde el 1 de enero.... 

Si leemos las declaraciones comunes, aparentemente no habría diferencias en ese aspecto, ya que hablamos de «salida obrera y popular », «gobierno de los trabajadores », «plan obrero alternativo », llamamos a construir coordinadoras, asambleas populares, etc.

Pero si vamos a la prensa y al accionar cotidiano de los partidos vemos que las cosas no son tan así.

Por ejemplo en los periódicos, volantes, pancartas del Partido Obrero, sin ninguna duda la consigna central no es el gobierno de los trabajadores, ni las asembleas populares, sino la Asamblea Constituyente.

Ese es planteo que hacen a los nuevos organismos que están surgiendo.

Y esa política, aunque con diferente intensidad, tambiém está siendo asumida por el MST, Izquieda Unida, y el PST.

Por eso decimos que a nivel de la Izquierda no está claro si la salida central planteada (para ahora, no para un futuro incierto) es obrera o es democrática.”[23]

 

 

CAPÍTULO I.

O PARTIDO SOCIAL-DEMOCRÁTICO DA ALEMANHA (SPD)

NA VIRADA DO SÉCULO XX

E O MARXISMO-REVOLUCIONÁRIO

 

Antes da irrupção da I Guerra Mundial Imperialista, o movimento dos trabalhadores alemães era o mais poderoso do mundo e servia de paradigma para muito partidos socialistas.

No último congresso do Partido Social-Democrático da Alemanha(SPD), realizado na cidade de Jena, em 1913, nas vésperas da deflagração da conflagração bélica de 1914, esse partido contava com cerca de 1 milhão de membros, 90 jornais diários e conformava, com seus 4 milhões e 250 mil votos obtidos em eleições parlamentares, o maior partido alemão de todos os tempos.

110 deputados federais, 220 deputados estaduais e 2.886 vereadores representavam o partido da Social-Democracia Alemã no parlamento do país.

Os sindicatos associados livremente à Social-Democracia Alemã incorporavam cerca de 2,5 milhões de trabalhadores e possuíam, sob seu controle, um patrimônio de cerca de 88 milhões de marcos alemães[24].

Com seu crescimento, o Partido Social-Democrático da Alemanha(SPD) havia, entretanto, deformado-se profundamente, sem que isso se tornasse manifestamente visível e compreensível, à primeira vista, para muitos analíticos políticos.

Com efeito, para o público externo em geral, a Social-Democracia Alemã, herdeira legítima das tradições revolucionárias de Marx e Engels, seguia representando um partido autenticamente socialista-revolucionário radical[25].

Nada obstante, tal organismo político havia-se transformado, efetivamente, em seu interior, em um partido essencialmente social-reformista e centrista-oportunista que, apoiando-se sobre o proletariado alemão e falando em seu nome, secundarizava o objetivo de luta revolucionária pelo socialismo em relação à perspectiva de movimentos em favor da obtenção de reinvidicações sócio-econômicas imediatas, mediante negociações sindicais e intervenções políticas junto aos parlamentos.

Os principais dirigentes da Social-Democracia Alemã promoviam, além disso, a cada nova oportunidade que surgia, a mais integral deformação oportunista das premissas estratégicas mais fundamentais do marxismo-revolucionário, com principal destaque para a questão do levante armado da classe trabalhadora, visando à implosão do Estado Burguês, a imprescindibilidade de instauração da Ditadura Revolucionária do Proletariado, incorporadora da mais ampla e historicamente superior Democracia Proletária, bem como a necessária compreensão do fenômeno da violência revolucionária para a derrubada da burguesia, enquanto fenômenos de transição inevitáveis para o atingimento da sociedade socialista.

Já mesmo no Projeto do Programa de Coalizão de Gotha, de 1875, a Social-Democracia Alemã, rumando para a fusão dos Eisenachianos e Lassalleanos, não reivindicou absolutamente, em seu “Congresso do Compromisso de Gotha”, ocorrido entre os dias 22 e 27 de maio de 1875, a consigna programática da Ditadura Revolucionária do Proletariado, bem como a indispensabilidade de destruição armada do aparelho de Estado Burguês pelo proletariado – apesar da experiência da Comuna de Paris - , mas sim a edificação de um Estado Popular Livre, a ser introduzido em substituição do então existente Estado Prussiano, assentado sobre a dominação de classe burguesa-capitalista e latifundista[26].

Cumpre assinalar, porém, que a elaboraçao esse Projeto do Programa de Coalizão de Gotha, de 1875 foi em grande parte, inspirada intelectualmente pelos lassalleanos Johann Baptist von Schweitzer e Wilhelm Hasselmann, sustentada enfaticamente por Eduard Bernstein[27], admitida politicamente, apesar de leves e inofensivas críticas, por August Bebel e Wilhelm Liebknecht – e rechaçada aguda e intrepidamente por Marx e Engels[28].

Em verdade, cumprira a Wilhelm Liebknecht iniciar, sem o conhecimento expresso de Marx e Engels, contatos com o dirigente lassalleano, Wilhelm Hasselmann, representante da Allgemeine Deutsche Arbeiterverein (Associaçao Geral dos Trabalhadores Alemaes), de modo a permitir a elaboraçao do Projeto do Programa de Coalizão de Gotha, de 1875, expressao apodrecida de um amontoado de frases intrincadamente oportunistas e pensamentos extremamente inconsistentes, empurrados solertemente para o interior do movimento dos trabalhadores alemaes.

Em sua renomadíssima carta a August Bebel, redigida entre 18 e 28 de março de 1875, Friedrich Engels teve oportunidade de escrever nitida e irrefutavelmente acerca do tema:

 

“O Estado Popular Livre transformou-se em Estado Livre.

Considerando-se em sentido gramatical, um Estado Livre é aquele em que o Estado é livre em face de seus cidadãos, i.e. um Estado com governo despótico.

Dever-se-ia abandonar todo o palavreado acerca do Estado, particularmente desde a Comuna que, em sentido próprio, já não era mais nenhum Estado.

O Estado Popular foi-nos atirado na cara, até não se poder mais, pelos anarquistas, ainda que os escritos de Marx contra Proudhon e, posteriormente, o “Manifesto Comunista” digam diretamente que com a introdução da ordem social socialista o Estado dissolve-se por si mesmo e desaparece.

Uma vez que o Estado é, porém, apenas uma instituição transitória da qual se lança mão na luta, na revolução, a fim de reprimir violentamente seus adversários, torna-se puramente absurdo falar-se de um Estado Popular Livre : enquanto o proletariado ainda necessita do Estado, dele necessita não no interesse da liberdade, mas sim para a repressão de seus adversários e, tão logo pode-se falar em liberdade, deixa o Estado de existir enquanto tal.

Por essa razão, proporíamos colocar, em todos os lugares, ao invés de Estado “Gemeinwesen(comunidade)”, uma boa e velha palavra alemã que pode muito bem representar a “Comuna” francesa.”[29]

 

Em uma carta dirigida a Ferdinand Domela Nieuwenhuis, Karl Marx, ainda em 1881, dois anos antes de sua morte, teve a oportunidade de confirmar sua concepção de luta revolucionária do proletariado, no quadro da perspectiva de formação de um Governo Socialista :

 

“Não podemos resolver nenhuma equação que não inclua em seus dados os elementos de sua solução.

Além disso, os embaraços de um Governo surgido repentinamente através de uma vitória popular não são, de nenhuma forma, algo especificamente “socialista”. Pelo contrário.

Os políticos burgueses vitoriosos sentem-se, imediatamente, embaraçados com sua “vitória”, quando o socialista pode intervir, no mínimo, desembaraçadamente.

Em uma coisa, você pode acreditar :

um Governo Socialista não assume o timão de um país sem situações tão desenvolvidas em que possa tomar sobretudo as medidas necessárias para intimidar (no original alemão : ins Bockhorn jagen, i.e. lançar no corno do bode) a tal ponto a massa da burguesia que o primeiro desideratum(i.e. objetivo) seja conquistado : tempo para uma ação cerrada.

Você me remeterá talvez para a Comuna de Paris.

Porém, independentemente do fato de que isso se tratou meramente de uma sublevação de uma cidade, em condições excepcionais, a maioria da Comuna não era, de nenhuma forma, socialista e nem podia sê-lo.

Com uma mínima quantidade de common sense(i.e. de senso comum), ela teria, entretanto, podido alcançar um útil compromisso para toda a massa popular – atingível apenas outrora.

Tão somente a apropriação do Banque de France teria colocado, com terror, um fim à arrogância de Versalhes etc. Etc. ...

A visão científica da desagregação inevitável da ordem social dominante, sempre em processamento diante de nossos olhos, as massas cada vez mais flageladas com sofrimentos pelos velhos fantasmas de governo, o concomitante desenvolvimento positivo, gigantescamente progressivo, dos meios de produção – isso tudo já basta como garantia para que, no momento da irrupção de uma revolução realmente proletária, sejam dadas também as condições de seu modus operandi(i.e. modo de agir) direto, próximo – ainda que seguramente não idílico.”[30]

 

Wilhelm Liebknecht logrou, porém, empreender, durante anos, diversas manobras políticas, visando a impedir que Friedrich Engels desse, manifesta e sistematicamente, publicidade às suas críticas e às de Marx contra o  Programa de Coalizão de Gotha, de 1875.

Tão somente no início dos anos 90, Engels, opondo-se, entao, abertamente, às resistências de Wilhelm Liebknecht e de seus aliados mais estreitos, logrou, finalmente, organizar a publicaçao da Crítica ao Programa de Gotha, a qual surgiu estampada no Nr. 18, Volume I, do “Die Neue Zeit(O Novo Tempo)”, dos anos de 1890 e 1891.

Em uma carta dirigida a F. A. Sorge, Friedrich Engels pronunciou-se, entao, da seguinte forma, contra as reaçoes de desapontamento de Wilhelm Liebknecht e de seus colaboradores lassalleanos, entre eles, especialmente Wilhelm Hasselmann :

 

Liebknecht está, naturalmente, furioso, posto que toda a crítica foi cunhada, especialmente, contra ele.

Ele é o pai que, juntamente com o veado pederasta do Hasselmann (no original : Arschficker Hasselmann, i.e. o Hasselmann, comedor de cú), pariu esse programa podre ...”[31]  

 

De toda sorte, cumpre ainda recordar, retrospectivamente, que o período da luta de classes travada na Alemanha que se estendeu de 1878 a 1890 foi marcado, enfática e decididamente, pela vigência da Lei Contra os Socialistas, em cujo contexto colocou-se à prova as convicções e as intervenções autenticamente revolucionárias dos militantes da Social-Democracia Alemã.

A Lei Contra os Socialistas, planejada pelo “Chanceler de Ferro”, Otto von Bismarck, surgiu, oportunisticamente, enquanto resposta repressiva ao segundo atentado fracassado contra a vida do Imperador Wilhelm I, empresa essa por ele atribuída à conta dos militantes da Social-Democracia Alemã, ainda que não subsistisse qualquer prova judiciariamente cabal nesse sentido.

Com efeito, em 11 de maio de 1878, um homem chamado Emil Max Hödel disparou, pela primeira vez, um velho revólver contra o Imperador Alemão, Wilhelm I sem lograr atingí-lo e – tal como pôde-se atestar, indubitavelmente, a partir da constituição da arma o caráter e as declarações do homem desclassificado – sem a séria intenção de promover um atentado.

Apesar disso, sua cabeça caiu por debaixo da guilhotina do verdugo imperial.

Todas as tentativas de fazer de Hödel um social-democrata não surtiram qualquer resultado.

Em 2 de junho de 1878, um tal Dr. Nobiling, sujeito depravado, saído de um círculo pequeno-burguês, disparou, então, com uma espingarda, contra o Imperador Alemão,  que passeava nas ruas, conseguindo ferí-lo.

Também Nobiling não possuia nenhuma ligação com a Social-Democracia.

Porém, já na noite posterior ao atentado, Bismarck, mandou distribuir, através do Bureau Telegráfico de Wolff, um telegrama, com o seguinte conteúdo, portando a marca de “oficial” :

 

« Berlim, 2 hs. Da madrugada. Na audiência judiciária posterior, Nobiling reconheceu que ele rende homenagem às tendências sociais-democráticas, tendo freqüentado, repetidamente, aqui, assembléias socialistas, havendo, desde oito dias, a intenção de assassinar Sua Majestade o Imperador, porque considerava ser frutífero para o Bem-Estar do Estado eliminar o Chefe de Estado.»[32]

 

Com base nesse telegrama, deu-se início à instauração de uma terrível dominação contra o movimento dos trabalhadores alemães.  

A seguir, Bismarck decretou a dissolução do Parlamento Alemão e, dinamizando toda a máquina do aparelho do Estado, oficial e inoficial, composta milhares de policiais e de agentes espiões denunciadores, convocou novas eleições em um clima de totalitarismo ideológico anti-socialista, visando à formação de um novo órgão parlamentar que aprovasse seu projeto de Lei Contra os Socialistas.

Formado nesse contexto de terror de Estado, o novo Parlamento do Império Alemão empreendeu, em 9 de setembro de 1878, a votação do projeto de lei formulado por Otto von Bismarck que clamava pela mais resoluta repressão das aspirações e atividades sociais-democráticas.

Em 21 de outubro do mesmo ano, foi publicada no Diário do Império a Lei Contra os Socialistas.

Em conformidade com o diploma legislativo em tela, o Parlamento do Império Alemão conferiu poderes às autoridades policiais estaduais para :

 

“proibir associações e ligações de todos os tipos, em particular as caixas corporativas, como também impressos, que sirvam às aspirações sociais-democráticas, socialistas ou comunistas, voltadas à subversão da ordem social e estatal existente em uma forma ameaçadora da paz pública e, em particular, da harmonia das classes da população.”[33] 

 

Com a lei em destaque, foram proibidas, igualmente, todas e quaisquer assembléias e editoras de publicações em que se pressupusesse a defesa das tendências políticas em destaque, todo e qualquer recolhimento de fundos e contribuições financeiras destinadas à sutentação de ideais de luta, ao mesmo tempo que todas e quaisquer violações contra os dispositivos da Lei Contra os Socialistas haveriam de ser reprimidas com pesadas punições de restrição de liberdade e de ordem pecuniária, deflagrando-se, assim, uma intensa e odiosa campanha de perseguição contra todos e quaisquer ativistas proletários.

Nesse contexto, a imprensa e as publicações sociais-democráticas – com destaque para os seus três jornais de maior circulação, contando com cerca de 45.000 assinantes – foram imediatamente proibidas.

Segundo o historiador revolucionário alemão Fritz Rück, foram, até 31 de junho de 1879, proibidos, além disso, 317 associações, 5 caixas, 127 jornais e 278 publicações não periódicas[34].  

Em novembro de 1878, foi imposto o estado de sítio, sobre a cidade de Berlim, por ordem de Otto von Bismarck, culminando com o banimento de dezenas e dezenas de militantes sociais-democráticos[35].

Contando-se a partir do ano de 1878, tal estado sítio perdurou, rigorosamente, durante o período dos 12 anos subseqüentes, ao longo dos quais Bismarck procurou, sofrega, porém inutilmente, quebrar a espinha dorsal do movimento revolucionário-socialista alemão.

Esse último fortaleceu-se, ano após ano, de eleição parlamentar em eleição parlamentar, no quadro de um trabalho essencialmente clandestino, criando novas forças, a partir da amarga luta travada contra os órgãos de repressão do “Chanceler de Ferro”, produzindo, além disso, diversas novas formas de resistência contra a exploração do capitalismo industrial e comercial alemão, em face das proibições dos sindicatos operários, do esmagamento dos salários e do prolongamento da jornada de trabalho

Nesse sentido, Fritz Rück assinala, precisamente :

 

“Uma outra estatística demonstra o que a classe dominante da Alemanha alcançou com a Lei Contra os Socialistas.

Ao tempo de sua promulgação, em 1878, o Partido Social-Democrático contava com 437.158 votos e possuia 42 jornais políticos.

As organizações sindicais dirigiam 50.000 membros e 14 órgãos.

No momento da abolição da Lei Contra os Socialistas, em 1890, a Social-Democracia obteve 1.427.298 votos e possuia 60 jornais políticos.

Os sindicatos possuiam 200.000 membros e 41 órgãos.”[36]    

 

Acerca do tema, escreveu Franz Mehring, da seguinte forma :

 

“Porém, tal como a perda, não se pode resumir também o ganho da Lei Contra os Socialistas em alguns números, ainda que tão gloriosos.

Segundo a conhecida lei dialética, a quantidade convertia-se, em certo ponto, em qualidade.

Na luta de 12 anos, o Partido havia-se tornado não apenas maior e mais forte, senão ainda desevolvido-se, em sua realidade essencial, mais ricamente.

Ele havia não apenas lutado e batido, mas também trabalhado e aprendido.

Não apenas fornecido a prova de sua força, senão ainda a prova de seu espírito.

Foram êxitos inestimáveis que não se podiam, de nenhuma maneira, expressar em números, tampouco quanto a consciência da invencibilidade que penetrou o Partido, desde que superou, exitosamente, a guerra, com todos os meios de poder de um grande Estado moderno, ao longo de 12 anos.

As massas foram o protaginista da Idade Heróica do Proletariado.

Nisso precisamente residiu sua própria grandeza e sublimidade.”[37]      

 

Tais ponderados depoimentos de Rück e Mehring acerca da Lei Contra os Socialistas, não pode, entretanto, obscurecer o fato de que, precisamente entre os anos de 1878 a 1890, cristalizou-se a mais integral deformação oportunista das premissas estratégicas mais fundamentais do marxismo-revolucionário no seio da direção da Social-Democracia Alemã, já registradas, anteriormente, por ocasião do Congresso do Compromisso de Gotha, ocorrido entre os dias 22 e 27 de maio de 1875, em cuja oportunidade abriu-se mão da consigna programática da Ditadura Revolucionária do Proletariado e desdenhou-se da concepção relativa à necessidade da destruição armada do aparelho de Estado Burguês pelo proletariado.

A cruzada repressiva de Bismarck, desencadeada em 1878, não encontrou os mais prestigiados dirigentes sociais-democráticos em um espírito de disposição de combate revolucionário e de promoção de imediato trabalho de contra-corrente.

A concepção relativa à necessidade de desenvolver-se um trabalho clandestino, secreto e ilegal foi, de início, inteiramente rejeitado por parte da da direção da Social-Democracia Alemã, então composta por Eisenachianos e Lassalleanos, por August Bebel e Wilhelm Liebknecht, por Johann Baptist von Schweitzer e Wilhelm Hasselmann : clamava-se por desarmar os homens do “Chanceler de Ferro” mediante indulgência.

Esse estado de grande condescendência com as formas mais perversas de degenerescência das orientações de Marx e Engels, foi, à época, denunciado, publicamente, por Wilhelm Bracke, um dos fundadores da corrente marxista dos Eisenachianos, em aberta crítica à direção oportunista de August Bebel e Wilhelm Liebknecht de então :

 

“Nós vaiamos a Lei.

Porém, em 17 de março de 1879, Wilhelm Liebknecht fez um discurso no Parlamento do Império no qual declarou, com base na tática adotada pelos dirigentes do Partido alemão : «o Partido respeitará a Lei Contra os Socialistas, porque é um Partido Reformista, no sentido estrito da palavra, sendo, de modo geral, um absurdo a realização violenta da revolução. »

As vaias de Bracke contra a Lei em tela não significou que o Partido não irá aderir a ela, senão constatou apenas a verdade histórica de que o Partido não se reprimirá, mediante essa Lei.”[38]

 

A posição defendida pelos principais dirigentes da Social-Democracia Alemã era, nesse contexto, a de acreditar que, não se fornecendo nenhum pretexto para a sua prorrogação, poderia ser a Lei Contra os Socialistas abrogada, em um breve período de tempo.        

Insensível a qualquer crítica formulada contra seu curso patentemente oportunista, a presidência do Partido chegou ao ponto de dissolver-se, formalmente, antes mesmo que a lei em destaque entrasse em vigor.

No que tange à intervenção parlamentar social-democrática, registrou-se, também, desoladores episódios de debilitamente do espírito revolucionário.

No quadro dos debates parlamentares relativos à nova tarifa alfandegária a ser introduzida pelo Império Alemão, ainda durante a vigência da Lei Contra os Socialistas, o Deputado Social-Democrata Kayser posicionou-se em favor do estabelecimento de tarifas protecionistas especiais, criadas em favorecimento da indústria nacional.

Acerca da aberta capitulação parlamentar da Social-Democracia Alemã, Karl Marx teve a oportunidade de assinalar, expressamente :

 

“Vocês já estão tão tomados pelo idiotismo parlamentar que acreditam situar-se acima da crítica, de modo a amaldiçoá-la com um «crime de lése majesté».”[39]

 

 

Engels, por sua vez, escreveu em sua carta dirigida a August Bebel, em 14 de novembro de 1879 :

 

“A tempestade que desabou após a Comuna sobre os socialistas franceses era, porém, algo totalmente diferente da Lei Nobiling, na Alemanha.

E, de modo muito mais orgulhoso e mais consciente, comportaram-se os franceses.

Onde é que você lá encontra essas fraquezas, esses cumprimentos dirigidos ao adversário ?

Eles se calaram, quando não puderam falar livremente.

Eles deixaram que os filistinos choramingassem.

Eles sabiam que o seu tempo voltaria novamente e, agora, esse tempo lá voltou.”[40]      

 

No quadro da votação acerca do Projeto Militar Imperial de 1880, August Bebel formulou críticas ao esboço do projeto, ressaltou, entretanto, que a Social-Democracia Alemã encontrava-se disposta a defender, agüerridamente, o solo pátrio contra as pretensões estrangeiras de conquista.

Quando desde a perspectiva anarquista, Johann Most criticou, em seu órgão jornalístico “Die Freiheit (A Liberdade)”, as declarações de August Bebel, esse último procurou embasá-las, pormenorizadamente, em “Sozialdemokrat (O Social-Democráta), diário da Social-Democracia Alemã[41].

No contexto da votação acerca da prorrogação da vigência da Lei Contra os Socialistas,  o dirigente social-democrata Julius Vahlteich considerou ser essencial protestar, notoriamente, em sua intervenção pública, contra acusações lançadas no sentido de que a Social-Democracia Alemã  pretenderia osquestrar uma revolução em “Heugabelsinne”, i.e. em claro português, uma revolução promovida com a luta armada para a derrubada violenta da dominação burguesa de classe.

De maneira exemplar e ostensiva, Vahlteich demonstrou afastar-se dos “revolucionários russos nihilistas”, declarando que :

 

“a revolução, no velho sentido da palavra, realizada com barricadas e coisas semelhantes, tornou-se já impossível, devido ao aperfeiçoamento das armas e à formação das forças armadas, em virtude de motivos puramente militares.”[42]

 

Diante desse quadro, foi-se formando, em meio aos melhores militantes e quadros revolucionários da Social-Democracia Alemã, um movimento de protesto dirigido contra as posturas da direção partidária majoritária e os membros da fração do Parlamento do Império Alemão, devido à sua atuação em face da Lei Contra os Socialistas.  

Já mesmo no Congresso da Social-Democracia Alemã de 1880, celebrado no Castelo Wyden, a organização partidária da cidade de Berlim submeteu ao plenário um voto de desconfiança em relação à maioria, dotado do seguinte conteúdo :

 

“Deve-se expender um voto de desconfiança aos deputados sociais-democráticos relativamente ao seu comportamento no Parlamento do Império Alemão.

Motivos :

a) a intervenção de Kayser em favor das tarifas protecionistas ;

b) o apelo de Bebel ao “patriotismo” dos companheiros, como também sua “expectativa” no sentido de que esses últimos golpeassem os inimigos da pátria ;

c) o protesto de Hasenclever contra a declaração de Hasselmann ;

d) as declarações de Wilhelm Liebknecht que levantaram a discussão pessoal, entre os deputados.”[43]   

 

A concepção manifestamente oportunista da Social-Democracia Alemã acerca da essência do Estado e do papel da violência revolucionária -  considerada por Karl Marx enquanto parteira de toda velha sociedade que se encontraria grávida de uma nova -, foi ocultada plenamente, a seguir, passando em brancas nuvens, pelo Programa de Erfurt, de 1891, considerado o Evangélio do Reformismo da II Internacional.

Nenhuma palavra acerca da Ditadura Revolucionária do Proletariado e da necessidade de preparação da luta armada proletária – quanto menos acerca da questão da Democracia Burguesa, enquanto forma de Estado em que a última luta decisiva do proletariado há de ter lugar  - foi consagrada pelo Programa de Erfurt.

Voltando sua atenção para as resoluções do Programa de Erfurt, Karl Kautsky, à época o principal mentor ideológico da Social-Democracia Alemã e da II Internacional, assinalou, expressa e cabalmente, em 1892 :

 

“Uma tal derrubada (i.e. a derrubada do poder político pelo proletariado) pode assumir as formas mais variadas, conforme as relações sob as quais se executar.

De nenhuma maneira, ela tem de necessariamente estar vinculada a atividades de violência e a derramento de sangue.

Já existiram casos na história mundial em que as classes dominantes foram particulamente compreensivas – ou particularmente fracas e medrosas -, de modo que abdicaram voluntariamente em face de uma situação de coação.”[44]   

 

E com efeito !

Dando embasamento às palavras de Karl Kautsky, é de destacar-se que Wilhelm Liebknecht, no quadro do Congresso de Erfurt, realizado em 1891, há um ano antes da publicação da obra em referência de Kautsky, pronunciou-se, categoricamente, da seguinte forma acerca da temática em destaque :

 

“O elemento revolucionário não se situa nos meios, mais sim no objetivo.

A violência é, desde há séculos, um fator reacionário.”[45]

  

Wilhelm Liebknecht negava, além disso, a necessidade histórica da Ditadura Revolucionária do Proletariado para o atingimento do socialismo – admitindo-a apenas como medida excepcional em caso de guerras[46].

Com tal concepção claramente oportunista de Wilhelm Leibknecht, encontrava-se também plenamente de acordo August Bebel, o mais célebre e renomado dirigente operário da Social-Democracia Alemã de então.

Em seus pronuncionamentos no Congresso de Erfurt, de 1891, August Bebel manifestou sua crença de que, mediante propaganda e agitação, oral e escrita, bem como por meio de atividade junto ao parlamento do Estado, o proletariado lograria chegar ao poder.

Nessa mesma oportunidade, Bebel declarou-se, formalmente, da maneira mais peremptória, contra o emprego de métodos revolucionários violentos para a tomada do poder político por parte do proletariado[47].

Em suma : Wilhelm Liebknecht, August Bebel, e Karl Kautsky expressavam, já na última década do século XIX, concepções irrevogavelmente oportunistas e notoriamente incompatíveis com os princípios revolucionários fundamentais de Marx e Engels.

As posições dos fundadores do socialismo científico quanto ao papel da violência revolucionária na história, bem como quanto à tarefa da luta proletária para destruição do Estado Burguês, passaram a colidir diamentralmente com as posições dos mais prestigiados dirigentes da Social-Democracia Alemã e da II Internacional, do século passado.

Acerca do pano de fundo dos métodos utilizados pela corrente oportunista de Liebknecht, Bebel e Kautsky para impulsionarem suas disputas políticas de outrora, dá-nos conta, precisamente, Friedrich Engels, em 3 de abril de 1895, poucos meses antes de sua morte, em uma de suas cartas enviadas a Paul Lafargue, ao protestar contra as amputações literárias realizadas por Wilhelm Liebknecht em sua Introdução à Guerra Civil na França :

 

Liebknecht permitiu-se a aplicar-me um golpe de mau gosto.

Ele retirou de minha introdução aos ensaios de Marx sobre a França, de 1848-1850, tudo aquilo que lhe servia para a apoiar, a todo custo, a tática pacífica e refutadora da violência.

Essa tática ele adora pregar desde há algum tempo e particularmente nesse momento em que, em Berlim, estão sendo preparadas Leis de Exceção.

Recomento uma tal tática apenas e tão somente para a Alemanha de hoje, sendo que ainda com reservas consideráveis.

Para a França, a Bélgica, a Itália e a Áustria, essa tática não é adequada, como um todo, e, para a Alemanha, pode ela se demonstrar inaplicável já amanhã.

Peço-lhe, portanto, esperar por todo o artigo, antes de você o julgar – provavelmente ele aparecerá no Neue Zeit(Novo Tempo) -, sendo que espero, de um dia para o outro, exemplares das brochuras.

É lamentável que Liebknecht veja apenas o preto e o branco.

As nuances não existem para ele.

Além disso, as coisas estão quentes na Alemanha, o que promete um fim de século grandioso. ...”[48]

 

Acerca dessa carta de Engels a Lafargue, importa ainda assinalar, elucidativamente, que, examinando-se o correio dirigido por Richard Fischer a Engels, em 6 de março de 1895, é de verificar-se a decisão da Presidência da Social-Democracia Alemã da época no sentido de que seria imperioso fosse moderado o tom por demais revolucionário empregado por Engels em sua Introdução à Luta de Classes na França, de 1848 a 1850, de Karl Marx, aludindo-se ao perigo de reedição de uma Lei contra os Socialistas.

Como resposta a Richard Fischer, Engels fortaleceu, em 8 de março, seu ponto de vista inequivocamente proletário-revolucionário, voltando-se, claramente, contra a posição centrista-oportunista da direção social-democrática, consistente em agir, politica e estrategicamente, sempre nos limites da legalidade burguesa.

Visando à publicação da Introdução no Neue Zeit(Novo Tempo), órgão teórico da Social-Democracia Alemã, Engels resolveu-se por alterar e suprimir certas formulações terminológicas mais sobressalientes de seu texto original, referentes à inevitabilidade da luta armada a ser travada pelo proletariado alemão, sem modificar, entretanto, o sentido e significado inapelavelmente revolucionário de sua produção literária. 

Entretanto, alguns dirigentes sociais-democráticos, entre eles Wilhelm Liebknecht, aproveitaram-se do fato de Engels ter operado alterações redacionais para, imprimirem nas colunas do Vorwärts(Avante), órgão quotidiano da Social-Democracia Alemã, o famoso artigo intitulado “Como se faz Revolução Hoje”, portador de várias amputações linguísticas do texto original da Introdução, procurando apresentar seu autor, i.e. Friedrich Engels, como um “pacífico venerador da legalidade quand même”.   

O texto original de Engels, datado de 1895, cumpre, pois, ser incorporado ao presente trabalho, com vistas a contribuir para a clarificação de suas próprias colocações acerca do tema, destacando-se, ao mesmo tempo, a grave falsificação teórico-doutrinária da disciplina militar-proletária que adquiriu, à época, a rasura empreendida pela direção da Social-Democracia Alemã ao seu último parágrafo que é destacado abaixo, com letras grifadas. 

A rasura em questão, efetuada na primeira edição de ”Introdução a “Lutas de Classes na França de 1848 a 1850 de Karl Marx”, organizada, então, pela Social-Democracia Alemã, visava a descreditar, inteiramente, a perspectiva das lutas revolucionárias violentas do proletariado para a derrubada da burguesia.

Tratou-se, pois, de uma verdadeira falsificação do marxismo-revolucionário realizada, à época e posteriormente sempre repetida, pelos defensores da democratização do Estado, como forma de ascender pacificamente ao socialismo.

Com efeito, segundo Engels :

 

“A rebelião de velho estilo, a luta de ruas com barricadas, que, até 1848, conferiu, por todos os lados, a última decisão, envelheceu significativamente.

Não nos iludamos acerca disso : um verdadeira vitória do levante sobre as forças militares na luta de ruas, uma vitória tal como entre dois exércitos, pertence às maiores raridades. ...

Do lado do insurgente, pelo contrário, todas as condições tornaram-se piores.

Um levante com o qual simpatizem todas as camadas populares surgirá dificilmente de novo.

Na luta de classes, provavelmente jamais se agruparão todas as camadas médias tão exclusivamente em torno do proletariado a ponto de desaparecer inteiramente, pelo contrário, o partido da reação que se aglutina em torno da burguesia.

O “povo” sempre surgirá dividido e, com isso, faltará uma alavanca poderosa, tão extremamente eficaz, como a de 1848.

Se surgirem do lado dos sublevados mais soldados prestativos, tanto mais difícil tornar-se-á armá-los.

As armas de fogo de caça e de luxo das lojas de armamentos – mesmo se não inutilizadas, de antemão, por intervenção policial, mediante apreensão da parte trancafiada – nem de longe estão à altura do fuzil de depósito de armas, no âmbito da luta corporal.

Até 1848, podia-se fazer para si mesmo a munição necessária com pólvora e chumbo.

Hoje, o cartucho é diferente para cada tipo de fuzil e apenas em um ponto, de igual natureza : ele constitui um artefato da grande indústria, i.e. não produzíveis ex tempore, i.e. inúteis para a maioria dos fuzis desde que não se possua a munição para eles especialmente adequada.

E, finalmente, os bairros das grandes cidades, reconstruídos desde 1848, projetados em ruas longas, retilíneas e amplas, tal como construídas para a atuação das novas artilharias e fuzis.

O revolucionário tem de ser um louco se escolher para si os novos distritos de trabalhadores no norte e no leste de Berlim, visando a travar uma luta de barricadas.

Isso quer dizer que, no futuro, a luta de ruas não desempenhará nenhum papel?

De maneira nenhuma.

Significa apenas que as condições, a partir de 1848, tornaram-se amplamente desfavoráveis para os lutadores civis e amplamente favoráveis para as forças militares.

Uma futura luta de ruas pode, portanto, apenas vencer se essa desvantagem da situação for contrabalançada por outros momentos.

Por isso, ela ocorrerá, mais raramente, no início de uma grande revolução, do que será o caso no transcurso subseqüente dessa última, havendo de ser empreendida com forças muito maiores.

Essas forças darão preferência, provavelmente , porém, – tal como na inteira Revolução Francesa, bem como em 4 de setembro e em 31 de outubro de 1870, em Paris – ao ataque aberto ao invés da técnica passiva das barricadas.[49]

 

Depois da morte de Engels, em 5 de agosto de 1895, Eduard Bernstein, encarregado da administração do conjunto das obras literárias de Engels, negou-se a publicar o texto original não-alterado da Introdução, em sua versão integral.

Desse modo, os principais dirigentes revisionistas da Social-Democracia Alemã colocaram em circulação a lenda pueril de que Engels haveria, no final de sua vida, sopesado devidamente seus antigos pontos de vista revolucionários, renegando-os em favor do reformismo[50].     

Em sua luta contra a falsificação política, marxista-revisionista, do Programa de Erfurt relativa à questão da conquista do poder político e da necessidade histórica da Ditadura Revolucionária do Proletariado para o atingimento do socialismo, falsificação essa defendida não apenas pelos centristas-oportunistas sociais-pacifistas, i.e. por Wilhelm Liebknecht, August Bebel e Karl Kustsky, senão ainda pelos sociais-reformistas da Social-Democracia Alemã, esses últimos representados, antes de tudo, por Eduard Bernstein e Conrad Schmidt, escreveu Rosa Luxemburg, já em 1903, de modo claro e preciso :

 

„Partindo do fundamento do socialismo científico de que „a libertação da classe trabalhadora pode ser apenas obra da classe trabalhadora“, a Social-Democracia reconhece que a subversão, i.e. a revolução para concretização da reconformação socialista, pode ser realizada apenas pela classe trabalhadora enquanto tal, e, em verdade, enquanto propriamente a ampla massa, sobretudo a massa do proletariado industrial.

A primeira ação da transformação socialista tem de ser, portanto, a conquista do poder político através da classe trabalhadora e a edificação da Ditadura do Proletariado, incondicionalmente necessária à materialização das medidas de transição.“[51]

 

Assim, importa assinalar, em linhas gerais, que, já a partir dos primeiros anos do século do século XX, quatro correntes doutrinariamente sedimentadas, pelo menos, combatiam no seio da Social-Democracia Alemã da época:

 

1.    os reformistas economicistas-parlamentaristas, defensores da colaboração de classes entre proletários e burgueses, comandados por Eduard Bernstein, clamando pela ampla revisão dos fundamentos da teoria de Marx e Engels, em benefício praticamente das posições doutrinárias de Ferdinand Lassalle[52];

2.    os centristas-oportunistas, repudiadores da violência proletário-revolucionária e protagonistas da democratização do Estado Burguês, coroada por uma pretensa independência política do partido proletário e um pretendido Governo dos Trabalhadores como forma de ascensão ao socialismo, comandandos por Karl Kautsky e pelos mais renomados dirigentes políticos alemães do proletariado, August Bebel e Wilhelm Liebknecht, empenhados em conciliar a política quotidiana reformista com a doutrina de Marx e Engels, desde um ponto de vista constitucional-pacifista ;

3.    os proletários revolucionários, fundados, porém, na equivocada defesa dos direitos e liberdades fundamentais de todos os indivíduos e organizações sociais e desprovidos de uma teoria partidária centralizada e clandestina, entre os quais figuravam Rosa Luxemburg, Karl Liebknecht, Franz Mehring, Clara Zetkin, Leo Jogliches, Julian Marchlevski, ocupados em combater, pricipiologicamente, o reformismo economicista e o centrismo oportunista na Social-Democracia Alemã, retomando e defendendo diversas bases fundamentais da teoria intelectual e da prática política proletário-revolucionária internacionalista de Marx e Engels, de modo a inclinararem-se em direção das posições marxistas-revolucionárias de Lênin, em certos episódios históricos da luta de classes mundial.

4.    os proletários-revolucionários de muito menor dimensão numérica, situados mais proximamente do Partido Bolchevique de Lênin, inclinado a adotar,  esporadicamente, posições manifestamente sectárias, reunidos em torno de Paul Fröhlich, Johan Knief e Julian Borchard.

 

Nesse contexto, haveria de germinar, no seio das correntes revisionistas, i.e. social-reformista e centrista-oportunista, da Social-Democracia Alemã, delas se diferenciando expressivamente, já no curso da primeira década do século XX – sobretudo após a indicação de Friedrich Ebert, em 1905, para o posto de Secretário da Presidência do Partido -, e impor-se, crescentemente, como corrente inquestionavelmente dominante, em particular a partir da morte de August Bebel, em 13 de agosto de 1913, um ala mais propriamente social-chauvinista, encabeçada por Friedrich Ebert, Philip Scheidemann e Gustav Noske.

Essa corrente social-chauvinista, aprofundando a revisão da doutrina do marxismo, desde um ângulo lassalleano, passou a considerar como sua principal tarefa política a defesa do Princípio de Defesa da Pátria(Prinzip der Vaterlandsverteidigung), contra as potenciais nações imperialistas hostis à Alemanha, em total detrimento da defesa dos interesses materiais de classe do proletariado revolucionário.

 

 

CAPÍTULO II.

LÊNIN E LUXEMBURG :

DUAS CONCEPÇÕES MARXISTAS

NO MOVIMENTO

PROLETÁRIO-REVOLUCIONÁRIO EUROPEU

DO INÍCIO DO SÉCULO XX

 

“Rosa equivocou-se na questao da independência da Polônia.

Ela equivocou-se, em 1903, na apreciaçao do menchevismo.

Equivocou-se quando, em julho de 1914, ao lado de Plekhanov, Vandervelde, Kautsky, entre outros, aspirou à unificação dos bolcheviques com os mencheviques.

Ela equivocou-se em suas anotações do cárcere de 1918 (nesse sentido, corrigiu grande parte de seus erros, depois de abandonar o cárcere, no fim de 1918 e no início de 1919).

Porém, apesar de todos os seus erros, Rosa foi e permanece sendo uma águia.”[53]

 

Apreciando, resgatando e defendendo, devidamente, a tradição essencialmente marxista de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg, apesar de seus tantos equívocos, porém sempre comprometidos, antes e acima de tudo, com a perspectiva de organização da revolução violenta do proletariado para a edificação da Ditadura Revolucionária do Proletariado na Alemanha, Lênin afirmou, solenemente, em seu Discurso de Abertura do I Congresso do Komintern :

 

„Em nome do Comitê Central do Partido Comunista da Rússia declaro aberto o I Congresso da Internacional Comunista. Em primeiro lugar, peço a todos os presentes que se levantem de suas cadeiras em memória dos melhores representantes da III Internacional : Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg.“[54]

 

Essas palavras de Lênin, relacionadas com sua interpretação do papel histórico de Liebknecht e Luxemburg, enquanto os melhores representantes da Internacional Comunista, deveriam, em princípio, servir, por si mesmas, como um látego desferido frontalmente contra as desavergonhadas tentativas doutrinárias dos principais ideólogos franco-gramscianos de Actuel Marx e do SU-QI, voltadas a transformar Rosa Luxemburg em uma social-oportunista vulgar, que carrega, eternamente, consigo, no caminho da luta pelo socialismo, a auréola santificada da defesa de fórmulas de liberdade essencialmente democrático-burguesas[55].

Nesse sentido, destaque-se, entretanto, à guisa de exemplo, entre os diversos e renomados textos de Rosa Luxemburg, aquele intitulado E Pela Terceira Vez o Experimento Belga, vindo à luz já em 4 de junho de 1902, quando essa autora teve a oportunidade de escrever, de modo incorruptivelmente claro, contra os legalistas belgas, i.e. Émile Vandervelde e outros :

 

 „Entretanto, não por predileção às ações violentas ou ao romantismo revolucionário devem os partidos socialistas, mais cedo ou mais tarde, estar preparados também para embates violentos com a sociedade burguesa, em casos em que nossas aspirações se direcionem contra os interesses vitais das classes dominantes, senão em razão também da amarga necessidade histórica.

O parlamentarismo enquanto meio de luta político da classe trabalhadora, individualizador do espírito, é tão fantástico e, em primeira linha, reacionário, como o é a greve geral, individualizadora do espírito, ou a barricada, individualizadora do espírito. Evidentemente, a revolução violenta é, nas condições atuais, um meio de dupla-face, aplicável de modo extremamente difícil.

E podemos esperar que o proletariado apenas faça uso desse meio quando se apresentar o único caminho adequado para sua implementação e, evidentemente, apenas em condições em que a situação política de conjunto e a relação de forças assegurem, mais ou menos, a probabilidade de êxito.

Porém, a concepção clara da necessidade da aplicação da violência, seja nos episódios individuais da luta de classes seja para a conquista definitiva do poder de Estado é nisso, de antemão, imprescindível. Ela representa isso que consegue conferir também à nossa atividade legal, pacífica, a apropriada ênfase e efetividade.“[56]

 

Com efeito, em sua luta contra a falsificação política da consigna contida no Programa de Erfurt relativa à „conquista do poder político“, falsificação essa empreendida pelos marxistas-revisionistas e sociais-reformistas do Partido Social-Democrático da Alemanha(SPD), representados, antes de tudo, por Eduard Bernstein, Conrad Schmidt e Karl Kautskye, em parte, também por Wilhelm Liebknecht que renegava a necessidade histórica da Ditadura Revolucionária do Proletariado para o atingimento do socialismo – admitindo-a apenas como medida excepcional em caso de guerras – escreveu Luxemburg, já em 1903, de modo claro e preciso :

 

„Partindo do fundamento do socialismo científico de que „a libertação da classe trabalhadora pode ser apenas ser obra da classe trabalhadora“, a Social-Democracia reconhece que subversão, i.e. a revolução para concretização da reconformação socialista, pode ser realizada apenas pela classe trabalhadora enquanto tal, e, em verdade, enquanto a ampla massa propriamente, sobretudo a massa do proletariado industrial.

A primeira ação da transformação socialista tem de ser, portanto, a conquista do poder político através da classe trabalhadora e a edificação da Ditadura do Proletariado, necessária incondicionalmente à materialização das medidas de transição.“[57]

 

O assassinato de Luxemburg e Liebknecht, em 1919, pela Social-Democracia Alemã e seus aliados políticos e militares burgueses representou um evento de significado histórico-mundial não apenas porque, segundo Lênin :

 

 Os melhores dirigentes da Internacional Comunista foram exterminados, senão ainda por ter-se revelado, definitivamente, o caráter de classe de um Estado Europeu desenvolvido, podendo-se dizer, sem exagero, o caráter de classe de  um Estado desenvolvido em escala mundial. ... „Liberdade“ significa em uma das repúblicas mais livres e desenvolvidas do mundo, na República Alemã, a liberdade para assassinar impunemente os dirigentes presos do proletariado.“[58]

 

Torna-se, pois, nos dias de hoje, cada vez mais necessário, resgatar-se e defender-se, devidamente, a tradição essencialmente marxista de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg, comprometida, antes e acima de tudo, com a perspectiva de organização da revolução violenta do proletariado para a edificação da Ditadura Revolucionária do Proletariado.

 

II.1.

A QUESTÃO ORGANIZATIVA

DO PARTIDO REVOLUCIONÁRIO

 

Quando em 1911, o célebre politólogo alemao, Robert Michels, elaborou sua obra clássica, intitulada Sociologia do Sistema de Partidos na Democracia Moderna. Investigaçoes acerca das Tendências Oligárquicas da Vida em Grupo, tratando preponderantemente, dos partidos políticos e de sua forma de organizaçao, nao se referiu, por uma única vez, a Lênin ou a Trotsky, ao passo que mencionou, pelo contrário, no mínimo, por dez vezes, o nome de Rosa Luxermburg.[59]      

Lênin  deslocou-se para os países da Europa Ocidental, em 1900, proveniente de seu exílio na Sibéria, poucos anos depois da chegada de Luxemburg nessa área geográfica do continente europeu.

Seus livros, suas anotações, suas brochuras, suas concepçoes partidário-organizativas, redigidas originalmente em língua russa, permaneceram sendo pouco conhecidas da militância socialista-revolucionária do ocidente, durante largos anos[60].

Um debate mais profundo acerca dos critérios defendidos por Lênin relativamente à teoria de organizaçao do Partido revolucionário foi, de início, estritamente restrito aos pouquíssimos especialistas de vanguarda do socialismo ocidental, que possuíam laços especiais com a causa da luta de classes travada na Rússia Czarista.     

Entretanto, sua concepçao de Partido conquistou, desde logo, uma grande atençao, em particular, junto aos agrupamentos revolucionários da Europa do Leste, por conformar-se ela no próprio cerne do leninismo ou do bolchevismo.

Quando a avançada teoria de organizaçao do Partido revolucionário de Lênin, elaborada já nos primeiros anos do século XX, começou a encontrar sua aplicaçao prático-concreta, contando com o apoio de uma grande parte de russos socialistas emigrados ou politicamente asilados na Europa Ocidental, passou a ser amplamente debatida nao apenas pelos sociais-democrátas russos, senao ainda pelos polonêses, letoes, caucasianos, bem como pelo membros judeus do Bund.     

No II Congresso do Partido Social-Democrático Russo (POSDR), ocorrido em 1903, na cidade de Londres, processou-se, entao, a ruptura entre bolcheviques(adeptos da fraçao da maioria) e mencheviques (adeptos da fraçao da minoria), relacionada essencialmente com a questao da organizaçao estrutural do Partido.

Se essa ruptura e os incontáveis artigos e polêmicas relacionados com a questao da teoria de organizaçao do Partido revolucionário encontrou, logo a seguir, apenas pequena repercussao entre os socialistas europeus do ocidente, verificar-se-ia precisamente o contrário entre os marxistas-revolucionários provenientes do ou politicamente ativos no Leste Europeu.

Entre esses últimos, encontrava-se, entao, Luxemburg, enquanto militante engajada e proveniente da organizaçao revolucionária polonesa da II Internacional Socialista.

Se tanto Luxemburg como Lênin eram efetivamente refugiados políticos, perseguidos pelo despotismo czarista, certo é que Lênin incorporou, conseqüentemente, em sua atividade militante-partidária, sempre fundalmentalmente norteada para a deflagraçao de processos revolucionários na Rússia, uma longa e intensiva experiência histórica de ação clandestina e insurrecional.

A presença de Lênin nas diversas localidades e cidades da Europa Ocidental em que viveu, ao longo de praticamente 15 anos, era impulsionada, essencialmente, tendo como base as necessidades do trabalho de sua organizaçao revolucionária russa. 

O atento estudo do socialismo europeu-ocidental, altamente cultivado, era empreendido detidamente por Lênin, tomando, porém, constantemente em consideração suas implicaçoes para o movimento revolucionário de seu país.

Lênin nao contava com aspiraçoes de militância estruturada, de longo-prazo, em um Partido europeu-ocidental.  

Pelo contrário, Luxemburg, depois de sua fuga do território polonês, aspirava a intervir, centralmente, em um Partido de massas legal da Europa Ocidental, precisamente na Alemanha, enquanto seguia, também, suas atividades revolucionárias, paralelamente, no território da Polônia.

Hanecki e Warski, delegados polonêses ao II Congresso do Partido Social-Democrático Russo (POSDR), de 1903, e, ao mesmo tempo, representantes do Comitê Central do Partido polônes a que pertencia Luxemburg, informaram essa última, detalhadamente, acerca da polêmica introduzida por Lênin relativamente à teoria de organizaçao do Partido revolucionário.

Com base nessas minuciosas informaçoes, Luxemburg fez publicar, no ”Die Neue Zeit(O Novo Tempo)”, órgao  jornalístico do Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD), em 1904, o artigo intitulado Questoes de Organizaçao da Social-Democracia Russa, atacando, frontalmente, as posiçoes partidário-organizativas defendidas por Lênin.[61]

Quando Lênin enviou, a seguir, sua resposta ao artigo de Luxemburg, resposta essa intitulada Roxinóis Podem Ser Iludidos com Contos de Fadas,  à redaçao de ”Die Neue Zeit(O Novo Tempo)”, essa última decidiu-se por nao a publicar, alegando falta de clareza por parte de Lênin na apresentaçao da matéria[62].   

Com efeito, Luxemburg pronunciava-se, nessa época, enquanto representante de um movimento de massas em ascensao na Europa Ocidental, antes mesmo de desenhados os primeiros sinais de sua decadência e degeneraçao, ao passo que Lênin surgia como represetante de um agrupamento conspirativo ilegal, ativo em um país despótico, semi-feudal e semi-bárbaro, que, apenas anos depois, seria sacudido por uma imensa revoluçao.

Sintetizando, brevemente, a concepçao de Lênin, expressada em suas obras magistrais acerca da teoria de organizaçao do Partido revolucionário[63], visando a confrontá-la com aquela de Luxemburg, cumpre assinalar que, aos olhos de Lênin, o movimento dos trabalhadores é um efetivo produto dos antagonismos da sociedade burguesa, os quais, em sua ativa dinâmica, sao capazes de produzir apenas consciência acerca de questoes sindicais, nomeadamente a consciência da classe trabalhadora de que seus interesses sao, em sentido econômico, diamentralmente opostos e inconciliáveis em relaçao àqueles da classe capitalista.

De modo espontâneo, poderiam os trabalhadores desenvolver, entretanto, apenas essa consciência sindical, jamais, porém, o nível superior de consciência, o nível de consciência política, em que a luta de classes revolucionária conduz, inevitavelmente, à derrubada violenta das instituiçoes de exploraçao econômica e dominaçao político-ideológica do capitalismo, no rumo de edificaçao de um Estado e de uma ordem social proletário-ditatorial, prelúdio à emergência de uma sociedade socialista, fase inferior do comunismo.

Segundo Lênin, a luta de classes nao se desenvolve, automaticamente, em formas políticas e jurídicas, nao se conforma em revoluçao socialista.

As concepçoes socialistas sao, pelo contrário, produtos de elaboraçoes fundamentalmente científicas.

Admitindo como correta uma categórica reflexao de Kautsky, Lênin destacará precisamente que o proletariado nao é, porém, o portador da ciência moderna : é-o, porém, a inteligência burguesa.

Isso nao pode, entretanto, significar que os trabalhadores nao participem das elaboraçoes científicas concernentes ao socialismo, porém ao fazê-lo, fazem-no nao como trabalhadores, mas sim como teóricos do socialismo, apropriando-se do saber de seu tempo e enriquecendo-o. 

Nesse sentido, Lênin assinala, em sua obra maior Que Fazer :

 

“Como suplemento ao dito acima, queremos citar ainda as seguintes palavras, muito apropriadas e valiosas, de Karl Kautsky acerca do Esboço do Novo Programa do Partido Social-Democrático Austríaco :

 

« Muitos de nossos críticos revisionistas admitem que Marx teria afirmado que o desenvolvimento econômico e a luta de classes criariam nao apenas as pré-condiçoes da produçao socialista, senao também diretamente o conhecimento(grifado por K.K.) de sua necessidade e, aí, os críticos terminam logo com a objeçao de que o país com o desenvolvimento capitalista mais avançado, a Inglaterra, seria dotado, entre todos os países modernos, desse conhecimento, da maneira mais ampla.

Segundo a nova versao, poder-se-ia admitir que também a Comissao Austríaca de Programa dividiria o ponto de vista “marxista-ortodoxo”, pretensamente reproduzido dessa forma.

Pois, afirma-se ali : “Quanto mais o desenvolvimento do capitalismo faz inflar o proletariado, tanto mais esse último será forçado e capaz de assumir a luta contra o capitalismo. O proletariado alcança a consciência“ da possibilidade e necessidade do socialismo etc. Nesse contexto, a consciência socialista surge enquanto o resultado necessário e direto da luta de classes proletária.

Porém, isso é errado.       

O socialismo enquanto doutrina enraiza-se, porém, tanto nas relaçoes econômicas contemporâneas como o faz a luta de classes do proletariado, emergindo, tal como essa última, da luta contra a pobreza de massas e a miséria de massas, que sao produzidas pelo capitalismo.

Porém, ambos surgem um ao lado do outro, nao um a partir do outro, e sob pressupostos diferentes.

A moderna consciência socialista pode surgir apenas na base de uma profunda concepçao científica.

Na realidade, a ciência econômica contemporânea forma uma pré-condiçao da produçao socialista tal como o faz, por exemplo, a técnica moderna, apenas que o proletariado nao pode, mesmo com a melhor das vontades, criar nem um nem outro. Ambos surgem do processo social contemporâneo.

O portador da ciência nao é, porém, o proletariado, mas sim a inteligência burguesa (grifado por K.K.).

Em membros isolados dessa camada surgiu, pois, também, o socialismo moderno e, apenas através deles, foi transmitido, espiritualmente, a proletários extraordinários que o introduziram, entao, na luta de classes do proletariado, onde as relaçoes permitiram-no.  

A consciência socialista é, portanto, algo trazido de fora, para dentro da luta de classes do proletariado (etwas in den Klassenkampf des Proletariats von aussen Hineingetragenes), nao algo surgido originariamente a partir desse último.

Em conformidade com isso, o velho Programa de Hainfeld afirma, de modo inteiramente correto, que pertence às tarefas da Social-Democracia encher o proletariado com a consciência (grifado por K.K.) acerca de sua situaçao e de sua tarefa.

Isso nao seria necessário dizer-se caso essa consciência emergisse, por si mesma, da luta de classes.

A nova versao tomou essa frase do velho Programa, apensando-o precisamente ao citado.

Através disso, porém, a dinâmica do pensamento foi inteiramente dilacerada...»”[64]         

 

Em observaçao a essas linhas de Karl Kautsky, Lênin assinalou, ainda, precisamente :

 

“Se entao nao se pode falar de uma ideologia autônoma, elaborada pelas massas trabalhadoras por si mesmas, no curso de seu desenvolvimento, pode-se colocar a questao apenas da seguinte forma : ideologia burguesa ou ideologia socialista.

 

Nota : Isso nao quer dizer, evidentemente, que os trabalhadores nao tomam parte nesse elaboraçao. Porém, fazem-no nao como trabalhadores, mas sim como teóricos do socialismo, como os Proudhon e Weitling, com outras palavras : eles tomam parte apenas e na medida em que conseguem, em maior ou menor medida, apropriar-se desse saber e enriquecê-lo.

Porém, para que os trabalhadores consigam fazê-lo mais freqüentemente é necessário fazer tudo para elevar o nível de consciência dos trabalhadores, em geral.

É necessário que os trabalhadores nao se recluam nos limites artificialmente estreitos de uma “Literatura para Trabalhadores”, mas sim sempre mais aprendam a apropriar-se da literatura geral.

Seria até mesmo mais correto dizer, ao invés de “nao se recluir”, nao serem recluídos, pois os trabalhadores mesmos lêem tudo e querem tudo ler, também aquilo que é redigido para a inteligência, sendo que apenas alguns (maus) intelectuais acreditam que “aos trabalhadores” basta se se lhes conta acerca das condiçoes na fábrica e mastiga, mais uma vez, coisas há muito tempo conhecidas.”[65]       

 

Tal como Engels, Lênin destaca que o socialismo, uma vez tornado ciência, deve ser estudado, tal como toda qualquer outra ciência.

Assim, resulta que uma ideologia proletária nao se poderia desenvolver espontaneamente, sendo que a limitaçao do movimento dos trabalhadores à dimensao econômica, sindical-reivindicatória, recusando-se a luta político-revolucionária socialista pela tomada do poder do Estado e, por consegüinte, à tarefa de organizaçao do Partido revolucionário incumbido de assegurar essa última tarefa, fundado na revoluçao impulsionada pelas massas proletárias, significaria precisamente lutar-se nao para emancipar os explorados e dominados pelo jugo capitalista, nao para derrubar a ordem social capitalista, mas sim para promover a adaptaçao da luta de classes dos trabalhadores às vicissitudes do jugo capitalista.

A libertaçao das massas trabalhadoras é obra das próprias massas trabalhadoras, porém tal fenômeno torna-se apenas possível quando adquirirem elas a consciência político-revolucionária acerca de sua própria condiçao, sendo uma das tarefas do Partido revolucionário ajudá-las a adquirí-la.

Os trabalhadores e seu Partido revolucionário haveriam, assim, de posicionar-se nos embates de interesses defendidos por todas as demais classes sociais, compreendendo e respondendo respectivamente às suas premissas intelectuais, morais, políticas e econômicas.

Um Partido rigorosamente organizado, segundo Lênin, seria, assim, uma exigência decorrente da luta de classes altamente desenvolvida e complexa de nossos dias, devendo constituir um fato ativo no processo histórico, intervindo conscientemente : nao configurando um simples produto passivo e reativo dos fenômenos históricos.

Supostas essas condições objetivas, a  direçao desse Partido funda sua açao política legal e parlamentar, bem como clandestina e insurrecional, sobre a análise científica do processo histórico e protege-se de falsificaçoes, através de uma luta permanente em prol da correta interpretaçao e aplicaçao dos princípios marxistas-engelsianos revolucionários.

É imprescindível, pois, que a direçao desse Partido funcione ininterruptamente, sendo capaz de desenvolver sua teoria, propaganda e organizaçao de modo impertubável, razao pela qual a constituiçao de um quartel-general revolucionário funcionante no exterior torna-se indispensável, sempre que necessário seja, em funçao da conjuntura histórica.

Segundo a teoria organizativa do Partido revolucionário de Lênin, as células partidárias vinculam-se aos organismos centrais e ao Congresso do Partido, ao mesmo tempo em que reconhecem o valor, a visao e a política defendidos por esses últimos, resultantes da síntese do processamento das experiências locais formada, unificada e unitariamente, em nível superior.

Os organismos do centro transmitem às células do Partido suas diretivas mediante profissionais revolucionários, i.e. mediante homens que dedicam disciplinadamente sua inteira existência profissional à necessidade de execuçao de estritas diretivas político-revolucionárias e constituem a ligaçao estreita da militância com o centro do Partido, suas concepçoes, seu programa e suas resoluçoes principistas, estratégicas e táticas revolucionárias.

Esses profissionais revolucionários constituem o eixo em torno do qual gira o conjunto da organizaçao.

Esse agrupamento de revolucionários, intervindo unitaria e centralizadamente, constitui uma organizaçao essencialmente conspirativa, em funçao dos objetivos insurrecionais perseguidos, sem que suas açoes parlamentares-institucionais sejam negligenciadas.

Pois, segundo Lênin :

 

“Trata-se de uma obrigaçao combinar as formas de luta ilegais e legais.”[66]

 

Nesse Partido revolucionário nao se ingressa, enquanto membro, apenas para expressar-se tendências políticas e aderir aos princípios fundamentais da ideologia do marxismo-revolucionário – nisso baseando seu comportamento social -, senao também para dedicar-se uma existência a uma causa revolucionária, no quadro de uma estrutura organizativa centralizada, unitária e disciplinada.

Notoriamente, as concepçoes organizativas de Lênin acerca do Partido revolucionário descendem tanto dos jacobinos como dos revolucionários russos que o antecederam, defensores da formaçao de grupos de vanguarda, compostos por dedicados revolucionários, empenhados na tarefa da tomada violenta do poder, no quadro da revoluçao socialista desencadeada pelas massas trabalhadoras – a exemplo das concepçoes de Nicolai Tchernyshevski, Sergei Netchaiev, Peter Tkatchev -, devendo tais tradiçoes insurrecionais estarem inseparavelmente vinculadas ao papel revolucionário do proletariado moderno.

Além de sua magnífica obra literário-conspirativa, intitulada Que Fazer ? Relatos sobre Gente Nova, Tchernyshevski assinalou, com grande clareza, já por volta de 1861, por ocasiao de sua ativa intervençao nas lutas de emancipaçao dos servos russos :

 

“Quem é o responsável pela servidao ? Apenas os nobres e alguns burocratas ?

Mas, o próprio Czar é proprietário de terras.

Entao, por que deixaria de levar em conta exclusivamente os interesses dos senhores de terra ?

Quando haverá liberdade de fato para os camponeses ?

Quando o povo irá se governar ?

Quando o camponês nao terá de pagar imposto e quando ele nao será separado da família e da sua aldeia para servir o Exército durante décadas ?

Como se conseguirá isso ?

Através de uma revoluçao.

É preciso que os camponeses troquem idéias entre si, aproximem-se de seus irmaos que servem como soldados e preparem-se para o grande o dia.

Mas, até entao, eles nao devem se envolver em rebelioes menores e isoladas contra o Governo.

Só quando o movimento ganhar caráter nacional é que a revoluçao poderá conseguir sucesso.”[67]  

 

No que concerne a Netchaiev, precisamente sua característica de recorrer às técnicas especiais de conspiraçao – a despeito de sua marcada influência anarco-bakhuninista -, foi devidamente apreciada por Lênin, sem prejuízo das pesadas críticas desferidas contra aquele revolucionário russo, em Os Possessos, pelo expoente literário do conservadorismo russo, Dostoievski.    

Paralelamente, segundo Tkatchev, a perspectiva de acreditar-se em rebelioes populares espontâneas, tal como defendidas por Michail Bakhunin, representava um sonho improvável de ser realizado[68].

Por outro lado, suas formulaçoes definiam já claramente um traço de separaçao e repúdio das iniciativas isoladas adotadas pelo terrorismo individual.

Sendo assim, observou Tkatchev, por volta de 1873 :

 

“Nós admitimos a anarquia ... apenas como o ideal desejável de um futuro distante.”[69]

 

O que poderia, entao, salvar a Rússia Czarista de uma catástrofe, representada por uma transiçao pacífica para o constitucionalismo burguês, explorador e usurário, seria precisamente o fervor revolucionário de uma organizaçao minoritária e rigorosamente centralizada de revolucionários, pois, segundo Tkatchev :

 

“Em virtude de seu desenvolvimento mental e moral, essa minioria sempre teve e terá de ter força intelectual e moral sobre a maioria.

A essência da revoluçao está na coerçao, por isso a organizaçao revolucionária exige centralizaçao, disciplina rigorosa, rapidez, decisao e coordenaçao de atividades.”[70]

 

A acentuada insistência na centralizaçao e na disciplina da organizaçao conspirativa e  revolucionária de vanguarda, o agudo criticismo quanto à possibilidade de rebelioes socialistas espontâneas das massas, a rejeiçao do terrorismo individual, por significar esse a dispersao de energias e de recursos revolucionários, o desprezo pela possibilidade de persuasao pacífica das classes dominantes, constituem fortes pontos de contato entre os jacobinos-radicais russos, encabeçados por Peter Tkatchev – jacobinos na forma de ainda “verdes estudantes secundaristas”, na apropriada expressao de Friedrich Engels – e a avançada concepçao socialista-revolucionária de Lênin, em cujo quadro, porém, o tipo de organizaçao revolucionária centralizada, incumbida da tarefa consciente de destruiçao do Estado Burguês e construçao de uma transitória Ditadura Revolucionária do Proletariado, combina-se com a elaboraçao de uma ideologia socialista-proletária avançada e a incorporaçao partidária da inteligência científico-socialista na direçao da revoluçao feita pelas massas.

Com efeito, Lênin contemplava no jacobinismo uma das etapas mais altas do movimento ascensional da classe oprimida na luta por sua emancipaçao, considerando que, nas principais cidades européias ocidentais da Rússia do século XX, o jacobinismo seria o Governo da Classe do Proletariado Revolucionário, que apoiado nos camponeses pobres e solidificado sobre bases materiais que já existiam para o movimento até o socialismo, conseguiria renovar não somente a grandeza, a força indestrutível dos jacobinos do século XVIII, senao ainda levar os trabalhadores do mundo inteiro ao triunfo definitivo.

No entendimento de Lênin, o jacobino  que uniu sua causa para sempre à organização do proletariado e que tem consciência dos seus interesses de classe, seria o lutador bolchevique.

Nessa medida, o Partido revolucionário haveria de ser também uma organizaçao de vanguarda de luta, incumbida de dirigir as massas proletárias e erigir a Ditadura Revolucionária do Proletariado, após destruir integralmente o Estado Burguês.

 

Luxemburg, ao  publicar, no ”Die Neue Zeit(O Novo Tempo)”, órgao  jornalístico do Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD), em 1904, o artigo intitulado Questoes de Organizaçao da Social-Democracia Russa, atacando, frontalmente, as posiçoes partidário-organizativas defendidas por Lênin, teve a oportunidade de destacar, inicialmente, que a questao da teoria de organizaçao do Partido revolucionário diria respeito “a toda jovem geraçao socialista (ganze jüngere sozialistische Generation)” da Rússia, militante sob as difíceis condiçoes impostas pelo despotismo czarista[71].

Sem embargo, Luxemburg censurou na concepçao de Lênin sua pretensao de construir um Partido de elite, organizado concentricamente, bem como de demarcar estritamente esse Partido de todos os demais.

Luxemburg criticou, duramente, as prerrogativas possuidas pelos organismos centrais do Partido de intervir na vida política das células e agrupamentos partidários, até mesmo com medidas de dissoluçao e reconstituiçao de células, com o que poderia influir, decisivamente, na mesma assembléia partidária no qual haveria de ser eleito.

Tais prerrogativas haveriam de transformar os organismos centrais no único núcleo propriamente ativo do Partido, ao passo que todas as demais células locais e regionais converter-se-iam em simples ferramentas de implementaçao de medidas, em total contradiçao com o desenvolvimento natural da luta de classes.

Segundo Luxemburg, à parte os princípios gerais de luta, nao existiriam quaisquer diretrizes, particularmente de ordem tática ou estratégica, que poderiam ser estabelecidas, de antemao, e impostas, por parte dos organismos centrais, aos militantes sociais-democrátas.

Existiriao, muito mais, permanentes flutuaçoes, sendo que dirigentes, militantes e massa do Partido revolucionário nao deveriam encontrar-se rigidamente separados.

Os Partidos da Social-Democracia deveriam constituir, na ótica de Luxemburg, nao apenas a organizaçao externa da classe trabalhadora, senao ainda a forma de movimento a ela apropriada.

A teoria organizativa do Partido revolucionário de Lênin seria uma mera transferência mecanicista do funcionamento dos grupos conspirativos de Auguste Blanqui, de matiz putchista, para o interior do movimento social-democrático revolucionário, do início do século XX[72].

Além disso, segundo Luxemburg, a Rússia Czarista situava-se, incontrastavel e puramente, diante de uma revoluçao democrático-burguesa e nao proletária.

Na Alemanha, pelo contrário, existiriam já fortes e inúmeros quadros proletários, cujo estrato dirigentes era constituido naturalmente pela Social-Democracia Alema.    

Se levada adiante, efetivamente, a concepçao partidária de Lênin, o fortalecimento exponencial das prerrogativas dos organismos centrais, até o estágio de instauraçao de uma Ditadura do Comitê Central, acarretar-se-ia, tendencialmente, o crescimento do oportunismo e do burocratismo da organizaçao de luta revolucionária dos trabalhadores.

Apenas o desenvolvimento espontâneo da luta de classes poderia, finalmente, superar todos os obstáculos históricos, direcionando a luta de classes para os trilhos corretos.

Nesse sentido, Luxemburg enfatizou, nitidamente :

 

“Passos falsos que um movimento realmente revolucionário dos trabalhadores empreende sao, em sentido histórico, incomensuravelmente mais frutíferos e valiosos do que a infalibilidade do melhor Comitê Central de todos.”[73]

 

Observe-se ainda que, no domínio da teoria de organizaçao do Partido revolucionário, Lênin defendeu, à época, suas posiçoes nao apenas contra Luxemburg, senao ainda contra muitos adversários ativos no interior do movimento proletário russo, entre os quais se encontrava Jules Martov, Georgi Plekhanov, Pavel Axelrod, Irakli Tsereteli, Lev Deich, Vladimir Antonov-Ovseienko, Mosei Uritsky, Noi Zhordania, Theodor Dan, Léon Trotsky entre outros.

Enquanto defensores e apoiadores da teoria organizativa de Partido revolucionário de Lênin, no contexto desse início do século XX, cumpre citar, porém, sobretudo, Jakov Sverdlov, Anatoli Lunatcharsky, Nadejda Krupskaya, Félix Dzerjinsky, Gregori Zinoviev, Lev Kamenev, Josef Stálin, Mikhail Lashevich, Mikhail Frunze, Aleksei Rykov, Maxim Litvinov, Vladimir Antonov, Gregori Ordjonikidze, Alexander Bogdanov entre outros.

Trotsky, muito próximo das posiçoes de Luxemburg, no domínio da teoria organizativa do Partido revolucionário, qualificou, em 1904, em seu artigo intitulado Nossas Tarefas Políticas, a defesa do centralismo democrático de Lênin como sendo  expressao de autêntica autocracia e regime autoritário de Partido, reivindincando, pelo contrário, vida longa à auto-atividade do proletariado e fim ao substitucionalismo político : 

 

“Nas políticas internas do Partido, esses métodos conduzem, tal como veremos abaixo, a que a organizaçao do Partido « substitua-se » ao Partido, o Comitê Central substitua-se à organizaçao partidária e, finalmente, o ditador substitua-se ao Comitê Central.”[74] 

 

Em sua obra Minha Vida, encontramos, entao, as seguintes palavras de Trotsky, acerca desse tema :

 

“Tendo vindo ao estrangeiro, trazia o convencimento de que a redaçao deveria estar «submetida» ao Comitê Central.

E esse era o modo de pensar da maioria dos partidários do Iskra.

-          “Nao, isso nao pode ser assim”, respondeu-me Lênin, quando falávamos sobre isso, “as forças sao muito desproporcionais. Como podem querer nos dirigir, a partir da Rússia ? Isso nao pode ser ... Nós formamos um centro fixo, somos os mais fortes ideologicamente e vamos dirigir o movimento a partir daqui.” 

-          “Entao, será instaurado um regime de plena ditadura, por parte da redaçao”, objetei.

-          “O que se perderá com isso ?”, respondeu-me Lênin. “Nas circunstâncias atuais, nao há um outro remédio”

......

Separei-me de Lênin por motivos que tinham muito de “moral” e até de pessoal.

Nada obstante, ainda que aparentemente assim fosse, a divergência possuía, no fundo, um caráter político que se refletia no campo organizativo.

Eu me encontrava entre os centristas. Porém, é certo que, entao, nao podia ainda dar-me clara conta do centralismo severo e imperioso que o Partido revolucionário devia reclamar para lançar milhoes de homens no combate da velha sociedade.”[75] 

 

O choque de concepçoes organizativas acerca do Partido revolucionário, protagonizado por Lênin, de um lado, e, de outro lado, Luxemburg e tantos outros mencheviques e seus aliados, nos primeiros anos do século XX, revela, antes de tudo e respectivamente, o embate entre uma teoria consideravelmente dinâmica de Partido marxista-revolucionário insurrecional e conspirativo – Partido esse de vanguarda cujo componente essencial seriam os revolucionários profissionais, atuantes sobre uma larga massa de militantes, apoiadores e simpatizantes claramente entrevistos no quadro de uma estrutura organizativa centralizada e unitária – e uma doutrina de Partido concebido enquanto reuniam de ativistas, simplesmente defensores de princípios fundamentais de uma ideologia revolucionária, organizado segundo a forma e imagem dos Partidos socialistas efetivamente entao existentes na Europa Ocidental, a exemplo do British Labour Party.

Lênin foi meridianamente claro ao acrescentar que o contexto da luta de classes proletária era essencialmente distinto na Rússia, situada essa sob o governo da autocracia czarista, na medida em que a formaçao de qualquer Partido de linhagem socialista resultava ser plenamente ilegal.

De toda sorte, tal aspecto permaneceu desconsiderado ou considerado insuficientemente nas posiçoes de Luxemburg, seja no que respeitava a mais clara situaçao de autocracia vivida, entao, pela Rússia Czarista, seja naquilo que concernia aos regimes democráticos-burgueses ocidentais-europeus do início do século XX, onde o ascenso do militarismo e do burocratismo dos Estados capitalistas imperialistas tornavam-se, progressivamente, uma realidade irrefutável.        

De toda sorte, o debate acerca da teoria organizativa do Partido revolucionário demonstra claramente o marcante antagonismo de posiçoes existentes entre Partido leninista e Partido luxemburguista.

Após a derrota da Revoluçao Russa de 1905, registrou-se um momento de reaproximaçao entre Lênin e Luxemburg, no domínio de diversas questoes político-analíticas, situadas no marco do Congresso Socialista Internacional de Stuttgart, de 1907, quando ambos cerraram fileiras na luta contra o oportunismo social-reformista de Eduard Bernstein e Eduard David, clamando por uma retomada da luta revolucionária em prol da derrubada do capitalismo durante a guerra imperialista que se anunciava no horizonte.

Importa anotar que o Congresso Socialista Internacional de Stuttgart foi o VII Congresso da II Internacional, sendo que se reuniu entre os dias 18 e 24 de agosto de 1907.

O Partido Social-Democrático Russo(POSDR) encontrava-se representado nesse congresso por 37 delegados. Por parte dos bolcheviques, tomaram parte nesse congresso Lênin, Lunatcharsky, Litvinov e outros.

O congresso em referência ocupou-se com as seguintes questoes :

 

1.    Militarismo e Conflitos Internacionais ;

2.    Relaçoes entre os Partidos Políticos e os Sindicatos ;

3.    Questao Colonial ;

4.    Imigraçao e Emigraçao de Trabalhadores e

5.    Direito de Voto das Mulheres.

 

O trabalho principal desse congresso concentrou-se nas comissoes que elaboravam os projetos de resoluçao para as sessoes do plenário.

Lênin interviu na Comissao sobre Militarismo e Conflitos Internacionais. 

Com seus requerimentos de emendas, colaborou para uma modificaçao fundamental, em sentido do marxismo-revolucionário, do projeto de resoluçao original acerca do tema,

No cerne da resoluçao congressual em tela redigiu-se o seguinte :

 

“Se a guerra ameaçar-nos, as classes trabalhadoras e seus representantes parlamentares de todos os países participantes que apóiam e compoem o Bureau Internacional obrigam-se a mobilizar todas as suas forças para impedir sua eclosao, mediante aquelas medidas que lhes pareçam ser as mais efetivas, o que modificar-se-á, segundo o aguçamento da luta de classes e a situaçao política geral.

Se a guerra irromper, apesar disso, eles obrigam-se a intervir em favor de sua mais rápida conclusao e explorar, com todas as forças, a crise econômica e política, criada pela guerra, para instigar o povo a acelerar o fim da dominaçao capitalista de classe ... “[76]

 

Nada obstante, apesar dessa reaproximaçao de Lênin e Luxemburg em diversos pontos políticos da luta de classes revolucionária, a questao da doutrina de organizaçao do Partido revolucionário permaneceu intocada e inconciliável.

A posiçao assumida pelos bolcheviques no quadro da II Internacional Socialista permaneceu sendo singular e marginal.

Os dirigentes dos Partidos de massas dos países do mundo ocidental entreviam na forma organizativa dos bolcheviques a expressao de um fanatismo insurrecional e conspirativo plenamente incomum no contexto do movimento socialista internacional, sendo que também Luxemburg esposava esse tipo de apreciaçao.

Nos anos que precederam a eclosao da I Guerra Mundial, a luta fracional no interior do movimento social-democrático russo atingiu um ponto de destaque.

Agora, nao apenas os mencheviques situavam-se em oposiçao aos bolcheviques, senao ainda quase todos os Partidos e agrupamentos socialistas ligados ou interessados, de alguma forma, na situaçao política da Rússia Czarista colidiam contra a concepçao de organizaçao partidária de Lênin. 

Em maio de 1914, os mencheviques solicitaram à direçao da II Internacional Socialista que interviessem, visando a coartar a tática de ruptura dos bolcheviques, já bastante avançada, depois da realizaçao da Conferência dos Bolcheviques, realizada em Praga, em 1912, a qual abriu a perspectiva de fundaçao do novo jornal ”Pravda(A Verdade)”, enquanto instrumento de propaganda ideológico-socialista e de organizaçao partidário-revolucionária insurrecional[77].

O dirigente belga, Emil Vandervelde, enquanto representante da Internacional, foi destacado para o cumprimento da tarefa de averiguar, em Petersburgo, em maio de 1914, a possibilidade de unificaçao das fraçoes em luta no interior do Partido Social-Democrático Russo (POSDR).

A despeito dos sinais clarevidentes da vindoura eclosao da I Guerra Mundial, a II Internacional Socialista planejou, entao, a realizaçao de uma conferência, reunindo as fraçoes em referência, para o mês de agosto de 1914, na cidade de Viena, sendo que um encontro preparatório teve lugar em Bruxelas, nos dias 16 e 17 de julho do mesmo ano, dando criaçao a uma Comissao Especial, que acolheu o relatório político de Vandelverde acerca do Partido Social-Democrático Russo (POSDR).

Nada obstante, a própria composiçao  dessa Comissao Especial demonstra a avançada situaçao de decomposiçao e reorganizaçao na qual se encontrava a Social-Democracia Russa. 

Nela, estavam representadas os seguintes agrupamentos :

 

1.    os mencheviques, encabeçados por Martov ;

2.    o Bloco de Agosto, composto pelos mencheviques em conjuto com Trotsky, Axelrod e a Bund Judaica, uma formaçao do ano de 1912, contraposta ao bolchevismo e celebrizada por suas posiçoes liquidacionistas ;

3.    o grupo dirigido por Plekhanov ;

4.    o grupo liderado por Lunatcharky ;

5.    uma fraçao dos sociais-democratas polonêses, comandada por Luxemburg ;

6.    uma fraçao dos sociais-democratas polonêses, atuantes sobretudo na cidade de Varsóvia, comandados por Unschlicht e Hanecki, influenciados teoricamente por Radek e objetivamente situados do lado dos bolcheviques ;

7.    os sociais-democratas letoes, comandados por Stutchka, alinhados rigorosamente com as posiçoes de Lênin ;

8.    os bolcheviques, dirigidos por Lênin e Zinoviev.

 

Os bolcheviques designaram Inès Armand, como sua representante nos trabalhos da Comissao Especial em tela.

O próprio fato de que nem Lênin nem Zinoviev viajaram da Suíça à Bruxelas para participar, diretamente, das discussoes e tarefas abordadas pela comissao, ilustra quais as impressoes de ambos relativamente ao possível conteúdo e decisoes que poderiam vir a ser adotadas na conferência, planejada para realizar-se em agosto de 1914.  

Em verdade, os bolcheviques e seus aliados abstiveram-se na votaçao que estabeleceu que todos os grupos do Partido Social-Democrático Russo (POSDR) dever-se-iam unificar sobre a base comum de um programa a ser objeto de uma resoluçao do  Bureau Internacional da II Internacional Socialista, sendo que para sua execuçao haveria de ser convocado um congresso geral de todo Partido.

Acerca desse episódio, Jules Martov relata-nos o seguinte :

 

“Axelrod e Luxemburg foram encarregados de elaborar um Manifesto acerca da necessidade da unificaçao, dirigido contra a política rupturista dos bolcheviques.

A fraçao de Lênin encontrava-se, dessa forma, inteiramente isolada ...

Porém, a Guerra Mundial, que eclodiu depois de algumas semanas, colocou um fim na obra de unificaçao iniciada.”[78]

 

A aplicaçao dessa resoluçao de unificaçao significaria, evidentemente, a separaçao dos bolcheviques da II Internacional Socialista, pois nao existem quaisquer indícios no sentido de que Lênin se submeteria à disciplina de uma maioria liquidacionista.

Luxemburg e Axelrod estavam, naturalmente, convictos disso, no momento em que aceitaram a incumbência de redigir o manifesto em referência.

A postura de Luxemburg quanto à questao organizativa do Partido revolucionário, em particular suas diferenças metológicas em face da concepçao de Lênin referente ao tema, aguçaram-se ainda mais, depois de que teve lugar a Revoluçao de Outubro de 1917.

Acerca do tema, Fritz Rück, dirigente da Liga Spartakus, em Baden-Württemberg, formula o seguinte relato, digno de ser reproduzido aos leitores, referentemente ao trabalho jornalístico, empreendido por sua organizaçao, nos últimos meses de 1917 e início de 1918 :

 

“Às vezes, foi difícil conferir uma fisionomia ao jornal, porém, ao mesmo tempo, tratou-se de uma ótima escola para mim isso de poder dizer sempre novamente, no mínimo, uma parte daquilo que a política beligerante descortinava, chamando a atençao dos leitores – muitos deles nos campos de batalha – sobre o colapso vindouro do sistema dominante e a necessidade de uma postura revolucionária.

A censura, outrora dotada de uma visao tao afiada, que riscava, freqüentemente, algumas frases ou palavras sem que se pudesse tornar o texto visível ao leitor, era cego, porém, quanto a um contexto : ele admitia, tranqüilamente, que se trouxesse artigos detalhados e séries de artigos sobre a revoluçao na Rússia, seus problemas e a política dos bolcheviques.

Por essa razao, servi-me, mais do que de outra forma seria o caso, do material que continha uma correspondência, surgida em Stockholm, redigida por Karl Radek, em colaboraçao com o Comitê Central Bolchevique de Petrogrado.

Porém, um dia recebi um carta na qual Leo Jogliches alertava-me para o fato de que os revolucionários russos possuíam seus próprios métodos e concepçoes, agindo em conformidade com eles.

A oposiçao alema e, sobretudo, o Grupo Spartakus, deveria, em verdade, apoiar a Revoluçao Russa, distanciando-se, porém, de Lênin e de seu Partido.

Sobretudo, a publicaçao dos artigos da pena de Radek nao seriam recomendáveis.

“As velhas histórias polonesas”, disse-me Paul Levi, sendo que nao nos preocupámos muito, por um certo tempo, com essas coisas.

A análise da política de paz dos bolcheviques e das transformaçoes ocorridas na Rússia fornecia a única perspectiva frutífera do fim da guerra, mediante uma revoluçao socialista.

Nem eu nem a organizaçao de Württemberg ou de Stuttgart possuía qualque tipo de ligaçao direta organizativa ou de outro gênero com os revolucionários russos.”[79]

 

A posiçao de Luxemburg acerca da questao organizativa do Partido revolucionário, projetou-se até mesmo nos debates preambulares de fundaçao do Partido Comunista da Alemanha, entendido como nova parte integrante e inseparável da revoluçao proletária mundial, inaugurada com a Revoluçao de Outubro de 1917.

Enquanto Karl Liebknecht, a partir de 9 de novembro de 1918, tornou-se um dos principais encabeçadores da iniciativa de criaçao do Partido Comunista da Alemanha – que viria a ocorrer em 30 de dezembro de 1918, no Salao de Festas da Câmara de Deputados de Berlim [80], é imperioso assinalar que Luxemburg seguiu opondo sérias resistências a que esse processo se concretizasse efetivamente.

Acerca do tema, Wilhelm Pieck registrou as seguintes consideraçoes :

  

“Cada vez mais fortemente, surgiu a concepçao de que a fundaçao de um próprio Partido seria necessária para consolidar o movimento, também em sentido organizativo.

Jogiches e também Rosa Luxemburg podiam apenas contentar-se pouco com esse pensamento.

Eles procuravam muito mais atingir seu velho objetivo de, no interior do Partido Social-Democrático Independente (USPD), influenciar tao fortemente os trabalhadores a ponto de a política da Liga Spartakus impor-se nesse Partido, trazendo a direçao desse último para as maos de Spartakus.

Porém, para tanto, existia precisamente o pressuposto de que o Congresso Imperial do USPD fosse convocado, de modo a tormar-se posiçao acerca da política da direçao do USPD.

Uma vez que, sob nossa reivindicaçao, nao ocorreu, até 25 de dezembro, uma resposta da direçao do USPD acerca da convocaçao do Congresso do Partido, havendo ela declarado, em 24 de dezembro, no “Freiheit (Liberdade)” que nao poderiam realizar o Congresso por causa das dificuldades de tráfego e da agitaçao eleitoral (obs. De SVK: agitaçao para as eleiçoes da Assembléia Nacional Constituinte), estabeleceu-se uma convocaçao de uma conferência de todo Império da Liga Spartakus, para o domingo, 29 de dezembro, na qual haver-se-ia de adotar um posicionamento sobre a crise do USPD e a fundaçao de uma Partido próprio.

A conferência que ocorreu no Salao de Festas do Câmara de Deputados, nao foi pública.

Depois de um curto debate, decidiu-se, contra três votos, em favor da fundaçao do Partido.

Acerca do nome do Partido existiram diferenças de opiniao, na medida em que Rosa Luxemburg e Jogiches eram a favor do nome “Partido Socialista dos Trabalhadores”, ao passo que um número de outros delegados posicionaram-se em prol do nome “Partido Comunista da Alemanha”.

Por isso, foi acionada uma comissao que, depois de prolongadas discussoes, decidiu em favor desse último nome, com o acréscimo (Spartakusbund – Liga Spartakus).

A conferência foi interrompida pela participaçao no funeral dos marinheiros, assassinados em 24 de dezembro ... “[81]         

 

Cumpriu, entao, a Karl Liebknecht, ao apresentar, nessa ocasiao, seu informe acerca da crise do Partido Social-Democrático Independente (USPD), destacando o papel dessa organizaçao na alta traiçao cometida por ela contra a revoluçao proletária mundial, concluir resolutamente, defendendo a criaçao do Partido Comunista da Alemanha (KPD), destacando o seguinte :

 

“Hoje, é necessário, perante todo o público, traçar uma linha de separaçao, constituindo-nos enquanto novo Partido autônomo, resoluto e implacável, coeso e unitário, no espírito e na vontade, dotado de programa, objetivos e meios claros, determinados segundo os interesses da revoluçao mundial socialista.

Nosso programa e nossos fundamentos fáticos, aplicámo-los desde há muito tempo.

Temos de os estabelecer ainda apenas de modo formal.

Nao temos de criar uma novidade.

As massas já sabem o que somos e o que queremos.

Devemos confirmar apenas formalmente o que somos desde há muito tempo e continuar nossa obra, sobre uma base mais ampla.”[82]

 

Com efeito, uma grande deficiência das lutas revolucionárias do proletariado alemao do início do século XX consistiu, seguramente, no fato de nao se ter formado, absolutamente, nesse país, um sólido Partido marxista-revolucionário, enriquecido com a concepçao de Partido de Lênin.

No que concerne ao movimento Spartakus, esse último jamais chegou a possuir uma orientaçao clara e determinada no sentido da criaçao de um Partido de massas, firmemente organizado e disciplinadamente centralizado.

Ele permaneceu sendo um grupo relativamente restrito que, embora lutando corajosa e ousadamente contra o imperialismo capitalista alemao e sua política militarista, jamais foi capaz de conferir ao movimento proletário alemao a força imprescindível para o cumprimento de suas tarefas revolucionárias.

A luta implacável de Karl Liebknecht contra as diferentes variantes do oportunismo social-democrático na Alemanha, suas intervençoes resolutas contra a flagrante traiçao revolucionária dos dirigentes do SPD e do USPD, seu decidido impulsionamento da Revoluçao Alema de 1918-1919, tornou possível o seu amadurecimento de aço, de modo a torná-lo o mais decidido protagonista da fundaçao do Partido Comunista da Alemanha (KPD – Spartakusbund), fundamentalmente inspirado no paradigma fornecido à história pelo Partido Comunista da Rússia (Bolchevique), de Lênin, sentido-se vinculado a esse último por sólida amizade.

Porém, o Partido Comunista da Alemanha (KPD – Spartakusbund) nasceu, tardiamente, já ao fogo da Guerra Civil da Alemanha, sem dispor das mais rudimentares possibilidades de conformar, dirigente e preponderantemente, esse processo revolucionário.

A importância histórica de seu surgimento reside, portanto, precisamente no fato de ter fixado uma pedra fundamental que deveria pavimentar o caminho que haverá de ser percorrido pelas novas geraçoes de revolucionários na Alemanha, no campo da concepçao de Partido marxista-revolucionário e de unidade da classe trabalhadora alema, sobre bases combativas e revolucionárias.

 

II.2.

ACERCA DO IMPERIALISMO

 

As agudas diferenças ideológicas existentes entre Lênin e Luxemburg no domínio da doutrina organizativa do Partido revolucionário estendiam-se, porém, a outros domínios teórico-analíticos, em particular àquele concernente à caracterizaçao acerca do imperialismo.

Se ambos concordavam, em linhas gerais, na apreciaçao geral da nova fase histórica que perpassava o capitalismo no ínicio do século XX – em que a concorrência das naçoes imperialistas tornava a guerra mundial inevitável – bem como na análise de que os Partidos socialistas nao poderiam vencer mediante reformas gradativas das relaçoes sócio-econômicas e político-institucionais do capitalismo, fato é que divergiam, consideravelmente, quanto ao caráter fundamental e ao método de luta a serem valorizados pelos marxistas-revolucionários no cumprimento de sua tarefa de derrubada da exploraçao e dominaçao capitalistas.

Destacando a influência da ofensiva militar e colonial promovida pelas naçoes imperialistas européias, na virada do século XX, Luxemburg concebeu como traço característico da nova fase do capitalismo a aspiraçao irrenunciável de todos os Estados Capitalistas de lutarem por mercados estrangeiros e novas áreas de investimentos[83].

Tomando como exemplo paradigmático a Gra-Bretanha e sua dominaçao colonial na Índia e no Egíto, Luxemburg enfatizou o fenômeno de criaçao de novas indústrias imperialistas, fundadas no trabalho barato dos nativos, em um meio especialmente favorável à intensificaçao da acumulaçao do capital.

Sua conclusao era, sobretudo, a de que, enquanto o mundo oferecesse aos capitalistas tais possibilidades de exploraçao e extraçao de mais-valia, poderiam as naçoes concorrentes deter o colapso do sistema por um certo período.

Se, porém, todos os povos nao  dotados de relaçoes capitalistas avançadas fossem engulidos pelas naçoes capitalistas-imperialistas, afundaria a acumulaçao do capital até um ponto morto e a sociedade capitalista mergulharia em uma guerra mundial, a qual poderia ser efetivamente impedida, senao combatida através da mobilizaçao do conjunto da classe trabalhadora, com uma série de greves de massas.

Com base em tal concepçao, Luxemburg pretendia responder à realidade econômica e política, profundamente marcada pelo advento do imperialismo capitalista.    

Lênin opôs-se a essa concepçao de imperialismo de Luxemburg.

Partindo das análises de J. Hobson e R. Hilferding acerca da ascensao do capital financeiro, Lênin desenvolveu suas concepçoes acerca da dominaçao expansiva imperialista dos Estados capitalistas, assinalando que a luta pela repartiçao do mundo já havia se iniciado[84].

Nesse contexto, a fase de desenvolvimento pacífica do capitalismo imperialista, existente entre 1872 e 1914, havia sido superada, convertendo-se toda a Europa em um barril de pólvora.

Nesse sentido, o capitalismo monopolista aspiraria a controlar todos os fatores de produçao e todos os mercados do mundo, sendo que apenas a posse desses poderia assegurar um mais pleno controle.

Segundo Lênin, apenas a intervençao consciente do proletariado, tomando o poder em vários países, mediante a realizaçao de uma série de revoluçoes socialistas vitoriosas, convertendo a guerra mundial imperialista em guerras civis, poderiam colocar termo ao período de decadência e de martírio das massas trabalhadoras.

Em verdade, para Lênin,  a guerra mundial já tornara-se efetivamente iminente, desde dos primeiros anos do século XX, havendo-se tornado um pressuposto fundamental da realidade da luta de classes que se relacionava à toda política de entao.

Nesse contexto, situou-se a concepçao de Lênin acerca das revoluçoes a serem empreendidas na Rússia e do programa de seu Partido revolucionário.

Quanto mais agudas se tornassem as contradiçoes internas do czarismo russo, tanto mais intensa haveria de se tornar sua ambiçao por conquistas territoriais, subjulgaçao de países, aventuras coloniais, marcada pela pretensao de escravizar os povos do Cáucaso, de avançar até a China e concretizar a aspiraçao pan-eslava de dominaçao expansiva até os Balcas.   

Apenas a derrubada violenta do czarismo, mediante a conversao da guerra imperialista em guerra civil russa, poderia apontar-se, igualmente, para a consagraçao do Direito de auto-determinaçao das naçoes oprimidas, temática essa suplementarmente polemizada agudamente entre Lênin e Luxemburg.

 

II.3.

A QUESTÃO MILITAR

DA REVOLUÇAO PROLETÁRIA

 

É sabido que Lênin combateu, agudamente, a concepçao defendida por muitos socialistas europeus de que o desarmamento seria a expressao mais clara, mais decidida e mais conseqüente da luta contra todo e qualquer militarismo e contra toda e qualquer guerra[85].

Sendo assim, os socialistas nao poderiam, segundo sua ótica, ser contra toda e qualquer guerra, sem deixarem de ser socialistas.

Em primeiro lugar, os socialistas nao poderiam ser jamais adversários das guerras revolucionárias.

Segundo Lênin, a burguesia das grandes potências imperialistas tendo-se tornado plenamente reacionária no quadro da eclosao da I Guerra Mundial, haver-se-ia de reconhecer a guerra, que essa burguesia estava conduzindo, como sendo reacionária, escravista e criminosa.

A problemática levantada a esse respeito por Luxemburg concernia, precisamente, a como ficariam as coisas em caso de uma guerra deflagrada contra essa burguesia, uma guerra dos povos que sao oprimidos por essa burguesia, povos coloniais ou dela dependentes.

Nas “proposiçoes diretrizes” do grupo “Internacional”, dirigido por Luxemburg, constou, expressamente, de seu parágrafo 5 :

 

“Na era desse imperialismo desatravancado, nao podem mais existir quaisquer guerras nacionais.”

 

No entendimento de Lênin, isso representava um equívoco manifesto de Luxemburg.

Pois, a história do século XX, esse século do “imperialismo desatravancado”, encontrava-se já repleta de guerras coloniais, guerras nacionais ou levantes nacionais da parte desses povos oprimidos.

Uma das propriedades mais fundamentais do imperialismo consistiria, precisamente, em que ele aceleraria o desenvolvimento do capitalismo nos países mais atrasados, expandindo  e aguçando a luta contra a opressao nacional.

Disso decorreria, inevitavelmente, que o imperialismo teria de produzir, com grande freqüência, guerra nacionais.

Pelo contrário, em sua brochura intitulada A Crise da Social-Democracia, redigida sob o pseudônimo Junius, Luxemburg defendeu as referidas “proposiçoes diretrizes”, afirmando que, na época imperialista, toda e qualquer guerra nacional contra uma das grandes potências imperialistas conduziria à intervençao de uma outra grande potência igualmente imperialista, concorrente da primeira, de modo que toda e qualquer guerra nacional tranformar-se-ia em uma guerra imperialista[86].

Segundo Lênin, porém, diversas guerras coloniais, realizadas entre os anos de 1900 e 1914, nao haviam percorrido esse caminho, sendo plenamente equivocado afirmar-se que, depois do findar da I Guerra Mundial, nao poderia vir a existir nenhuma guerra nacional, progressiva, revolucionária, como p.ex. da parte da China, em aliança com a Índia, a Pérsia e o Siao etc. Contra as grandes potências.

A negaçao de toda possibilidade de guerras nacionais sob o imperialismo resultou ser, para Lênin, teoricamente incorreta, bem como manifestamente falsa, em sentido histórico, sendo que, em termos prático-concretos, equivaleria ao chauvinismo europeu : os pertencentes às naçoes opressoras de centenas de milhoes de seres humanos na Europa, na África, na Ásia etc., declarariam aos povos oprimidos que sua guerra contra as naçoes capitalistas-imperialistas seria “impossível”.

Em segundo lugar, em conformidade com o pensamento de Lênin, as guerras civis seriam também guerras, sendo que quem reconhecese a luta de classes nao poderia deixar de reconhecer também as guerras civis que, em toda sociedade de classes, representam uma continuaçao natural e inevitável, em determinadas circunstâncias, da luta de classes, seu desenvolvimento e aguçamento.

Negar ou esquecer as guerras civis, significaria precipitar-se no mais extremo oportunismo, recusando a revoluçao socialista.

Em terceiro lugar, na ótica de Lênin, a revoluçao socialista vitoriosa em um país nao excluiria, de nenhuma forma, de uma vez por todas, todas as guerras em geral.

Pelo contrário : ela as pressuporia.

Partindo do pressuposto marxista que o desenvolvimento do capitalismo processar-se-ia de maneira altamente desigual nos mais diferentes países, Lênin formulou a conclusao de que  o socialismo nao poderia vencer, simultaneamente, em todos os países.

Ele venceria, de início, em um ou alguns países, sendo que outros permaneceriam, por um certo tempo, burgueses ou pré-burgueses.

Essa situaçao haveria de produzir nao apenas fricçoes, senao ainda a aspiraçao direta da burguesia de outros países a esmargar o proletariado vitorioso em um certo país.

Em tais casos, uma guerra desencadeada pelo proteriado seria legítima e justa.

Representaria uma guerra pelo socialismo, pela libertaçao de outros povos da burguesia.

Destaque-se, além disso, que Engels teve a oportunidade de reconhecer, expressamente, em sua carta de 12 de setembro de 1882, dirigida a Kautsky, a possibilidade de “guerras defensivas do socialismo”, que já teria vencido.

Ele referiu-se, nomeadamente, à defesa do proletariado vitorioso contra a burguesia de outros países.

Assim, para Lênin, apenas depois de derrubada a burguesia no mundo inteiro – e nao apenas em um país -, apenas depois de ter-se-a vencido completamente e expropriado, tornar-se-iam as guerras impossíveis.

Cientificamente, resultaria, pois, plenamente incorreto como plenamente nao revolucionário, contornar-se ou obscurecer-se o mais importante, a derrubada da resistência da burguesia, i.e. o mais difícil, aquilo que se exige, na maioria das lutas, na transiçao rumo ao socialismo, sonhando com a possibilidade de um futuro socialismo pacífico.

Sendo assim, o conceito de “defesa da naçao” resultaria odiado por alguns marxistas-revolucionários porque, através dele, os sociais-pacifistas encobrem e disfarçam, na guerra de rapina em causa, as mentiras da burguesia.

Porém, seria simplesmente estúpido nao pretender aceitar a “defesa da naçao” por parte dos povos oprimidos, em sua guerra contra as grandes potências imperialistas ou por parte do proletariado vitorioso, em sua guerra contra qualquer Gallifet de um país burguês[87].

Seria fundamentalmente equivocado, em sentido teórico, esquecer-se de que toda e qualquer guerra é apenas a continuaçao da política com outros meios.

A I Guerra Mundial seria, pois, a continuaçao da política imperialista de dois grupos de grandes potências e essa política teria sido gerada e alimentada pelo conjunto das relaçoes da época imperialista.

Porém, essa mesma época haveria, segundo Lênin, de produzir necessariamente a política da luta contra a opressao nacional, bem como da luta do proletariado contra a burguesia, e, por isso, gerar a possibilidade e a inevitabilidade, em primeiro lugar, dos levantes nacionais revolucionários, em segundo lugar, das guerras e levantes do proletariado contra a burguesia, em terceiro lugar, da unificaçao de ambos esses tipos de guerras revolucionárias etc.

 

 

II.4.

O DIREITO DE AUTO-DETERMINAÇÃO

DAS NAÇÕES OPRIMIDAS

 

O Direito de auto-determinaçao das naçoes oprimidas foi, antes de tudo, concebido por Lênin enquanto uma arma de fortalecimento e formaçao da unidade do proletariado na luta anti-imperialista.

Em torno da questao do Direito de auto-determinaçao, em particular do Direito de auto-determinaçao da naçao polonesa, eclodiu uma profunda controvérsia entre Lênin e Luxemburg.

Essa última entendia, em princípio, que o Direito de auto-determinaçao era irrealizável sob o sistema de exploraçao econômica e dominaçao política capitalista.

A idéia de uma futura sociedade autentica e integralmente socialista, fundada na planificaçao avançada da economia, segundo Luxemburg, estaria, já por si mesma, por indicar que as hostilidades nacionais viriam a ser limitadas à esfera essencialmente cultural, tornando sem razao de ser as diferenças nacionais.

Nesse sentido, Luxemburg enfatizava a artificialidade das fronteiras nacionais, existente sob a égide do capitalismo.

Luxemburg defendeu essas suas posiçoes em diversas oportunidades, já a partir dos primeiros anos de sua ativa vida política, seja nos anos que precederam a deflagraçao da guerra, seja naqueles que a sucederam.

Ao longo dos anos de guerra, porém, Luxemburg tornou mais complexa o desvendar da essência de sua concepçao ao assinalar que a tendência do capitalismo financeiro de expandir-se para além dos maiores entes estatais, mesmo sem ocorrendo isso sem consideraçao da nacionalidade dos povos afetados, representaria, em última instância, um progresso econômico, pois as formas brutais da dominaçao imperialista preparariam o socialismo, no interior das relaçoes sociais capitalistas, mediante o fenômeno da maior concentraçao das forças produtivas.

Sendo assim, os sociais-democratas nao poderiam reivindicar, nos países capitalistas plenamente desenvolvidos, o retorno às velhas formas, i.e. nao poderiam lutar nem em favor do restabelecimento dos velhos Estados nacionais nem em prol da edificaçao de novos.

Sua consigna deveria soar, entao : “Abaixo com as fronteiras.”

A luta contra a repressao de uma naçao poderia, assim, ser empreendida, unicamente,  enquanto parte inseparável da luta geral contra o imperialismo e pelo socialismo, resultando as consignas relacionadas com o Direito de auto-determinaçao das naçoes oprimidas atendidas, por si mesmas e automaticamente, em uma nova ordem socialista. 

Sua oposiçao política em face dos nacionalistas polonêses, era sustentada por Luxemburg em nome de seu pretenso internacionalismo socialista-proletário mais conseqüente.

A concepçao luxemburgista tornou-se celebrizada e aperfeiçoada, antes de tudo, na resoluçao de seu partido polonês, firmada dois anos depois da eclosao da I Guerra Mundial Imperialista, nos seguintes termos :  

 

“Nao temos nenhuma razao para admitir que, na sociedade socialista, será conferida à naçao um caráter de unidade político-econômica.

Segundo todas as probabilidades, ela possuirá apenas o caráter de uma unidade cultural e linguística, dado que a divisao territorial do círculo cultural socialista, enquanto essa existir, poderá resultar apenas segundo as necessidades da produçao, com o que acerca dessa divisao, entao, teriam que decidir nao naturalmente naçoes isoladas, a partir da própria plenitude de poder (tal como o “Direito de auto-determinaçao” o exige), mas sim todos os cidadaos interessados.

A transferência da fórmula do “Direito de auto-determinaçao” para o socialismo consiste em um total desconhecimento do caráter da comunidade socialista.

A guerra mundial comprovou que o período de formaçao dos Estados Nacionais na Europa acabou ...

A postura da burguesia política em todos os Estados repartidos demonstrou, de maneira crassa, que o ideal do Estado Nacional é um anacronismo, na época imperialista, confirmando a correçao da postura dos sociais-democratas polonêses-russos, em face das aspiraçoes independentistas ...

O proletariado polonês jamais fez da independência política o seu objetivo ...

Hoje, em vista das experiências da guerra mundial, o levantamento da consigna da independência enquanto meio de luta contra a opressao nacional representaria nao apenas uma utopia perniciosa, senao ainda a negaçao dos fundamentos mais simples do socialismo.”[88] 

 

Munida de uu suposto saber inabalável acerca do futuro do socialismo, Luxemburg impugnou, aguçada e habilmente, o Direito de auto-determinaçao das naçoes oprimidas, destacando, antes de tudo, tratar-se de uma consigna inerente à típica cadaverizaçao da II Internacional Socialista, cujos paradoxos haviam conduzido, necessariamente, à defesa das respectivas pátrias capitalistas pelo proletariado dos diversos países do mundo.

Lênin esforçou-se, ao máximo, por combater também essa concepçao de Luxemburg, tendo sempre em conta, porém, as dificuldades da luta dos sociais-democratas polonêses contra as correntes nacionalistas.

A defesa das naçoes oprimidas e combatentes em favor de sua auto-determinaçao representou, nesse sentido, parte integrante da doutrina revolucionária de Lênin.

Em sua luta contra o Estado Czarista Semi-Feudal, Lênin conduziu uma luta de duas décadas, denunciando como sendo uma traiçao ao socialismo renunciar-se à defesa do Direito de auto-determinaçao das naçoes oprimidas.

Nesse sentido, teve oportunidade de destacar que a análise dos revolucionários polonêses, comandados por Luxemburg, negligenciaria, inteiramente, a questao contemporânea do Estado Burguês e da luta de classes revolucionária do proletariado, super-dimensionando o papel da planificaçao da economia do socialismo, enquanto, em verdade, constituiria apenas um aspecto da sociedade socialista.

Citando o artigo de Friedrich Engels intitulado “O Pó e o Reno”, Lênin afirma que as fronteiras naturais européias formaram-se ao longo de séculos, sobre a base de um parentesco linguístico e cultural-nacional.

No curso do processo histórico, os Estados maiores e mais ativos engoliram os Estados menores e mais débeis, assim que as fronteiras naturais de um período original foram suprimidas :

 

“O capitalismo imperialista-reacionário deixará ao socialismo, que o substituirá, uma série de anexoes, na Europa, e em outras partes do globo, tidas como herança.

Sendo assim, o socialismo vitorioso, que, em toda linha, restabelecerá e levará até o final a mais plena democracia, renunciará à determinaçao democrática das fronteiras do Estado ?

Ele nao deverá ter de contar com as “simpatias” da populaçao ?

Basta levantar essas perguntas para ver claramente o quanto nossos colegas polonêses afastam-se para longe do marxismo, rumo ao economicismo imperialista.”[89]

   

O principal exemplo de trabalho de Lênin era seu próprio país :

 

“Na Rússia, onde pertencem às naçoes oprimidas nao menos do 57 % da populaçao, i.e. mais 100 milhoes de pessoas, onde as naçoes moram em suas principais massas nas áreas fronteiriças, onde uma parte dessas naçoes é, no domínio da cultura, mais ampla do que os grao-russos, onde a ordem político-estatal caracteriza-se através de um caráter bárbaro e medieval inteiramente particular, onde a revoluçao democrático-burguesa ainda nao foi levada até o fim : nessa Rússia é, para os sociais-democratas, incondicionalmente obrigatório o reconhecimento do Direito de livre separaçao das naçoes oprimidas desse país, em nome de suas tarefas democráticas e socialistas ...

Os socialistas russos que nao exigem a liberdade de separaçao para a Finlândia, a Polônia, a Ucrânia e assim por diante ..., agem como chauvinistas, como lacaios dos monarquistas imperialistas e da burguesia imperialista, cobertos com sangue e sujeira.”[90]

 

II.5.

EM FACE DA QUESTÃO DA

ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE

 

Cumpre, nesse passo, apresentar ao leitor, em breves linhas, a polêmica travada entre Luxemburg e Lênin, enquanto  revolucionários proletários marxistas, acerca da natureza, extensão e limites da Democracia Proletária em face da consigna de Assembléia Nacional Constituinte, Direito Geral Eleitoral, Liberdade de Reunião e de Imprensa, no quadro da Revolução de Outubro, tendo como esteio o debate em torno do Direito de Auto-Determinação da Naçoes Oprimidas e a Questão Agrária Russa. 

Com efeito, acerca do tema, Luxemburg teve a oportunidade de escrever criticamente contra Lênin e os bolcheviques, em sua celebrizada Acerca da Revolução Russa, de junho de 1918  :

 

„A consigna sacada pelos bolcheviques : imediato apossamento e repartição do solo e da terra pelos camponeses teve, precisamente, de atuar em sentido oposto.

Ela não representa não apenas nenhuma medida socialista, senão ainda corta o caminho para uma tal medida, ela produz em face da transformação das relações agrárias, em sentido socialista, dificuldades insuperáveis(p. 343). ...

A Reforma Agrária de Lênin criou para o socialismo no campo uma nova camada popular poderosa de inimigos.

Nisso, os bolcheviques possuem parte de culpa.

Essas dificuldades objetivas da situação, os próprios bolcheviques aguçaram, em grande medida, através de uma consigna, que lançaram no primeiro plano de sua política : o assim-chamado Direito de Auto-Determinação das Nações ou, o que se esconde debaixo dessa frase na realidade : a decomposição estatal da Rússia. ...

De início, embate-se contra a estultice e a rígida conseqüência com que Lênin e seus companheiros atrelaram-se a essa palavra de ordem o fato de que se situam tanto em crassa contradiçao com o seu centralismo da política, apregoado em outros momentos, quanto em relaçao à posiçao que assumiram em face dos demais fundamentos democráticos. 

Enquanto demonstram um desprêzo frio relativamente à Assembléia Constituinte, ao Direito Geral Eleitoral, à Liberdade de Reunião e de Imprensa, em suma, relativamente a todo o aparato das liberdades fundamentais democráticas das massas populares (p. 346) que formam, todas juntas, o „Direito de Auto-Determinação“ na própria Rússia, tratam o Direito de Auto-Determinação das Nações enquanto um nó górgio da política democrática, em amor ao qual todos os pontos de vista práticos da crítica real deveriam silenciar.

Enquanto eles não se permitiram minimamente influenciar pelo plebiscito da Assembléia Constituinte na Rússia – um plebiscito conduzido na base do Direito Eleitoral Geral e em total liberdade de uma República Popular -, e, dirigidos por ponderações críticas insensatas, declararam, simplesmente, ser nulo e anulado seus resultados, combateram eles, em Brest, pelo „plebiscito“ das nações estrangeiras da Rússia acerca de sua apartenência estatal, enquanto o verdadeiro guardião de toda liberdade e democracia, enquanto a qüintessência inadulterada da vontade popular e a instância máxima decisiva na questão do destino político das nações.(p. 347).“[91]

 

Adstringindo-se aqui à questao da Democracia Proletária na Ditadura Revolucionária do Proletariado, cumpre assinalar que Rosa Luxemburg abandona notoriamente, na passagem de sua crítica em destaque, o critério de classe revolucionário-proletário, ao empreender sua defesa „em geral“ da Assembléia Constituinte, do Direito Geral Eleitoral, da Liberdade de Reunião e de Imprensa, em suma, de todo o aparato das supostas liberdades fundamentais democráticas das massas populares.

Em verdade, Luxemburg omite o fato fundamental e decisivo de que a Assembléia Constituinte de que fala negou-se, expressamente, em 5 de Janeiro de 1918, a sufragar a Declaraçao dos Direitos do Povo Trabalhador e Oprimido e o Programa do Poder Soviético, e, em 6 de janeiro de 1918, a aprovar a Política de Paz do Governo Soviético.

Fosse essa Assembléia Constituinte realmente representativa das „massas populares“(no original alemao : Volksmassen), não teria, de nenhuma forma, embargado a votação da Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Oprimido, justamente em sua sessão de abertura[92].

De toda sorte, seria pretender reduzir Rosa Luxemburg à condição de uma social-oportunista vulgar – como o fazem os meta-marxistas franco-gramscianos e os principais ideólogos do SU-QI – caso não destacássemos, em letras garrafais, que Luxemburg, mais uma vez no texto em destaque, Acerca da Revolução Russa, de junho de 1918, colocou-se, clara e abertamente, em defesa da Ditadura Revolucionária do Proletariado, quando assinalou, enfaticamente :

 

„Os bolcheviques colocaram, imediatamente, enquanto objetivo dessa tomada do poder, todo o programa revolucionário mais amplo : não, por ex., a garantia da Democracia Burguesa, mas a Ditadura do Proletariado, com o objetivo de concretização do socialismo.

Com isso, conquistaram o mérito histórico imortal de proclamar, pela primeira vez, os objetivos finais do socialismo, enquanto programa imediato da prática política(p.341). ...

Isso é o essencial o remanescente da política bolchevique.

Nesse sentido, cabe-lhes o mérito histórico imortal por terem se adiantado ao proletariado internacional com a conquista do poder político e da colocação prática da concretização do socialismo, bem como por terem impulsionado, poderosamente, a disputa entre capital e trabalho no mundo inteiro.

Na Rússia, o problema pode ser apenas colocado.

Na Rússia não pôde, porém, ser resolvido. Esse problema pode apenas ser resolvido em escala internacional.

E, nesse sentido, o futuro pertence, em todas as partes, ao „bolchevismo“(p. 365).”[93]

 

Nada obstante, convém destacar, documentalmente, como Lênin abordou a problemática da consigna da Assembléia Nacional Constituinte, nas Teses e Exposição acerca da Democracia Burguesa e a Ditadura do Proletariado, de 4 de março de 1919 :

 

“A mais completa bancarrota dos socialistas que se reuniram em Berna (Lênin refere-se aqui aos socialistas da Internacional Amarela, Kautsky, Hilferding, Martov, Longuet, Turati, Branting etc.), sua mais completa incompreensão para a nova, i.e. para a Democracia Proletária, pode ser atestada no seguinte :

Em 10 de fevereiro de 1919, Branting declarou encerrada a Conferência Internacional da Internacional Amarela, em Berna.

Em 11 de fevereiro de 1919, seus participantes publicaram, em Berlim, no jornal “A Liberdade” um apelo do Partido dos “Independentes” ao proletariado.

Nesse apelo aceita-se o caráter burguês do governo Scheidemann, acusa-se-o de querer eliminar os Conselhos (Räte), que são chamados de portadores e guardiães (Träger und Schützer) da revolução, e formula-se a proposta de legalizar os Conselhos (Räte), conferindo-se-lhes Direitos de Estado, dando-se-lhes o Direito de Impugnação contra as decisões da Assembléia Nacional, com o efeito de ter de decidir um plebiscito nacional.

Uma tal proposta desmascara a total falência ideológica dos teóricos que defendem a democracia e não entenderam seu caráter burguês.

A tentativa ridícula de unificar o Sistema dos Conselhos, i.e. a Ditadura do Proletariado, com a Assembléia Nacional, i.e. a Ditadura da Burguesia, desvenda, definitivamente, às forças incessantemente crescentes da nova Democracia Proletária, tanto a pobreza de espírito dos Socialistas Amarelos e dos Sociais-Democrátas e sua essência politicamente reacionário-pequeno-burguesa quanto suas concessões medrosas(p. 479)...

Nos primeiros oito meses da Revolução Russa foi por demais discutida a questão da organização dos Soviets.

Para os trabalhadores não estava claro no que consistiria o novo sistema e se seria possível fazer dos Conselhos um aparelho de Estado.

Procedemos em nossa revolução de modo prático e não teoricamente.

A questão da Constituinte, p.ex., não a havíamos colocado, teoricamente, antes.

Não havíamos dito que não reconhecíamos a Assembléia Constituinte.

Apenas depois, i.e. depois de que as organizações soviéticas se espalharam por todo o país e conquistaram o poder político, apenas então ocupamo-nos de desbaratar a Constituinte(p. 486).[94]         

 

É, precisamente, nesse sentido que o artigo 9° da Constituição de Lênin e Sverdlov, a Constituição da Guerra Civil, promulgada em 10 de julho de 1918, poucos meses após a fundação da Internacional Comunista, proclamou, expressamente :

  

“Art. 9°. O problema fundamental da Constituição da República Federal Socialista Soviética Russa envolve, em vista do presente período de transição, o estabelecimento da Ditadura do Proletariado urbano e rural e dos camponeses pobres, na forma de um poderoso poder soviético de toda a Rússia, com o objetivo de derrotar completamente a burguesia, de aniquilar a exploração do homem pelo homem e de instaurar o socialismo, no qual não existirá nem divisão de classes nem poder estatal.”[95] 

 

Em suas Teses e Exposição acerca da Democracia Burguesa e a Ditadura do Proletariado, de 4 de março de 1919, Lênin teve a oportunidade de esclarecer, notoriamente, no quadro do I Congresso da Internacional Comunista – que indicou como seus melhores representantes Karl Liebnecht e Rosa Luxemburg [96] -, o significado do exercício da Democracia Proletária na Ditadura do Proletariado :

 

“A diferença fundamental entre a Ditadura do Proletariado e a Ditadura das outras classes, da Ditadura dos Latifundiários na Idade Média, da Ditadura da Burguesia em todos os países capitalistas civilizados, reside em que a Ditadura dos Latifundiários e da Burguesia representava a opressão violenta da resistência da maioria esmagadora da população, nomeadamente a opressão dos trabalhadores.

Pelo contrário, a Ditadura do Proletariado é a opressão violenta da resistência dos exploradores, i.e. de uma minoria ínfima da população, dos Latifundiários e Capitalistas.

Disso resulta que a Ditadura do Proletariado deverá portar, consigo, inegavelmente, não apenas, dito genericamente, uma modificação das formas e das instituições da democracia, mas sim um tal modificação delas que os escravizados pelo capitalismo, as classes trabalhadoras, execerão, efetivamente, a democracia em uma medida jamais vista no mundo antes.

Realmente, a forma da Ditadura do Proletariado, que já foi praticamente elaborada, i.e. o Poder Soviético na Rússia, o Sistema de Conselhos na Alemanha, os Comitês de Fábrica e outras instituições soviéticas análogas em outros países, significa e materializa precisamente para as classes trabalhadoras, i.e. para a maioria esmagadora da população, uma grande oportunidade para se servir dos direitos democráticos e liberdades, tal como jamais existiu, mesmo que aproximadamente, nas melhores e mais democráticas repúblicas burguesas(p. 479).”[97]

      

Precisando seu raciocínio acerca da Democracia Proletária, assinalou Lênin, em suas teses 16 e 20 :

 

“16. A velha, i.e. a Democracia Burguesa e o Parlamentarismo foram organizados de tal forma que precisamente as massas trabalhadoras eram estranhas ao aparelho administrativo, na medida mais extrema.

O Poder Soviético, i.e. a Ditadura do Proletariado é, pelo contrário, organizado de modo a aproximar as massas trabalhadoras do aparelho administrativo.

Ao mesmo objetivo serve, igualmente, a unificação do Poder Executivo e do Poder Legislativo na organização soviética do Estado e a substituição das circunscrições eleitorais territoriais pelas unidades de produção, tais como oficinais e fábricas(p. 480). ....

20. A cessação (no original alemão : Aufhebung) do Poder de Estado é o objetivo que todos os socialistas colocaram a si mesmos, entre eles e, em seu ápice, Marx.

Sem a materialização desse objetivo, o verdadeiro democratismo, i.e. a igualdade e a liberdade são inatingíveis.

Apenas a Democracia Soviética, ou Proletária, conduz, praticamente, a esse objetivo, pois ela ruma, imediatamente, para a preparação do total perecimento de todo Estado, na medida em que incorpora as organizações das massas dos trabalhadores na participação permanente e incondicional da administração do Estado(p. 481).”[98]

 

Diante dessas colocações iniciais, resulta claro que a Ditadura Revolucionária do Proletariado, sendo incorporadora da mais ampla e, em sentido histórico, incomparavelmente, mais elevada Democracia Proletária, indispensável à construção de uma sociedade socialista, não pode e não deve incorporar, de nenhuma forma, a mais ampla liberdade política para as forças contra-revolucionárias, capitalistas-restauracionistas, no marco de uma Assembléia Nacional Constituinte.

Se tomados como base já mesmo os extratos, acima reproduzidos, das Teses e Exposição acerca da Democracia Burguesa e a Ditadura do Proletariado, de 4 de março de 1919, formuladas por Lênin, na abertura do I Congresso da Internacional Comunista, pode-se verificar que a Ditadura Revolucionária do Proletariado pressupõe a idéia de opressão violenta da resistência dos exploradores, i.e. de uma minoria ínfima da população de capitalistas e latifundiários.

Além disso, nessa mesma sede, Lênin reconhece, expressamente, a possibilidade do uso da violência até mesmo contra certos setores do proletariado, empenhados em destruir, direta ou indiretamente, a Ditadura Revolucionária do Proletariado, incorporadora da mais ampla Democracia Proletária :

 

“Nossos mencheviques percorreram, passo a passo, quase o mesmo desenvolvimento dos teóricos dos Independentes na Alemanha (Lênin refere-se, nesse momento, a Kautsky e Hilferding, entre outros).

Antes, quando neles tinham a maioria, eram a favor dos Soviets.

Diziam : “Viva os Soviets!” “Em defesa dos Soviets!”, “Os Soviets são a Democracia Revolucionária!”.

Depois de que nós, bolcheviques, alcançamos a maioria nos Soviets dizem que os Soviets não podem existir ao lado da Assembléia Constituinte.

Diversos teóricos dos mencheviques fizeram, além disso, a mesma proposta formulada pelos Independentes Alemães de acoplar o Sistema Soviético à Assembléia Constituinte, organizando-os nos limites do Estado(p. 484).[99]

 

E, da maneira mais evidente, escreve Lênin, a seguir :

 

“A grande maioria dos mencheviques passou para o lado da burguesia e luta na guerra civil contra nós.

Nós perseguimos, naturalmente, os mencheviques, nós até mesmo os matamos, se eles lutam na guerra contra nós, contra o Exército Vermelho, se eles assassinam nossos oficiais vermelhos.

À guerra da burguesia respondemos com a guerra do proletariado.

Uma outra saída não pode existir(p. 485).”[100]  

 

Sendo assim, cumpre destacar ser plenamente coerente com o patrimônio doutrinário e os ensinamentos político-práticos de Marx e Engels, Lênin e Trotsky, o fato de que a Ditadura Revolucionária do Proletariado pressupõe, evidentemente, não apenas a estrita restrição de liberdade política e direitos democráticos para forças contra-revolucionárias, p.ex. (neo)-fascistas ou capitalistas-restauracionistas, senão ainda a possibilidade de uso da violência até mesmo contra certos setores do proletariado que procurem destruir, direta ou indiretamente, tal Ditadura, incorporadora da mais ampla Democracia Proletária.

Nesse mesmo sentido, Nahuel Moreno teve a oportunidade de assinalar, de maneira notoriamente clara, o seguinte :

 

“Para Lênin, não era a liberdade política, porém apenas o poder ditatorial que era “ilimitado”, após a Revolução de Outubro : « O termo científico « Ditadura » significa nada mais nada menos do que autoridade desvinculada de quaisquer leis, absolutamente irrestringida por regras, quaisquer que forem, e baseada diretamente sobre a força » (Lênin, Uma Contribuição à História das Questões da Ditadura, 1920).

Em O Estado e a Revolução, Lênin cita Engels : « Enquanto o proletariado ainda necessitar (grifo no original) do Estado, ele não o faz no interesse da liberdade, porém a fim de oprimir seus adversários e, tão logo se torne possível falar de liberdade, o Estado enquanto tal deixará de existir. »  (Lênin, O Estado e a Revolução, 1917).

No « Programa do Partido Comunista », por ele escrito e ratificado por Trotsky, em 1936, Lênin enfatiza as « restrições .... de liberdade » até que o socialismo tenha vencido e a exploração do homem pelo homem desapareça : « ...supressão de direitos políticos e outras restrições de liberdade são meramente medidas provisórias que deixarão de ser necessárias quando a possibilidade objetiva de exploração do homem pelo homem deixar de existir... ».

Na Revolução Traída, o volume no qual o SU-QI procura basear sua « norma programática e principista », Trotsky insiste que, sob a Ditadura do Proletariado, devem existir « limitações estritas de liberdade » (« Para estar assegurada, uma Ditadura Revolucionária significa, por sua própria essência, estritas limitações de liberdade »). (Trotsky, A Revolução Traída, 1936).

Próximo do exílio, ele nos alertou que « a Ditadura do Proletariado é inconcebível sem o uso da força mesmo contra seções mesmo do proletariado ».

Em 1938, o « Programa de Transição » repete essa declaração « ... as fórmulas de democracia (liberdade de imprensa, direito sindical etc.) significam, para nós, apenas consignas incidentais e episódicas no movimento independente do proletariado ... »(Trotsky, A Agonia Mortal do Capitalismo e as Tarefas da IV Internacional, 1938).“[101] 

 

No que concerne à extensão da Ditadura Revolucionária do Proletariado, portadora histórica da mais ampla Democracia Proletária, já é possível deduzir-se, coerentemente, a partir das citações e argumentações retro-apresentadas, qual seria a postura dela exigível, no quadro dos processos revolucionários do proletariado, em face das instituições mais típicas e inseparáveis do Parlamentarismo Burguês, tal como aquela consubstanciadora da concepção jurídico-burguesa de Assembléia Nacional Constituinte.

 

 

CAPÍTULO III

I GUERRA MUNDIAL

DO CAPITALISMO IMPERIALISTA

E A PAZ CIVIL 

 

 

“Sobem os dividendos e caem os proletários.”

 

Com tais palavras Rosa Luxemburg descreveu a I Guerra Mundial[102], iniciada, formalmente, em 28 de julho de 1914, com a declaraçao de guerra da Áustria-Hungria à Sérvia, seguida da declaraçao de guerra da Alemanha à Rússia, em 1 de agosto, e à França, em 3 de agosto.

Nessa conflagraçao mundial, a guerra concorrencial das potências imperialistas deixou de ser travada exclusivamente nos galpoes das empresas, nos mercados mundiais e nos espaços diplomáticos, fundando-se em extorsoes de mais-valia e conquista de esferas de influência : ela passou  a invadir, suplementarmente, os campos militares de batalha, no quadro de uma confrontaçao diretamente sangrenta. 

Nessa medida, a I Guerra Mundial constituiu a conseqüência estritamente lógica da época burguesa-imperialista, que desenvolve a níveis inauditos as forças materiais de destruiçao militarista e a formaçao de trustes empresariais mundiais, visando à conquista da vitória na luta pela repartiçao dos mercados e das colônias: todos esses fenômenos conformadores de efeitos necessariamente decorrentes da sociedade capitalista de classes mais aguçadamente constituída e enebriada pelo veneno nacional-chauvinista.

Todos os elementos característicos da civilizaçao burguesa do século XX encontram-se devidamente espelhados na I Guerra Mundial, de modo que ela pôde configurar a primeira guerra total (totaler Krieg), na qual passou a ser decisiva nao apenas a capacidade estritamente militar, senao ainda a força de produçao econômica de toda a naçao.

Para que essa última alcançasse o nível mais elevado possível, o empreendimento de guerra teve de ser ideologizado, ocultando-se os motivos efetivos da confrontaçao militar, declarando-se a morte nos campos de batalha com um “dever sagrado (heilige Pflicht)”.

Nesse preciso sentido, assinalou Rosa Luxemburg :

 

“A guerra é um assassinato metódico, organizado e gigantesco.

Para um assassinato sistemático, deve-se, porém, criar a respectiva embriaguez, junto a seres humanos que atuam normalmente.

Desde sempre, esse é o método bem fundado dos dirigentes da guerra.

À bestialidade da práxis deve corresponder a bestialidade do pensamento e da consciência : essa última deve preparar e acompanhar a primeira.”[103]

 

Essa embriaguez ideológica, criada pela burguesia imperialista da Alemanha, já antes mesmo de 1914 e intensificada exponencialmente, a partir de agosto de 1914, assumiu a forma do conceito jurídico-político do nacionalismo alemao, decantado, poeticamente, nos célebres versos de Rudolf Herzog e Gerhard Hauptman :

 

“Oh! Tu, Alemanha, agora hás de odiar,

blindada com jazidas :

A cada inimigo, um golpe de baioneta no coraçao !

Nao faças nenhum prisioneiro !

Emudeças a todos, de igual maneira !

Faz do cinto dos países que te circundam um deserto.”[104]

 

Para os trabalhadores e camponeses alemaes, a fraseologia nacionalista nao surgia, naturalmente, como expressao de um lirismo dramático, porém também eles encontravam-se contaminados pelo entusiasmo militarista, devido à doutrina da ”guerra defensiva(Verteidigungskrieg)”, difundida pelos mais expressivos sindicalistas e os mais renomados protagonistas do já degenerado Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD), como também por força da crença de que, enquanto outrora “companheiros sem pátria (vaterlandslose Gesellen)”, viriam a ser considerados, em seu próprio país, após a “comunidade popular das trincheiras (Volksgemeinschaft des Schützengrabens)”, como membros de uma nova naçao vitoriosa na guerra e emancipada dos preconceitos de classe.

Com efeito, grandes massas populares, situadas sob o impacto da conflagraçao mortífera e a dominante orientaçao social-chauvinista do Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD), especulavam com as promessas de ganhos materiais que adviriam da nova Alemanha, convertida no principal poder hegemônico-europeu vitorioso.

Com a eclosao da I Guerra Mundial, transformando-se a II Internacional Socialista em um cadáver mal-cheiroso, o social-reformismo chauvinista adquiriu, na Alemanha, um novo estágio de traiçao do proletariado mundial : postular sistematicamente reformas sociais, valendo-se agora, porém, da tragédia da guerra e de suas injunçoes.         

Em 4 de agosto de 1914, a fraçao do Partido Social-Democrático (SPD) junto ao Parlamento Imperial votou em favor da concessao dos créditos de guerra, exigidos pelo Governo do Império Monárquico Alemao, rompendo, aberta e despudoradamente com toda e qualquer perspectiva de solidariedade internacional proletária.

Nessa primeira votaçao, Karl Liebnecht e uma minoria oposicionista, submetendo-se à disciplina partidária social-democrática, somou-se aos demais deputados de sua fraçao, votando também em favor dos créditos de guerra.    

Em 26 de agosto de 1914, o Imperador Wilhelm II proclamou, entao, de modo categórico e exultante :

 

“Já nao reconheço mais nenhum Partido.

Reconheço apenas alemaes.” 

 

Com essas palavras, foi introduzida, em solo alemao, a doutrina burguesa-imperialista da “Paz Civil (Burgfrieden)”.

Através da aprovaçao dos créditos de guerra, a Social-Democracia Alema (SPD), consagrando, historicamente, sua orientaçao política dominante de linhagem social-chauvinista e de aberta colaboraçao de classes, expressando a prelavência dos princípios lassalleanos em total prejuízo do marxismo-revolucionário, converteu-se em fator sustentador da ordem e do Estado burgueses.     

Os fundamentos doutrinários equacionados por Ferdinand Lassalle, fundidos ao social-reformismo de Eduard Bernstein, haveria de lograr assegurar a renúncia por parte do Partido Social-Democrático (SPD) da perspectiva revolucionária da luta de classes, promovendo sua subjulgaçao aos objetivos da conduçao imperialista da guerra mundial, dado o fato de que a deflagraçao de uma “guerra total(totaler Krieg)” seria virtualmente impossível em face da agüerrida oposiçao das massas trabalhadoras alemas.

Em 1916, a doutrina da “Paz Civil (Burgfrieden)” encontrou, entao, a sua expressao mais bem acabada, em sentido estritamente jurídico-legal, com a promulgaçao da “Lei de Serviço Patriótico Auxiliar (Vaterländisches Hilfsdienstgesetz)”.

Com base nesse instrumento legal, o Comando Supremo das Forças Armadas Alemas, encabeçado por Hindenburg e Ludendorff, lograram obter junto aos principais dirigentes sindicais do Partido Social-Democrático (SPD) seu consentimento para o mais amplo esgotamento das forças da classe trabalhadora, bem como a máxima elevaçao da produçao militarista.

No quadro das tratativas relacionadas com a lei em tela, os dirigentes sociais-democráticos negaram-se, ostensivamente, a opor qualquer resistência às novas obrigaçoes trabalhistas introduzidas e à supressao da liberdade de circulaçao dos trabalhadores, no interior do mercado de trabalhos alemao, preferindo tomar parte dos debates acerca da redaçao desses dispositivos normativos, a fim de alcançarem algumas poucas alteraçoes no texto legislativo final, em particular relativamente à previsao de Juntas Arbitrais (Schlichtungsausschüsse), a serem compostas, paritariamente por empresários e representantes sindicais e presididas por um oficial das forças armadas alemas.

Esse importante instrumento de colaboracionismo de classes, firmado por sindicalistas, empresários e oficiais militares alemaes, veio a desempenhar um importante papel reacionário na Revoluçao Alema de 1918-1919, tal como restará demonstrado.    

Anote-se aqui, apenas de passagem, que a orientaçao original, firmada já em 1875, por ocasiao do congresso de fusao dos Eisenachianos e Lassalleanos, relativa a conformar-se os sindicatos alemaes, enquanto representantes dos interesses econômicos do proletariado alemao, seja como instrumentos de conquistas de reformas sociais relacionadas com a melhoria do nível salarial e condiçoes de trabalho, seja como ferramentas políticas de luta para a supressao do sistema de escravidao assalariada, resultou integralmente eliminada, com a promulgaçao da “Lei de Serviço Patriótico Auxiliar (Vaterländisches Hilfsdienstgesetz)”.

A partir daqui, a confrontaçao existente entre trabalhadores, empresários e governo foi substituída por um complexo mecanismo de trabalho-capital-Estado, no qual os sindicatos deixaram de desempenhar um papel categoricamente definido e claro, do que resultou em passarem a defender, desde entao, os interesses nao mais os interesses dos trabalhadores, mas sim aquele do Estado Burguês e dos trabalhadores.

Os sindicatos alemaes foram, assim, integrados na organizaço da economia de guerra imperialista, na medida em que o capitalismo alemao necessitava de elementos estabilizadores, resultantes do fato de que, superada a perspectiva de uma vitoria militar rápida, exigia a total incorporaçao das forças integrantes da econômica nacional, impedindo-se greves e distúrbios operários.

A burguesia alema e seus dirigentes militares encontravam, assim, no Partido Social-Democrático (SPD) e nos sindicatos sociais-democráticos patrióticos, organismos supostamente capazes de domesticar as massas trabalhadoras potencialmente revolucionárias, sempre que julgassem encontrarem-se à vista as mais ínfimas possibilidades de obter-se concessoes ainda que de secundária importância do capitalismo imperialista alemao.

 

CAPÍTULO IV.

ASCENSO REVOLUCIONÁRIO DE 1918-1919 :

A REORGANIZAÇAO DO MOVIMENTO

DOS TRABALHADORES ALEMAES

E O SURGIMENTO

DE UM GOVERNO APARENTE DOS TRABALHADORES

 

Essa orientaçao consistente na domesticaçao da própria base sindical, visando à obtençao de reformas, tornou-se, gradativamente, irrealista, com o acirrar dos conflitos bélicos.

O discurso sobre a “guerra defensiva” foi progressivamente desmascarado, visto que as conquistas territoriais alemas em face da Rússia Soviética, advindas da Paz de Brest-Litovsk, possuiam um caráter inconfundível.

Ademais disso, a situaçao relativa ao abastecimento de alimentos tornou-se catastrófica e o “campo da honra (Feld der Ehre)”, uma superfície de carnifica de massas.

Nesse contexto, os proletários revolucionários, fundados, porém, na defesa dos direitos e liberdades fundamentais de todos os indivíduos e organizações sociais, entre os quais figuravam Rosa Luxemburg, Karl Liebknecht, Franz Mehring, Clara Zetkin, Leo Jogliches, Julian Marchlevski, ocuparam-se do combate principiológico do reformismo economicista e do centrismo oportunista na Social-Democracia Alemã, levantaram-se contra a ideologia da “guerra defensiva” e do social-chauvinismo, incorporado na tarefa política a defesa do Princípio de Defesa da Pátria(Prinzip der Vaterlandsverteidigung), retomando e defendendo diversas bases fundamentais da teoria intelectual e da prática política proletário-revolucionária internacionalista de Marx e Engels, de modo a inclinararem-se em direção das posições marxistas revolucionárias de Lênin.

Quando em 2 de dezembro de 1914, Karl Liebknecht quebrou a férrea disciplina partidária da Social-Democracia Alemã empenhada desde o início da I Guerra Mundial, em 4 de agosto de 1914, em postular a Aprovação dos Créditos de Guerra(Bewillingung der Kriegskredite) – votando abertamente, enquanto primeiro e único Deputado do Parlamento Imperial Alemao, contra esse projeto social-chauvinista, consagrador da tormenta e do martírio do proletariado europeu e mundial[105].

Nesse ato, Liebknecht revigorou a melhor e mais genuína tradiçao marxista-internacionalista revolucionária dos anos 70 do século XIX, brilhantemente defendida, entao, por August Bebel e Wilhelm Liebknecht, hostil às ambiçoes beligerantes e de rapina do Estado Alemao.

Reagindo à ousada postura revolucionária de Karl Liebknecht, o imperialismo alemao recrutou-o, em 1915, para a prestaçao de serviço militar obrigatório, na qualidade de soldado de armamento (Armierungssoldat), proibindo-lhe de exercer toda e qualquer atividade política, a nao ser aquelas relacionadas com suas atividades institucionais-parlamentares.

Com base em seus posicionamentos resolutos, Liebknecht abriu o caminho para a fundação de um novo organismo marxista-revolucionário em solo alemão[106].

Esse novo agrupamento de proletários revolucionários haveria de surgir, inicialmente, sob a bandeira do Gruppe Internationale(Grupo Internacional), que, desde logo, em razão de seu órgão político, denominado Spartakusbriefe(As Cartas de Spartakus), passou a ser denominado de Spartakusbund(Liga Spartakus).

No 1° de Maio de 1916, Karl Liebknecht conseguiu, até mesmo, comandar uma manifestaçao, na Praça de Postdam, em Berlim, tendo como consignas “Abaixo a Guerra ! Abaixo o Governo !”.       

Desprovido de todos os seus mandatos parlamentares, Karl Liebknecht foi, imediatamente, aprisionado e, em 23 de agosto de 1916, condenado, em segunda instância, pelo Supremo Tribunal da Guerra de Berlim, a quatro anos e um mês de penitenciária.

Tao somente em 23 de outubro de 1918 – após dois anos e dois mêses de reclusao -, foi novamente libertado.

Porém, seu voto de 2 de dezembro contra os créditos de guerra e sua declaraçao de guerra à guerra imperialista, lançada em 1° de maio de 1916, logrou representar, historicamente, o fim da Paz Civil, celebrada entre sindicatos, empresários e as instituiçoes alemaes do Estado.

O agrupamento encabeçado por Luxemburg e Liebknecht, tendo aproximado-se da Esquerda de Zimmerwald, a partir de setembro de 1915, porém não a ela expressamente aderindo, optou por ingressar, então, no primeiro semestre de 1917, no Partido Social-Democrático Independente da Alemanha(USPD), comandado, entao, por Karl Kautsky, Hugo Haase e Eduard Bernstein.

Com efeito, quando a confirmaçao dos Direitos de anexaçao do capitalismo imperalista alemao tornaram-se inconfundíveis, a ala esquerda do Partido Social-Democrático (SPD), encabeçada pelos agora sociais-pacifistas Kautsky, Haase e Bernstein, estando paralisada desde 1914, decidiu-se por romper com a orientaçao e a disciplina partidária dos dirigentes sociais-chauvinistas, reunidos em torno de Ebert, Scheidemann e Noske.

Em março de 1917, fundou-se, na cidade de Gotha, o Partido Social-Democrático Independente (USPD), sob cujo teto foi também se reunir o Grupo Spartakus, dirigido por Rosa Luxemburg e Karl Liebknecht.

Nas empresas, dirigentes de comissoes de fábrica do USPD passaram a assumir importantes posiçoes e atingir um grande auditório.

Em setembro de 1918, entrou em colapso o fronte alemao do oeste, e, em no curso do mês de outro, o fronte alemao do leste : a Alemanha havia sido derrotada na I Guerra Imperialista Mundial[107].

Tendo-se incrementado a resistência das massas contra a baldada conduçao da guerra, seja em particular entre tropas combatentes, como também junto à populaçao trabalhadora, expressando-se na forma de deserçoes e greves, a Direçao Suprema do Exército Alemao viu-se forçada a exigir do Imperador Alemao e do Governo Imperial fossem iniciadas, imediatamente, tratativas para a celebraçao de um armistício.

Esse ato teve como imediata conseqüência a imediata renúncia do Governo do Chanceler Hertling.

Nesse contexto, a orientaçao política da Social-Democracia Alema (SPD) foi a de continuar propagandeando integralmente em favor da concessao de créditos de guerra ao Imperador Alemao e seus generais, com o argumento de que, desse modo, uma paz honrosa poderia ser alcançada, da maneira mais rápida e exitosa.

Ainda em outubro de 1918, a Social-Democracia Alema (SPD) fez publicar as seguintes linhas, em seu órgao jornalístico-partidário central, denominado Vortwärts ! (Avante !), sobre a IX subscriçao dos empréstimos de guerra :

 

“Um grande êxito dos empréstimos de guerra fortalecerá, no interior do país, a credibilidade, e, em face do exterior, elevará nosso respeito, contestando as esperanças dos inimigos acerca de um colapso financeiro da Alemanha, conferirá ao Império os meios para a continuaçao da luta, caso deva ela ser necessária, e, para o caso de celebrar-se a paz, facilitará a transiçao de nossas relaçoes econômicas para bases pacíficas.”[108]   

 

Após a derrubada do Chanceler Hertling, um novo governo da maioria parlamentar formou-se sob a direçao do Príncipe Max von Baden.

Em seu governo, ingressaram, em 3 de Outubro de 1918, nao apenas os representantes do Partidos Nacional-Liberal e do Centro, senao ainda os da Social-Democracia Alema (SPD), em particular os Deputados Philip Scheidemann e Gustav Bauer.

Acerca desse contexto histórico, Paul Fröhlich, renomado dirigente revolucionário marxista-leninista alemao, teve a ocasiao de assinalar :   

 

“A agonia da dominaçao guilhermina havia começado.

Como sempre, em tais casos, a febre de mudança, que assaltou a velha ordem, produziu o pânico.

Ele descarregou-se nas regras mais contraditórias possíveis.

O velho haveria de ser salvo através de reformas.

Um governo “parlamentar” foi criado, em cujo ápice colocou-se o futuro Arquiduque de Baden (segurança da monarquia), a cujos ministros pertencia o Social-Democrata Scheidemann (apaziguamento das massas populares).”[109]   

 

Esse novo governo deveria, entao, assumir a responsabilidade pela formulaçao das justificativas esclarecedoras da derrota do país, dando início à entabulaçao das negociaçoes de paz.

Através dessa tática política, Paul Hindenburg, Erich Ludendorff e o conjunto do Estado-Maior Alemao procuraram subtrair-se a qualquer imputaçao de culpa pela derrota militar.

Agora, nao mais sob a consigna de ”guerra defensiva(Verteidigungskrieg)”, mas sim de “defesa nacional (nationale Verteidigung)” – tendo-se em vista o iminente contexto de derrota militar – haveriam de ser mobilizadas as derradeiras forças do proletariado alemao para a continuaçao dos combates que propiciassem a celebraçao de uma paz honrosa.

A nova política de “defesa nacional (nationale Verteidigung)”, visando à conquista de uma paz honrosa, formulada e defendida por Ludendorff, correpondia, pois, inteiramente, aos anseios dos principais dirigentes da Social-Democracia Alema (SPD), entre eles sobretudo Friedrich Ebert, que, mediante seu social-chauvinismo desbragado, pretendia conquistar pontos decisivos de sustentaçao e simpatia, no seio das forças armadas alemaes, para a sua política social-democrática.

Em análise desse novo contexto, uma das Cartas de Spartakus assinalou o seguinte :

 

“ ... Scheidemann e Bauer, que começam dando um beijo na mao da monarquia alema, terminarao ainda dando hematomas (feijoes azuis) nos trabalhadores alemas, grevistas e manifestantes.

O socialismo de governo, com o seu atual ingresso no governo, coloca-se, enquanto salvador do capitalismo, no caminho da revoluçao proletária vindoura.

A revoluçao proletária caminhará por cima de seus cadáveres.

Seu primeiro chamado, sua primeira etapa deverá ser : Alemanha – República.”[110]     

 

Com efeito, Friedrich Ebert entendia que, mediante a participaçao ativa da Social-Democracia Alema (SPD), no Governo do Príncipe Max von Baden, seria possível impedir-se o desencadeamento de uma revoluçao proletário-socialista, no estilo da Revoluçao Russa de Outubro de 1917, fortalecendo-se as perpectivas de uma saída monárquico-constitucional, democrático-parlamentarista.

Com a instituiçao do parlamentarismo democrático no Império Monárquico Alemao, o objetivo político defendido pela Social-Democracia Alema (SPD) haveria sido atingido, sendo que essa última haveria de opor-se, conseqüentemente, a qualquer tentativa adicional de impulsionar-se uma revoluçao das relaçoes sociais entao existentes.

Em conformidade com isso, a Social-Democracia Alema (SPD) fez publicar a seguinte conclamaçao, em 17 de outubro de 1918 :

 

“Aos homens e às mulheres alemaes !

As relaçoes político-internas do Império Alemao conheceram, em poucos dias, uma profunda transformaçao, cujo significado nao atingiu à consciência ainda dos mais amplos círculos populares.

A Alemanha encontra-se no rumo que vai de um Estado Autoritário a um Estado Popular.

Na Prússia, está assegurado o Direito Eleitoral Igual e, com isso, foi dado o primeiro passo decisivo para o despedaçamento da dominaçao do latifúndio.

Também em todos os outros Estados Federados, agitam-se as massas populares para eliminar os obstáculos que se situam no caminho da livre efetivaçao da autêntica vontade popular.

A vontade do povo, enquanto lei suprema, deverá tornar-se e permanecer sendo, dentro em breve, o motivo principal decisivo para o Governo do Império e  dos Estados Federados.

Lamentavelmente, a situaçao político-externa de nosso país teve de se conformar tao desfavoravelmente para provocar essa transformaçao, em favor da qual a Social-Democracia tem lutado desde há décadas.    

Milhoes de vidas humanas florescentes e bens culturais incomensuráveis teriam sido preservados da destruiçao se o povo alemao, em sua maioria, nao tivesse confiado nos dominadores, mas sim, desde há muito tempo, tomado seus destinos em suas próprias maos.

Agora, a situaçao de nosso país é amargamente séria.

O fronte do sudeste entrou em colapso e, no fronte do oeste, atacam contra nossas tropas os exércitos de massas da Entente que possuem à disposiçao os homens e as forças econômicas de três continentes da terra, com terrível sobrepeso em homens e material.

A Alemanha e o povo alemao encontram-se expostos ao perigo de se tornarem a vítima da ambiçao de conquista dos chauvinistas britânicos-franceses e dos políticos conquistadores.

O que declarámos, no dia 4 de agosto de 1914 : “Na hora do perigo, nao abandonaremos a nossa Pátria.”, vale hoje, em medida fortalecida.

Com uma paz de estupro, da humilhaçao e da violaçao de seus interesses vitais, nao se contentará jamais o povo alemao.

Os trabalhadores dotados de consciência de classe devem rejeitar deixar-se abusar

enquanto bode de ataque da contra-revoluçao e cúmplice dos políticos do poder imperialista, desse e do outro lado do fronte.

Nao é através da provocaçao do caos bolchevique, através do desencadeamento da guerra civil que, além do rio de sangue fluente nos frontes para desgraça vinda ao povo alemao, traria nova desgraça e novos rios de sangue, fazendo crescer apenas a necessidade e a miséria e excitando a gana de conquista de nossos inimigos, nao é através disso que ocorreria a renovaçao interna da Alemanha.

Exclusivamente para preservar nosso país e sua vida econômica do colapso, assumiram os representantes de nosso Partido o sacrífico de ingressar no Governo.

Nessa terrível situaçao, eles assumiram seus ofícios de grande responsabilidade, dotados da aspiraçao de trazer paz e liberdade para o nosso povo.

O Governo ao qual pertencem sociais-democratas deve ser um governo da paz e da conformaçao democrática de nosso país.

Apenas na medida em que o for, nele permanecerao os sociais-democratas.

Visando a finalizar as horripilantes mortandades, o novo Governo propôs, da maneira mais rápida possível, um armistício, declarando-se disposto a concluir uma paz de Direito e de confraternizaçao dos povos, tal como o Partido Social-Democrático a aspirou, desde o início da guerra.

Também a parlamentarizaçao e democratizaçao de nosso país foram assumidas, de modo enérgico.           

O Partido Social-Democrático coloca-se, com todas as forças, em favor de que a transformaçao político-interna necessária ocorra de modo rápido e integral.

Quanto mais rapida e decididamente colocarem-se as grandes massas populares atrás desse Partido, tanto mais rapidamente alcançara ele seu objetivo, tanto mais facilmente superará ele as forças que se colocam no caminho, de modo impeditivo e obstaculizador.

Os poderes obscuros da contra-revoluçao já se agitam contra essa revoluçao pacífica.

Aqueles políticos de interesses e de conquista, conservadores pan-germânicos da indústria pesada, aqueles chauvinistas demagogos e visionários que, apoiados pelos milhoes dos lucradores com a guerra de todos os gêneros e estimulados pela camarilha militar irresponsável, que envolveu, desde ano e dia, o povo alemao em uma nuvem de fumaça artificial cheia de mentiras e engôdos, com cartazes coloridos, asquerosos, enganadores e frases nacionalistas de vitória das assembléias do Partido da Pátria e seus escritos, tal como em uma imprensa complacente, todos aqueles culpados que conduziram o povo alemao à pior situaçao, escalam, agora, depois de que seu castelo de cartas desabou, à cumeeira da sem-vergonhice, caindo em cima do povo como piolhos diante dos olhos : eles tentam direcionar a insatisfaçao do povo contra o novo Governo ... “[111]   

 

Na medida, porém, em que cresciam o número de vítimas no quadro da I Guerra Mundial e prolongava-se, indefinidamente, a conflagraçao bélica, tornando-se, cada vez mais, difícil disfarçar a carnificina humana como constituindo, agora, uma forma de “defesa nacional (nationale Verteidigung)” comportou-se a classe trabalhadora alema, progressivamente, de maneira mais hostil em relaçao às batalhas de campo.

A Social-Democracia Alema (SPD) percebera apenas muito lentamente essa mudança de postura dos trabalhadores e, ainda mais lentamente, relocalizou sua posiçao política em face do novo contexto, de tal sorte que o abismo existente entre a política oficial, defendida pela direçao social-democrática, tornou-se tao grande a ponto de conduzir, inevitavelmente, a uma ruptura verificada em grande parte do movimento dos trabalhadores, crescentemente insatisfeito como estado de coisas da época.

A seguir, em 23 de outubro de 1918, no quadro de uma anistia geral concedida a presos políticos, Karl Liebknecht foi libertado de sua reclusao carcerária, sendo recebido entusiasticamente pelas massas trabalhadoras alemaes.

Juntamente com Rosa Luxemburg, Liebknecht assumiu, entao, a direçao da Liga Spartakus, contribuindo para a ediçao de seu novo órgao jornalístico, Rote Fahne (Bandeira Vermelha).

Nesse contexto, de intenso ascenso revolucionário, foi-se tornando inevitável a rejeiçao pela Liga Spartakus de toda e qualquer colaboraçao político-partidária nao apenas com a Social-Democracia Alema (SPD), de Ebert e Scheidemann, senao ainda com o Partido Social-Democrático Independente (USPD), de Kautsky e Bernstein, em face do qual tornou-se inadiável uma ruptura pela esquerda.[112]  

Em 4 de novembro de 1918, eclodiu a revoluçao das massas alemas.

Seu prelúdio foi o Levante dos Marinheiros de Kiel que se negaram, ainda no último minuto, a acatar ordens para zarpar e atacar as forças armadas britânicas.

Em Kiel, surgiu, nesse quadro, o primeiro Conselho de Trabalhadores e Soldados, que fez com que a onda revolucionária se espraiasse dessa cidade para as outras grandes cidades do resto da Alemanha, tais como Berlim, Frankfurt a.M., Bremen etc.

Pelo contrário, nas localidades do interior do país, onde a Social-Democracia Alema (SPD) possuía mais pleno controle do movimento de massas, logrou ela impedir que o mesmo fenômeno de surgimento de Conselho de Trabalhadores e Soldados pudesse ser verificado[113].

Em observaçao a esse episódio lendário, escreveu o historiador alemao Evelyn Anderson :

 

“A Revoluçao Alema nao foi uma obra de qualquer uma das organizaçoes tradicionais da classe trabalhadora alema.

Nao foi nem obra dos Partidos ou grupos socialistas, como nao o foi dos sindicatos.

Até mesmo os dirigentes revolucionários que tinham antecipado, em sua própria organizaçao, algo similar, tal como os conselhos de trabalhadores (desempenhando um papel dirigente no Comitê Executivo de Berlim do Conselho de Trabalhadores e Soldados), tornaram-se tao somente ativos depois de que a revoluçao já havia estourado em outras localidades.”[114]        

 

Logo a seguir, em 9 de novembro de 1918, irrompeu a greve geral na cidade de Berlim.

Trabalhadores e soldados armados dominaram as ruas, de modo ameaçador.

Tal movimento provocou o colapso definitivo do Império Monárquico Alemao.

O Chanceler do Império, Princípe Max von Banden, tranferiu seu cargo, entao, oficialmente, para Friedrich Ebert, o Presidente da Social-Democracia Alema (SPD), naquele contexto.

Acerca do tema, assinalou o renomado biógrafo de Rosa Luxemburg, Peter Nettl :

 

“Imediatamente, ambos os Partidos Socialistas empreenderam negociaçoes acerca da formaçao do governo.

O SPD ofereceu, generosamente, composiçao paritária do gabinete.

Em troca, os Independentes (obs.: o USPD) retiraram, “a fim de consolidar as conquistas socialistas revolucionárias”, quase todas as consignas radicais contra as quais embatia-se o SPD.

Agora que o grande dia havia chegado, os dirigentes sentiam um impulso para a unidade.

O novo governo do Império designou a si mesmo “Conselho dos Comissários do Povo”, compondo-se, respectivamente, de três representantes do SPD e outros três do USPD.”[115]

 

Nesse mesmo dia 9 de novembro de 1918, Karl Liebknecht proclamou, da sacada do Castelo de Berlim, a fundaçao da “República Socialista Livre da Alemanha”.

Há duas horas antes do mesmo dia, porém, Philipp Scheidemann havia instituído, no Parlamento Imperial Alemao, desde uma perspectiva notoriamente burguesa-imperialista, a “República Livre Alema”.[116]

No dia seguinte, em 10 de novembro de 1918, reuniu-se, no Circo Busch, a Assembléia Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados de Berlim e deu vida, mediante eleiçao, a um Conselho Executivo que, enquanto órgao supremo de representaçao dos conselhos, haveria de funcionar até a convocaçao de um Congresso dos Conselhos do Império.

Suas funçoes nao foram, porém, claramente, definidas.

Nada obstante, o resultado mais relevante dessa Assembléia Geral foi o de haver optado pelo reconhecimento do Conselho dos Comissários do Povo, composto por três membros da Social-Democracia Alema(SPD)Ebert, Scheidemann e Landsberg – e três membros do Partido Social-Democrático Independente(USPD) – Haase, Dittman e Barth -, enquanto Governo Provisório da Alemanha, confirmando, pois, sua existência e atribuiçoes.

A natureza política mais relevante desse Conselho dos Comissários do Povo, formados pelos principais representantes políticos do SPD e do USPD, foi a de constituir-se em um Governo Aparente dos Trabalhadores, i.e. de um Governo Social-Democrático dos Trabalhadores[117].

Nessa ocasiao, os dirigentes do SPD e do USPD exigiram que Karl Liebknecht ingressasse, igualmente, nesse Governo Provisório da Alemanha, sustentado pela Assembléia Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados de Berlim e por seu Conselho Executivo.

Na agitaçao demagógica do do SPD e do USPD todos os estratagemas desempenhavam um papel decisivo, sendo que, tornadas urgentes as negociaçoes de paz, o nome de Liebknecht, consagrando o novo Governo Provisório, adquiria uma extraordinária dimensao. 

Karl Liebknecht, em sua intervençao oral nessa Assembléia Geral, discursou de modo a desmarcar, implacavelmente, a política nitidamente traidora desses dois Partidos sociais-democráticos referidos.

A seguir, rechaçou a idéia de ingressar em um governo, integrado por sociais-chauvinistas.

Visando a convencer os trabalhadores e soldados reunidos no Circo Busch de que um governo comum com a direçao do SPD e do USPD representaria exclusivamente o apoio da contra-revoluçao, Liebknecht justificou seu repúdio, formulando, desafiadoramente, uma série de reivindicaçoes, cujo atendimento conduziria à própria consolidaçao da revoluçao proletário-socialista na Alemanha.  

A mais importante delas enunciava a condiçao de que a Alemanha haveria de se converter em uma República Socialista, com todos os poderes institucionais, o Poder Executivo, o Poder Legislativo e o Poder Judiciário, concentrados exclusivamente nas maos dos organismos dos trabalhadores e soldados, i.e. nas maos da Assembléia Geral dos Conselhos e do Conselho Executivo dos Trabalhadores e Soldados de Berlim.    

Como se os dirigentes do SPD e do USPD do novo Governo Provisório em processo de constituiçao rejeitassem tal proposta, resultou fora de questao para Karl Liebknecht o ingresso em um tal governo.

Nessa Assembléia Geral, Karl Liebnecht ainda admoestou, em alto e bom tom : “A contra-revoluçao encontra-se no meio de vocês !”[118]

Na formaçao desse Governo Social-Democrático dos Trabalhadores, funçao de primeira importância foi desempenhada pelo dirigente do USPD e principal doutrinador da II Internacional Socialita, Karl Kautsky.

Com efeito, Kautsky cumpriu efetiva posiçao de estadista político no seio desse governo, demonstrando sua conivência com e sua participaçao efetivamente minoritária em um governo de colaboracao de classes.

Isso veio a claramente invalidar sua posiçao político-histórica, defendida ainda em sua renomada obra Der Weg zur Macht (O Caminho para o Poder), de 1909, em que frizava, de modo aparentemente principista, deve ser condenada toda e qualquer participaçao minoritária ou majoritária dos marxistas em um governo de coalizao, em virtude de o proletariado dever sempre exigir de um governo em que seu próprio partido esteja representando a assistência dos órgaos do Estado nas suas lutas contra o capital[119].   

Tal posicionamento envelhecido de Kautsky situou-se, efetivamente, apenas no meio do sendeiro político percorrido por ele, rumo à mais plena deformaçao do marxismo-revolucionário.

Em face do ascenso revolucionário dos anos de 1918 e 1919, Kautsky viria nao apenas a defender a participaçao em governos de coalizao marcado pela colaboracao de classes (i.e. um governo do USPD e do SPD), senao ainda tornar-se ele mesmo Secretário de Estado do Ministério do Exterior da Alemanha, em um dos piores momentos da contra-revolução em defesa do capital na Alemanha, precisamente nos dias em que se tratava de esmagar os lutadores comandados por Liebknecht e Luxemburg.

Sobre a participaçao de Kautsky nesse governo de coalizao, pode-se ler até mesmo em um interessante estudo histórico da ediçao Nr. 68 de “Der Spiegel”, de 1968, o seguinte :

 

“Apesar de a funçao do Conselho Executivo dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados residia, preponderantemente, no controle do Conselho dos Comissários do Povo, a concretizaçao dessa tarefa permaneceu em acordos existentes entre ambos esses grêmios.

De fato, o poder situava-se, porém, nas maos da Social-Democracia.

Contra a vontade do USPD, o Conselho dos Comissários do Povo continuou a cooperar com os secretários de Estado imperiais, com os juízes, com o aparato de administraçao transmitido e com os militares ...

« Tratava-se de », soava a divisa que proclamou o Dr. Jakov Reichert, dirigente de negócios da Uniao dos Industriais Alemaes do Ferro e do Aço, « saber como preservar também o empresariado da socializaçao ameaçadora, que varreria todos os domínios da economia ».

Para desarticular as preocupaçoes do USPD e do Conselho Executivo, foram nomeados dois assessores para cada ministro (um do USPD e outro do SPD), que, porém, ou por falta de conhecimentos específicos de sua funçao de controle nao podiam agir ou por habilidade dos ministros eram manipulados.

Assim, o Chefe do Ministério do Exterior, Sr. Solf, ordenou ao Assessor do USPD, Karl Kautsky, outrora um dos proeminentes teóricos do SPD, devesse ele tomar conhecimento de “peças processuais que nao toleravam nenhuma procrastinaçao... apenas depois de seu decurso”.

O Assessor do Ministério da Guerra Prussiana, Paul Göhre, foi acusado por seus próprios companheiros de se comportar, simplesmente, como uma « máquina de vistar papéis ».”[120]

 

Porém, também seria possível entrever-se Kautsky participando também ativamente da Comissao de Sozializaçao (SK) que, a requerimento do Comissário do Povo, Hugo Hasse (USPD), foi instituida em 18 de novembro de 1918 e reunida, em 5 de dezembro de 1918, pela primeira vez, na Rua Bunsen, de Berlim.

Acerca do tema, o conhecido historiador berlinense, Manfred Behrend escreve, adequadamente, o seguinte :

 

“ A direçao governamental « puramente socialista» poderia editar decretos, com força de lei, para, com o apoio dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados, impulsionar o processo de socializaçao.

Nada fez, porém, nesse sentido. ...

A composiçao (obs.: dessa comissao) era adequada para isso.

Em verdade, nao se logrou, em razao de um veto do USPD – tal como planejara o SPD – conduzir-se à nomeaçao na comissao de Walther Rathenau, um senhor dirigente monopolista, o Presidente da Sociedade Geral de Eletricidade, proprietário de cerca de 100 cadeiras do conselho administrativo e dirigente de longa data da Divisao da Matérias-Primas de Guerra junto ao Ministério da Guerra Prussiano.   

Porém, pertenciam a ela, ao lado do Dr. Theodor M. Vogelstein, da Sociedade Auer, antigo diretor da Metais de Guerra S.A. e, mais tarde, banqueiro, ao lado do socialista de cátedra, Prof. Ernst Francke e o Professor Docente, Dr. Emil Lederer, também o editor do jornal teórico social-democrático “Die Neue Zeit(O Novo Tempo)”, Heinrich Cunow, e o Presidente da Associaçao dos Trabalhadores Mineiros, Otto Hué, igualmente um adversário da socializaçao, que, igualmente, defendia o acordo de solidariedade de trabalho das associaçoes empresarias e dos sindicatos, voltado para a conciliaçao de classes e salvaçao da dominaçao burguesa, acordo esse datado de 15 de novembro de 1918.

A ala esquerda da Comissao de Socializaçao (SK) – se assim se quer – era composta pelos Professores Carl Ballod e Robert Wilbrandt, pelo ideólogo do USPD, Karl Kautsky e por Rudolf Hilferding, Chefe Redator da “Freiheit(Liberdade)”.”[121]

 

No contexto daqueles anos de intenso ascenso revolucionário, foi-se tornando, por isso, inevitável a rejeiçao pela Liga Spartakus de toda e qualquer colaboraçao político-partidária nao apenas com a Social-Democracia Alema (SPD), de Ebert e Scheidemann, senao ainda com o Partido Social-Democrático Independente (USPD), de Haase, Kautsky e Bernstein, em face do qual tornou-se inadiável uma ruptura pela esquerda.

Anote-se que, em verdade, ainda em 24 de dezembro de 1918, Kautsky seguia integrando o Governo Aparente dos Trabalhadores, de Ebert e Scheidemann, contribuindo para o fomento do dualismo contemporizador-colaboracionista entre as forças do capital e do trabalho.

De colossal importância para o desenrolar da Revoluçao Alema de 1918-1919 veio a representar, imediatamente a seguir, porém, os trabalhos do  I Congresso dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados do Império, o qual teve lugar, a seguir, entre os dias 16 e 20 de dezembro de 1918. 

Particularmente, sobre esse tema estarei tratando no próximo capítulo.

 

CAPÍTULO V.

O CONGRESSO GERAL

DOS CONSELHOS DE TRABALHADORES

E SOLDADOS :

 

ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE

OU

IMPULSÃO DOS

ÓRGAOS DE PODER PROLETÁRIO

 

Os eventos de 6 de dezembro de 1918 demonstraram, claramente, as concepçoes de Friedrich Ebert e Otto Wels, ordenaradores de disparos contra os trabalhadores.

Em 10 de dezembro, retornaram à grande cidade as primeiras unidades das tropas berlinenses do fronte.

Porém, ainda resultava ser muito cedo para desferir-se o grande golpe contra-revolucionário.

De início, seria necessário esperar-se pelo I Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha.

Esse congresso reuniu-se, entao, de 16 a 21 de dezembro de 1918, na Câmara dos Deputados da Prússia, situada na Rua Prinz Albrecht, hoje Rua Niederkirchner, sob a presidência de Richard Müller, renomado dirigente do Partido Social-Democrático Independente (USPD).

Nas manifestaçoes de rua que acompanharam e guarneceram os debates desse importante congresso de trabalhadores e soldados, as massas populares alemas marchavam, por todos os lados da cidade de Berlim, portando faixas que, a exemplo da Revoluçao de Outubro de 1917, postulavam “Todo Poder aos Conselhos ! (Alle Macht den Räten !).”

Por diversas vezes, o congresso foi interrompido por representantes e delegados de base dos trabalhadores e soldados que protestavam, ininterruptamente, nas imediaçoes, exigindo a ”Proclamaçao da República Socialista(Ausrufung der sozialistischen Republik)” e a ”Passagem de Todo Poder aos Conselhos der Trabalhadores e Soldados (Übergabe aller Macht an die Arbeiter- und Soldatenräte !)”.[122]    

Inesperadamente, ingressaram, no salao de assembléia, 30 soldados, portando sua bandeira de regimento, e cercaram a tribuna.

O soldado Felchner tomou, entao, a palavra, em nome dos Conselhos de Soldados de Berlim e reinvindicou a aprovaçao das seguintes medidas :

 

“1.O Conselho Supremo de Soldados, composto pelos delegados eleitos por todos os Conselhos de Soldados, assumirá o comando de todas as tropas e da marinha ;

2. Todas as insígnas hierárquicas ficarao abolidas ;

3. Todos os oficiais serao desarmados.”

 

A seguir, Felchner agregou :

 

“Essas medidas entram em vigor tão logo ocorrer a entrega de armas, nas casernas das tropas regressadas.

Os Conselhos de Soldados sao responsáveis pela lealdade e disciplina das tropas.”[123]  

 

Tais postulaçoes apresentadas por Felchner sao, com efeito, típicas à orientaçao geral das organizaçoes de soldados que pululavam por todo o Império Alemao, nos últimos meses de outubro de 1918, logo após a derrota sofrida por esse último nos campos de batalha.

Nesse mesmo sentido, o reconhecidamente moderado Conselho de Soldados de Hamburg apoiavam, em essência, o conjunto das posiçoes de Felchner, dele divergindo, porém, quanto à proibiçao de portar-se insígnas hierárquicas.

No desenrolar dos trabalhos congressuais, porém, a questao central que consumiu, desde o início, os debates dos delegados presentes foi a disjuntiva : Assembléia Nacional Constituinte ou República dos Conselhos.

Paralelamente, polemizou-se acerca da temática : estabilizaçao das velhas estruturas sociais ou conformaçao revolucionária do sistema social.

Os aspectos fundamentais desses últimos debates resultavam claro, provavelmente, apenas para a ínfima minoria dos representantes dirigentes dos delegados, sendo que a abordagem acerca do acolhimento ou repúdio da consigna de Assembléia Nacional Constituinte demonstrava-se para a grande massa dos delegados presentes ser muito mais apenas expressao de sua mais íntima e espontânea persuasao política do momento em causa do que da efetiva compreensao e aplicaçao da concepçao e prática do marxismo revolucionário.

Os delegados foram eleitos em clima de grande confusao, sem procedimento eleitoral regular, sem tese-guia[124].

Cada delegado era eleito na proporçao de 200.000 trabalhadores e soldados, tendo como base o resultado de cálculo da populaçao alema de 1910.

Nessas condiçoes, foram eleitos 489 delegados trabalhadores e soldados, sendo 405 deles oriundos dos Conselhos de Trabalhadores e 84 deles, dos Conselhos de Soldados[125].

Desses, 288 eram adeptos do Partido Social-Democrático (SPD) – sendo 164 deles profissionais do Partido -, 90 do Partido Social-Democrático Independente (USPD) – dos quais 31 profissionais do Partido -, 11 eram ligados a Heinrich Laufenberg e denominavam-se revolucionários unidos, sendo que 10 eram membros da Liga Spartakus, dirigida por Rosa Luxemburg e Karl Liebknecht.

Além disso, 25 delegados eram adeptos do Partido Democrático Alemao (DDP), de orientaçao social-liberal, sendo que os 65 restantes nao possuiam organizaçao partidária (tal como diversos delegados dos soldados).

No que tange a origem social dos delegados em causa, anote-se que 195 deles haviam sido eleitos pelos organismos de partidos e de sindicatos, 71 eram intelectuais, 84 militares ativos das forças armadas alemas, 139 eram trabalhores diretamente eleitos pela base[126].

Desde logo, esse I Congresso negou-se, pereptoriamente, a permitir que Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg obtivessem um mandato e participassem ativamente dos debates.

 

“Nem Liebknecht nem Luxemburg receberam mandatos.

O USPD foi dirigido por Richard Müller, Däumig e Lebedour.

A Liga Spartakus, por Leviné e Heckert.

Uma grande manifestaçao, organizada pela Liga Spartakus e pelos dirigentes saudaram o Congresso.

Porém, logo esse último decepcionou os militantes de esquerda.

Por 344 votos a 98, foi rejeitado o requerimento de Däumig que clamava pela convocaçao de um novo Congresso de Conselhos.

Por 400 votos a 50, o Congresso declarou-se em favor da Assembléia Nacional, fixando a data das eleiçoes para 19 de janeiro.”[127]  

 

O dirigente mais representativo que interviu nesse congresso em prol da consigna de Assembléia Nacional Constituinte foi, inquestionavelmente, o líder do Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD), Max Cohen.

Em sua intervençao do período da manha de 19 de dezembro, Max Cohen exprimiu-se da seguinte forma acerca do tema :

 

“Karl Marx concebeu o desenvolvimento de modo que as forças produtivas cresceriam gradativamente a uma tal intensidade na qual essas forças de produçao, monstruosamente expandidas, fariam saltar os limites capitalistas.

Asimm, em decorrência do gigantesco crescimento das forças produtivas, a maioria do povo viria a compor-se de proletários.

Nesse contexto, Karl Marx afirmou : entao, soaria a hora da expropriaçao dos expropriadores, entao, o socialismo substituiria o capitalismo e, entao, o proletariado, tornado maioria no povo, assumiria a Ditadura, no período de transiçao.”[128]

 

Seguramente, as alusoes de Max Cohen às posiçoes políticas de Karl Marx resultavam fundamentalmente equivocadas e negligenciavam, ostensivamente, as novas oportunidades revolucionárias, abertas com a Revoluçao Alema de 1918-1919.

Fiel à sua visao nitidamente social-reformista, reprodutora das ilusoes burguesas-constitucionais, assinalou, adicionalmente, Max Cohen :

 

“A socializaçao é um processo orgânico de desenvolvimento e de reconformaçao, no qual novas formas econômicas existirao ao lado de formas futuras e também de velhas formas.

Porém, caso nao se estimule esse processo de desenvolvimento do modo mais cuidadoso, a catástrofe será inevitável ...

Se a produçao paralisar-se – tal como entre nós ocorre – se nao resultarem disponíveis nem matérias-primas nem fábricas, o que se deverá, entao, propriamente socializar ?

Nessas condiçoes, o repentino socializar significa uma loucura desabrida, posto que, nesse quadro, nao existe absolutamente nada a ser socializado.”[129]      

      

Nas palavras de Max Cohen, expressavam-se, notoriamente, a orientaçao lassaleana-reformista de que apenas quando o proletariado viesse a adquirir a maioria parlamentar, poder-se-ia refletir acerca de medidas de socializaçao.

Para que o socialismo se convertesse em realidade fático-social, seria de exigir-se ainda, segundo Cohen, a verificaçao de um segundo pressuposto : as relaçoes econômicas haveriam de tornar-se, objetivamente, tao maduras ao ponto de que uma transiçao orgânica do capitalismo para o socialismo pudesse ser produzida sem grandes abalos econômicos e políticos.

Nisso, revelava-se a trágica cegueira dos reformistas e revisionistas sociais-democratas em face da realidade, existente entao na Alemanha, os quais, desde antes mesmo de 1914, levantavam a exigência de afirmar-se contra os principais teóricos marxistas-revolucionários das crises sistêmicas a perspectiva de desenvolvimento gradativo e exponencial do capitalismo, despregado de modo pretensamente isento de crises, como forma de transitar-se, pacificamente e sem grandes comoçoes sociais, ao socialismo.  

A partir desse ponto de vista, formou-se a concepçao, defendida por Max Cohen e pelos mais célebres dirigentes do Partido Social-Democrático da Alemanha  (SPD),  de que o socialismo haveria de ser conquistado nao mais através da mais impiedosa luta de classes revolucionária, fundada na crise econômica e político-estatal do sistema capitalista, mas sim atingido mediante a tomada pacífica do poder político, viabilizada pelos mecanismos parlamentares.

De outro lado, cumpriu ao dirigente do Partido Social-Democrático Independente (USPD), Ernst Däumig, enquanto defensor da República dos Conselhos[130], rebater os posicionamentos sustentados por Max Cohen.

Com efeito, Däumig clamou, ao dirigir-se aos delegados da classe trabalhadora alema, presentes por ocasiao do congresso em destaque :

 

“Companheiros e Camaradas !

Poucos momentos atrás, quando o companheiro Cohen de modo tao candente defendeu a Assembléia Nacional e posiciou-se em favor de uma data fixada brevemente para sua convocaçao, vocês aplaudiram, em parte, entusiasticamente.

Porém, com isso, vocês declararam, indubitavelmente, a sua própria sentença de morte ...

O que deverá fazer esse Sistema de Conselhos ao lado de um Sistema Burguês Democrático-Parlamentar, tao amplamente assentado, tal como há de decorrer da Assembléia Nacional, uma vez instituída !    

Uma armaçao vazia, uma marionete !

Na vida econômica, os sindicatos de velho estilo e, naturalmente, os Conselhos de Trabalhadores serao expulsos das fábricas, de modo inteiramente rápido, contando ainda com o auxílio da Assembléia Nacional e da burguesia. ...

Porém, eu lhes digo : todas as suas ilusoes em relaçao a uma nova Alemanha livre, livre também em sentido cultural e espiritual, ilusoes em relaçao a um povo alemao que lançou para longe de si esse velho espírito de vassalagem, cravado, ainda hoje, muito profundamente, no fundo do povo alemao, ilusoes em relaçao a uma Alemanha na qual o povo também assuma também uma parte realmente ativa em seus destinos – e nao corra, a cada dois anos ou três anos, com uma cédula eleitoral na mao, rumo às urnas eleitorais – vocês nao obterao com esse velho sistema.”[131]         

 

Essa intervençao de Ernst Däumig resultou, entretanto, derrotada.

Após esses debates, o congresso em causa fracionou-se profundamente, apesar das discussoes turvas e obscuras levadas adiante, já antes mesmo que o congresso se iniciasse, no quadro das diversas organizaçoes partidárias e sindicais.

Por um lado, os representantes da Social-Democracia Alema (SPD) afirmam defender o socialismo e ser ele efetivamente necessário para a Alemanha, de modo a poder conquistar a confiança de uma larga base dos delegados presentes, por outro lado, sustentavam ser o socialismo, no momento histórico em andamento, plenamente irrealizável, devido ao caos econômico decorrente das destruiçoes provocadas pela I Guerra Mundial.

Além disso, as ponderaçoes e as dúvidas surgidas junto a alguns delegados sociais-democratas acerca do curso essencialmente parlamentar de seu próprio Partido foram superadas, em regra, pela perversa propaganda social-democrática, repleta de referências ameaçadoras ao “exemplo caótico” fornecido, entao, pela Rússia Soviética.    

Em verdade, as revoluçoes russas haviam sempre possuido uma grande repercussao no movimento dos trabalhadores alemaes, encontrando sempre seus grandes defensores em Rosa Luxemburg e Karl Liebknecht.

A Revoluçao de 1905 influenciou, decisivamente, o debate sobre as greves de massas.

Em verdade, desde esse ano, Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg passaram a protagonizar, intelectual e praticamente, a fraçao de extrema esquerda da Social-Democracia Alema (SPD), difundindo, integralmente, os métodos de luta dinamizados pelos trabalhadores oprimidos da Revoluçao de 1905, na Rússia, propagando a necessidade do impulsionamento de greves de massas e greves gerais, bem como de uma específica campanha antimilitarista, visando à derrubada da exploraçao e da dominaçao do imperialismo capitalista alemao[132].

Em 1912, a posiçao antimilitarista radical de Karl Liebknecht tornara-se internacionalmente renomada, constituindo-se como eixo diferenciador em face do antimilitarismo anarquista e semi-anarquista, postulados por Gustave Hervé, Ferdinand Domela Nieuwenhuis, Henriette Roland-Host e outros.

A Revoluçao de Fevereiro de 1917 estimulou o movimento alemao anti-militarista e republicano.

A Revoluçao de Outubro de 1917 proporcionou aos revolucionários alemaes nova orientaçao e impulso.

Para Rosa Luxemburg, esse último evento consistiu no fato mais poderoso, produzido pela conflagraçao bélica mundial :

 

“Na Rússia, o problema pode apenas ser colocado, nao podendo ser aí resolvido.

Tal problema pode ser resolvido apenas em nível internacional.

E, nesse sentido, o futuro pertence, por todos os lados, ao bolchevismo.”[133]

 

A partir da Revoluçao de Outubro de 1917, cresceu junto a Rosa Luxemburg e Karl Liebknecht o compromisso de impulsionar a revoluçao proletária alema, precisamente tendo em conta o fato de que o isolamento da Rússia Soviética haveria de conduzir à sua inevitável degenaraçao e fracasso.

Diversamente comportavam-se os sociais-democratas e Karl Kautsky, que condenavam, asperamente, os supostos absurdos e dificuldades decorrentes do ”Movimentismo Revolucionário Russo”. 

Nesse preciso sentido, Max Cohen contestou aos posicionamentos de Ernst Däumig, por ocasiao do I Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha, enfatizando, prazerosamente, as dificuldades de abastecimento, conhecidas durante o primeiro ano do Comunismo de Guerra, impulsionado pelo Estado Russo-Soviético :

 

“Nao se pode introduzir o socialismo precisamente através da violência e decretos.

Isso foi-nos demonstrado pelo exemplo russo.”[134]

 

Esse contexto de manobras, intrigas, ambiçoes e disputas pessoais permitiu que os principais dirigetens da Social-Democracia Alema (SPD), comandados nos bastidores por Friedrich Ebert e Philipp Scheidemann, obtivessem as melhores posiçoes, efetivamente alcançavel devido ao fato de que imperava grande indefiniçao nas fileiras dos mais variados partidos e sindicados do congresso em tela, inclusive do próprio SPD.

Para os dirigentes da Social-Democracia Alema (SPD) e para alguns renomados dirigentes do Partido Social-Democrático Independente (USPD), o ressentimento anti-russo do período anterior à I Guerra Mundial conformou-se na nova ideologia anti-comunista, em cujo quadro deixaram de ser formuladas análises objetivas acerca dos problemas da Revoluçao de Outubro.

A essa circunstância agregava-se a deficiência entao existente de informaçoes confiáveis, o que concedia amplo espaço para que pudesse ser desenvolvida uma densa propaganda socia-democrática contra-revolucionária dirigida contra os bolcheviques e o governo de Lênin.   

Em vista da maioria social-democrática, verificada no I Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha, defensora da consigna de Assembléia Nacional Constituinte, nao puderam se impor os defensores da República dos Conselhos.

Em verdade, os delegados da maioria colocaram-se nao apenas em favor da consigna de Assembléia Nacional Constituinte, senao ainda em prol da fixaçao de uma mais breve data para a realizaçao das eleiçoes em tela, i.e. o dia 19 de Janeiro de 1919, ao invés do anteriormente programado 16 de março de 1919.

Ademais, conferiu-se ao Conselho dos Comissários do Povo o exercício dos Poderes Legislativo e Executivo e a um Conselho Central da República Socialista da Alemanha, eleito no congresso enquanto sucessor do temporário Conselho Executivo, a funçao de “supervisao parlamentar” das atividades do Conselho dos Comissários do Povo e do Governo Prussiano.

Na medida em que o Partido Social-Democrático Independente (USPD) negou-se a participar do recém-instaurado Conselho Central, todos os 27 membros integrantes desse novo órgao vieram a ser representantes do Partido Social-Democrático (SPD), denominados à época os “mamelucos de Friedrich Ebert (Eberts Mamelucken).”[135]

O mais expressivo contraste a essas ilusoes constitucionais, acolhidas pelo I Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha, revelou-se no grande acolhimento dos delegados presentes da luta contra a organizaçao burguesa-imperial das forças armadas alemas.

Fundando-se nos “7 Pontos de Hamburg”, o congresso em referência decidiu-se em favor da constituiçao de Forças Armadas Democráticas.

Nesse sentido, o novo regime de funcionamento das corporaçoes militares haveriam de ser o seguinte :

 

1.    o Conselho Central haveria de exercer o poder de comando sobre o exército, a marinha e as tropas de defesa (Ponto Nr. 1) ;

2.    as qualificaçoes hierárquicas e o porte extraordinário de armamentos haveriam de ser suprimidos (Ponto Nr. 2) ;

3.    os Conselhos de Trabalhadores estariam incumbidos da manutençao da disciplina (Ponto Nr. 3) :

4.    bem como, incumbidos do afastamento de oficiais linha-dura, com o que se haveria de assegurar “distúrbios” (Ponto Nr. 4) ;

5.    a eleiçao de dirigentes das forças armadas haveria de ser realizada pelos soldados (Ponto Nr. 5) ;

6.    aprovaçao da admissao de oficiais em ofícios militares administrativos e hierárquicos, tendo em conta a concretizaçao do objetivo de desmobilizaçao e o critério de lealdade dos oficiais militares em face do processo revolucionário em curso (Ponto Nr. 6).   

7.    supressao das forças armadas regulares e a instituiçao de forças armadas populares (Ponto Nr. 7)[136].

 

De toda sorte, essas últimas exigências nao eram aceitáveis para o oficialato burguês alemao, sendo que os principais representantes do Partido Social-Democrático (SPD),   Friedrich Ebert e Philipp Scheidemann, eram disso plenamente conscientes e apressaram-se por assegurar ao Supremo Comandante das Forças Armadas em Exercício, General Groener, que essas resoluçoes permaneceriam sendo palavras vazias, na medida em que o I Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha haveria de ser considerado apenas sob o ponto de vista tático de contençao das forças revolucionárias, sem qualquer vinculaçao política efetiva.

Sua insistência sobre a preservaçao dos princípios basilares jurídico-burgueses de Assembléia Nacional Constituinte e República Democrática Parlamentar, enquanto pressupostos de toda e qualquer política de conformaçao social, significava, precisamente, que Ebert, Scheidemann, Noske e seus seguidores manobravam, segundo os interesses do colaboracionismo de classes, procurando submeter e domesticar os órgaos de expressao da vontade proletária de massas da Alemanha de 1918 : o Congresso dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados, o Conselho dos Comissários do Povo, o Conselho Executivo ou o Conselho Central, furtando-se, muitas vezes, ao dever de efetiva prestaçao de contas aos órgaos revolucionários de controle de suas negociaçoes entabuladas com a Direçao Suprema do Exército.

Ebert lutava, desesperadamente, pela preservaçao da estrutura das velhas forças armadas imperiais alemas, pretendo-as converter apenas em forças armadas republicanas em plena harmonia com as forças armadas proletárias, em espírito de colaboraboracionismo, conciliacionismo, e, nesse sentido, alegava pretender apenas depositar grande importância na manutençao das divisoes de defesa das fronteiras do país.

Nessa esteira de raciocínio, Ebert argumentou, despudoradamente, diante do I Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha em referência :

 

“Existiu um tempo em que nossas fronteiras polonesas em particular estiveram em perigo em razao dos ataques de tropas irregulares, vândalos etc.

Estávamos obrigados a tudo realizar no interesse de nosso povo abalado, a fim de que protegê-lo na direçao do Leste ...

No que diz respeito agora ao Oeste, recebemos, no domingo, da Suprema Direçao do Exército a proposta de que se deve criar uma proteçao aqui, diante da zona neutra desocupada, sendo que, para isso, deve ser organizada uma certa tropa.

Houve também, simultaneamente, propostas acerca de como conectar essas novas tropas com aquelas tropas de segurança dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados.

Solicitamos, de início, determinadas informaçoes junto à Suprema Direçao do Exército ...

Essa é a situaçao concreta, apresentada calma e objetivamente.

É, pois, justo que o colega Barth (obs.: trata-se aqui de Emil Barth) desfira ataques contra isso ?”[137]    

 

Solidários e compromissados com o militarismo burguês-imperialista alemao, Ebert, Scheidemann e Noske seguiam dando ouvidos e amedrontavam-se com as palavras do Marechal Imperial de Campo, Paul Hinderburg, quando afirmava :

 

“Nao reconheço a resoluçao acerca do poder de comando dos oficiais, redigida pelo Congresso dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados.

Para o exército, permancem válidos os acordos firmados com o governo Ebert.

Apenas se esse último mantiver suas declaraçoes precedentes ..., permanecerá tudo como antes no exército.”[138]    

 

Nada obstante, a Revoluçao Alema de 1918-1919 tinha-se desenvolvido muito diversamente em relaçao ao que conceberam os “realistas” sociais-reformistas.

As contradiçoes da acumulaçao capitalista conduzira ao imperialismo capitalista e esse último à I Guerra Mundial, evento político-militar de monstruosa aniquilaçao de riquezas econômicas, humanas e materiais, a partir de cuja base o socialismo poderia, de fato, inicialmente, começar a ser introduzido, caso se lograsse destruir, integralmente, o velho aparato de Estado Burguês-Imperialista e erigir-se a Ditadura Revolucionária do Proletariado, incorporadora da mais avançada e historicamente superior democracia dos trabalhadores, materializada politicamente no Governo dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha.    

Ao invés de nao permitir permanecerem existindo as reminescências capitalistas decaídas, o Sisyphus social-democrático de 1918 tratou de defendê-lo e empurrá-lo, novamente, com sangue e suor, para o “ápice do desenvolvimento”.

Por força das resoluçoes do I Congresso dos Conselhos dos Trabalhadores e Soldados, realizado de 16 a 21 de dezembro de 1918, a impulsão da Revoluçao Alema de 1918-1919 haveria de se tornar extraordinariamente mais dificultosa, precisamente porque, com a decisao em favor da consigna de Assembléia Constituinte, fortaleceu-se a concepçao constitucional, ilusória e fantasiosa, de que apenas um Parlamento livremente eleito estaria legitimado para a efetuaçao de intervençoes mais amplas do Estado nas relaçoes sócio-econômicas, ainda que se acoplasse aos Conselhos de Trabalhadores e Soldados.

Os grupos marxistas-revolucionários que se esforçavam por acelerar o processo de transformaçoes sociais viram-se, após a ocorrência do congresso em tela, expostos à dificuldade adicional de serem, falsificadamente, considerados como suspeitos de putchismo e de desconsiderarem, em absoluto, a vontade formalmente expressada pela maioria do proletariado alemao, em uma palavra : de serem “bolcheviques”.

Por outro lado, os resultados extraídos do I Congresso dos Conselhos dos Trabalhadores e Soldados, realizado de 16 a 21 de dezembro de 1918, estimulou, consideravelmente, a presença das tropas contra-revolucionárias em e nas imediaçoes de Berlim, no curso de dezembro de 1918 e nos primeiros meses de 1919.

Particularmente depois dos trabalhos congressuais, Ebert nao se sentiu vinculado a qualquer representaçao dos trabalhadores e soldados no desenrolar de seu plano sigiloso de colaboraçao com os dirigentes das forças armadas alemas.

Logo após o fim desse congresso, começou-se a executar os planos militares traçados pelo Estado-Maior dos Generais Groener e Hindenburg, consistente em eliminar, decisivamente, os principais representantes da revoluçao proletária alema.

O que nao havia sido plenamente conseguido com os eventos de 6 de dezembro de 1918, pode ser expressivamente conseguido no quadro do I Congresso dos Conselhos dos Trabalhadores e Soldados, celebrado de 16 a 21 de dezembro de 1918 : em 23 de dezembro, Ebert solicitou ao General von Lequis, comandante da guarniçao de Brandenburgo, marchar sobre a cidade de Berlim e ocupá-la militarmente.

Essa solicitaçao haveria de cumular-se à decisao de dissoluçao da Divisao de Marinha Popular.

Com efeito, essa divisao havia-se convertido no símbolo mais expressivo daqueles meses, sendo que contou, de início, com cerca de 6.000 marinheiros rebelados, até que, posteriormente, diversos milhares de marinheiros e soldados a ela se filiaram.

Desde a Revolta de Kiel, pairava sobre a Divisao de Marinha Popular uma verdadeira auréola de glória revolucionária.

Durante os primeiros dias de outubro de 1918, haviam os membros dessa tropa ocupado, provisoriamente, o bairro do antigo Castelo Imperial.

Sem aderir forlmamente a qualquer organizaçao partidária da época, a Divisao de Marinha Popular colocara-se à disposiçao de Ebert, sendo que esse último procurou se livrar dessas forças indesejáveis, tao logo quanto fosse possível.

Após diversos choques e embates violentos, os marinheiros haviam levantado sua pretensao ao recebimento regular de soldo militar.

Em 23 de dezembro, a divisao em causa ocupou, por algumas horas, a Chancelaria do Império e o Departamento de Telégrafos, visando a protestar contra o nao pagamento de seus soldos.

Emil Barth, delegado de polícia de Berlim e representante do Partido Social-Democrático Independente (USPD), conseguiu, entao, que os marinheiros levantassem sua ocupaçao dos prédios públicos, sob a promessa de que negociaria, pessoalmente, com o governo de Ebert e Scheidemann.

Entrementes, interviu o General von Lequis, bombardeando pesadamente o bairro do antigo Castelo Imperial, porém, uma vez que resistisse, bravamente, a Divisao de Marinha Popular, agora na regiao do Marstall, Ebert e seus seguidores foram forçados a reconhecer o Direito de permanência dos marinheiros nessa localidade, desde que fosse firmado o compromisso de essa divisao de rebelados cessar com seus recrutamentos de novos combatentes.

Quando as notícias sobre a resistência encarnecida da Divisao de Marinha Popular chegou ao conhecimento da Direçao Suprema do Exército abateu-se sobre essa última um profundo desânimo e um marcado abatimento[139].

O militarismo burguês-imperialista alemao pretendeu, a partir de entao, romper, definitivamente, com os principais representantes do conciliacionismo de classes de entao, Ebert e Scheidemann.

Porém, a resposta de Ebert ao Estado-Maior Alemao, incorporado na figura do General Groener, foi inequívoca :

 

“Saiba o Sr. De uma coisa : agora, eu vou-me embora.

Vou deitar-me por três dias. Tenho urgente necessidade disso.

Vou sumir totalmente da Chancelaria do Império e vou dormir.

Providenciarei para que todos os demais senhores partam também, nesses dias.

Só porteiro vai ficar.

Se o grupo de Liebknecht aproveitar agora a oportunidade de puxar o Governo para o seu lado, niguém estará por aqui.

Nao sendo encontrado nada, ele fará um golpe de vento.

Entao, depois de alguns dias, em algum outro lugar, talvez em Potsdam, estaremos em condiçoes de abrir nosso Governo novamente.”[140]      

 

Diante desse contexto, estavam lançados alguns dos  pressupostos fundamentais para a eclosao da Greve Geral de Janeiro de 1919, que viria a ser encabeçada pelo USPD, pelos sindicalistas independentes revolucionários (revolutionäre Obleute) e Karl Liebkencht.

A despeito disso, resulta inteiramente surpreendente, à primeira vista, os motivos e as razoes pelas quais, ao reunir-se o II Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha, em 15 de abril de 1919, também na cidade de Berlim, já não possuir esse órgão de poder proletário qualquer maior significado palpável, tendo em vista que, no período intermediário entre janeiro e abril de 1919, inúmeros dirigentes revolucionários de fábricas haviam sido exterminados ou aprisionados, no quadro da Guerra Civil da Alemanha, despregada durante esses meses[141].

Finalmente, em 23 de agosto de 1919,o Ministro do Interior da Social-Democracia Alemã, Gustav Noske, mandou confiscar o Bureau do Conselho dos Trabalhadores e Soldados da Grande Berlim[142].    

 

CAPÍTULO VI.

A FUNDAÇAO DO PARTIDO COMUNISTA DA ALEMANHA (KPD) SOB O SIGNO DA ASCENSÃO DE KARL RADEK :

DIFERENÇAS DE MATIZES POLÍTICOS ENTRE LIEBKNECHT E LUXEMBURG NO QUADRO DA GREVE GERAL DE 1919

 

Nos dias 29 e 30 de dezembro de 1918, reuniu-se, na Sala de Festas da Câmara dos Deputados de Berlim, o Congresso de Fundação do Partido Comunista da Alemanha(KPD – Liga Spartakus).

Em uma sessão fechada, ocorrida nas vésperas, a Liga Spartakus posicionara-se apenas com três votos contra a saída do Partido Social-Democrático Independente(USPD), resolvendo-se em prol da fundação de um partido próprio.

A esse projeto associou-se também o grupo dos Radicais de Brêmen, denominado Comunistas Internacionais da Alemanha, encabeçado por Paul Fröhlich e Johan Knief, redatores do jornal Arbeiterpolitik(Política dos Trabalhadores).

Esse último agrupamento encontrava-se, em verdade, muito mais próximo do Partido Bolchevique de Lênin do que a Liga Spartakus, à época ainda dirigida pela orientação política de Rosa Luxemburg, apesar da grande simpatia que Karl Liebknecht, Clara Zetkin e Franz Mehring, desde a Revolução de Outubro de 1917, nutriram pelo bolchevismo.

Um terceiro grupo de pequena dimensão, encabeçado por Julian Borchard, denominado Socialistas Internacionais da Alemanha, igualmente próximos ao bolchevismo, já não possuiam praticamente qualquer significado existencial à época do Congresso de Fundação.

Acerca do tema, Hermann Weber assinalou o seguinte, destacando a influência de Karl Radek sobre o movimento marxista-revolucionário alemão dessa época :

 

“No interior da esquerda radical alemã formou-se, durante a guerra três grupos.

O mais expressivo (e propriamente precursor do PCA(KPD)) foi o Grupo Internacional(p. 11). ...

O segundo grupo radical, os radicais de esquerda de Brêmen, posicionavam-se muito mais próximos do que a Liga Spartakus.

Além de seu centro em Brêmen, possuíam pontos de sustentação, no norte, na Saxônia e no Reno.

Sob a direção de Johann Knief e Paul Fröhlich, editavam o Arbeiterpolitik(Política dos Trabalhadores), um semanário legal, e concordavam com a Liga Spartakus nas questões fundamentais.

Colaboradores de Arbeiterpolitik(Política dos Trabalhadores) eram também os dirigentes bolcheviques Lênin, Radek, Zinoviev e Bronski(p. 12).

O representante do grupo, Paul Fröhlich, aderiu, em Kienthal, à Esqueda de Zimmerwald (leninista) – diferentemente dos representantes da Liga Spartakus.

Plenamente no sentido leninista, os radicais de esquerda de Brêmen também não entraram no USPD, mas sim lutaram pela fundação de uma partido próprio da esquerda radical.

Esse grupo chamava-se, desde 1918, “Comunistas Internacionais da Alemanha”.

Um terceiro grupo da radical de esquerda situava-se, sob a direção de Julian Borchardt, um grande amigo de Radek, igualmente bem próximo dos bolcheviques.

Esses “Socialistas Internacionais da Alemanha”, como seu órgão “Lichtstrahlen(O Brilho da Luz)” não possuíam, entretanto, nenhuma influência sobre as massas digna de menção.

O próprio Borchadt já havia aderido, na Primeira Conferência de Zimmerwald, a todas as teses leninistas e recusou-se, também, a ingressar no USPD.

A influência de Karl Radek, que já havia atuado na Alemanha antes da guerra,  foi decisiva para o posicionamento pró-leninista de ambos os grupos mencionados por último.

Apesar de todas as reservas de Rosa Luxemburg, a Liga Spartakus fez, a todo tempo, propaganda para os bolcheviques, após a Revolução Russa, pois essa liga situava-se, fundamentalmente, sobre o terreno da Revolução de Outubro(p.13).”[143]

  

No Congresso Fundacional do Partido Comunista da Alemanha(KPD – Liga Spartakus) tomaram parte 100 participantes, dentro os quais 83 delegados eleitos por de 43 localidades.

Na ordem do dia, apresentavam informes Karl Liebknecht, acerca da crise do USPD, Paul Levi, sobre a Assembléia Nacional da República, Rosa Luxemburg, discorrendo sobre o programa e situação política, Hugo Eberlein, sobre a organização do partido, Paul Lange, acerca das lutas econômicas e Hermann Dubcker, tratando das conferências internacionais.

Wilhelm Pieck e Jacob Walcher foram indicados para a Presidência do Congresso.

No quadro de uma missão clandestina em Berlim, Radek veio a tomar parte, em dezembro de 1918, do Congresso de Fundação do Partido Comunista da Alemanha(KPD – Liga Spartakus), sendo que contribui, ativamente, para o aceleramento da decisão fundacional[144].

Com grande entusiasmo, o Congresso Fundacional saudou Karl Radek, que interviu na qualidade de representante do Governo Revolucionário Bolchevique, provocando tempestuosos aplausos.

Radek assinalou, nessa oportunidade, que o novo PCA(KPD) surgiria como um partido débil, porém não mais débil do que o Partido Bolchevique, em abril de 1917.

 

“Para o vosso Congresso, olhamos com grande esperança(p. 18).

Não como se a Revolução Russa se permitisse a ser copiada ...

O caminho da classe trabalhadora será distinto em cada um dos diferentes países(p.31).”[145]    

 

Em seu discurso proferido nesse Congresso Fundacional é plenamente possível identificar-se argumentos sibilinos de Radek no sentido de que um processo revolucionário do proletariado alemão já não se apresentava como iminente, apesar de a revolução mundial caminhar a passos rápidos. Com efeito :

 

“Nada mais provoca um tal entusiasmo junto aos trabalhadores russos do que quando lhe dizemos que o tempo poderá vir em que os trabalhadores alemães serão chamados para ajudá-los e em que vocês terão de lutar com eles no Vale do Ruhr, tal como eles, de nosso lado, nos Urais.

Estamos convencidos de que a revolução mundial virá em passo acelerado, que é mentira ser o bolchevismo a enfermidade dos povos vencidos.

Isso significaria que a classe trabalhadora das nações vitoriosas teria de permanecer escrava para sempre.

Estamos convencidos que a guerra civil internacional libertar-nos-á da luta entre os povos.

Porém, ninguém pode calcular a dinâmica de desenvolvimento.”[146] 

 

Desvendando praticamente o significado enigmático de seu discurso retro-mencionado, Radek opôs-se, logo no mês seguinte, à iniciativa de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg de apoiar a Greve Geral de Janeiro de 1919, com ocupação de prédios (Vorwärts – órgão do SPD -, Diário de Berlim, os conglomerados mediáticos Scherl, Ullstein e Mosse, a Tipografia  Büxenstein e o Escritório de Telégrafo Wolff) e armamento das massas, objetivando à recondução de Emil Eichhorn ao cargo de Presidente do Comissariado de Polícia de Berlim, qualificando-a de putschismo blanquista, por supostamente pretender derrubar imediatamente o Governo de Ebert, Scheidemann e Noske, sustentado pelos Generais Groener, Lequis e von Lüttwitz, destruindo, de um golpe, o Estado Burguês Alemão e edificando uma República Socialista Livre dos Conselhos dos Trabalhadores, mesmo contando com a minoria da classe trabalhadora.

Com efeito, nos primeiros dias desse novo ano, foram os sociais-democratas independentes Bretscheid, Rosenfeld e Hoffman, excluídos, sumariamente, do Governo Imperial Prussiano, comandado pela Social-Democracia Alemã.

Juntamente com esse ato de exclusão, Emil Eichhorn, Presidente da Polícia de Berlim, igualmente adepto dos independentes, foi imediatamente deposto.

Logo a seguir, o Partido Social-Democrático Independente(USPD) e os principais dirigentes do PCA(KPD) conclamaram os trabalhadores berlinenses a mobilizaram-se e deflagarem greve.

Dos protestos operários surgiram embates armados que, embora desaconselhados pelos principais dirigentes do PCA(KPD), não vieram a ser por eles resolutamente condenados e desconvocados. 

Acerca desse evento histórico, Radek assinalou, então, com base em sua acusação de putschismo dirigida não apenas contra Karl Liebknecht, senão também contra Rosa Luxemburg :

 

“Em sua Brochura de Programa “O Que Quer a Liga Spartakus ?”, vocês declaram quererem apenas assumir o governo se tiverem atrás de si a maioria da classe trabalhadora.

Esse ponto de vista inteiramente correto encontra sua fundamentação no simples fato de que o Governo dos Trabalhadores sem organização de massas do proletariado é inconcebível. ...

Nessa situação, não se pode pensar absolutamente na tomada do poder pelo proletariado. Se ele caisse nas mãos de vocês, mediante um golpe de Estado, tal governo seria estrangulado e esmagado em alguns dias a partir da província. ...  

A única força de freio que pode impedir essa infelicidade são vocês, o Partido Comunista. Vocês possuem suficientemente visão para saber que a luta não tem perspectiva. Que vocês sabem disso, já me disseram os vossos membros, os companheiros Levi e Dunckers ...

Nada impede o mais fraco de recuar diante de poder superior.

Detivemos, em julho de 1917, as massas com todas as forças, apesar de sermos então mais fortes do que vocês e, onde isso não foi possível, retiramo-las, mediante intervenção abusiva, de uma batalha vindoura sem perspectiva.”[147]

 

A seguir, Karl Radek procurou formular suas acusações de putchismo contra Karl Liebknecht da seguinte forma, mesmo já diante da impossibilidade desse último  esclarecer suas decisões político-revolucionárias[148] :

 

“O Distúrbio de Janeiro foi, sem dúvida, um putsch, uma tentativa de atropelar a burguesia.

A desculpa – não das massas que não precisam se desculpar, pois elas no início da revolução tinham de estar confusas, mas sim a desculpa de dirigentes, como Lebedour e Liebknecht – reside em que o poder da burguesia era ainda extraordinariamente débil, que ela provocava diretamente para um assalto.”[149] 

 

Comentando as posições políticas de Karl Radek, transmitidas apressuradamente a seus mais diversos simpatizantes por meio de cartas, Alfons Paquet, um dos mais renomados poetas alemães, permeado nitidamente pelo espírito democráta-burguês, assinalou acerca da missiva de Radek, que lhe havia sido endereçada em 20 de março de 1919 :

 

“Radek acentuou mais uma vez que, tal como todos os outros, ele esteve contra os Putsches de Janeiro(nos quais ele não desempenhou nenhum papel), pois, segundo ele, “a conquista do poder político é apenas possível, de nosso ponto de vista, se temos a maioria da classe trabalhadora atrás de nós. Isso não tínhamos em janeiro e ainda hoje não o temos.” ...

Recordo-me bem das conversações em Moscou e das declarações da Radek acerca do caráter da Guerra Civil na Alemanha.

Com coração constrito, também eu era da opinião que, na Alemanha, podia-se chegar tão longe a ponto de que regimentos de trabalhadores industriais e regimentos das ligas rurais se entregassem a combates de uns contra os outros. ...

Ao mesmo tempo, em oposição às expectativas sangüinárias produzidas em Moscou, no outono de 1918 e, particularmente, no quadro da irrupção da Revolução Alemã,  também eu era da opinião que a dinâmica da revolução na Alemanha não poderia nem ser acelerada nem atrasada desde fora, sem colocá-la ao máximo em perigo. ...

É possível que também Radek tenha estado contra o ataque, porém vejo nos lutadores implacáveis o precursor natural de uma tática russa não apenas nervosa como também brutal.

Rejeito-a, tal como repudio toda violência e vingança em geral, sendo que não gostaria de ver substituído um militarismo por um outro.”[150]

 

Impactado pela brutal repressão da Greve Geral de Janeiro de 1919, em que os Freikorps ceifaram, sumariamente, as vidas de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg, bem como impressionado pelo Fevereiro da Covardia, em que Leo Jogiches foi assassinado pelas costas sob o pretexto que pretendia escapar de sua prisão, Karl Radek, pretendendo preencher, logo a seguir, o vazio de direção que se produzira no seio do recém-nascido Partido Comunista da Alemanha(KPD), passou a intervir, literariamente, nas discussões sindicais alemães, já mesmo do verão de 1919, quando ainda encontrava-se na prisão de Moabit, em Berlim, gozando de tratamento privilegiado decorrente de seu status de diplomata soviético ucraniano.  

Tendo sido preso em fevereiro de 1919, Radek gozou do benefício de um tratamento privilegiado, por ser considerado pelas autoridades militares alemães como um representante do Estado Soviético Russo.

A partir da prisão de Moabit, Radek logrou tomar parte ativa na reconformação do Partido Comunista da Alemanha(KPD) recentemente decapitado, postulando-se como o melhor especialista bolchevique em matérias concernentes à luta de classes na Alemanha, em um momento inicial em que inexistia um contato direto, regular e orgânico entre os organismos dirigentes revolucionários da URSS e da Alemanha.

Contando com o beneplácito dos Generais Alemães Staff e Ludendorff, de grandes empresários e políticos, como Felix Deutsch e Walther Rathenau, que decidiram poupar-lhe a vida a fim de utilizá-lo como contato entre os interesses do capitalismo alemão e o jovem governo revolucionário de Lênin, Radek entrevistava-se não apenas com esses representantes do imperialismo da Alemanha, senão ainda instruía, em sua vasta e agradável cela de prisão, os principais dirigentes do comunismo alemão, tais como Paul Levi, August Thalheimer e Ruth Fischer.[151]

Desfrutando de sua qualidade de membro do Comitê Central do PC da URSS e, ao mesmo tempo, de representante do Estado Soviético Russo em uma missão militar e diplomática junto ao Governo Alemão, e, posteriormente, como membro da Presidência do Komintern, ainda que sem exerçer permanentemente as funções de membro do Politburo da PC da URSS, Radek logrou desempenhar um papel de primeiríssima relevância para a definição da nova orientação política a ser observada pelo Partido Comunista da Alemanha(KPD) no ínicio dos anos 20.

Acerca do tema, Trotsky forneceu, precisamente, as seguintes valiosas observações :

 

“Por um certo tempo, Radek foi membro do Comitê Central e, nessa condição, possuiu o Direito de estar presente nas sessões do Politburo.

Por iniciativa de Lênin, as questões sigilosas eram examinadas invariavelmente na ausência de Radek.

Lênin considerava Radek como jornalista, porém, ao mesmo tempo, não suportava sua impulsividade, seu comportamento risível em face de questões sérias, seu cinismo.

É necessário referir aqui a apreciação de Radek, fornecida por Lênin, no VII Congresso do Partido(em 1918), à época das divergências sobre a Paz de Brest-Litovsk.

Por ocasião das palavras de Radek : “Lênin abandona a sala, a fim de ganhar tempo”.

Lênin observou : “- Dirijo-me ao camarada Radek e, aqui, quero registrar que ele consegue dizer, por acaso, uma frase séria.” ... 

E depois, novamente : “Dessa vez, resultou que se recebeu do camarada Radek uma frase inteiramente séria.”

Essas observações repetidas por duas vezes expressam a própria essência da relação para com Radek não apenas por parte do próprio Lênin, senão ainda de seus colaboradores mais próximos.”[152]

 

Quando Radek foi liberado de sua detenção, no fim de 1919, tornou-se Secretário Executivo da Internacional Comunista, de cuja função veio a ser, posteriormente, afastado por defender, no caso do tratamento do Partido Comunista dos Trabalhadores Alemães(KAPD), a orientação política de Paul Levi e do Partido Comunista da Alemanha(KPD), contra o PC da URSS, comandado por Lênin.

É certo que as limitações intelectuais, a típica abordagem jornalística das questões políticas, bem como o método de apreciação impressionista de Karl Radek, eram já bastante conhecidas por Lênin, Sverdlov e Trotsky.  

Ainda que as caracterizações formuladas pelo Politburo da PC da URSS acerca da luta de classe na Alemanha não viessem a se fundar preponderantemente nos relatórios e informes a ele fornecido por Radek, sendo que muitas vezes as propostas desse último não eram aceitas ou substancialmente modificadas, era notório o fato de que Radek lograva, paulatinamente, construir-se como um dos mais importantes dirigentes dos comunistas alemães do início dos anos 20.

Todos os principais dirigentes bolcheviques de então velavam por suas conexões com grupos de comunistas estrangeiros.

Lênin e Zinoviev eram, particularmente, interessados pela Alemanha.

Trotsky era um dos principais especialistas do Politburo da PC da URSS e do Komintern para questões relacionadas com a luta de classes da França e da Espanha.

Rykov, Bucharin e Zinoviev dedicavam-se, além disso, às questões italianas.

A predisposição de Radek em envolver-se nas questões relativas à construção do Partido Comunista da Alemanha(KPD) e dedicar-se à análise da dinâmica da luta de classes revolucionárias da Alemanha, situada no quadro de sua pretensão de ingressar em um importante Politburo a fim de desempenhar um papel de primeira importância na definição dos planos partidários mais decisivos, fazia com que Radek fosse considerado, no início dos anos 20, o membro do Comitê Central do PC da URSS mais profundamente conhecedor do movimento revolucionário da Alemanha e mais bem informado de todos os detalhes da vida política comunista e contra-revolucionária desse país.

Com efeito, fundado na experiência de sua militância na Social-Democracia Alemã, entre os anos de 1908 e 1913, esse último ano em que foi expulso de suas fileiras no quadro de um processo escandaloso, orquestrado por Rosa Luxemburg e Leo Jogiches desde a Social-Democracia Polonesa, Radek voltou a intensificar suas viagens à Alemanha, entre os anos de 1918 e 1921.

Como saldo dessa atividade, resultou que conhecia centenas de militantes alemães pessoalmente, inúmeras cidades e províncias, bem como dispunha do saber relacionado com a elaboração de diversos documentos partidários muito condizentes com a realidade político-institucional desse país.

Aliado desde 1908 com os agrupamentos sociais-democráticos de August Thalheimer, de Göppingen, e de Anton Pannekoek, de Brêmen, Radek possuía, além disso, um núcleo militantes alemães sempre dispostos a fazer publicar suas concepções políticas acerca da dinâmica da revolução socialista internacional, seja nas colunas do Freie Volkszeitung(Gazeta Livre do Povo), de Thalheimer, seja nas páginas do Arbeiterpolitik(Política dos Trabalhadores), de Pannekoek, seja ainda na editora comunista Carl Hoym, de Hamburg.          

Muitos dos trabalhos de Radek, produzidos diretamente em língua alemã, no início dos anos 20, haviam se convertido em manuais para a militância, sendo estudados intensamente e tomados como orientação verdadeiramente bolchevique, em sua direta aplicação na realidade objetiva da luta de classes da Alemanha, como o que adquiriam mais relevância do que os textos produzidos pelos dirigentes alemães de então, como Paul Levi, August Thalheimer, Clara Zetkin, Jacob Walcher, Wilhelm Pieck e Heinrich Brandler.

Depois da morte da velha direção revolucionária alemã de Karl Liebknecht,  Rosa Luxemburg e Leo Jogiches, apesar de suas expressivas diferenças políticas com esses últimos e, no caso de Luxemburg e Jogiches, apesar de suas marcadas disputas pessoais de intrigas e perseguições, Radek conseguiu atrair para sua influência a grande maioria dos dirigentes alemães sobreviventes.  

Todos os principais dirigentes do Partido Comunista da Alemanha(KPD)  passaram, em fins de 1919 e início dos anos 20, a sustentar a direção política de Karl Radek, considerado como o mais legítimo representante do bolchevismo leninista em solo alemão.

Nada obstante, a orientação política de Radek, formulada segundo sua metodologia e concepção próprias, primava, constantemente, por uma tonalidade pessimística, hesitante e cética acerca da possibilidade de desenvolvimento das lutas revolucionárias na Alemanha e, nesse sentido, da capacidade de construção politicamente independente do Partido Comunista da Alemanha(KPD).

Em um primeiro momento, Radek ligou-se, intensamente, a Paul Levi, que assumiu a função de Presidente do PCA(KPD) desde os mêses subseqüentes a morte de Liebknecht e Luxemburg, ocorrida em janeiro de 1919, até fevereiro de 1921, pretendendo persuadí-lo acerca da necessidade de conquistar as massas para a revolução proletária socialista alemã, renunciar às tendências esquerdistas de Liebknecht e seus admiradores, trabalhar mais intensamente nos sindicatos e prestigiar grandiosamente as tribunas eleitorais e parlamentares.        

Já no início de outubro de 1919, em uma sua famosa carta ao II Congresso de Heidelberg e Mannheim, do Partido Comunista da Alemanha(KPD), Radek pronunciava-se da seguinte forma :

 

“Porém, se é uma ilusão oportunista procurar tranqüilamente por vitórias, então é uma ilusão revolucionária pensar em um ascenso linear, em um avanço ininterrupto da revolução.

A revolução mundial é um processo muito lento, durante o qual existirá mais do que uma derrota.

Com efeito, não tenho dúvida de que em todos os países (obs. Por consegüinte também na  Rússia Soviética !), o proletariado será forçado a, por diversas vezes, construir sua ditadura e vê-la desabar, até que vença definitivamente.”[153]   

 

Além disso, em sua renomadíssima broschura, redigida especialmente para o congresso em destaque, denominada O Desenvolvimento da Revolução Alemã e as Tarefas do Partido Comunista, Radek assinalou, expressamente, após destacar que o “Distúrbio de Janeiro” havia sido, sem dúvida, um Putsch, i.e. um Golpe de Estado, ou ainda “uma tentativa de atropelar a burguesia” :

 

“Entendemos que o Partido Comunista pode fazer como ponto de partida de sua política a perspectiva de uma próxima onda ascendente da revolução, de um alargamento da revolução mundial. ... 

Não existe a menor dúvida para nós que a burguesia não será capaz de estabilizar sua dominação, por isso rejeitamos a adaptação oportunista ao período de empantanamento.

Porém, é muito provável que a luta revolucionária de massas pela Ditadura Proletária requeira muito tempo.

É preciso investigar os motivos disso, bem como as questões de tática na luta econômica e política que daí decorrem.

A investigação da mecânica dessa luta dará, por si mesmo, a resposta às nossas controvérsias táticas.”[154] 

 

Em sentido lógico-político, Radek estava, já em 1919, profundamente convencido de que, durante um longo período, o Partido Comunista da Alemanha(KPD) não mais poderia fazer senão organizar a vanguarda de lutadores proletários e impulsionar atividades de propaganda, impedindo confrontações das massas sublevadas contra o poder do Estado Burguês Alemão.

Quando essa sua orientação manifestamente cético-pessimística reavivou a defesa de posições abertamente oportunistas por Paul Levi, discípulo inseparavelmente fiel à doutrina teórico-política e partidário-organizativa de Rosa Luxemburg, Radek lançou mão de apreciações entusiasticamente combativas, fundadas nas posições bolcheviques de Lênin e Trotsky, para polemizar contra Paul Levi acerca do caráter, sentido e significado  das Revoluções Bávara e Húngara, de 1919.

Isso não impediu, entretanto, que Radek e Levi continuassem compartindo a direção do Partido Comunista da Alemanha(KPD) e já em seu balanço histórico acerca dos anos de 1918 e 1919, Radek formulou a seguinte caracterização, formulada em seu discurso proferido junto ao III Congresso Mundial do Komintern, entre 22 de junho e 12 de julho de 1921, sugido  sob o título “O Caminho da Internacional Comunista” :

 

“Em 1918-1919, o partido consistia de diversos milhares de trabalhadores, sendo que a Liga Spartakus tinha o papel de segurar a classe trabalhadora e evitar choques desnecessários.”[155]

 

De maneira cético-jornalística, Radek procurou, em suas publicações e discursos do início dos primeiros anos do anos 20, fundar sua orientação política central para o desenvolvimento das lutas revolucionárias de classes na Alemanha, consistente em demonstrar a impossibilidade de desenvolverem-se as forças do Partido Comunista da Alemanha(KPD) no campo das lutas, dos embates e dos conflitos abertos de classes contra as instituições de exploração e dominação do Estado Burguês, conquistando crescentemente a confiança da classe trabalhadora, hegemônica sobre todas demais massas socialmente oprimidas sob sua direção social e política.

Com efeito, no fundamento de seu marcado tom pessimista, Radek admitia abertamente a possibilidade de a Ditadura Revolucionária do Proletariado, instaurada pela Rússia Soviética, não ser capaz de resistir à ofensiva do capitalismo imperialista mundial.

Em função dessa premissa originária, competiria ao Partido Comunista da Alemanha(KPD), dedicando-se preponderantemente a atividades propagandísticas, atrelar-se, mediado por críticas e denúncias, à dinâmica de luta da Social-Democracia Alemã, como forma de, através de cooperação, infiltração, desintegração e reconsolidação,  arrebatar-lhe a influência sobre as grandes massas proletárias alemães.

Dessa forma, a minoria comunista revolucionária haveria de ser educada de maneira a poder intervir sobre a maioria dos quadros da Social-Democracia, sob pena de permanecer inteiramente isolado no quadro dos eventos políticos subseqüentes.

As atividades dos comunistas haveriam, assim, segundo Radek, de concentrarem-se em uma luta propagandista de defesa do socialismo revolucionário e da Rússia Soviética.

Nesse contexto, os diversos eventos da luta de classes mundial surgiam interpretados como expressões cabais e confirmatórias dessa abordagem hesitante e pessimista, sendo que a proposta de Radek de luta comum do Partido Comunista da Alemanha(KPD) com o Partido Social-Democrático Alemão(SPD) e as organizações sindicais situadas sob sua órbita de influência, haveria de ser enfocada e compreendida nos termos daquele seu enfoque fundamental, permeado de críticas e denúncias elucidadoras.

Essa perspectiva haveria de marcar profundamente o despregar da luta de classes travada na Alemanha, durante todos os anos subseqüentes, até o culminar com a derrota histórica da Revoluçao Alema de Outubro 1923.

 

CAPÍTULO VII

A CONSTITUIÇAO JURÍDICO-NORMATIVA DO

SOCIALISMO DEMOCRÁTICO :

 

CONSTITUIÇAO MENOS DEMOCRÁTICA

E MAIS SOCIALISTA, AINDA QUE

RESULTANTE NÃO DE UM SOCIALISMO SUPERPODEROSO,

PORÉM RENOVADO ... 

 

 

Em 19 de janeiro de 1919, tiveram lugar as eleiçoes para a Assembléia Nacional Constituinte da Alemanha, sendo que a sessao inaugural desse máximo organismo burguês jurídico-legislativo foi marcada para o dia 6 de fevereiro de 1919.

Com a realizaçao das eleiçoes em tela, o Conselho Central da República Socialista da Alemanha  - eleito no Congresso dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados, de 16 a 21 de dezembro de 1918, enquanto sucessor do antigo e temporário Conselho Executivo, para o exercício da funçao de “supervisao parlamentar” das atividades do Conselho dos Comissários do Povo e do Governo Prussiano até a ocasiao das eleiçoes programadas para o dia 19 de janeiro – haveria de conhecer a proximidade de seu fim.

Em 4 de fevereiro de 1919, o Conselho Central haveria de transferir, mediante declaraçao escrita, seu poder à Assembléia Nacional Constituinte, tal como, efetivamente, ocorreu.

Tal como se depreende do exposto nos capítulos precedentes, esse Conselho Central possuiu sua natureza existencial, desde sua mais tênue origem, no inexorável cumprimento da tarefa de fortalecer a posiçao da direçao da Social-Democracia Alema (SPD), encabeçada por Ebert e Scheidemann, incorporada, institucionalmente, no Governo Provisório, operante no contexto de um regime político social-colaboracionista de contemporizaçao de um dualismo de poderes.

Ele nao serviu, absolutamente, enquanto organismo de representaçao dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados, para o exercício mesmo das débeis e escassas funçoes que lhe haviam sido formalmente atribuídas.

No novo contexto da luta de classes da Alemanha, mesmo já estando implacavelmente superados todos os esforços de intervenção marxista-revolucionária no quadro do I Congresso dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha, o recém-fundado Partido Comunista da Alemanha (KPD – Spartakusbund) posicionou-se, de modo ultra-esquerdista, em seu congresso fundacional, realizado nos dias 29 e 30 de dezembro de 1918  - opondo-se manifestamente às posições anti-boicotistas, defendidas de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg - em favor do boicote às eleições vindouras para a Assembléia Nacional Constituinte, por temor de, uma vez constituída essa última, poder ela eventualmente sufocar de modo integral um dos últimos embriões dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados.

Agindo desse modo, o recém-fundado Partido Comunista da Alemanha (KPD – Spartakusbund) haveria de desperdiçar a possibilidade de mobilizar as grandes massas contra o Governo de Frente Popular em torno de um tema de decisiva importância que envolvia todos os fundamentos da secular mitologia jurídico-constitucional. 

Acerca do tema, Wilhelm Pieck teve a oportunidade de assinalar, permitindo, porém, entrever inequivocamente seu posicionamento político-estratégico, defendido à época :

 

“Confrontaçoes maiores surgiram, no Congresso, acerca da participaçao nas eleiçoes da Assembléia Constituinte.

O Comitê Central da Liga Spartakus colocou-se em favor da participaçao, com vistas a, através disso, ter a possibilidade de mobilizar as massas contra o Governo e contra a Assembléia Nacional.

Porém, os motivos apresentados em favor disso nao encontraram nenhuma recepçao junto à maioria dos participantes do Congresso.

A maioria opinou que nao era momento para eleiçoes, mas sim de obrigatoriamente conduzir a luta contra a Assembléia Nacional com greves de massa e metralhadoras.

A participaçao nas eleiçoes apenas confundiria os trabalhadores e desviaria da luta.

A votaçao resultou em que apenas 23 participantes votaram em favor, sendo 62 votaram contra a participaçao nas eleiçoes.

A companheira Luxemburg e o companheiro Jogiches ficaram extremamente decepcionados com essa votaçao.

Eles vislumbraram nesse posicionamento a incompreensao para com as tarefas do Partido e temeram, com a preponderância de tais votos, a ocorrência de um desenvolvimento perigoso.

Porém, nao permitiram que se chegasse a uma ruptura entre os participantes, porque estavam convencidos de que a militância do Partido convencer-se-ia muito brevemente da incorreçao dessa resoluçao.”[156]

    

As eleiçoes em tela realizaram-se sob o clima ilusoriamente alvissareiro das entao iniciadas Negociaçoes de Paz, entabuladas no Castelo de Versalhes, na França, desde 18 de janeiro de 1919, bem como sob o predomínio do terrorismo político e da vulgar hipocrisia do imperialismo e de seus aliados, desferido sobre os cadáveres dos Spartakistas :

Nesse sentido, a Social-Democracia Alema (SPD), defendendo os interesses do capital com seus mais belos trajes socialistas, clamou, debragadamente, em seus cartazes afixados por toda cidade, às massas berlinenses eleitoras  :

 

 

“Crianças dos Trabalhadores, Empregados, Auxiliares de Atividades e Funcionários,

peçam a seus pais, parentes e conhecidos que todos pensem em vocês durante a eleiçao !

Pois, a vocês pertence o futuro !

 

A velha ordem social privilegia o pequeno número de crianças dos pais abastados.

A nova ordem social assegura a toda criança os mesmos meios para a educaçao e formaçao profissional.

O Estado Capitalista faz o progresso dependente do acaso do nascimento, da grandeza do saco de dinheiro dos pais.

O Estado Socialista assegura pleno desenvolvimento de todos os talentos, cria caminho livre para os realmente capazes, sem consideraçao da origem ou do patrimônio.

 

Por isso, jovens, conclamem, em voz alta, a todos os eleitores :

 

Pensem em nós !

 

Votem na

 

Lista do Partido Social-Democrático da Alemanha

(SPD) [157]

 

 

Algo mais esquerda, clamavam os sociais-reformistas colaboracionistas, adeptos do Partido Social-Democrático Independente (USPD), agora pretendidamente oposicionistas conseqüentes ao regime de Ebert e Scheidemann :

 

 

Partido Social-Democrático Independente da Alemanha (USPD) !

 

                                               Diante da Decisão !

 

Trabalhadores ! Soldados ! Senhoras e Senhoritas da Populaçao Economicamente Ativa !

No próximo domingo, dia 19 de janeiro, deve-se decidir acerca da representaçao para a Assembléia Nacional Constituinte.

Todos os membros do Império, homens e mulheres acima de 20 anos, sao chamados a manifestar sua vontade política.

Uma série de Partidos candidatam-se ao seus votos !

O Partido Nacional Alemao (DNVP) pretende reconstituir os velhos estamentos.

O Partido Democrático do Povo (DDP) quer reunir a burguesia.

Que eles o consigam !

A populaçao economicamente ativa deve, em contraposiçao a esses velhos Partidos, novamente disfarçados, caminhar o seu próprio caminho.

Ela nao possui nada que ver com esses Partidos.

Para ela resta apenas a escolha de votar pelos representantes de seus próprios interesses, na medida em que nao queira eleger os seus próprios açougueiros.

Que Partido é esse ?

Dois Partidos Sociais-Democráticos pedem pelos seus votos !

E agora perguntamos :

Quem mandou rolar, em 24 de dezembro, os canhoes contra os marinheiros ? (obs.SVK : Anote-se que, em verdade, ainda em 24 de dezembro, também os Sociais-Democratas Independentes, i.e. Karl Kautsky, Hugo Haase, Emil Barth e tantos outros, encontravam-se no Governo Provisório, contribuindo para fomentar o dualismo contemporizador-colaboracionista entre esse Governo e o Conselho Executivo dos Conselhos dos Trabalhadores e Soldados ... )

O Governo Ebert-Scheidemann !

Quem mandou na Noite Sagrada de Natal derramar sangue inutilmente ? 

O Governo Ebert-Scheidemann !

Quem mantém os antigos militares poderosos, os Generais e os Oficiais, em seus postos ?

O Governo Ebert-Scheidemann !    

Quem fomenta e estimula a formaçao da nova Guarda, composta de estamentos de estudantes e oficiais, inimigos dos trabalhadores ?

O Governo Ebert-Scheidemann !

Quem é responsável pela fúria da Guarda de Reinhardt e a Guarda de Grupo, em Berlim, pelo fato de que ninguém mais encontra-se seguro em sua vida ?

O Governo Ebert-Scheidemann !

Quem constrói a velha dominaçao militar novamente ?

O Governo Ebert-Scheidemann !

Quem aniquila as conquistas da Revoluçao de Novembro ?

O Governo Ebert-Scheidemann !

Quem promoveu, conscientemente, nas últimas semanas, o fratricídio ?

O Governo Ebert-Scheidemann !

Quem deixou sem ouvidos e friamente esmorecer o grito dos trabalhadores em favor da abdicaçao das pessoas comprometidas e da unificaçao dos trabalhadores e trabalhadoras amantes da liberdade ?

O Governo Ebert-Scheidemann !

Quem é responsável pelo fato de que presos indefesos estejam sendo seviciados e fuzilados indiscriminadamente por tropas mercenárias ?

O Governo Ebert-Scheidemann !

Um trabalhador, um soldado, uma trabalhadora pode dar seu voto ao representantes desse Partido-Scheidemann, em 19 de janeiro ?

Nao ! E mais uma vez, nao !

Dêem a esse Partido, em 19 de janeiro, o desdenho !

Proteste, através de votaçao, contra a instituiçao de uma nova dominaçao da violência e do arbítrio !

Estejam prevenidos ! Nao se deixem enganar !

Porque defendemos a verdade, estamos sendo caluniados e injuriados.

Preste atençao na armadilha. A verdade foi sempre objeto de mentira.

Apenas o Partido Social-Democrático Independente conduziu a luta contra o sistema dominante, já durante a horrível guerra e apesar de todas as perseguiçoes.

Apenas o Partido Social-Democrático Independente levou à derrubada do velho sistema apodrecido.

Apenas o Partido Social-Democrático Independente continua a lutar contra toda a dominaçao arbitrária, contra a exploraçao capitalista das massas, em prol da felicidade humana e do socialismo.

Quem deseja isso, deve aderir a esse Partido, considerando, no dia 19 de janeiro, a lista do Partido Social-Democrático Independente como sua lista.

Apenas os seus representantes asseguram que as conquistas da revoluçao serao garantidas e que o desenvolvimento será levado adiante, em sentido socialista.

Para vocês, nao existe, pois, em 19 de janeiro, nenhuma outra escolha senao a de votar nos representantes do Partido Social-Democrático Independente, a lista que começa com

 

Eichhorn, Haase.

 

Todas as demais listas devem ser repudiadas.

Nao deixem que nenhum eleitor, nenhuma eleitora, deixe de fazer uso de seu Direito Eleitoral, no dia 19 de janeiro.

Quem ficar em casa, fortalece a força da contra-revoluçao !

 

Todos à eleiçao em favor da lista dp Partido Social-Democrático Independente da Alemanha (USPD) !

 

Nossos candidatos sao :

 

Emil Eichhorn, Redator, Berlim

Hugo Haase, Advogado, Berlim

Gustav Laukant, Trabalhador Metalúrgico, Berlim

Luise Zietz, Secretária, Berlim

Richard Herbst, Secretário. Berlim

Margarete Wengels, Berlim

Dr. Herman Wenl, Médico, Berlim

Dr. Siegfried Weinberg, Advogado, Berlim

Agnes Fuhrenwald, Berlim

Hermann Müller, Secretário, Berlim

Alfred Schwahn, Comerciante, Berlim

Herman Claius, Pintor, Berlim

Karl Siegle, Carpinteiro, Berlim

Wilhelm Thiel, Restaurador, Berlim”[158]

 

 

Do outro lado, à direita, alardeavam, sofregamente, a malta dos sequazes do Partido Nacional do Povo Alemao (DNVP), de orientaçao proto-fascista : 

 

 

Os Judeus – Vampiros da Alemanha

 

Tendo alcançado o poder dominante na Inglaterra, os judeus instigaram, incessantemente, contra a Alemanha. O Rei Eduardo possuíram eles como ferramenta.Porque eles fizeram isso ?

Porque a Alemanha colocou-se freqüentemente no caminho da dominaçao mundial já possuída pelos judeus e porque eles queriam, em uma Guerra Mundial, ofuscá-la.

Em virtude do último motivo, eles agitaram e empurram para a Guerra Mundial, também na Alemanha.

Eles alcançaram o seu objetivo : a Alemanha encontra-se esmagada sobre o solo.

72 bilhoes passaram, durante a Guerra Mundial, das maos dos cristaos às maos dos judeus. Nove décimos do capital circulante, três quartos de todas as empresas industriais encontram-se em suas maos.

Apenas nao conseguiram eles ainda apropriarem-se da posse do solo, como na realidade desejavam.

Apenas e tao somente os Judeus tiram vantagem da Guerra Mundial !

 

Abandonamos, por isso, nossos filhos e nossos irmaos, nossos homens e nossos noivos ?

Por essa razao, definhamos e passamos fome durante quatro longos anos ?

Evidentemente que nao !

E os judeus carregaram, por acaso, junto conosco os fardos da Guerra Mundial ?

Nao !

A partir do início da guerra, possuíam eles em suas maos o abastecimento dos meios de alimentaçao, velaram por suas mesas fartas, deixaram que se assasse até paes em suas panelas, fizeram bolos e lambuzaram com manteiga o pao, com dedos gordos, enquanto nós tivemos de optar voluntariosamente por legumes sem centeio, batatas e margarina mal-cheirosa.

Os judeus nao queriam ir para as trincheiras, pois suas valiosas vidas correria assim perigo. ...

Quase um milhao e meio de de irmaos alemaes tiveram de sacrificar suas vidas nos campos de batalha.

E qual foi o fim disso ? Leiam ainda mais uma vez a conclamaçao de Hindenburg contra a falta de acionismo, cujos principais protagonistas eram os judeus, cuja preguiça é conhecida mundialmente.

Pensem no fato de que a Embaixada Russa de Berlim, totalmente convertida ao judaísmo, infiltrou o veneno bolchevique na Alemanha, com o auxílio do judeu Dr. Kohn, velando para que esse veneno fosse levado ao fronte por turistas inescrupulosos.

Lá, esse veneno desmoralizou nosso Exército orgulhoso e vitorioso, sendo que no mundo jamais desenrolou-se um tal cenário ocorrido em que os vencedores de tantas batalhas tivessem de refugiar-se na Pátria, tal como se tivessem eles sofrido a maior das derrotas.

Eis o armistício mais desavergonhado no qual a Alemanha teve de entregar-se ao inimigo de maos atadas, ao qual uma paz nao menos desavergonhada seguir-se-á !

A quem devemos isso ? À traiçao da Pátria do judaísmo. ...

O judeu agrediu a coroa. Estamos sendo governados pelos Landsberg e Haase, John e Davidson, por Levi e Rosa Luxemburg ! ...

 

Nao vote em nenhum deputado senao naqueles do Partido Nacional do Povo Alemao (DNVP) !” [159]

 

“Violência contra a a Assembléia Nacional.

Nao é a Democracia, mas sim o Despotismo.

Spartakus quer impedir as eleiçoes.

 

Na segunda-feira, uma Assembléia do Grupo Spartakista decidiu, unanimemente, declarar greve geral no dia 19 de janeiro, dia das eleiçoes para a Assembléia Nacional e, com todos os meios, acabar com a eleiçao.

Ouçam, trabalhadores e cidadaos !

O sangue custoso da Revoluçao, a liberdade política, a democracia, o Direito de Auto-Determinaçao de nosso povo deve vir a ser destruído por uma descarada contra-revoluçao de esquerda.

 

Todos às filas !

Saíam às ruas vocês todos !

 

Trata-se de defender as conquistas mais sagradas da Revoluçao.

 

Editora Lehmann, Berlim SW.”[160]

 

 

Situados na centro-direita, o Partido Cristao Popular (Zentrum), coligado ao Partido Popular da Baviera (BVP), defendia a seguinte tônica de propaganda eleitoral, especialmente voltada ao voto feminino :

 

 

MULHERES ALEMÃES

 

Raiou o ano do destino do nosso povo alemao !

As forças de nossa Pátria encontram-se despedaçadas, a construçao do Estado do Império Alemao encontra-se caída no chao !

Nessa hora mais difícil, fomos nós, mulheres alemas, conclamada a contribuir para a nova construçao da Alemanha. Nós queremos contribuir !

Com toda a nossa lealdade do dever, com forte sentimento de responsabilidade, queremos refletir acerca do que pode salvar nossa Pátria a superar sua profunda derrota. Quebrou-se a poderosa força que durante 4 anos resistiu ao inimigo.

Através das reivindicaçoes de liberdade ilimitada que coloca sobre todas as leis cristas, destrui-se nossa vida familiar e a pureza da nossa juventude.

Através do afastamento da religiao da escola e da vida do Estado arranca-se ao nosso povo a fonte mais poderosa de sua força moral.

Um fardo monstruoso foi-nos imposto : temos de suportar 100 bilhoes de dívida própria e duras reivindicaçoes de nossos inimigos.

Como podemos realizar isso empobrecidos e esgotados, tal como estamos ?

Temos de velar para que se trate com o máximo de poupança nosso patrimônio popular.

Nao pode ser que os Conselhos de Trabalhadores e Soldados desperdicem tanto dinheiro, que a populaçao pobre, das Igrejas dos fiéis, p.ex., seja obrigada a pagar o dobro dos impostos, para fazer-se novamente o mesmo.

Temos de velar para que o comércio e a indústria, fontes de nossa riqueza, nao sejam destruídos.

As greves que sempre retornam, o tempo de trabalho reduzido, as elevadas exigências salariais, empurram, porém, muitas empresas para a falência.

A Siemens, p.ex., tem de pagar 70 milhoes a mais de salários, mesmo recebendo entradas de 13 ½ milhoes. Entao, as empresas sao estatizadas, dizem eles.

Porém, como se encontram as empresas estatais ?

As companhias ferroviárias da Prússia e de Hessen possuem, no ano contábil corrente, um déficit de 118 milhoes de marcos, nesse quadro, porém, uma despesa adicional de salários de 1.309 milhao de marcos. Quem deve pagar essa conta ?

Nós, na medida em que os preços de viagem sejam fortemente aumentados, tanto para pessoas quanto para cargas.

A Krupp foi forçada pelos Conselhos de Trabalhadores e Soldados a admitir esquadroes de segurança para os estoques de meios alimentícios de seus trabalhadores que lhe custou tanto dinheiro que poderia ela contratar com isso 500 funcionários, vindos dos campos de batalha.

Mulheres alemas, reflitam para onde segue a viagem.

A terra e o solo alemaes podem alimentar apenas 35 milhoes de pessoas.

Se a nossa indústria for orientada para o despenhadeiro, 30 milhoes de pessoas terao de emigrar e implorarao aos nossos inimigos por meios de sobrevivência.

Como devemos pagar nossas dívidas ?

Nosso dinheiro nao tem mais nenhum valor no estrangeiro.

Dia e noite, sao impressas novas notas bancárias que terao, em breve, apenas o valor de trapos de papel.

Pois, os bilhetes monetários constituem títulos de dívida.

Ninguém no mundo acredita, porém, que nós os possamos honrar, arruinando-se tanto a nossa vida econômica, tal como nas últimas quatro semanas.

Nossos inimgos confiscarao, entao, nossas empresas estatais e nossa propriedade popular e poderemos apenas trabalhar para eles como escravos assalariados.

Nós, porém, nós, mulheres alemas, queremos que, dos escombros, um novo Estado Popular seja construido, no qual domine a moral e o Direito, a liberdade e o respeito diante do membro do povo.

Queremos lutar contra o poder selvaticamente destruidor que aniquila nossa vida econômica com a bandeira da liberdade, entregando-nos à fome e à miséria, à mais sórdida servidao.

Queremos que, mediante uma legislaçao social fortemente elaborada, sejam prestados a todo trabalhador e a toda trabalhadora proteçao contra a exploraçao, bem como auxílio nos dias de enfermidade e de velhice.       

Possibilitaremos que, mediante forte colonizaçao interna, todo alemao viva sobre terra e solo própriosm, em sua Pátria.

Ao invés da luta de classes e do ódio que prega a Social-Democracia, queremos que o respeito e a confiança regule a relaçao dos membros individuais do povo.

Queremos nos colocar sobre o campo do cristianismo, que venera em Deus a fonte de todo o Direito e de toda a Justiça, que estimula as santidade da família, o respeito para com a mulher enquanto esposa e mae, o Direito dos pais sobre seus filhoes. Em 19 de janeiro, queremos entregar nosso voto ao

 

Centro, Partido Cristao Popular

e estamos certos de que, sobre o fundamento de seu programa de trabalho, as feridas de nossa Pátria serao curadas e que viverá uma nova e feliz Alemanha.”[161]

 

No cenário dessa luta de classes acirradamente polarizada, as eleiçoes para a Assembléia Nacional Constituinte acabaram concedendo, fracionariamente, maioria de votos aos Partidos burgueses alemaes, ainda que a Social-Democracia Alema (SPD), beneficiando-se da máquina de propaganda movida pelo Governo de Ebert e Scheidemann, lograsse consagrar-se como o Partido mais bem votado.

Se nao, vejamos, tendo em conta os dados estatísticos abaixo :

 

RESULTADO DAS ELEIÇÕES

DE 19 DE JANEIRO DE 1919

PARA A ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE

 

Número de eleitores (em 33 circunscriçoes eleitorais) .......................................34.046.366

Índice de participaçao (em 33 circunscriçoes eleitorais) .................................... 83%

Votos válidos ...................................................................................................... 30.400.344

Porcentagem de votos válidos ........................................................................... 99,6%

Votos nulos ........................................................................................................ 124. 504

Porcentagem de votos nulos .............................................................................. 0,4%

 

Votaçao conferida a cada Partido :

Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD) ....................................... 11.509.048

Percentual dos votos obtidos .............................................................................  37,9 %

Deputados eleitos ...............................................................................................  163 

 

Partido Cristao Popular (Zentrum) e Partido Popular da Baviera (BVP) .....  5.980.216

Percentual dos votos obtidos .............................................................................. 19,7 %

Deputados eleitos ................................................................................................ 91

 

Partido Democrático Alemao (DDP) ................................................................. 5.641.825

Percentual dos votos obtidos ............................................................................... 18,5 %

Deputados eleitos ................................................................................................. 75

 

Partido Nacional do Povo Alemao (DNVP) ....................................................... 3.121.479

Percentual de votos obtidos .................................................................................. 10,3%

Deputados eleitos .................................................................................................. 44

 

Partido Social-Democrático Independente da Alemanha (USPD) ................. 2.317.290

Percentual de votos obtidos ................................................................................. 7,6%

Deputados eleitos ................................................................................................. 22

 

Partido do Povo Alemao (DVP) ......................................................................... 1.345.638

Percentual de votos obtidos .................................................................................  4,4%

Deputados eleitos .................................................................................................  19

 

Outros .................................................................................................................     484.848

Percentual de votos obtidos ..................................................................................  1,6%

Deputados eleitos .................................................................................................   7

Número Total de Deputados Eleitos à Assenbléia Nacional Constituinte .............  421[162]

 

 

No que tange, porém, às eleiçoes para a Assembléia Estadual Constituinte da Prússia, cuja capital era Berlim, cumpre anotar os seguintes resultados : 

 

 

RESULTADO DAS ELEIÇÕES DE 19 DE JANEIRO DE 1919

PARA A ASSEMBLÉIA ESTADUAL CONSTITUINTE DA PRÚSSIA

 

Índice de participaçao nas eleiçoes ................................................................... 75%

Votaçao conferida a cada Partido :

 

Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD)

Percentual dos votos obtidos .............................................................................   36,4 %

Deputados eleitos ...............................................................................................  145 

 

Partido Cristao Popular (Zentrum) e Partido do Centro Alemao-Hanoveriano (DHZP)

Percentual dos votos obtidos ..............................................................................  22,3%

Deputados eleitos ................................................................................................  87 + 7

 

Partido Democrático Alemao (DDP)

Percentual dos votos obtidos ............................................................................... 16,2 %

Deputados eleitos ................................................................................................. 65

 

Partido Nacional do Povo Alemao (DNVP)

Percentual de votos obtidos .................................................................................. 11,2%

Deputados eleitos .................................................................................................. 48

 

Partido Social-Democrático Independente da Alemanha (USPD)

Percentual de votos obtidos ................................................................................. 7,4%

Deputados eleitos ................................................................................................. 24

 

Partido do Povo Alemao (DVP)

Percentual de votos obtidos .................................................................................  5,7%

Deputados eleitos .................................................................................................  23

 

Partido Alemao-Hanoveriano (DHP) e Democracia dos Trabalhadores Rurais

e Camponeses de Schleswig-Holstein (SHBLAP)

Percentual de votos obtidos .................................................................................. 0,8%

Deputados eleitos .................................................................................................. 2 + 1

 

Número Total de Deputados Eleitos à Assembléia Estadual

Constituinte da Prússia .........................................................................................  402[163]

 

 

 

 

Gerhard Anschütz, o grande vulto do positivismo jurídico-constitucional da Alemanha do século XX, formulou as seguintes linhas em sua renomada obra A Constituiçao do Império Alemao de 11 de Agosto de 1919, acentuando que esse diploma constitucional havia nascido de uma revoluçao socialista-democrática :

 

“Aqui, demonstra-se quão longe alcançou a influência do mundo especulativo socialista, na nova Alemanha.

E nao se pode negar que essa influência alcança, de fato, muito longe.

Muito do que surge na Parte V é, decidamente, socialista.

Assim deve ser entendida a autorizaçao, conferida ao Império, de transferir ao domínio comum empreendimentos econômicos privados, apropriados à comunidade (Art. 156), os preceitos sobre a proteçao da força de trabalho, a previdência social, o dever de trabalho e o direito ao trabalho (Art. 157, 161-163).

Totalmente localizado no campo do socialismo surge também o Art. 165, inciso I, alínea I, que autoriza o trabalhador e o empregado, a produzir, conjuntamente, com os empresários, a regulamentaçao das condiçoes salariais e laborais, assim  como a atuar, conjuntamente, no desenvolvimento econômico comum das forças produtivas.”[164]    

    

Eis como, após a aprovaçao da consigna de Assembléia Nacional Constituinte, no seio do I Congresso Geral dos Conselhos dos Trabalhadores e Soldados, realizado entre os dias 16 e 21 de dezembro de 1918, sua abertura e início de trabalhos, em 4 de feveiro de 1919, e posteriormente à eliminaçao física dos mais expressivos dirigentes marxistas-revolucionários da classe trabalhadora alema, os principais dirigentes do Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD) e seus aliados, através da aplicaçao dos mecanismos sociais-reformistas e do revisionismo do marxismo, conduziram, pela via parlamentar-institucional as massas exploradas e oprimidas alemas ao socialismo democrático e dos trabalhadores !

A Constituiçao do Império Alemao de 11 de Agosto de 1919 demonstra, efetivamente, o que poderia resultar, na prática, na hipótese de os bolcheviques, sob a direçao de Lênin, houvessem se decidido em favor do nao fechamento da Assembléia Nacional Constituinte, em 5 de fevereiro de 1918 : rumar-se para instituiçao de um Socialismo Democrático

Porém, cumpre permitir que o renomado jurista alemao em tela, Gerhard Anschütz diga com suas próprias palavras :

     

“A Parte V dos Direitos Fundamentais e dos Deveres Fundamentais é aquela parte da Constituiçao na qual emerge, da maneira mais nítida, que essa Constituiçao nasceu de uma revoluçao nao tanto democrática quanto socialista.

Nenhuma outra parte da Constituiçao demonstra traços tao marcadamente socialistas como essa.

Isso é compreensível, pois o Socialismo é uma concepçao econômica e, aqui, trata-se da Vida Econômica.”[165]  

 

Nao achando conveniente ainda utilizar o uso do vocábulo “socialista” para a qualificaçao da Constituiçao de Weimar de 1919, outro consagrado professor alemao, ligado ao nacional-socialismo(nazismo), Ernst Rudolf Huber, designou os preceitos desse diploma constitucional como “desvios da ordem de relaçoes puramente individualistas, entre Estado e economia”[166]. 

Para o mais distinguido professor Gerhard Anschütz, porém, Ernst Huber equivocava-se acerca de sua análise da Constituiçao de Weimar de 1919. 

Tudo estava a indicar que a Alemanha, sob a égide da República Imperial de 1919, colocava-se diante de um novo período sócio-político inteiramente novo, imprecisamente definido com antigas expressoes, vinculadas ao sistema de Direitos fundamentais liberais.

 

“Huber evita apenas, conseqüente e fluentemente, falar de intervençoes e efeitos socialistas.

Ele prefere, ao invés disso, palavras que exprimem o oposto de “liberal” e “liberalismo”.

Com isso, desconhece-se, porém, que as disposiçoes, renegadoras do individualismo, que se situam no discurso, nao se enraizam em um anti-liberalismo de um novo e próprio tipo e origem (i.e. nao socialista) (em particular, nao nas idéias “de economia planificada”, mais aparentada, essencialmente, ao fascismo do que ao socialismo democrático), mas sim enraizam-se em um socialismo do século XIX e início do século XX, tradicional e muito poderoso,  vindo do período de surgimento da Constituiçao do Império, ainda que nao superpoderoso.”[167] 

 

A Constituiçao de Weimar de 1919, produto da Assembléia Nacional Constituinte, votada pelo I Congresso Geral dos Conselhos dos Trabalhadores e Soldados, de dezembro de 1918 – consoante o pensamento jurídico-político largamente dominante na Alemanha, expressado por esse célebre professor de Heidelberg – retrataria, por assim dizer, nao um período de anti-liberalismo, mas sim propriamente de socialismo renovado, nao “superpoderoso”, distinto das concepçoes de socialismo proletário-revolucionário.

Nesse sentido, os preceitos da Vida Econômica da República de Weimar representariam, segundo Anschütz, uma forte influência da doutrina socialista, de nenhuma forma, porém, sua total concretizaçao.

O célebre artigo 151 da Constituiçao de Weimar, de 11 de agosto de 1919, prescreveu, entao, em plena harmonia com o quadro da época histórica, marcado pelo Socialismo Democrático, renovado e nao superpoderoso  :

 

“Art. 151. A ordem da vida econômica deve corresponder aos fundamentos da Justiça, com o objetivo de garantir uma existência digna a todos.

Nesses limites, assegura-se a liberdade econômica do indivíduo.

A coaçao legal será apenas permitida para a efetivaçao de Direitos ameraçados ou colocada a serviço dos reclamos prementes do bem comum.

É assegurada a liberdade do comércio e da indústria, nos termos da lei do Império.”[168]   

 

Ainda que o primeiro governo republicano de Ebert e Scheidemann, exercido através do Conselho dos Comissários do Povo (Rat der Volksbeauftragten), declarasse, na proclamaçao de 12 de novembro de 1918, pretender concretizar o socialismo, isso nao poderia, naturalmente, significar que a Constituiçao de Weimar tivesse dele se aproximado substancialmente.

A Parte V da Constituiçao da República de Weimar nao ordenava e nem permitia, evidentemente, a organizaçao da relaçao do Estado com a economia de modo efetivamente socialista.

E isso mesmo, no quadro da concepçao jurídico-dominante à época de socialismo renovado, promovido pela Social-Democracia Alema (SPD), era, assim, apresentada pelo mesmo constitucionalista Anschütz da seguinte forma :

 

“Ela (a Constituiçao de Weimar de 1919) é também nessa sua parte econômico-política a obra de um parlamento no qual a parte do povo que pensa de modo socialista era, em verdade, muito forte, porém nao representada de modo dominante.

E, em razao disso, o acolhimento de exigências e diretrizes socialistas foram plasmadas na Constituiçao, por todos os lados, apenas ao preço de consideráveis enfraquecimentos e fortes concessoes  à concepçao econômica individualista – ou, como os socialistas falam : capitalista, herdada : um resultado com o qual o radicalismo dos socialistas que se posicionam de modo comunista pôde ter todos as razoes para se tornar insatisfeito.”[169]  

 

Em verdade, mister é reconhecer que a Constituiçao da República de Weimar, de 11 de agosto de 1919 nada mais representou senao a consagraçao da orientaçao social-reformista do capitalismo imperialista alemao, dando expressao jurídico-constitucional à tentativa de colaboracionismo de classes, i.e. de conciliacionismo dos interesses materiais do proletariado e da burguesia, algo impossível de ser efetivamente realizado, no marco da preservaçao da exploraçao econômica e dominaçao política assegurada pelo Estado Burguês : tal contexto foi denominado pelos principais diregentes sociais-democráticos e pelo pensamento jurídico-dominante da época como sendo o de um Socialismo Democrático Renovado.

Nesse diploma constitucional, as instituiçoes e as liberdades burguesas egoístas-individualistas, legadas pelo capitalismo imperialista, surgiam, em termos linguístico-formais, reformadas por diversos novos institutos, instituiçoes e programas sociais, timidamente dotadas de alguma eficácia e efetividade concreta.

Tal como assinalou, um dos preceptores ideológicos do nazismo alemao, o renomado jurista alemao Carl Schmitt, nas garantias de liberdade contratual, de propriedade privada e no direito de herança, dos Artigos 152, 153 e 154 da vida econômica da República Constitucional de Weimar, ressurgiam consolidados três grandes pilares da ordem social, econômica e jurídica capitalista, que a Revoluçao de 1918-1919 logrou abalar, porém, de nenhuma forma, revolucionar[170].      

Quanto aos Direitos da Ordem Econômica, a Constituiçao Imperial em tela dispôs, expressamente :       

 

“Art. 151. A ordem da vida econômica deve corresponder aos fundamentos da Justiça, com o objetivo de assegurar a todos uma existência digna.

Nesses limites, garante-se a liberdade econômica.

A coaçao legal é apenas admitida para a efetivaçao de Direitos ameaçados ou a serviço das exigências extraordinárias do bem comum.

A liberdade de comércio e de indústria é assegurada, em conformidade com as Leis do Império.

 

Art. 152. Na circulaçao econômica vale a liberdade contratual, em conformidade com as Leis.

A usúria é proibida. Os negócios jurídicos que violem os bons costumes sao nulos.

 

Art. 153. A propriedade é assegurada pela Constituiçao.

Seu conteúdo e seus limites resultam da lei.

Uma desapropriaçao poderá apenas ocorrer em favor do bem geral, com base em fundamento estabelecido em lei.

Ela ocorrerá mediante indenizaçao adequada, na medida em que uma Lei do Império nao disponha diversamente.

Em caso de litígio motivado pelo montante da indenizaçao, há de manter-se aberta a via jurídica junto aos Tribunais ordinários, desde que Leis do Império nao determinem diversamente.

A desapropriaçao feita pelo Império em face dos Estados membros, Municípios e associaçoes de utilidade comum pode ocorrer apenas mediante indenizaçao. 

A propriedade obriga.

Seu uso deve, ao mesmo tempo, ser útil ao bem comum.

 

......

 

Art. 157. A força de trabalho encontra-se sob especial proteçao do Império.

O Império criará um Direito do Trabalho unitário.

 

.....

 

Art. 161. Para a manutençao da saúde e da capacidade de trabalho, para a proteçao da maternidade e para a previdência contra as consequências econômicas da velhice, da fraqueza, dos imprevistos da vida, o Império criará um sistema de seguro abrangente, com a participaçao decisiva dos segurados.”[171]

 

 

Em comentário às prescriçoes normativas em tela, Gerhard Anschütz assinalou :

 

“As velhas Constituiçoes (tipicamente : a Constituiçao Prussiana de 1850, Art. 9) afirmaram : “A propriedade é intocávell”.

Se houvessemos dado ao invés dessa expressao aquela menos patética “A propriedade é assegurada pela Constituiçao”, isso nao significaria, porém, nenhuma mudança objetiva.

As expressoes “é intocável” e “é assegurada” dizem a mesma coisa.

Nenhuma delas proclama a soberania do indivíduo  e de sua propriedade.

Ambas afirmam, porém, que o indivíduo “pode proceder com sua propriedade segundo seu bel prazer, na medida em que a lei ou os Direitos de terceiras pessoas nao se oponham.”[172]

 

Eis, portanto, alguns dos segredos insofismáveis do Socialismo Democrático e de uma Constituiçao menos democrática e mais socialista, ainda que emergente nao de um socialismo superpoderoso, porém renovado, tal como protagonizado pelos principais dirigentes da Social-Democracia Alema (SPD) e seus aliados mais solidários, no projeto de defender a consigna de Assembléia Nacional Constituinte, erigida sobre o apoio do I Congresso Geral dos Conselhos dos Trabalhadores e Soldados, em um clima de mais pleno social-colaboracionismo dualista-contemporizador.

Eis porque ainda retumbam nos ouvidos dos marxistas revolucionários as categóricas palavras paradigmáticas, firmes, proféticas e cristalinas de Karl Liebknecht que, a partir da Sacada do Edifício da Assembléia Estadual,  em 16 de Dezembro de 1918, dia da abertura dos trabalhos do I Congresso dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha – há cerca de 10 meses antes da vinda ao mundo do estafermo constitucional de Weimar -,  pontificavam às massas berlinenses presentes nas ruas da cidade :

 

“Esse dia, em que aqui se reuni o I Congresso dos Conselhos dos Trabalhadores e Soldados, possui significado histórico.

A primeira tarefa do Congresso é a de proteger a revolução, derrotando a contra-revolução. ...

Momentaneamente, não temos, na Alemanha, uma República Socialista, mas sim uma República Capitalista.

A República Socialista deve ser instaurada apenas pelo proletariado, mediante a luta contra o Governo atual que se tornou o portador do capitalismo.

Exigimos do Congresso que ele tome em suas mãos o inteiro poder político, visando à implementação do socialismo, não transferindo seu poder a uma Assembléia Nacional, que não representaria o órgão da revolução.

Exigimos do Congresso dos Conselhos que ele estenda a mão aos nossos irmãos russos, conclamando os delegados da Rússia a aqui comparecerem.

Queremos a Revolução Mundial e a unificação dos proletários de todos os países, consagrada entre Conselhos de Trabalhadores e Soldados.”[173]

 

 

À GUISA DE CONCLUSÃO

O balanço histórico sobre o processo revoucionário na Alemanha do século XIX e XX é extremamente complexo e não há ainda lições muito claras a estudar e a ensinar categoricamente, já que, nesse terreno, domina a histografia de frações burguesas e pequeno-burguesas, revisionistas, stalinistas e até mesmo não conseqüentemente leninistas.

Pois, se reina acordo quanto ao fato de que a Social-Democracia Alemã superara o desafio da ilegalidade, expressado pela Lei Contra os Socialistas de Bismarck, o Partido já se encontrava, segundo Marx e Engels, seriamente degenerado, em sentido teórico e programático, mesmo na década de 70 do século XIX,  por capitular crescentemente ao lassalleanismo.

Poucos reconheciam isso, porque a Social-Democracia Alemã crescia quantitativamente, e, daí, fechavam os ouvidos aos posicionamentos de Marx e Engels que destacavam sua decadência qualitativa, em termos proletário-revolucionários, agravada a partir das negociações do Programa de Gotha, de 1875. Costuma-se contemplar, superficialmente, August Bebel e Wilhelm Liebknecht como os grandes organizadores numéricos da Social-Democracia Alemã, deixando-se de destacar que o Partido havia, simplesmente, inchado, tornado-se incapaz de lutar, revolucionariamente, nos anos 90 do século XIX, devido ao crescente oportunismo teórico e programático, fomentado pelos próprios August Bebel e Wilhelm Liebknecht. Além disso, é de praxe criticar o reformismo de Eduard Bernstein e pouco se destaca o oportunismo de August Bebel em sua colaboração militante com Friedrich Ebert, a partir de 1905.

Entre 1871 e 1918, a Prússia, assumindo a forma estatal de Império Alemão, havia-se tornado a grande nação imperialista da Europa Continental que derrotara, militarmente, a Áustria e a França, esmagara a insurreição da Comuna de Paris, ampliara suas colônias desde a China (Shantong) até a África.

A I Guerra Mundial imprimiu uma “derrota técnica” ao imperialism alemão que capitulara, sem que nenhum soldado da Entente Franco-Britânico-Estadounidense houvesse invadido o seu solo, sem que a retirada de suas tropas dos territórios ainda ocupados na Europa se desse de modo desordenado, sem que o Comando Supremo de suas Forças Militares – composto por Paul von Hindenburg e Erich Ludendorff – houvesse sido aniquilado ou, ao menos, encarcerado. 

Após a Revolução de 9 de Novembro de 1918, impulsionada pela insurreição dos trabalhadores, soldados e marinheiros alemães amotinados, formou-se um Governo de Coalizão, composto pela Social-Democracia Patriótica, encabeçada por Ebert, Scheidemann e Landsberg, e pela Social-Democracia Independente e Pacifista, dirigida por Hugo Haase, Wilhelm Dittman e Emil Barth.

 Perante o público, apoiaram-se, de início, em 10 de novembro, sobre a Assembléia Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados, representante de todos os conselhos do Império Alemão.

Porém, no mesmo dia, surgia o Pacto Militarista selado entre o SPD, comandado com Friedrich Ebert, e o Alto Comando do Exército Imperial, dirigido, agora, pelo General Wilhelm Groener, visando, sobretudo, a preservar a estrutura hierárquica das forças armadas imperiais, manter o velho aparato militarista do Estado, reconstruir o imperialismo alemão, proteger o novo Estado contra a “Revolução Bolchevique” e seus representantes imaginários na Alemanha, i.e. os spartakistas, dirigidos por Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg.

Diretamente interessados no Pacto Ebert-Groener estavam, além disso, os grandes capitalistas alemães Siemens, Stinnes, Borsig e outros.    

Esse contexto favorecera imensamente a difusão da “Lenda da Punhalada pelas Costas (Dolchstoßlegende)”, criada pelos Generais von Hindenburg e Ludendorff e defendida pelo Comando Supremo do Exército Imperial, segundo a qual os únicos culpados pela derrota da Alemanha na I Guerra Mundial teriam sido os socialistas de todos os gêneros que insuflavam as massas para a revolução, os social-democratas, sim, mas, particularmente, os marxistas de todos os gêneros e, sobretudo, os bolcheviques e, por essa via, os judeus, responsáveis pela conspiração internacional judia, em uma palavra: todos os criminosos da Revolução de Novembro (Novemberverbrecher), que assinaram a Paz de Versalhes, em 11 de novembro de 1918, “sem que os últimos meios de resistência estivessem esgotados” …

Aos “criminosos de novembro” não cumpriria conceder tréguas: caberia responder com os métodos mais impiedosos e implacáveis do imperialismo alemão, tão bem demonstrado no massacre da Comuna de Paris, comandado pelo Chanceler de Ferro, Otto von Bismarck.

Valeria esmagar os marxistas revolucionários, valendo-se, de início, da Social-Democracia Patriótica de Ebert e Scheidemann, para, depois do esmagamento daqueles, destroçar também estes, de modo a acertar contas com todos os que supostamente “apunhalaram e espetaram pelas costas o sagrado Exército imperial, o Siegfried alemão, a cada momento em que combatia no fronte.”     

Tanto pior eram as palavras de Friedrich Ebert que saudava os soldados imperiais que retornavam do fronte, em 1918, proclamando que não haviam sido derrotados nos campos de batalha (“im Felde unbesiegt”), ou mesmo de Konrad Adenauer, do Partido do Centro cristão-democrata burguês, que afirmava que o Exército Imperial regressava ser ter sido vencido sem, ter sido derrotado, (“nicht besiegt und nicht geschlagen in die Heimat zurück”).

A “punhalada” (Dolchstoß) haveria sido desferida no interior do país, convulsionado pelos insurgentes marxistas…, pela mão do judeu bolchevique   

No período da I Guerra Mundial e imediatamente depois dela, em face da crise do Imperialismo Alemão e seu ímpeto selvagem de reorganização, alimentado pela “Lenda da Punhalada nas Costas (Dolchstoßlegende)”, os mais complexos problemas surgidos no interior das filerias dos revolucionários alemães advinham das visões da águia Rosa Luxemburg sobre a questão organizativa e seu revisionismo teórico do marxismo, permanecendo em descompasso com a nova idade do imperialismo, fase superior do capitalismo.

De modo nenhum, emergiam do que se alega pudesse ser o “putschismo” de Karl Liebknecht, aliás o que nunca foi efetivamente provado, pois as acusações de tentativa de derrubada imediata do governo de Ebert, Scheidemann e Noske, aliado dos Generais Groener, Lequis e von Lüttwitz, em Janeiro de 1919, mediante insurreição armada, acusações essas dirigidas sobretudo contra Karl Liebknecht, partem, majoritariamente, entre as fileiras da esquerda, de Paul Levi e luxemburguistas e também de Radek, Brandler e Richard Müller, e, d’entre as fileiras burguesas, do habermasiano Heinrich August Winkler. 

Um elemento de complicação nessa equação da luta de classes na Alemanha era, sem dúvida, o fato que a III Internacional não se encontrava nem sequer fundada, no período que se estende de novembro de 1918 e janeiro de 1919.

Depois da morte de Rosa Luxemburg, Lenin assinalou, em 1920, em tom de síntese:

“Rosa equivocou-se na questão da independência da Polônia.

Ela equivocou-se, em 1903, na apreciação do menchevismo.

Equivocou-se quando, em julho de 1914, ao lado de Plekhanov, Vandervelde, Kautsky, entre outros, aspirou à unificação dos bolcheviques com os mencheviques.

Ela equivocou-se em suas anotações do cárcere de 1918 (nesse sentido, corrigiu grande parte de seus erros, depois de abandonar o cárcere, no fim de 1918 e no início de 1919).

Porém, apesar de todos os seus erros, Rosa foi e permanece sendo uma águia.”[174]

 

Mas, a Greve Geral de Janeiro de 1919, com ocupação de prédios (Vorwärts – órgão do SPD -, Diário de Berlim, os conglomerados mediáticos Scherl, Ullstein e Mosse, a Tipografia Büxenstein e o Escritório de Telégrafo Wolff) e com armamento das massas, objetivando à recondução de Emil Eichhorn ao cargo de Presidente do Comissariado de Polícia de Berlim, entrou na historiografia burguesa e mesmo de boa parte da esquerda revisionista como a “Insurreição de Spartakus” ou o “Levante de Spartakus”.

Nesse contexto, sobretudo Karl Liebknecht teria pretendido empreender um putschismo blanquista, supostamente destinado a derrubar imediatamente o Governo de Ebert, Scheidemann e Noske, sustentado pelos Generais Groener, Lequis e von Lüttwitz, destruindo, de um golpe, o Estado Burguês Alemão e edificando uma República Socialista Livre dos Conselhos dos Trabalhadores, mesmo contando com a minoria da classe trabalhadora.

Nesse contexto, teriam os companheiros de Karl Liebknecht do KPD Sparktakista, Rosa Luxemburg, Paul Levi, Leo Jogliches permanecido dotados de bom senso contra o putschismo de Karl Liebknecht, quando se posicionaram e votaram contra uma resolução de derrubar o Governo do SPD, aliado ao Generalato Imperarlista Alemão.

Diz a lenda popular que Karl Liebknecht teria assinado, juntamente com Georg Lebedour (USPD) e Paul Scholze (Revolutionäre Obleute), em uma “Junta Revolucionária (Revolutionsausschuss)”, já em 4 de janeiro (!), no mesmo dia em que Emil Eichhorn, um membro do USPD, foi deposto da Presidência do Comissariado de Polícia de Berlim, uma “declaração”(!), defendendo a derrubada imediata do Governo Ebert e Scheidemann.

Outras voces afirmam que Karl Liebknecht, entusiasmado pelas manifestações de rua de 5 de janeiro de 1919, teria, juntamente com Lebedour e Scholze, votado, “na seqüência”, embriagado pela pressão dos acontecimentos, uma efêmera “resolução”(!), em um organismo comum de três organizações, contando com 33 membros e um “secretariado”(!) de três dirigentes, clamando pela derrubada do Governo Ebert e Scheidemann“a qual não teve maiores desdobramentos(!)”. 

Outros acentuam que, em 6 de janeiro, a “Junta Revolucionária (Revolutionsausschuss)”, buscando cooptar as tropas imperiais alemães, declarou, ao sessionar no próprio Parlamento Imperial (Reichstag), o Governo Ebert e Scheidemann como já  derrubado (“abgesetzt”), o que teria sido comunicado à população mediante panfleto, cujo responsável seria, “como de costume (wie üblich)”, Karl Liebknecht e Wilhelm Pieck, membro da direção do KPD Spartakista. 

Outros, por fim, alegam que Karl Liebknecht teria votado uma “resolução” (!) de derrubada depois da Greve Geral de 7 de Janeiro, clamando por invadir, com armas em punho, a Chancelaria do Império de Ebert, situado na Wilhelmstraße 77, antigo Palácio do Príncipe Anton Radziwill, bairro de Kreuzberg.  

 

Ora, é importante destacar que mesmo a Greve Geral de Janeiro de 1919 não foi, absolutamente, planejada, desencadeada ou dirigida pelo KPD Spartakista, senão um produto da manifestação de massas, com ocupação de prédios que ocorrera em 5 de janeiro de 1919, sob convocação da Presidência da Social-Democracia Independente (USPD) da cidade de Berlim, em colaboração com maioria dos  delegados sindicais independentes revolucionários (revolutionäre Obleute), ligados estes ao USPD, na base do movimento operário berlinense, objetivando  a impedir a demissão de Emil Eichhorn do cargo de Presidente do Comissariado de Polícia de Berlim, ordenada em 4 de janeiro de 1919 pelo Governo de Ebert,  Scheidemann e Noske.

Estas foram as forças que, em verdade, dirigiram as manifestações de massas e a Greve Geral de Janeiro de 1919, sobre a qual Karl Liebknecht, Rosa Luxemburg e o KPD Spartakista  incidiam, em condição de absoluta minoria. 

O próprio USPD de Georg Lebedour, Hugo Haase, Wilhelm Dittman, Emil Barth – tal quais os spartakistas, saído bem derrotado do Congresso do Império dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados (Reichskongress der Arbeiter- und Soldatenräte)  de 16 a 21 de dezembro de 1918 que, por 400 a 50, posicionou-se, em favor, da imediata convocação de eleições para uma Assembléia Nacional Constituinte, a realizar-se em 19 de janeiro de 1919, bem como por 344 votos a 98, a rejeição categórica da convocação imediata de um novo Congresso dos Conselhos  - encontrando-se também em esmagadora minoria no movimento operário alemão, procurava reconquistar suas posições perdidas no quadro de seu projeto de Governo Frente Popular, formado com o SPD de Ebert e Scheidemann, em 9 de novembro de 1918, e imerso em crise, depois de o USPD ter abandonado o Conselho dos Comissários do Povo (Rat der Volksbeauftragten), em 28 de dezembro de 1918, em virtude da repressão militar dos protestos da Divisão de Marinha do Povo (Volksmarinendivision), promovida pelo Pacto Ebert-Groener, durante o transcurso das Festas de Natal de 1918. 

O próprio USPD não possuía sérias ambições de derrubar o Governo: era, por princípio, pacifista e defendia uma estratégia frentepopulista, estando disposto a colaborar com o social-patriotismo de Ebert e Scheidemann – que sabia pactuar com o Generalato Imperialista Alemão -, desde que não houvesse esmagamento de massas. Era seu projeto político cavalgar as lutas das massas, desde que necessárias para imprimir mais impulso à sua perspectiva de fazer instaurar em solo alemão uma “República dos Conselhos” e a “Democratização das Forças Armadas Imperialistas.”      

Karl Liebknecht – enquanto o mais prestigiado quadro político do KPD Spartakista – veio a declarar, publicamente, na noite de 5 de janeiro, seu apoio às todas as lutas e mobilizações sociais das massas berlinenses - ademais sustentadas também por Rosa Luxemburg e demais membros do KPD Spartakista -  e, assim, passou a tomar parte no  então formado Comando de Greve (Streikleitung), composto por 53 destacados militantes, funcionando em Marstall, o qual entraria para a historiografia dominante como a “Junta Revolucionária  (Revolutionsauschuss)”. 

Em essência, o Comando de Greve de Janeiro de 1919 Georg Lebedour, Paul Scholze e Karl Liebknecht -  expressava a composição dirigente da antiga Junta Executiva do Conselho de Trabalhadores e Soldados da Grande Berlim (Vollzugsrat des Arbeiter- und Soldatenrates Groß-Berlin), surgida em outubro de 1918, e não era, em verdade, alheia às visões de planejamento consciente de ações revolucionárias e insurreições em Berlim, pois que já rompera com a velha concepção predominante no SPD de que o capitalismo e o seu Estado se desagregam e desabam por si mesmos, não devendo ser destroçados pela derrubada planejada do proletariado revolucionário. 

Porém, de 5 para 6 de janeiro, no quadro das mobilizações de massas, o que, de fato, ocorreu foi a ocupação de vários prédios relacionados com a imprensa berlinense (Vorwärts – órgão do SPD -, Diário de Berlim, os conglomerados mediáticos Scherl, Ullstein e Mosse, a Tipografia Büxenstein e o Escritório de Telégrafo Wolff).  Em vez do Vorwärts, jornal do SPD que publicará a demissão de Emil Eichhorn,  passou a circular o Revolutionäre Vorwärts, sob a redação de Eugen Leviné, Wolfgang Fernbach e Werner Möller, contando com o apoio dos operários da Knorr-Bremse, AEG e Schwarzkopff.

A seguir, a Greve Geral, convocada para 7 de janeiro de 1919, foi, freneticamente, sustentada por mais 500 mil berlinenses que ocuparam as ruas e as praças da capital, clamando, até 9 de janeiro, pelo desarmamento das tropas estacionadas na cidade, ao mesmo tempo em que os ocupantes dos prédios armavam-se, para eventual defesa contra a repressão. Dos depósitos do Estado de Spandau e Wittenau, distribuiram-se armas a cerca de 3.000 pessoas, diante do Comissariado de Polícia de Emil Eichhorn. 

De toda sorte, não se registrou a passagem de tropas imperiais berlinenses para as fileiras dos grevistas, bem como resultou que a Divisão de Marinha do Povo (Volksmarinedivision) declarara sua neutralidade, a despeito das mobilizações de massas.

De 9 a 11 de janeiro, em um momento de descenso do movimento grevista e estagnação na dinâmica da ocupação de prédios, tomados como escudos proterores, passaram, porém, a manifestarem-se claros desacordos internos no Comando de Greve (Streikleitung), cujo conteúdo não se encontra, historicamente, bem comprovado, nos documentos historiográficos alemães.

De um lado, parece claro que estariam os adeptos de Georg Lebedour (USPD), defendendo a retomada de negociações com o Governo de Ebert e o Generalato Imperialista Alemão – as quais já haviam sido supostamente iniciadas mesmo em 6 de janeiro - , d’outro, os adeptos de Karl Liebknecht que, supostamente, segundo se conta, teriam defendido – contra a posição de Rosa Luxemburg e Leo Jogliches – uma absurda tentativa de assaltar, com armas na mão, o prédio de Ebert, Scheidemann e do Conselho dos Comissários do Povo (Rat der Volksbeauftragten), o que implicaria, na prática, dispor de tropas revolucionárias proletárias móveis, inexistentes naqueles dias, que percorressem quilômetros de Spandau, da Jerusalemstraße, da Zimmerstraße e da Kochstraße até a sede de Governo de Ebert, Scheidemann e Noske, na Chancelaria do Governo, em Kreuzberg, passando de uma situação já defensiva e estagnada das ocupações para uma impossível ofensiva extrema de ataque arriscado, sendo capaz de desferir golpes militares.

No entanto, em 8 de janeiro, é consenso afirmar que Liebknecht e o KPD Spartakista já haviam decidido abandonar o Comando de Greve (Streikleitung), devido a terem descoberto que Lebedour e o USPD negociavam, em suas costas, uma trégua com o Governo de Ebert e Scheidemann. 

Era evidente que Karl Liebknecht sabia que se encontrava em absoluta minoria no Comando de Greve (Streikleitung). Como poderia, naquelas circustâncias, então, o revolucionário tão experiente que era pretender postular a deflagração de um “putsch” contra Ebert e Scheidemann?

Além disso, haviam fracassado, até mesmo em 8 de janeiro, as tentativas de arrastar para a Greve Geral os marinheiros da Divisão de Marinha do Povo (Volksmarinedivision) e, desde esse dia, as tropas e os paramilitares de Ebert proclamavam o lema de que: “a hora do acerto de contas se aproximava!”(Die Stunde der Abrechnung naht!).

Como planejar a derrubada imediata de um governo, quando a tarefa essencial do momento era a de defesa?  

Tratava-se, como se dizia, de assegurar a tarefa de lutar contra a “traição de Judas no Governo” (“Kampf gegen die Judasse in der Regierung”), contra as tropas que estavam sendo financiadas pelo industrial Heinrich Sklarz e deslocadas por Nokse e Reinhardt para o centro de Berlim, com as ostensivas conclamações dos jornais burgueses à população para que integrasse as fileiras paramilitares dos Freikorps, ali mesmo no Café Vaterland, na Praça de Potsdam, como se depreende dos tantos panfletos operários publicados à época em Berlim.  

Todos sabiam que a “Liga Anti-Bolchevique” de Eduard Stadler e Waldemar Pabst – que, entre 9 e 15 de janeiro, participara da execução sumária de Liebknecht e Luxemburg, bem como do massacre de cerca de 170 pessoas (anote-se que a Greve de Março de 1919 custou a vida de mais de 1.000 pessoas) -, encontrava-se enriquecendo-se com as doações dos grandes capitalistas Siemens, Stinnes, Borsig, repassadas aos Freikorps, armados com lança-chamas, metralhadoras e artilharia pesada.

Em 9, quando as tropas imperiais, as Guardas Brancas e os Freikorps avançaram, o Comando de Greve (Streikleitung) não clamou pela derrubada do governo, senão para que se utilizasse as armas “contra vossos inimigos mortais”(Gebraucht die Waffen gegen Eure Todfeinde!).

Em verdade, toda e qualquer análise rigorosamente fundada, sob o ângulo dialético-materialista – i.e. não oportunisticamente social-filistino -, acerca do perfil revolucionário de Karl Liebknecht há de iniciar-se, sempre e invariavelmente, com o preclaro e lapidar parecer expendido por Lenin sobre um dos mais destemidos lutadores revolucionários de vanguarda que o proletariado internacional conheceu.

 Em sua carta dirigida aos trabalhadores da Europa e dos EUA, Lenin escreveu da seguinte maneira:

Karl Liebknecht : esse nome é conhecido pelos trabalhadores de todos os países.

Por todos os lados ..., esse nome é símbolo da devoção de um dirigente em prol dos interesses do proletariado, da fidelidade à revolução socialista.

Esse nome é o símbolo da luta realmente verdadeira, realmente sacrificante, incomplacente, contra o capitalismo.

Esse nome é o símbolo da luta inconciliável contra o imperialismo, não em palavras, senão em ações, símbolo de uma luta que é disposta ao sacrifício precisamente quando a “própria” nação é envolvida pelo delírio de vitórias imperialistas.”[175]

 

O luxemburguismo, a seguir desenvolvido por Paul Levi representou uma forma alienada de representações das idéias de Rosa e sua cristalização anti-leninista, o que ficou, em 1921, meridianamente evidenciado com as tomadas de posições declaradas de Levi, culminando em sua expulsão da III Internacional, em um momento em que Lenin, Trotsky e Zinoviev a dirigiam. Depois disso, em 1922, Levi regressou… à II Internacional.

As apreciações de Rosa, Levi, Radek e, mais modernamente, Pierre Broué (e, por essa via, Grant e Woods) dominam, hoje, o tema e devem ser vistas com reservas. São contraditórias e representam visões equivocadas sobre o desenvolvimento do processo revolucionário da Alemanha.

As escassas análises de Lenin e Trotsky e mesmo da III Internacional sobre o processo revolucionário alemão de novembro de 1918 a janeiro de 1919 quase nunca são investigadas e citadas, o que abre ainda mais espaço ao luxemburguismo e sua suposta correção no tratamento das revoluções e o projeto de “socialismo democrático”, nos termos da obra clássica de Rosa Luxemburg, de 1918: Sobre a Revolução Russa. Essa historiografia dominou e ainda domina a esquerda, depois da stalinização da União Soviética, tendo-se tornado a base ideológica de inúmeros partidos da esquerda alegadamente democrática, reformista, oportunista e liquidacionista, que evitam o bolchevismo, valorizando a suposta posição “alternativa” de organização e moderação de Rosa Luxemburg. 

Mas, certo é que nem Lenin, nem Sverdlov, nem Trotsky, jamais se pôs a afirmar que Karl Liebknecht pretendera derrubar imediatamente o governo de Ebert, Scheidemann e Noske, sustentado pelos Generais Groener, Lequis e von Lüttwitz e pelas unidades paramilitares dos Freikorps, em Janeiro de 1919 ou coisa do gênero. Não lhe censuraram ou o corrigiram por ter sido um “putschista” aventureiro e querer imediatamente derrubar o governo, em meio à sua visível minoria, no seio da classe trabalhadora alemã.

Ainda no quadro histórico do ascenso insurrecional espontâneo das massas trabalhadoras, soldados e marinheiros de Berlim, provocado pela conclamação de Greve Geral de Janeiro de 1919, Karl Liebknecht escreveu, em 23 de dezembro 1918, demonstrando ter clareza do que pretendia e do que acusavam os spartakistas: 

“Agora, atacam os spartakistas com todos os meios imagináveis. A imprensa da burguesia e dos social-patriotas, do Vorwärts (Avante) ao Kreuz-Zeitung (Jornal da Cruz), debordando com mentiras aventureiras, exagerando com as mais insolentes distorsões, deformações e injúrias. O que é que nos lançam na cara de todas as maneiras? Que proclamamos o terror; Que queremos desencadear a mais sanguinolenta das guerras civis; Que nos equipamos com armas e munições, preparando-nos para uma insurreição armada. Em uma palavra: que somos os mais perigosos e inescrupulosos cães sangrentos do mundo. Essas mentiras são fáceis de compreender.”[176]   

 

Diferentemente das Jornadas de Julho de 1917 na Rússia – e das posições de Podvoisky, Nevsky, Volodarsky e da Organização Militar Bolchevique em Petrogrado (antagonizadas por Trotsky, Zinoviev e Kamenev) – certo é que Karl Liebknecht não propôs, na semana de 4 Janeiro de 1919, retomar sequer a cosigna “Todo Poder aos Conselhos de Trabalhadores” – que aparecera em dezembro de 1918, por ocasião do Congresso dos Conselhos de Fábrica, cuja vitória coube ao SPD de Ebert e Scheideman.

Em Janeiro de 1919, o intuito de Karl Liebknecht não era absolutamente derrubar o governo, mas sim mobilizar permanentemente as massas, inclusive armando-as ainda mais – o que era a regra naquele período posterior à derrota da I Guerra Mundial, com ruas tomadas por soldados da Divisão da Marinha do Povo (Volksmarinedivision), delegados sindicais revolucionários independentes, eleitos por conselhos de fábrica (revolutionäre Obleute), presididos por Paul Scholze, militantes da Social-Democracia Independente (USPD) e do comunistas-spartakistas (KPD) -, ocupando prédios públicos, e, por essa via, reverter, no curto prazo, a demissão do Presidente do Comissariado de Polícia de Berlim, Emil Eichhorn.

Seu método era o seguinte: acreditava que as massas trabalhadoras, soldados e marinheiros, sobretudo através das lutas, das greves gerais, avançariam em sua consciência política, arrastando, finalmente, para o campo dos revolucionários a tão esperada maioria. Esta seria a précondição para a tomada consciente do poder. Sua grande debilidade era a questão organizativa, presidida pela visão de Rosa Luxemburg.

Mas, a Greve Geral de Janeiro de 1919 foi reprimida brutalmente pelo Governo Ebert e Scheidemann, através de combates armados. Um novo capítulo da luta de classes se abrira, pois, diferentemente, das Jornadas de Julho de 1917 – em que dirigentes das lutas proletárias – como Trotsky, Lunatcharky e Zinoviev - foram encarcerados e depois simplemente liberados -, o Janeiro de 1919 na Alemanha foi o início de uma barbárie no centro do capitalismo avançado europeu: os dirigentes não eram presos e soltos, eram executados sumariamente. Pelas suas cabeças ofereciam-se recompensas milionárias.

Lenin sabia que o bolchevismo revolucionário tinha de chegar à Alemanha para que fosse possível vencer e que Karl Liebknecht – depois deste, Mehring – era precisamente o dirigente que mais ansiava por implantá-lo. A resistência mais encarnecida e insuperável, no interior das fileiras dos revolucionários alemães contra o bolchevismo, provinha de Rosa Luxemburg, Leo Jogliches, Paul Levi e seus aliados, destacadíssimos dirigentes do marxismo revolucionário alemão.

Depois da morte de Karl Liebknecht, Luxemburg e Jogliches, procurou Radek, desonestamente, a fim de surgir como o grande representante da III Internacional na Alemanha, “provar” que putschistas eram não apenas Liebknecht e seus seguidores, mas também Rosa Luxemburg e Jogliches, por que haviam participado do projeto de levante, concordando com ele ou não.

Uma crítica justa sobre Karl Liebknecht deveria referir-se muito mais ao seu revisionismo teórico, no campo da economia política, não ao fato de poder ser acusado de putschista, tal quais quiseram Radek, Levi e o luxemburguismo.[177]

 

Por fim, cumpriria frisar que não foi o “putschismo” ou a “estratégia da ofensiva” – tal como diz a lenda de Levi, Däumig, luxemburguistas, Brandler, Radek etc. - que destruiu o KPD alemão: pelo contrário, enquanto o Partido lutava, apesar de todos os erros de caracterização, atraia mais lutadores combativos para suas fileiras. Em fins de 1920, toda a ala esquerda do USPD ingressou no KPD.

Emil Eichhorn foi eleito pelo KPD repeditamente Deputado no Parlamento Alemão, até 1924, apesar de, contra ele, circular, desde janeiro de 1919, um mandato de prisão. Nos entreatos das eleições parlamentares, voltava à clandestinidade. Novamente eleito, gozando de imunidade parlamentar, voltava à cena pública. Morreu em julho de 1925.

 O KPD foi destruido, paulatinamente, a passo e passo, pelo stalinismo, a partir de 1924, tendo sido a direção Radek-Brandler o veículo de transmissão intermediária dessa transformação gradativa. Em suma, foram as capitulações, a parálise, a falta de luta e impulso combativo, o oportunismo do bloco do Plebiscito Vermelho KPD-Nazistas, que apodreceu o projeto de Partido marxista-revolucionário alemão, levando a que, em 1933, com a chegada de Hitler ao poder, o KPD permancesse inteiramente paralisado, não ousando nem sequer convocar uma Greve Geral.

Por tudo isso, creio que a questão da experiência alemã deveria ser examinada mais profundamente, mesmo sabendo que, dessa experiência histórica, pouco pode ser extraído positiva e categoricamente, senão apenas contraditoria e exortativamente, sendo o mais importante contrastar as posições equivocadas de Rosa em relação à questão da organização do Partido marxista-revolucionário, visando corrigí-las.

 

EDITORA DA UNIVERSIDADE COMUNISTA SVERDLOV

PARA A ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO

MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA DO PROLETARIADO

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS

FEVEREIRO DE 2002

 

 

 

 



[1] Vide, nesse sentido, LIEBKNECHT, KARL. Acerca da Justiça de Classe, São Paulo-Munique-Paris : Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2002, especialmente : Estado de Direito e Justiça de Classe, pp. 21 e 22.

[2] Passim PETRAS, JAMES. La Contraofensiva Imperial : Contradicciones, Desafíos y Oportunidades, in : Marxismo Vivo. Revista del Koorkom, Nr. 4, Deciembre de 2001, p. 44.

[3] Cf. LIEBKNECHT, KARL. Der neue Burgfrieden ( A Nova Paz Cidadã)(19 de Novembro de 1918), in : Dokumente und Materialien zur Geschichte der deutschen Arbeiterbewegung (Documentos e Materiais acerca da História do Movimento dos Trabalhadores Alemães), Série II, Vol. II, Berlim : Dietz, 1958, pp. 428 a 430.

[4] Cf. TUKHATCHEVSKY, MICHAIL N. Die Kampfhandlungen von Aufständischen während eines Aufstandes. Fortsetzung des letzten Kapitels(As Ações de Luta dos Sublevados Durante um Levante. Continuação do Capítulo Anterior), in : A. Neuberg. Der bewaffnete Aufstand. Versuch einer theoretischen Darstellung(A Insurreição Armada. Tentativa de uma Apresentação Teórica), Frankfurt a. M. : Georg Wagner, 1971, p. 241.

[5] Cf. LIEBKNECHT, KARL. Dokumente und Materialien zur Geschichte der deutschen Arbeiterbewegung (Documentos e Materiais acerca da História do Movimento dos Trabalhadores Alemaes), Série II, Vol. II, Berlim : Dietz, 1957, pp. 273 e 274.

[6]Presentemente, segue sendo decisivo ressaltar o efetivo caráter marxista-revolucionário de Karl Liebknecht, em face das atualíssimas produções corrosivamente oportunistas, delineadas por intelectuais vinculados ao Partido do Socialismo Democrático da Alemanha (PDS), os quais pretendem apresentar Liebknecht como um simples “político (Politiker)”, marcadamente identificável por seu matiz essencialmente idealista, desprovido de grande discernimento marxista-engelsiano. Em sentido paradigmático, examine-se o recentíssimo texto, inteiramente canhestro, da – assim designada pelo jornal alemão Junge Welt – proeminente Professora Doutora Laschitza, Annelies. Rosa Luxemburg und Karl Liebknecht – Ein biographischer Vergleich (Rosa Luxemburg e Karl Liebknecht – Uma Comparação Biográfica), in : Mitteilungen der Kommunistischen Plattform, 8 de Janeiro de 2002.; tb. Junge Welt. An Sonnabend zu den Gräbern von Karl und Rosa (No Domingo, Vamos ao Túmulo de Karl e Rosa), 13 de Janeiro de 2000. Ora ! Toda e qualquer análise rigorosamente fundada, sob o ângulo dialético-materialista – i.e. não oportunisticamente social-filistina -, acerca do perfil revolucionário de Karl Liebknecht há de iniciar-se, sempre e invariavelmente, com o preclaro e lapidar parecer expendido por Lênin sobre um dos mais destemidos lutadores revolucionários de vanguarda que o proletariado alemão conheceu : “Karl Liebknecht : esse nome é conhecido pelos trabalhadores de todos os países. Por todos os lados ..., esse nome é símbolo da devoção de um dirigente em prol dos interesses do proletariado, da fidelidade à revolução socialista. Esse nome é o símbolo da luta realmente verdadeira, realmente sacrificante, incomplacente, contra o capitalismo. Esse nome é o símbolo da luta inconciliável contra o imperialismo, não em palavras, senão em ações, símbolo de uma luta que é disposta ao sacrifício precisamente quando a “própria” nação é envolvida pelo delírio de vitórias imperialistas.” LÊNIN, VLADIMIR I. Brief an die Arbeiter Europas und Amerikas (Carta aos Trabalhadores da Europa e da América), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXIII, Berlim, 1959, p. 384.

[7]Cf. LIEBKECHT, KARL. Trotz alledem ! (Apesar de Tudo !), in : Rote Fahne (A Bandeira Vermelha), 15 de Janeiro de 1919.

[8] Cf. FLECHTHEIM, OSSIP K. Die KPD in der Weimarer Republik (O PCA na República de Weimar), Frankfurt a.M., 1969, p. 126.

[9]Cf.  VERFASSUNG DES DEUTSCHEN REICHS VOM 11. AUGUST 1919 (Constituiçao do Império Alemao, de 11 de Agosto de 1919), in : Reichsgesetzblatt (Diário Legal do Império), 1919, Nr. 152, pp. 1.383 e s.

[10] Acerca do tema, vide, mais amplamente, VON KÖLN, SCHMIDT.  O Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI) e a Corrente Franco-Gramsciana de Atualização, Correção e Superação do Marxismo (Meta-Marxismo de Actuel Marx). A Enfermidade Gramsciana no Movimento Trotskysta Contemporâneo e nas Lutas de Emancipação do Proletariado, Moscou – São Paulo – Munique – Paris : Editora da Universidade Comunista Sverdlov, Novembro de 2000, pp. 3 e s.

[11]  Nesse sentido, examine-se, mais profundamente, GRAMSCI, ANTONIO. Il Significato e i Risultati del III Congresso del Partito Comunista d’Italia (L’Unità, 24 de Fevereiro de 1926), in : Antonio Gramsci. Scritti Politici, Roma, 1967, pp. 651 e s.

[12]   Cf. TROTSKY, LÉON.  Lettera ai Bordighisti (Constantinopla, 25 de Novembro de 1929). Scritti sull’Italia (1921-1938), a cura di Dario Romero, in : http:// www. marxists.org /archive /noneng /trotsky, 1999.

[13] Cf. IDEM. Scritti sull’Italia (1921-1938), Roma : Controcorrente, p. 184.

[14] Cf. LÊNIN, VLADIMIR I. Thesen und Referat über bürgerliche Demokratie und Diktatur des Proletariats 4. März. I Kongreß der Komm. Internationale (Teses e Exposição acerca da Democracia Burguesa e Ditadura do Proletariado de 4 de Março. I Congresso da Internacional Comunista), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXVIII (De Julho de 1918 à Março de 1919), Berlim, 1959, pp. retro-mencionadas.

[15] Nesse sentido, vide, paradigmaticamente, os argumentos contidos no artigo publicístico do Professor Titular de Economia na Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de Buenos Aires (UBA), RIEZNIK, PABLO. A Revolução Argentina. Bancarrota, Dissolução e Rebelião Popular, Tradução de Osvaldo Coggiola e Pedro Pomar, in : Outras Palavras, Revista Eletrônica do Grupo de Estudos e Pesquisas  Teoria Crítica e Educação, Ano 2, 2002.

[16] Cf. PRENSA OBRERA. Altamira Planteó la Constituyente en la Legislatura de Buenos Aires, in: Prensa Obrera, Nr. 735, 27 de Dezembro de 2001.

[17] Cf. Ibidem.

[18] Cf. Ibidem.

[19] Acerca desse tema, vide mais detalhadamente VON KÖLN, SCHMIDT. ibidem, sobretudo Capítulo II.A : Atual Linha Político-Programática do SU-QI sob o Impacto do Gramscismo em Cinco Casos Específicos, pp. 76 e s.

[20] Cf. PARTIDO OBRERO. Marcha Nacional : 11-15 de Marzo, in : Prensa Obrera, Nr. 743, 28 de Fevereiro de 2002.

[21] Cf. IDEM. Editoral, Qué Debaten Las Asembleas Populares, in : ibidem..

[22] Cf. MST – UIT EN IZQUIERDA UNIDA. Surge la Asamblea Interbarrial en la Capital del País, in : Correspondencia Internacional. Argentinazo. Contra el Modelo del FMI y la Glöobalización, Nr. 17, Janeiro – Abril 2002, p. 8.

[23] Cf. FRENTE OBRERO SOCIALISTA – LIGA INTERNACIONAL DE LOS TRABAJADORES. ¿Salida Democrática o Salida Obrera ?, in : Lucha Socialista, Nr. 43, de 23 de Janeiro de 2002.

[24] A respeito desses dados empíricos, vide, sobretudo, Weber, Hermann. Von Rosa Luxemburg zu Walter Ulbricht. Wandlungen des deutschen Kommunismus (De Rosa Luxemburgo a Walter Ulbricht. Mudanças do Comunismo Alemão), Hannover : Literatur und Zeitgeschehen, 1961, pp. 7 e s.

[25] Acerca do tema, vide tb. Möller, Dietrich. Karl Radek in Deutschland. Revolutionär, Intrigant, Diplomat (Karl Radek na Alemanha. Revolucionário, Intrigante, Diplomata), Köln : Verlag Wissenschaft und Politik, 1976, pp. 18 e s.

[26] Recentemente, em 20 de maio de 2000, o Chanceler Federal da Alemanha, Gerhard Schröder, Presidente da Social-Democracia Alemã, exaltou, efusivamente, os méritos do Programa de Gotha, no quadro das Festividades dos 125 Anos do “Congresso da Unificação” dos Lassalleanos e Eisenachianos, ocorridas na cidade de Gotha, não deixando, porém, de assinalar, com a mais típica sagacidade sicofanta-filistina : “Mais uma vez em sua longa história, a Social-Democracia Alemã situa-se diante da tarefa de votar sua questão programática, o que é denominado de “realidade social”. ... Em 22 de maio de 1875, começou aqui em Gotha, em Tivoli, o “Congresso da Unificação da Social-Democracia da Alemanha”. Nele, fundiram-se o Partido dos Trabalhadores Social-Democrático (SDAP), fundado por August Bebel e Wilhelm Liebknecht, os assim-chamados “eisenachianos”, e a “Associação Geral dos Trabalhadores Alemães”, criada por Ferdinand Lassalle. Na história da teoria da esquerda alemã, essa data encontra-se, sobretudo, em mente em virtude da crítica mordaz de Karl Marx ao “Programa de Gotha” aqui firmado.  Além disso, por causa de uma parte corrupta da literatura – totalmente independente daquilo tudo que foi produzido em nome da doutrina marxista, nesse século, que ainda hoje vale a leitura. Retornarei mais tarde a isso, porque no que concerne ao teor do programa nada absolutamente surgia, em primeira linha, em diferenciação da programática social-democrática. O significado histórico do Congresso de Unificação de Gotha reside no poderoso passo rumo à unificação e à  unidade do movimento social-democrático dos trabalhadores. Apenas através dessa unificação a Social-Democracia, cujas raízes remontam até o ante-março e os anos da Revolução de 1848/49, tornou-se um partido relevante para toda a Nação. ... A sociedade civil burguesa que queremos criar é uma sociedade da liberdade e da auto-determinação, da solidariedade e da justiça. Uma sociedade que não seja dominada por uma classe, senão que conceda aos cidadãos soberanos sua independência e responsabilidade própria. Nisso – dizemo-lo com a mesma responsabilidade histórica – não permitimos que ninguém fique de lado. A Social-Democracia permanece sendo o poder de defesa dos fracos. Porém, ela permanece sendo a única força política em nosso país que é favorável à renovação de parte de sua tradição. Uma densa renovação tornou-se, em nossa sociedade, apenas sempre possível quando a Social-Democracia logrou impor o princípio da participação : participação no bem-estar, porém também nas decisões políticas da sociedade. E precisamente esse princípio abrir-nos-á o caminho para o futuro. Por isso, somos um partido forte que é consciente de seu passado e permanece vinculado às suas tarefas do futuro.” Cf. Schröder, Gerhard. Rede des SPD-Parteivorsitzenden, Bundeskanzler Gerhard Schröder, anlässlich der Festveranstaltung 125  Jahre "Vereinigungs-Congress" der  Lassalleaner und der Eisenacher (Discurso do Presidente do Partido Social-Democrático da Alemanha, Chanceler Federal Gerhard Schröder, por ocasiao do Ato de Festejo de 125 Anos do “Congresso da Unificação” dos Lassaleanos e dos Eisenachianos), in : http://www.spd.de/events/congress/schroeder.htmlGotha, 20 de maio de 2000.     

[27] Nesse sentido, vide p.ex. Detlef, Joseph. Rechtsstaat und Klassenjustiz. Texte aus der sozialdemokratischen “Neue Zeit” 1883-1914(Estado de Direito e Justiça de Classe. Textos do “Neue Zeit(Novo Tempo) Social-Democrático), Freiburg-Berlim : Rudolf Haufe, 1996, p. 402.

[28] Nesse sentido, vide sobretudo Marx, Karl. Kritik des Gothaer Programms(Crítica ao Programa de Gotha) (Abril e Início de Maio de 1875), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. XIX, Berlim : Dietz Verlag, 1961, pp. 13 e s.

[29] Cf. Engels, Friedrich. Brief an August Bebel (Carta à August Bebel) (18 – 28 de Março de 1875), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. XIX, Berlim : Dietz Verlag, 1961, p. 6.

[30] Cf. Marx, Karl. Brief an Ferdinand Domela Nieuwenhuis (Carta à Ferdinand Domela Nieuwenhuis)(22 de Fevereiro de 1881), in : ibidem, Vol. XXXV, pp. 160 e 161.

[31] Cf. Engels, Friedrich. Brief an F. A. Sorge (Carta à F. A. Sorge) (11 de Fevereiro de 1891), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. XXXVIII, Berlim : Dietz Verlag, 1961, pp. 30 e 31. Acerca dos posicionamentos de Friedrich Engels em face da questao do homossexualismo, vide, em particular, seus comentários acerca do livro de Karl Heinz Ulrichs, um dos primeiros e mais célebres propagandistas do movimento homossexual da Alemanha, Cf. Engels, Friedrich. Brief an Marx (Carta à Marx)(22 de Junho de 1869), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. XXXII, Berlim : Dietz Verlag, 1961, pp. 324 e 325.; também Idem, Der Ursprung der Familie, des Privateigentums und des Staats (A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado)(Fim de Março à 26 de Maio de 1884), in : ibidem, Vol. XXI, p. 67.

[32] Cf. Rück, Fritz. Von Bismack bis H. Müller. Vom Sozialistengesetz zur Koalitionsregierung. Der Weg der deutschen Sozialdemokratie vom Sozialistengesetz zum Panzerkreuz A 1878 – 1928 (De Bismarck a H. Müller. Da Lei Contra os Socialistas ao Governo de Coalizão. O Caminho da Social-Democracia Alemã da Lei Contra os Socialistas ao Cruzador Blindado A 1878 – 1928), Berlim : Internationaler Arbeiterverlag, 1928, p. 4.

[33] Cf. Idem. ibidem, p. 3.

[34] Vide, nesse sentidom, o excelente trabalho investigativo de Rück, Fritz. ibidem, p. 4.

[35] Procurando elaborar um balanço político acerca desse período da luta de classes da Alemanha, escreve Rück, com grande propriedade : “Segundo uma estatística imprecisa, foram proibidos, sob a vigência da Lei Contra os Socialistas, 1.300 publicações períodicas e não periódicas e 332 organizações de trabalhadores de um tipo ou do outro. Ocorreram 900 expulsões das áreas ocupadas, que atingiram mais de 500 pais de família. O volume dos penas de privação de liberdade, impostas judiciariamente, atingiu cerca de 1.000 anos, distribuidos entre 1.500 pessoas. Em face, porém, das vítimas que os trabalhadores revolucionários da Alemanha tiveram, nos anos desde o esmagamento da Revolução de 1918, no quadro da luta pela imposição de seus objetivos de classe, esses números não são demasiadamente elevados. Também a derrota da Comuna custou consideravelmente mais ao proletariado francês do que a Lei Contra os Socialistas, ao movimento dos trabalhadores alemães. Porém, a Lei Contra os Socialistas não foi a conseqüência de uma revolução derrotada, na qual se discutisse sobre toda a intervenção havida, mas sim a tentativa de Bismarck de impedir o desenvolvimento de um Partido classista-revolucionário do proletariado alemão.” Cf. Rück, Fritz. ibidem, p. 5.     

[36] Cf. Rück, Fritz. ibidem, p. 6.     

[37] Cf. Mehring, Franz.

[38] Cf. Bracke, Wilhelm.

[39] Cf. Marx, Karl.

[40] Cf. Engels, Friedrich.

[41] Nesse sentido, vide, precisamente, Rück, Fritz. ibidem, p. 7.

[42] Cf. Idem, ibidem, p. 7.

[43] Cf. Idem, ibidem, p. 7.

[44] Cf. Kautsky, Karl. Das Erfurter Programm(O Programa de Erfurt)(1892), Berlim : Dietz Verlag, 1919, p. 102.

[45] Cf. Liebknecht, Wilhelm. Protokoll des Erfurter Parteitages (Protocolo do Congresso de Erfurt), Berlim : Dietz Verlag, 1891, p. 206.

[46] Nesse sentido, vide Idem. Zukunftstaatlisches (Coisas do Estado Futuro), in : Cosmopolis, Berlim, 1898, pp. 218 e 219.

[47] Cf. Bebel, August. Protokoll des Erfurter Parteitages (Protocolo do Congresso de Erfurt), Berlim : Dietz Verlag, 1891, p. 172.

[48] Cf. Engels, Friedrich. Brief an Paul Lafargue(Carta a Paul Lafargue)(3 de Abril de 1895), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. XXXIX, Berlim : Dietz Verlag, 1961, p. 458. 

[49] Cf. Idem. Einleitung zu Karl Marx‘ „Klassenkämpfe in Frankreich 1848 bis 1850“(Introduçao a “Lutas de Classes na França de 1848 a 1850 de Karl Marx)(14 de Fevereiro – 6 de Março de 1895), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. XXII, Berlim : Dietz Verlag, 1961, pp. 519 e s.      

[50] Acerca do tema, vide Marx und Engels Werke(Obras de Marx e Engels), Vol. XXXIX, Berlim : Dietz Verlag, 1961, pp. 605 e 606. 

[51] Cf. Luxemburg, Rosa. Dem Andenken des „Proletariat“ (Em Lembrança do „Proletariado“)(1903), in : Rosa Luxemburg Gesammelte Werke, Vol. ½, Berlim, 1972, p. 317.

[52] Continua sempre sendo muito importante estudar e desvendar-se, detidamente, o lassalleismo pacifista de Eduard Bernstein. No presente trabalho, limito-me a salientar que Bernstein surge, na história do movimento proletário internacional, como o principal editor e defensor da doutrina de matiz idealista-oportunista e reformista-colaboracionista de Ferdinand Lassalle. Nesse sentido, vide as introduções, elaboradas por Bernstein, aos volumes de Lassalle, Ferdinand. Gesammelte Reden und Schriften. Herausgegeben und Eingeleitet von Eduard Bernstein(Discursos e Escritos Reunidos. Editados e Prefaciados por Eduard Bernstein), Berlim : Paul Cassirer, 1919, Vol. I e s. Em seu prefácio ao Vol. II das obras em tela, Bernstein assinala acerca do discurso de Lassalle, intitulado Sobre o Sistema Constitucional, de 1862 : “Na realidade, pode-se dizer que, no que concerne à aplicação da concepção materialista da história às questões do desenvolvimento político dos povos, não existe nenhum escrito que demonstre aquela relação de dependência em ilustração mais clara do que esse discurso. Ele encontra seu eqüivalente apenas nos capítulos “A Teoria do Poder” de Friedrich Engels, contida no Anti-Dühring.” Cf. Bernstein, Eduard. Vorbermekung(Nota Preliminar), in : Ferdinand Lassalle, ibidem, Vol. II : Discursos Constitucionais. O Programa dos Trabalhadores e os Subseqüentes Discursos de Defesa, Berlim : Paul Cassirer, 1919, p. 12. No que concerne à obra-prima econômica de Ferdinand Lassalle, denominada O Sr. Bastiat-Schulze von Delitzsch, dedicada por Lassalle expressamente Dem Deutschen Arbeiterstande und der Deutschen Bourgeoisie, i.e. ao “Estamento dos Trabalhadores Alemães e à Burguesia Alemã”, Eduard Bernstein anota o seguinte : “Em “Bastiat-Schulze” temos diante de nós o principal trabalho sócio-econômico de Lassalle. O “Sistema dos Direitos Adquiridos” foi, em seu último objetivo, a tentativa de uma fundamentação jurídico-científica das idéias socialistas. Lassalle pretendeu, então, ingressar na fundamentação econômica do socialismo, para o que realizou estudos antecipatórios, por todos os lados, no curso dos anos, quando, de início, o conflito constitucional-prussiano lançaram-no no movimento político e, a seguir, no movimento ascendente dos trabalhadores, bem como na agitação prática socialista.” Cf. Idem. Vorbermekung(Nota Preliminar), in : Ferdinand Lassalle, ibidem, Vol. V : Principal Obra Econômica de Lassalle, Berlim : Paul Cassirer, 1919, p. 9. 

[53] Cf. Lênin, Vladimir I. Der „linke Radikalismus“, die Kinderkrankheit im Kommunismus (O „Radicalismo de Esquerda“ : Enfermidade Infantil no Comunismo)(Abril-Maio de 1920), in : W. I. Lenin Werke, Berlim, 1962, Vol. XXXI, pp. 20 e s.

[54] Cf. Lênin, Vladimir I. Rede bei der Eröffnung des Kongresses 2. März. I Kongreß der Komm. Internationale (Discurso na Abertura do Congresso de 2 de Março. I Congresso da Internacional Comunista), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXVIII (De Julho de 1918 à Março de 1919), Berlim, 1959, p. 469. Ainda em defesa de Rosa Luxemburg, vide Lênin, Vladimir I. Brief an die Arbeiter Europas und Amerikas (Carta aos Trabalhadores da Europa e da América) (21 de Janeiro de 1919), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXVIII, Berlim, 1962, p. 446 e s.; IDEM. Rede Anläßlich der Ermordung Luxemburgs und Liebknechts (Discurso Por Ocasião do Assassinato de Luxemburg e Liebknecht)(19 de Janeiro de 1919), in : ibidem, Vol. XXVIII, p. 422.

[55] Acerca dessa polêmica, com referências claras aos posicionamentos de Jacques Texier e François Vercammen, como também à posição de Rosa Luxemburg, vide mais precisamente Von Köln, Schmidt. O Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI) e a Corrente Franco-Gramsciana de Atualização, Correção e Superação do Marxismo (O Meta-Marxismo de Actuel Marx). A Enfermidade Gramsciana no Movimento Trotskysta Contemporâneo e nas Lutas de Emancipação do Proletariado, Munique : 2000, pp. 1 e s.

[56] Cf. Luxemburg, Rosa. Und Zum Dritten Male das Belgische Experiment (E Pela Terceira Vez o Experimento Belga)(4 de Junho de 1902) , in : Rosa Luxemburg Gesammelte Werke, Vol. ½, Berlim, 1972, p. 247.

[57] Cf. Idem. Dem Andenken des „Proletariat“ (Em Lembrança do „Proletariado“), in : ibidem, p. 317. Acerca de W. Liebkencht, vide Liebknecht, Wilhelm. Zukunftstaatlisches (Coisas do Estado Futuro), in : Cosmopolis, Berlim, 1898, pp. 218 e 219.

[58] Cf. Lênin, Vladimir I. I. Kongreß der Kommunistischen Internationale (I Congresso da Internacional Comunista)(2 de Março de 1919), in : ibidem, Vol. XXVIII, p. 477. No mesmo sentido, vide Idem. Über die Gründung der Komintern (Acerca da Fundaçao da Internacional Comunista) (6 de Março de 1919), in : ibidem, Vol. XVIII, p. 499.; Idem. Erfolge und Schwierigkeiten der Sowjetmacht (Sucessos e Dificuldades do Poder Soviético) (17 de Abril de 1919), in : ibidem, Vol. XXIX, p. 56.; Idem. Plenum des Gesamtrussischen Zentralrats der Gewerkschaften (Plenária do Conselho Central de Toda Rússia dos Sindicatos) (11 de Abril de 1919), in : ibidem, Vol. XXIX, p. 283.; Idem. Über die Aufgaben der III. Internationale (Sobre as Tarefas da III Internacional)(14 de Julho de 1919), in : ibidem, Vol. XXIX, p. 501.; Idem. Wie die Bougeoisie die Renegaten Ausnutzt (Como a Burguesia Usa os Renegados) (Setembro de 1919), in : ibidem, Vol. XXX, pp. 9 e s.; IDEM. Rede auf dem I. Gesamtrussischen Verbandstag der Bergarbeiter (Discurso na I Conferência de Toda a Rússia da Associaçao dos Mineiros) (5 de Abril de 1920), in : ibidem, Vol. XXX, pp. 490 e s.     

[59] Vide, nesse sentido, Michels, Robert. Soziologie des Parteiswesens in der modernen Demokratie. Untersuchungen über die oligarchischen Tendenzen des Gruppenlebens  (Sociologia do Sistema Partidário na Democracia Moderna. Investigaçoes acerca das Tendências Oligárquicas da Vida em Grupo)(1911), ed. Werner Conze, Stuttgart : Kröner, 1957, pp. 7 e s.

[60] Acerca do tema, coteje-se a obra de Fischer, Ruth. Stalin und der deutsche Kommunismus. Der Übergang zur Konterrevolution(Stálin e o Comunismo Alemão. A Transição para a Contra-Revoluçao), Frankfurt a. M. : Verlag der Frankfurter Hefte, 1948, pp. 9 e s.

[61] Acerca do tema, vide Luxemburg Rosa. Organisationsfrage der russischen Sozialdemokratie(Questoes de Organizaçao da Social-Democracia Russa), in : Die Neue Zeit (O Novo Tempo), 1904, pp. 484 e s. 

[62] Vide, nesse sentido, sobretudo Lênin, Vladimir I. Nachtigallen Mag Man mit Märchen Abspeisen(Roxinóis Podem Ser Iludidos com Contos de Fadas)(1904), in : W. I. Lenin Werke, Berlim, 1962, Vol. III, pp. 17 e s.

[63] Acerca do tema, vide, sobretudo, Idem, Womit Beginnen ? (Com O Que Começar)(Maio de 1901), in : ibidem, Vol V, pp. 1 e s.; Idem, Was Tun ? Brennende Fragen unserer Bewegung (Que Fazer ? Questoes Cadentes do Nosso Movimento)(Outono 1901 – Fevereiro de 1902), in : ibidem, Vol. V, pp. 355 e s.

[64] Cf. Idem, Was Tun ? Brennende Fragen unserer Bewegung (Que Fazer ? Questoes Cadentes do Nosso Movimento)(Outono 1901 – Fevereiro de 1902), in : ibidem, Vol. V, p. 367 e s.

[65] Cf. Idem, ibidem, p. 368.

[66] Cf. Idem, ibidem, p. 370.

[67] Cf. Steklov, Y. M. N. G. Tchernyshevski, Moscou, 1928, Vol. I, p. 294.

[68] Cabe assinalar que Tkatchev, apesar de considerar-se discípulo de Tchernyshevski, divergia do grande mestre por não entender que o tempo corresse em favor da revolução e o futuro pertencesse, inquestionável e necessariamente, ao homem novo e à gente nova, de Que Fazer?. Deixando-se escapar a oportunidade revolucionária e o ímpeto de luta da vanguarda, diluindo-se, de maneira baldada, o cataclismo de protestos, o futuro pertenceria à classe média, exploradora e usurária. Nesse sentido, vide Ulam, Adam B. Die Bolshewiki. Vorgeschichte und Verlauf der kommunistischen Revolution in Russland, Köln-Berlin, 1967, p. 97.     

[69] Cf. Tkatchev, Peter N. Sobranie Sotchinenii (Obras Completas), Moscou, 1933, Vol. III, p. 223.

[70] Cf. Idem. ibidem, p. 225.

[71] Acerca do tema, vide Luxemburg Rosa. Organisationsfrage der russischen Sozialdemokratie(Questoes de Organizaçao da Social-Democracia Russa), in : Die Neue Zeit (O Novo Tempo), 1904, pp. 484 e s. 

[72] Observe-se que Auguste Blanqui foi o célebre revolucionário francês que, em 1839, intentou realizar um levante armado, na França. Libertado do cárcere, Blanqui tomou parte ativa na Revolução de 1848. Em 1871, cerca da metade dos dirigentes da Comuna de Paris eram declaramente blanquistas, sendo que o próprio Blanqui encontrava-se, a esse tempo, aprisionado. Blanqui celebrizou-se por organizar clubes revolucionários ilegais e por doutrinar que “a luta a ser travada entre ricos e pobres haverá de ser vencida pela Ditadura Revolucionária.” Entretanto, Marx advertiu, no Segundo Relatório do Conselho Geral da Internacional, de 9 de setembro de 1870,  contra Blanqui que fundara, em 1870, “La Patrie en danger(A Pátria está em Perigo)”: “Nao se deixar dominar pelas recordaçoes nacionais de 1792”, “Executar exaustivamente a organizaçao de sua própria classe”, “Nao se colocar como objetivo a derrubada do governo (“uma estupidez deseperada”.  Em novembro de 1880, Blanqui censurou, em seu livro intitulado Ni Dieu ni maître(Nem Deus nem Mestre), a teoria da luta de classes e a separaçao dos interesses do proletariado dos interesses da naçao. Com efeito, Blanqui nao operava qualquer separaçao entre entre trabalhadores e burguesia revolucionária. Acerca do tema, vide os próprios argumentos de Lênin, Vladimir I. Plan einer Vorlesung über die Kommune (Plano de uma Exposiçao sobre a  Comuna)(Fevereiro – Março de 1905), in :  W. I. Lenin Werke (Obras de V. I. Lênin), Vol. VIII, Berlim : Dietz Verlag, 1962, pp. 195 e s.

[73] vide Luxemburg Rosa. Organisationsfrage der russischen Sozialdemokratie(Questoes de Organizaçao da Social-Democracia Russa), in : Die Neue Zeit (O Novo Tempo), 1904, pp. 527. 

[74] Nesse sentido, vide Trotsky, Léon. Our Political Tasks (Nossas Tarefas Políticas)(1904), in : http: // www. marxists. org. / archive/ trotsky/works /1904, em particular Part II : Tactical Tasks. The Content of Our Activity in the Proletariat – To Work Then ! Long Live the Self-Activity of the Proletariat ! Down with the Political Substitutionalism ! (Parte II : Tarefas Táticas. O Conteúdo de Nossa Atividade no Proletariado – Entao ao Trabalho ! Vida Longa à Auto-Atividade do Proletariado ! Abaixo o Substitucionalismo Político !)  

[75] Cf. Idem. Moia Jizn. Opyt Avtobiografii (Minha Vida. Uma Tentativa de Auto-Biografia), Berlim : Granit, 1930, pp. 213 e s.

[76] Acerca do tema, vide, mais precisamente, Lênin, Vladimir I. Der Internationale Sozialistenkongress in Stuttgart(O Congresso Internacional Socialista de Stuttgart)(Agosto-Setembro de 1907) in : W.I. Lenin Werke (Obras de V.I. Lênin), Vol. XIII, Berlim : Dietz Verlag, 1962, pp. 71 e s.; Idem. Der Internationale Sozialistenkongress in Stuttgart (O Congresso Internacional Socialista de Stuttgart) (Meados de Setembro de 1907) in : W.I. Lenin Werke (Obras de V.I. Lênin), Vol. XIII,  Berlim : Dietz Verlag, 1962, pp. 83 e s.   

[77] Acerca do tema, vide, tb., Idem. Unsere Liquidatoren (Nossos Liquidadores)(1911), in : ibidem, Vol. XVII, pp. 62 e s.

[78] Cf. Martov, Jules A. Geschichte der Russischen Sozialdemokratie, mit einem Nachtrag von Theodor Dan : Die Sozialdemokratie Russlands nach dem Jahre 1908 (História da Social-Democracia Russa, com um Apenso de Theodor Dan : A Social-Democracia da Rússia após 1908), Berlim, 1926, p. 268.

[79] Cf. Rück, Fritz.  November 1918. Die Revolution in Württemberg(Novembro de 1918. A Revoluçao em Württemberg)(1958), in : Fritz Rück. Schriften zur Deutschen November-Revolution 1918 (Escritos Acerca da Revoluçao Alema de Novembro de 1918), Stuttgart : Studiengruppe zur Geschichte der Arbeiterbewegung, 1978, p. 14.

[80] Vide, nesse sentido, Liebknecht, Karl. Acerca da Justiça de Classe, Sao Paulo-Munique-Paris : Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2002, especialmente Introduçao : O Revolucionário Karl Liebknecht, p. 16.

[81] Cf. Pieck, Wilhelm. Erinnerungen an die Novemberrevolution und an die Gründung der KPD (Recordaçoes da Revoluçao de Novembro e da Fundaçao do PCA), in : Vorwärts und nicht Vergessen : Erlebnisberichte aktiver Teilnehmer der Novemberrevolution 1918/1919.  (Avante e Sem Se Esquecer : Relatórios de Vida dos Ativos Participantes da Revoluçao de Novembro 191871919), ed. Instituto de Marxismo-Leninismo junto ao Comitê Central do Partido da Unidade Socialista, Berlim : Dietz, 1958, pp. 64 e s.

[82] Cf. Bericht über den Gründungsparteitag der Kommunistischen Partei Deutschlands (Spartakusbund) vom 30. Dezember 1918 bis 1. Januar 1919 (Relatório sobre o Congresso de Fundaçao do Partido Comunista da Alemanha (Liga Spartakus) de 30 de dezembro a 1° de janeiro de 1919), Berlim : Kommunistische Partei Deutschlands, 1919,  p. 6.

[83] Acerca dessa temática, vide, sobretudo, Luxemburg, Rosa. Die Akkumulation des Kapitals : Ein Beitrag zur ökonomischen Erklärung des Imperialismus (A Acumulaçao do Capital : Uma Contribuição à Clarificação Econômica do Imperialismo), Berlim, 1913, pp. 5 e s.

[84] Acerca do tema, vide, sobretudo, Lênin, Vladimir I. Der Imperialismus als höchste Stufe des Kapitalismus (O Imperialismo enquanto Fase Superior do Capitalismo) in : W.I. Lenin Werke (Obras de V.I. Lênin) (1916), Vol. XI,  Berlim : Dietz Verlag, 1962, pp. 83 e s.   

[85] Nesse sentido, vide, sobretudo, Lênin, Vladimir I. Die Militärfrage der proletatischen Revolution (A Questao Militar da Revoluçao Proletária) (Setembro de 1916), in : Drei Aufsätze von W. I Lenin, Leo Trotzki, Karl Liebknecht. Gegen den bürgerlichen Militarismus ! Gegen den Pazifismus ! Für die Bewaffnung des Proletariats (Três Ensaios de V. I. Lênin, Léon Trotsky, Karl Liebknecht. Contra o Militarismo Burguês ! Contra o Pacifismo ! Pelo Armamento do Proletariado), Schriftreihe Internationale Jugendbibliothek (Série de Escritos da Biblioteca Internacional da Juventude), Nr. 17, Berlim : Verlag Jungendinternationale - Junge Garde, 1921, pp. 20 e s.  Esse artigo de Lênin encontra-se publicado, igualmente, da seguinte forma, Idem. Das Militärprogram der proletarischen Revolution(O Programa Militar da Revoluçao Proletária)(Dezembro de 1916), in :  W. I. Lenin Werke (Obras de V. I. Lênin), Vol. XXIII, Berlim : Dietz Verlag, 1962, pp. 72 e s. Cumpre anotar, de modo elucidador, que o artigo em tela, foi objeto de tradução para o idioma português, por Schmidt von Köln. O seu original surgiu, originalmente, em língua alemã, em setembro de 1916, tendo sido destinado à publicação na imprensa escandinava social-democrática de esquerda. Essa última havia intervindo, durante a guerra mundial imperialista de 1914-1918, contra o ponto do programa social-democrático de "armamento do povo", levantando a falsa consigna de "desarmamento". Em dezembro de 1916, o artigo objeto da presente tradução foi publicado, em língua russa, no Nr. 2 do "Sbornik Sozial-Demokrata (Compêndio Social-Democrata), em versão adaptada, sob o título "Acerca da Consigna de «Desarmamento»". Em abril de 1917, pouco antes de sua partida para a Rússia, Lênin repassou o primeiro artigo, redigido em língua alemã, à redação de "Internacional da Juventude". Essa versao original foi publicada, entao, em 1917, no Nr. 9 e 10 dessa revista.

[86] Cf. Luxemburg, Rosa. Krise der Sozialdemokratie (A Crise da Social-Democracia)(Abril 1915), in: Rosa Luxemburg, Gesammelte Werke, Band IV, Berlim : Dietz Verlag, 1974, p. 11 e s.

[87] Observe-se que o General Galiffet foi o célebre militar francês, renomado pela autoria de suas carnificinas perpetradas no quadro do esmagamento da Comuna de Paris. Atribui-se a Galiffet, a sumária execuçao de mais de 100.000 trabalhadores communards. 

[88] Cf.  Thesen über Imperialismus und Nationale Unterdrückung angenommen vom Zentralkomitee der Sozialdemokratischen Partei Russisch-Polens(Teses acerca do Imperialismo e a Opressao Nacional, adotadas pelo Comitê Central do Partido Social-Democrático da Polônia Russa), in : Gazeta Robotnicza (Jornal dos Trabalhadores), 2 de abril de 1916.

[89] Cf. Lênin, Vladimir I. Die Ergebnisse der Diskussion über die Selbstbestimmung, in : W. I. Lenin Werke (Obras de V. I. Lênin), Vol. XIX, Berlim : Dietz Verlag, 1962, pp. 295 e s.

[90] Cf. Idem, Das Selbstbestimmungsrecht der Völker (O Direito de Auto-Determinação dos Povos), especialmente títulos “Das Verhalten der russischen und polnischen Sozialdemokratie und der II Internationale (O Comportamento da Social-Democracia Russa e Polonesa com a II Internacional)”, in : ibidem, Vol. XVIII, pp. 54 e s.

[91] Cf. Luxemburg, Rosa. Zur Russischen Revolution (Acerca da Revoluçao Russa) (Junho de 1918), in : Rosa Luxemburg Gesammelte Werke, Vol. 4, Berlim, 1972, pp. retro-mencionadas.

[92] Acerca do tema, vide, p.ex., Lênin, Vladimir I. Außerordentlicher Gesamtrussischer Eisenbahnerkongreß (Congresso Extraordinário de Toda Rússia dos Ferroviários) (13 de Janeiro de 1918), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXVI, Berlim, 1962, p. 489 e s.; Idem. Die Dritte Internationale und ihr Platz in der Geschichte(A III Internacional e Seu Lugar na História)(15 de Agosto de 1919), in : ibidem, Bd. XXIX, pp. 299 e s.; Lunatscharsky, Anatoly. Jakob Michailovitsch Sverdlov(Traduçao para a Língua Portuguesa de Emil von München), in : Textos sobre o Grande Organizador da Revoluçao Proletária Russa e Representante da Primeira República Soviética Socialista J. M. Sverdlov, Sao Paulo-Munique-Paris : Editora Sverdlov para a Organizaçao Socialista-Revolucionária dos Trabalhadores, 4 de Agosto de 1999.

[93] Cf. Luxemburg, Rosa. Zur Russischen Revolution (Acerca da Revoluçao Russa) (Junho de 1918), in : Rosa Luxemburg Gesammelte Werke, Bd. 4, Berlim, 1972, pp. retro-mencionadas.

[94] Cf. Lênin, Vladimir I. Thesen und Referat über bürgerliche Demokratie und Diktatur des Proletariats 4. März. I Kongreß der Komm. Internationale (Teses e Exposição acerca da Democracia Burguesa e Ditadura do Proletariado de 4 de Março. I Congresso da Internacional Comunista), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXVIII (De Julho de 1918 à Março de 1919), Berlim, 1959, pp. retro-mencionadas.

[95] Vide, acerca do tema, CONSTITUTION OF THE RUSSIAN SOCIALIST FEDERATED SOVIET REPUBLIC, Adopted by the Fifth All-Russia Congress of Soviets (Adotada pelo V Congresso dos Soviets de Toda Rússia), Moscou, 10 de Julho de 1918, Chapter V, art. 9°. Vide tb. comentários de STUTCHKA, PIOTR.  Constitutsia Grajdanskoi Voinyi (1918 - A Constituição da Guerra Civil. Tradução em Língua Portuguesa de Emil von München), in: Textos Jurídicos de Formação dos Juristas Socialistas da Classe Trabalhadora. Instituto Luís e Rosa Sunderman : Ed. Jurídica Socialista dos Trabalhadores, São Paulo-Munique-Paris, 2000.

[96] Apreciando, resgatando e defendendo, devidamente, a tradição essencialmente marxista de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg, comprometida, antes e acima de tudo, com a perspectiva de organização da revolução violenta do proletariado para a edificação da Ditadura Revolucionária do Proletariado na Alemanha, Lênin afirmou, solenemente, em seu Discurso de Abertura do I Congresso do Komintern : „Em nome do Comitê Central do Partido Comunista da Rússia, declaro aberto o I Congresso da Internacional Comunista. Em primeiro lugar, peço a todos os presentes que se levantem de suas cadeiras em memória dos melhores representantes da III Internacional : Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg.“ Cf. LÊNIN, VLADIMIR I. Rede bei der Eröffnung des Kongresses 2. März. I Kongreß der Komm. Internationale (Discurso na Abertura do Congresso de 2 de Março. I Congresso da Internacional Comunista), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXVIII (De Julho de 1918 à Março de 1919), Berlim, 1959, p. 469. Essas palavras de Lênin, relacionadas com sua interpretação do papel histórico de Liebknecht e Luxemburg, enquanto os melhores representantes da Internacional Comunista, deveriam, em princípio, servir, por si mesmas, como látego desferido frontalmente contra as desavergonhadas tentativas doutrinárias dos principais ideólogos franco-gramscianos de Actuel Marx e do SU-QI, voltadas a transformar Rosa Luxemburg em uma social-oportunista vulgar, que carrega, eternamente, consigo, no caminho da luta pelo socialismo, a auréola santificada da defesa de fórmulas de liberdade essencialmente democrático-burguesas. Acerca dessa polêmica, com referências claras aos posicionamentos de Jacques Texier e François Vercammen,  como também às próprias posições de Rosa Luxemburg, vide mais precisamente o Capítulo II do presente texto.

[97] Cf. Lênin, Vladimir I. Thesen und Referat über bürgerliche Demokratie und Diktatur des Proletariats 4. März. I Kongreß der Komm. Internationale (Teses e Exposição acerca da Democracia Burguesa e Ditadura do Proletariado de 4 de Março. I Congresso da Internacional Comunista), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXVIII (De Julho de 1918 à Março de 1919), Berlim, 1959, p. 479.

[98] Cf. Idem. ibidem, pp. 480 e 481.

[99] Cf. Idem. ibidem, p. 484.

[100] Cf. Idem. ibidem, p. 485.

[101] Cf. Karim, Darioush. The Revolutionary Dictatorship of the Proletariat, Bogotá: Partido Socialista de los Trabajadores of Colombia, 1979, pp. 25 e 26.

[102] Cf. Luxemburg, Rosa. Krise der Sozialdemokratie (A Crise da Social-Democracia)(Abril de 1915), in: Rosa Luxemburg, Gesammelte Werke, Band IV, Berlim : Dietz Verlag, 1974, p. 163.

[103] Cf. Idem, ibidem, p. 64.

[104] Cf. Kuczynski, Jürgen. Darstellung der Lage der Arbeiter in Deutschland von 1900 bis 1917/18 (Apresentaçao da Situaçao dos Trabalhadores na Alemanha de 1900 a 1917/18), Vol. IV : Die Geschichte der Lage der Arbeiter unter dem Kapitalismus (A História da Situaçao dos Trabalhadores sob o Capitalismo), Berlim : Akademie-Verlag, 1967, p. 233. A poesia em referência soa, no vernáculo : “O du Deutschland, jetzt hasse; geharnischt in Erz : Jedem Feind einen Bajonettstich ins Herz ! Nimm keinen gefangenen ! Mach jeden gleich stumm ! Schaff zur Wüste den Gürtel der Länder rundum!”

[105] Nesse sentido, vide, sobretudo, Liebknecht, Karl. Acerca da Justiça de Classe, Sao Paulo-Munique-Paris : Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2002, especialmente Introduçao : O Revolucionário Karl Liebknecht, p. 15.

[106] Em verdade, não se permitiu a Karl Liebknecht nem sequer expressar-se oralmente durante os debates de votação, sendo que as razões jurídico-políticas justificadoras de sua rejeição de concessão dos créditos de guerra não constam de qualquer protocolo parlamentar oficial. Nesse sentido, vide Friedrich, Thomas. Revolution und Konterrevolution 1918/19. Chronik der wichtigsten Ereignisse (Revolução e Contra-Revolução de 1918-1919. Crônica dos Eventos Mais Importantes), in : Neue Gesellschaft für Bildende Kunst (Nova Sociedade para a Arte Cultural), Revolution und Fotografie. Berlin 1918/19 (Revolução e Fotografia. Berlim 1918-1919), Berlim : Verlag Dirk Nishen, 1989, p. 85.

[107] Acerca desse episódio histórico, um representante do Estado-Maior das Forças Armadas Alemaes relatou os seguintes fatos ao Ministério do Interior do Império acerca do ascenso da temperatura revolucionária entre os soldados e trabalhadores alemaes : “... É lamentavelmente verdadeiro o fato de que segue progredindo a decomposiçao das associaçoes das tropas do fronte e do interior país. O Departamento de Polícia Central do Leste comunicou, repetidamente, que setores de tropa que estavam concentrados nas guarniçoes orientais, rejeitaram, no momento de seu transporte,  embarcar nos vagoes, desfraldando bandeiras vermelhas ou distribuindo fitas vermelhas. Em várias ocasioes, foram também disparados tiros reais no ar ...” Cf. Kunstamt Kreuzberg und Institut für Theaterwissenschaft der Universität Köln. Weimarer Republik, Berlin-Köln : Elefanten Press, 1977, p. 104.  

[108] Cf. Vortwärts. Berliner Volksblatt (Avante. Diário Berlinense do Povo). Aufruf zur Zeichnung der IX. Kriegsanleihe (Conclamaçao para a Subscriçao do IX Empréstimo de Guerra), Berlim, 27 de Outubro de 1918.

[109] Cf. Fröhlich, Paul. Rosa Luxemburg. Gedanke und Tat(Rosa Luxemburg. Pensamento e Açao), Frankfurt am Main, 1967, p. 303.

[110] Cf. Spartakusbrief (Carta de Spartakus), Nr. 12, Outubro de 1918.

[111] Cf. Vortwärts. Berliner Volksblatt (Avante. Diário Berlinense do Povo). Aufruf des Parteivorstandes zum Eintritt der SPD in die Regierung (Conclamaçao da Presidência do Partido para o Ingresso do SPD no Governo), Berlim, 17 de Outubro de 1918.

[112]  Vide, acerca do tema, Liebknecht, Karl. Acerca da Justiça de Classe, Sao Paulo-Munique-Paris : Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2002, especialmente Introduçao : O Revolucionário Karl Liebknecht, p. 16.

[113] Nesse sentido, vide, de modo mais preciso, Winkel, Udo. November-Revolution 1918(A Revoluçao de Novembro de 1918), in : Fritz Rück. Schriften zur Deutschen November-Revolution 1918 (Escritos sobre a Revoluçao Alema de Novembro de 1918), Stuttgart : Selbstverlag Studiengruppe zur Geschichte der Arbeiterbewegung, 1978, p. 10.

[114] Cf. Anderson, Evelyn. Hammer oder Amboß (Martelo ou Bigorna), Nürnberg, 1948, p. 65. 

[115] Cf. Nettl, Peter. Rosa Luxemburg, Köln-Berlin, 1969, p. 677.

[116] Vide, nesse sentido, Liebknecht, Karl. Acerca da Justiça de Classe, Sao Paulo-Munique-Paris : Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2002, especialmente Introduçao : O Revolucionário Karl Liebknecht, p. 16.

[117] Acerca dessa caracterizaçao político-doutrinária, vide, mais precisamente, PROTOKOLL DES VIERTEN KONGRESSES DER KOMMUNISTISCHEN INTERNATIONALE (Protocolo do IV Comgresso da Internacional Comunista)(De 5 de Novembro a 5 de Dezembro de 1922), especialmente : Aufrufe, Thesen, Resolutionen. Beilage VII. Thesen über die Taktik der Komintern (Conclamações, Teses, Resoluções. Anexo VII. Teses acerca da Tática do Komintern)  Hamburg : Carl Hoym, 1923, pp. 1.007 e s.

[118] Acerca do tema, vide Pieck, Wilhelm. Vorwort zum Karl Liebknechts Gesammelte Werke (Prefácio às Obras Completas de Karl Liebknecht), in : Karl Liebknecht. Gesammelte Werke, Berlim : Dietz, 1958, p. 44.

[119] Acerca do tema, vide Kautsky, Karl. Dr Weg zur Macht(O Caminho para o Poder)(1909), Frankfurt a.M. : Europäischer Verlag-Anstalt, 1972, pp. 13 e s.

[120] Cf. Der Spiegel, Nr. 68, 1968, pp. 7 e s.

[121] Cf. Behrend, Manfred. Der Wandschirm, hinter dem nichts geschiet. Bildung, Tätigkeit und Ende der ersten deutschen Sozialisierungskomission (A Tela de Parede, Atrás da Qual Nada Acontece. Formaçao, Atividade e Fim da Primeira Comissao de Socializaçao), in : Glasnost Archiv, Berlim, www. glasnost. de/ autoren/ behrend/ sokomm.html. Cumpre anotar que esse artigo de Manfred Behrend em referência baseia-se, largamente, em seu trabalho da maior amplitude e de grande interesse histórico, intitulado “Die erste deutsche Sozialisierungskomission in ihrem Verhältnis zu den Reichsbehörden(A Primeira Comissao de Socializaçao Alema em Relaçao com as Autoridades Imperiais), produzido em 1957. Adicionalmente acerca do tema, permito-me remeter o leitor à importante obra de Habedank, Heinz. Um Mitbestimmung und Nationalisierung während der Novemberrevolution und im Frühjahr 1919(Acerca da Decisao Participativa e da Nacionalizaçao Durante a Revoluçao de Novembro e o Início do Ano de 1919), Berlim, 1967, pp. 7 e s.

[122] Nesse sentido, vide, claramente, Dingel, Frank. Die Revolution 1918/19 in Deutschland (A Revoluçao de 1918-1919 na Alemanha), in : Neue Gesellschaft für Bildende Kunst (Nova Sociedade para a Arte Cultural), Revolution und Fotografie. Berlin 1918/19 (Revolução e Fotografia. Berlim 1918-1919), Berlim : Verlag Dirk Nishen, 1989, p. 40.

[123] Nesse sentido, vide as citações apresentadas por Fischer, Ruth. Stalin und der deutsche Kommunismus. Der Übergang zur Konterrevolution(Stálin e o Comunismo Alemão. A Transição para a Contra-Revoluçao), Frankfurt a. M. : Verlag der Frankfurter Hefte, 1948, p. 86.

[124] Acerca do tema, vide o relato do presidente do congresso Muller, Richard. Vom Kaiserreich zur Republik (Do Império Cesarista à República), Vol. II, Berlim, pp. 203 e s.

[125] Sobre esses números, vide Flechtheim, Ossip K. Die KPD in der Weimarer Republik (O PCA na República de Weimar), Frankfurt a.M., 1969, p. 125.

[126] Relativamente a esses números – que divergem, porém, apenas sensivelmente nos diversos livros publicados sobre o tema – vide, sobretudo, Cf. Kunstamt Kreuzberg und Institut für Theaterwissenschaft der Universität Köln. Weimarer Republik, Berlin-Köln : Elefanten Press, 1977, p. 104.  

[127] Cf. Flechtheim, Ossip K. Die KPD in der Weimarer Republik (O PCA na República de Weimar), Frankfurt a.M., 1969, p. 126.

[128] Cf. Cohen, Max. in : Allgemeiner Kongress der Arbeiter- und Soldatenräte Deutschlands vom 16 bis 21 Dezember 1918 im Abgeordnetenhause zu Berlin. Stenographische Berichte.(Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha de 16 a 21 de Dezembro de 1921, ocorrido na Câmara dos Deputados de Berlim. Relatórios Estenográficos), ed. Zentralrat der sozialistischen Republik Deutschlands (Conselho Central da República Socialista da Alemanha), Berlim : Herrenhaus, 1919, Coluna 216.

[129] Cf. Idem, ibidem, Coluna 217 f.

[130] Anote-se que foi apenas em dezembro de 1920, no quadro do Congresso Extraordinário dos Sociais-Democratas Independentes, que se operou a esperada ruptura entre a ala majoritária de esquerda, comandada por Ernst Däumig (237 delegados), e a ala de direita, dirigida por Rudolf Hilferding (156 delegados), sob o impacto da intervenção oral de Grigori Zinoviev que clamava : “Vocês têm de decidir claramente em prol do menchevismo ou do bolchevismo !” Acerca do tema, vide Weber, Hermann. Die Wandlungen des deutschen Kommunismus. Die Stalinisierung der KPD in der Weimarer Republik(As Modificações do Comunismo Alemão. A Stalinização do PCA(KPD) na República de Weimar), Vol. 1, Frankfurt a.M., 1926, p. 24. A seguir, teve lugar a fusão da ala esquerda do Partido Social-Democrático Independente da Alemanha(USPD) com o Partido Comunista da Alemanha(KPD), operada entre os dias 4 e 7 do mesmo mês de dezembro de 1920, no quadro do Congresso de Halle, dando nascimento ao Partido Comunista Unificado da Alemanha(VKPD), sob a Presidência de Paul Levi e Ernst Däumig. Depois da expulsão de Paul Levi do novo KPD, em 15 de abril 1921, Ernst Däumig veio a abandonar esse Partido. Junto com ele, seguiram o mesmo caminho diversos deputados comunistas, entre os quais Clara Zetkin, Adolph Hoffmann, Kurt Geyer e Wilhelm Düwell. A partir do momento de sua expulsão, Paul Levi fundou, transitoriamente, a Comunidade dos Trabalhadores Comunistas(KAG) e dirigiu-se, a seguir, para o Partido Social-Democrático Independente da Alemanha (USPD), de Karl Kautsky e Rudolf Hilferding.

[131] Cf. Däumig, Ernst. in : Allgemeiner Kongress der Arbeiter- und Soldatenräte Deutschlands vom 16 bis 21 Dezember 1918 im Abgeordnetenhause zu Berlin. Stenographische Berichte.(Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha de 16 a 21 de Dezembro de 1921, ocorrido na Câmara dos Deputados de Berlim. Relatórios Estenográficos), ed. Zentralrat der sozialistischen Republik Deutschlands (Conselho Central da República Socialista da Alemanha), Berlim : Herrenhaus, 1919, Coluna 229.

[132] Acerca do tema, vide ainda Liebknecht, Karl. Acerca da Justiça de Classe, Sao Paulo-Munique-Paris : Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2002, especialmente Introduçao : O Revolucionário Karl Liebknecht, p. 14.

[133] Cf. Luxemburg, Rosa. Zur Russischen Revolution (Acerca da Revolução Russa), in : Rosa Luxemburg. Gesammelte Werke, Vol. IV, Berlim : Dietz Verlag, 1974, p. 365.

[134] Cf. Cohen, Max. in : Allgemeiner Kongress der Arbeiter- und Soldatenräte Deutschlands vom 16 bis 21 Dezember 1918 im Abgeordnetenhause zu Berlin. Stenographische Berichte.(Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha de 16 a 21 de Dezembro de 1921, ocorrido na Câmara dos Deputados de Berlim. Relatórios Estenográficos), ed. Zentralrat der sozialistischen Republik Deutschlands (Conselho Central da República Socialista da Alemanha), Berlim : Herrenhaus, 1919, Coluna 217.

[135] Essa designação foi empregada, criativamente, em Rote Fahne (Bandeira Vermelha), Berlim,  20 de Dezembro de 1918.

[136] Cf. Anhang. Allgemeiner Kongress der Arbeiter- und Soldatenräte Deutschlands vom 16 bis 21 Dezember 1918 im Abgeordnetenhause zu Berlin. Stenographische Berichte.(Anexo. Congresso Geral dos Conselhos de Trabalhadores e Soldados da Alemanha de 16 a 21 de Dezembro de 1921, ocorrido na Câmara dos Deputados de Berlim. Relatórios Estenográficos), ed. Zentralrat der sozialistischen Republik Deutschlands (Conselho Central da República Socialista da Alemanha), Berlim : Herrenhaus, 1919.

[137] Cf. Ebert, Friedrich. Stenographischer Bericht (Relatório Estenográfico), in : Heinrich Schäfer. Tagebuchblätter eines rheinischen Sozialisten (Páginas do Diário de um Socialista Renano), Bonn, 1919, pp. 220 e 221.

[138] Cf. Volkmann, E. O. Revolution über Deutschland (Revoluçao Através da Alemanha), Oldenburg, 1930, p. 147.

[139] Cf. Idem. Ibidem, p. 163.

[140] Ebert, Friedrich. Stenographischer Bericht (Relatório Estenográfico), in : Heinrich Schäfer. Tagebuchblätter eines rheinischen Sozialisten (Páginas do Diário de um Socialista Renano), Bonn, 1919, pp. 225.

[141] Cf. Fischer, Ruth. Stalin und der deutsche Kommunismus. Der Übergang zur Konterrevolution(Stálin e o Comunismo Alemão. A Transição para a Contra-Revoluçao), Frankfurt a. M. : Verlag der Frankfurter Hefte, 1948, p. 84.

[142] Acerca do tema, Schäfer, Heinrich. Tagebuchblätter eines rheinischen Sozialisten (Páginas do Diário de um Socialista Renano), Bonn, 1919, pp. 11 e s.

[143] Cf. Weber, Hermann. Von Rosa Luxemburg zu Walter Ulbricht. Wandlungen des deutschen Kommunismus (De Rosa Luxemburgo a Walter Ulbricht. Mudanças do Comunismo Alemão), Hannover : Literatur und Zeitgeschehen, 1961, pp. retro-mencionadas.

[144] Nesse sentido, vide Radek, Karl. Unterm eigenen Banner(Debaixo de Bandeiras Próprias)(Fevereiro-Março de 1918), in : Karl Radek. In den Reihein der deutschen Revolution 1909-1919. Gesammelte Aufsätze und Abhandlungen (Karl Radek. Nas Fileiras da Revolução Alemã de 1909 a 1919. Ensaios e Dissertações Escolhidas), München : Kurt Wolff, 1921, pp. 406 e s.

[145] Cf. Idem. Die russische Revolution, die deutsche Revolution und die Weltlage. Begrüßungsrede auf dem Gründungsparteitag der KPD(A Revolução Russa, a Revolução Alemã e a Situação Mundial. Discurso de Saudação no Congresso de Fundação do PCA(KPD))(30 de Dezembro de 1918), Berlim : Druck Chemnitz, 1919, pp. retro-mencionadas.

[146] Cf. Idem. ibidem, p. 32.

[147] Cf. Idem. Brief an das Zentralkomitee der KPD (Carta ao Comitê do PCA(KPD))(9 de Janeiro de 1919), in : Illustrierte Geschichte der Deutschen Revolution (História Ilustrada da Revolução Alemã), Berlim, 1929, p. 282.

[148] É imprescindível, porém, resgatar e defender, devidamente, a tradição essencialmente marxista-revolucionária de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburg, comprometida, antes e acima de tudo, com a perspectiva de organização da revolução violenta do proletariado para a edificação de sua Ditadura Revolucionária. Esse posicionamento foi, precisamente, reconhecido e postulado por Lênin no contexto de seu Discurso de Abertura do I Congresso do Komintern, quando se referiu a Liebknecht e Luxemburg, enquanto os melhores representantes da Internacional Comunista. Vide Lênin, Vladimir I. Rede bei der Eröffnung des Kongresses 2. März. I Kongreß der Komm. Internationale (Discurso na Abertura do Congresso de 2 de Março. I Congresso da Internacional Comunista), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXVIII (De Julho de 1918 à Março de 1919), Berlim, 1959, p. 469. Destaque-se, entretanto, à guisa de exemplo, entre os diversos e renomados textos de Rosa Luxemburg, aquele intitulado E Pela Terceira Vez o Experimento Belga, vindo à luz já em 4 de junho de 1902, quando essa autora teve a oportunidade de escrever, de modo incorrumptivelmente claro, contra os legalistas belgas, i.e. Émile Vandervelde e outros : „Entretanto, não por predileção às ações violentas ou ao romantismo revolucionário devem os partidos socialistas, mais cedo ou mais tarde, estar preparados também para embates violentos com a sociedade burguesa, em casos em que nossas aspirações se direcionem contra os interesses vitais das classes dominantes, senão em razão também da amarga necessidade histórica. O parlamentarismo enquanto meio de luta político da classe trabalhadora, individualizador do espírito, é tão fantástico e, em primeira linha, reacionário, como o é a greve geral, individualizadora do espírito, ou a barricada, individualizadora do espírito. Evidentemente, a revolução violenta é, nas condições atuais, um meio de dupla-face, aplicável de modo extremamente difícil. E podemos esperar que o proletariado apenas fará uso desse meio quando se apresentar o único caminho adequado para sua implementação e, evidentemente, apenas em condições em que a situação política de conjunto e a relação de forças assegurem, mais ou menos, a probabilidade de êxito. Porém, a concepção clara da necessidade da aplicação da violência, seja nos episódios individuais da luta de classes seja para a conquista definitiva do poder de Estado é nisso, de antemão, imprescindível. Ela representa aquilo que consegue conferir também à nossa atividade legal, pacífica, a apropriada ênfase e efetividade.“ Cf. Luxemburg, Rosa.  Und Zum Dritten Male das Belgische Experiment (E Pela Terceira Vez o Experimento Belga)(4 de Junho de 1902) , in : Rosa Luxemburg Gesammelte Werke, Vol. ½, Berlim, 1972, p. 247.

[149] Cf. Radek, Karl. Die Entwicklung der deutschen Revolution und die Aufgaben der Kommunistischen Partei (O Desenvolvimento da Revolução Alemã e as Tarefas do Partido Comunista), Berlim : Rote Fahne, 1919, pp. 32 e s. 

[150] Cf. Paquet, Alfons. Der Geist der russischen Revolution(O Espírito da Revolução Russa), Leipzig : Nyland, 1919, pp. VII e s.

[151] Nesse sentido, desde a perspectiva da minoria zinovievista do Partido Comunista da Alemanha(KPD), Ruth Fischer assinala : “O Comitê Central do Partido Comunista da Alemanha novamente formado não estava oficialmente informado acerca desses contatos entre Radek e o General Staff, porém dois ou três de suas pessoas íntimas, tal como Paul Levi e August Thalheimer, sabiam, inquestionavelmente, sobre eles. Muitas figuras políticas da República de Weimar ficavam contentes de ter a oportunidade de ver Radek e com ele discutir acerca de política alemã. Ele desempenhava seu duplo papel habilmente – ele era, de um lado, o representante do Politburo Russo, e, de outro, fez-se como o enviado do Estado Russo em uma missão militar e diplomática semi-oficial junto ao Governo Alemão.” Cf. Fischer, Ruth. Fischer, Ruth. Stalin und der deutsche Kommunismus. Der Übergang zur Konterrevolution(Stálin e o Comunismo Alemão. A Transição para a Contra-Revoluçao), Frankfurt a. M. : Verlag der Frankfurter Hefte, 1948, pp. 207 e 208. 

[152] Cf. Trotsky, Léon. Prestuplienia Stalina (Os Crimes de Stálin)(1937), Moskva : Izdatel’stvo Humanitarnoi Litieratury, 1994, p. 152.

[153] Cf. Radek, Karl. Zur Taktik des Kommunismus : Ein Schreiben an den Oktoberparteitag der KPD(Acerca da Tática do Comunismo : Uma Carta ao Congresso de Outubro do PCA(KPD)), Berlim : Editora do KPD-Spartakusbund, 1919, p. 5.

[154] Cf. Idem. Die Entwicklung der deutschen Revolution und die Aufgaben der Kommunistischen Partei (O Desenvolvimento da Revolução Alemã e as Tarefas do Partido Comunista), Berlim : Rote Fahne, 1919, pp. 36 e s. 

[155] Cf. Idem. Der Weg der Kommunistischen Internationale. Rede auf dem III. Weltkongress der Kommunistischen Internationale(O Caminho da Intenacional Comunista. Discurso no III Congresso Mundial da Internacional Comunista), in : Bibliothek der Kommunistischen Internationale, Hamburg : Carl Hoym, 1921, p.34.

[156] Cf. Pieck, Wilhelm. Erinnerungen an die Novemberrevolution und an die Gründung der KPD (Recordaçoes da Revoluçao de Novembro e da Fundaçao do PCA), in : Vorwärts und nicht Vergessen : Erlebnisberichte aktiver Teilnehmer der Novemberrevolution 1918/1919.  (Avante e Sem Se Esquecer : Relatórios de Vida dos Ativos Participantes da Revoluçao de Novembro 191871919), ed. Instituto de Marxismo-Leninismo junto ao Comitê Central do Partido da Unidade Socialista, Berlim : Dietz, 1958, pp. 65 e s.

[157] Cf. Kunstamt Kreuzberg und Institut für Theaterwissenschaft der Universität Köln. Weimarer Republik, Berlin-Köln : Elefanten Press, 1977, p. 148.  

[158] Cf. Idem, ibidem, p. 149.

[159] Cf. Idem, ibidem, p. 148.

[160] Cf. Idem, ibidem, p. 148.

[161] Cf. Idem, ibidem, p. 150.

[162] Cf. Die deutsche Revolution 1918-1919, Frankfurt a. M., 1968, p. 315.

[163] Cf. Idem, ibidem, p. 316.

[164] Cf. Anschütz, Gerhard. Die Verfassung des Deutschen Reiches vom 11. August 1919 (A Constituiçao do Império Alemão de 11 de Agosto de 1919), Berlin-Darmstadt : v. Stilke, 14. ed, 1933, pp. 697 e s. Vide, ainda, os comentários de Astuto R. Gomes, Emílio. Banco Central e Ordem Jurídica, Sao Paulo : Tese de Doutorado da USP, 1997, pp. 56 e s.

[165] Cf. Idem. ibidem, p. 698.

[166] Nesse sentido, vide Huber, Ernst Rudolf. Bedeutungswandel der Grundrechte (Transformação do Significado dos Direitos Fundamentais), in : Archiv des öffentlichen Rechts (Arquivo do Direito Público), Vol. LXII, pp. 38 e s.

[167] Cf. Anschütz, Gerhard. Die Verfassung des Deutschen Reiches vom 11. August 1919 (A Constituiçao do Império Alemão de 11 de Agosto de 1919), Berlin-Darmstadt : v. Stilke, 14. ed, 1933, p. 697.

[168] Cf. Verfassung des Deutschen Reichs vom 11. August 1919 (Constituiçao do Império Alemao, de 11 de Agosto de 1919), in : Reichsgesetzblatt (Diário Legal do Império), 1919, Nr. 152, p. 1.383.

[169] Cf. Anschütz, Gerhard. Die Verfassung des Deutschen Reiches vom 11. August 1919 (A Constituiçao do Império Alemão de 11 de Agosto de 1919), Berlin-Darmstadt : v. Stilke, 14. ed, 1933, p. 698.

[170] Nesse sentido, vide Schmitt, Carl. Inhalt und Bedeutung des zweiten Hauptteils der Reichsverfassung (Conteúdo e Significado da Segunda Parte Principal da Constituição do Império), in : Handbuch des Deutschen Staatsrechts (Manual de Direito Alemão do Império), Vol. II, Berlim-Leipzig, 1932, pp. 574 e s.

[171] Cf. Verfassung des Deutschen Reichs vom 11. August 1919 (Constituiçao do Império Alemao, de 11 de Agosto de 1919), in : Reichsgesetzblatt (Diário Legal do Império), 1919, Nr. 152, p. 1.383.

[172] Cf. Anschütz, Gerhard. Die Verfassung des Deutschen Reiches vom 11. August 1919 (A Constituiçao do Império Alemão de 11 de Agosto de 1919), Berlin-Darmstadt : v. Stilke, 14. ed, 1933, p. 705.

[173] Cf. Karl Liebknecht. Dokumente und Materialien zur Geschichte der deutschen Arbeiterbewegung (Documentos e Materiais acerca da História do Movimento dos Trabalhadores Alemaes), Série II, Vol. II, Berlim : Dietz, 1957, pp. 273 e 274.

[174] Cf. Lenin, Vladimir I. Der „linke Radikalismus“, die Kinderkrankheit im Kommunismus (O „Radicalismo de Esquerda“ : Enfermidade Infantil no Comunismo)(Abril-Maio de 1920), in : W. I. Lenin Werke, Berlim, 1962, Vol. XXXI, pp. 20 e s.

[175] Cf. Lenin, Vladimir I. Brief an die Arbeiter Europas und Amerikas (Carta aos Trabalhadores da Europa e da América), in : W. I. Lenin Werke, Vol. XXIII, Berlim, 1959, p. 384.

[176] vide LIEBKNECHT, KARL. Was Will der Spartakusbund? (O Que Quer a Liga Spartakus), 23 de Dezembro de 1918, p. 519.

[177] Vide LIEBKNECHT, KARL. Grundzüge einer Marxkritik (Traços Fundamentais de uma Crítica de Marx), in: Studien über die Bewegungsgesetze der Gesellschaftlichen Entwicklung (Estudos sobre as Leis de Movimento do Desenvolvimento Social), Kurt Wolff Verlag, Munique, 1922, pp. 247 e s.